quarta-feira, janeiro 17, 2024

Vává


Passei há pouco no Vává. Que será feito daquele lugar? Nem arrisquei entrar!

Nunca fui muito do Vává, o mítico café e snack-bar da Praça dos Estados Unidos, lugar geométrico de encontro geracional de gente que fez muito bem às artes, às letras e à modernidade de um Portugal então parado no tempo. Os meus pousos lisboetas, por esses tempos dos anos 60 e 70, eram, um pouco mais abaixo, a Granfina (e o Nova Iorque, às quartas, quando a Granfina fechava) e, mais tarde, o Montecarlo.

Eduardo Guerra Carneiro, poeta vila-realense de um tempo anterior ao meu, com quem ainda tive o gosto de charlar em algumas noites no Snob (eu era mais Procópio), escreveu um dia isto sobre o Vává, no seu "Isto anda tudo ligado":

"Os guerrilheiros que saem do Vává benzem-se à sua maneira, como se a próspera guerrilha se fundasse em qualquer casa além da linha. Sábios de nascença citam nomes e têm decorada uma biblioteca, tal qual alguns desenraizados do Saldanha - mas de modo diferente. Abotoam-se com esmero e engravatam-se ou não conforme as circunstâncias. Os guerrilheiros que entram no Vává usam as citações à bandoleira e telefonam com muita assiduidade."

19 comentários:

Luís Lavoura disse...

Que engraçado, eu morava muito perto do Vavá, mas nunca tive qualquer consciência de que esse estabelecimento fosse "mítico". Creio que só lá entrei uma ou duas vezes! Nunca fui de cafés nem snack-bares...

Tony disse...

O Vavá foi durante anos reencontro dos chamados cineastas, entre eles: António Pedro de Vasconcelos, Zé Fonseca e Costa, César Monteiro, João Botelho, etc. E ainda se lhes juntavam Vários outros, ainda estudantes, como os meus amigos: Fernando Vilhena de Carvalho, José Manuel Picão de Abreu, António Russo Dias, Margarida Figueiredo, prima de Sá Carneiro (estes dois, colegas do Sr. Embaixador). Alguns deles viviam numa República, defronte na Av.EUA.

Francisco Seixas da Costa disse...

Problema seu, Luís Lavoura, problema seu! Embora talvez não saiba! Se não conhece a importância do Vává...

Tony disse...

No Vavá, numa remodelação, foi decorada com bonitas pinturas da Menez, na altura mulher de Eduardo Anahory.

Flor disse...

É de facto um Café mítico. Infelizmente nunca entrei. Passava do outro lado da rotunda a caminho da Mexicana e pelo caminho olhava para as montras. Alguns dos grupos que eu era fã paravam por lá. Talvez para quem me acompanhava o Vavá não lhe dizia nada.

manuel campos disse...


Eu nem por isso, minha mulher sim, ali entre o fim da adolescência e o princípio da idade adulta.

Por acaso também estava ali a menos de 100 metros e a pé há uma hora atrás, pelo que se me tivesse já dado conta desta dúvida teria lá ido dar uma espreitadela.
Vou lá um dia destes, ainda que saiba que é sempre um risco voltar aos locais onde alguém foi feliz (dependendo da conclusão logo a trago ou não aqui).

Passou-se há "centenas" de anos uma situação caricata comigo no Vává.
Tinha lá ido jantar com uma namorada da altura e os pais dela quando, eis senão quando, terei dito qualquer coisa que o senhor (que não morria de amores por mim) "aproveitou" para expulsar-me da mesa, porventura com a ideia de também me correr da vida dele.
Portanto peguei no meu prato, copo e talheres e fui acabar de jantar para outra mesa (e pagar a minha conta, claro).
É bom lembrar que estávamos em meados dos anos 60, não era suposto um promitente genro ter muitas opiniões.

PS- Caro Tony, eu acrescentaria à sua bem composta lista o nome de Fernando Lopes (e Maria João Seixas), de quem conhecemos a descendência.
E claro Fernando Tordo, Paulo de Carvalho e Carlos Mendes, noutra "secção".

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Uma lenda!
Estive no Vavá em 2016 quando fui fazer uma espécie de casting para participar no concurso "The Big Picture" da RTP, no Hotel Roma. Participei no concurso, vim de mãos a abanar, mas cheguei à antepenúltima pergunta.

manuel campos disse...


Referia-me aos descendentes do 1º casamento de Fernando Lopes e, neste particular, às filhas.

Tony disse...

Muito bem, caríssimo Manuel Campos.

manuel campos disse...


Para quem queira ír mais longe (ou não ficar tão perto).

“Vavá, a história de um café com muito cinema” de Lauro António em “amensagem.pt”, o sítio de Lisboa, uma crónica de 16 de Julho de 2017.

No sítio Lojas com História é procurar “lojascomhistoria.pt/lojas/va-va", por aqui fica-se com uma ideia da decoração actual que, do meu estrito ponto de vista, me parece menos propícia a discussões intelectuais até às tantas da manhã.

Hoje não se conversa, não se trocam ideias, não se debatem com honestidade argumentos contrários, o diálogo morre antes de nascer pela radicalização crescente das novas “trincheiras” em que muita gente se enfia para se sentir segura nas suas inseguranças.
Por isso, a “nova” vida é construída à volta dos dois polegares a escreverem freneticamente banalidades no teclado do smartphone.

Pensando melhor acho que é melhor não dar a espreitadela, está dada virtualmente.
Deixo a casa livre para os “deste tempo” pois eu sou claramente “de outro tempo”, como já qui disse.

Como ontem o médico me disse, logo que entrei no gabinete dele, um esfuziante “Está cada vez mais novo!” e nem tem pressa nenhuma que eu faça as análises e exames de rotina do ano (nem as prescreveu), sou capaz de me ír safando por uns tempos.
Passadas as 3 da manhã aqui continuo e hoje fartei-me de tratar de assuntos por aí, 7 horas de um lado para o outro sempre a pé ou de Metro, meia hora para almoçar pelo caminho.

Tony disse...

Parabém, Manuel Campos. Saúde de ferro, sem ferrugem. Penso que somos da mesma década (1946) cá o rapaz, daqui, por três meses, vão 78. A atividade é indispensável. Eu, desde 1981, estou inserido numa classe de ginástica do SCP,3 vezes por semana,(3a, 5a e sábado) ás 8 da manhã. No fim, ainda, dois jogos de Volei. Tudo, gente reformada da vida ativa, ou em vias disso: Vários médicos, economistas, advogados. Até o Sr. João Rocha, integrou a nossa classe. Isto, para dizer, caro Manuel Campos, que me sinto com uma pujança física de fazer inveja. O pior é que me abre muito o apetite! Estimulada, ainda, pelas sábias sugestões gastronómicas do Patrão.

Nuno Figueiredo disse...

oh lavoura, vá-se catar!

manuel campos disse...


Caríssimo Tony

Mais que da mesma década, do mesmo ano, ainda que o meu amigo tenha mais alguns mesitos que eu, o que nestas idades pesa imenso, como se sabe.
Eu aliàs costumo dizer que tenho 77 anos mas ninguém me dá mais que 76.

A actividade é de facto indispensável e eu nunca páro.
Pelo que me conta também não pára e há mais de 40 anos (!) num registo “mais profissional” que o meu (e globalmente mais correcto para o efeito que se pretende), é notável.
Eu é que lhe dou os sinceros parabéns, até mesmo com uma certa “invejazita” da sua persistência e resistência.
Agora às 8 da manhã é que me parece uma violência: pois se eu às 3 da manhã ainda estou aqui a debitar filosofia barata.

Ora ainda bem que lhe abre o apetite (e isso de tentar justificar-se com as “provocações” do Patrão dá sempre jeito pois não se pode provar que não é bem assim).
É que nunca devemos, para viver até aos 100 anos, privar-nos das coisas que justificam que se viva até aos 100 anos.

Hoje lá foi dia de levar minha mulher a um tratamento ali para os lados do CI, deixei-a à porta, fui arrumar o carro no parque do dito cujo CI, andei um bocado pela livraria, fui ter com ela a pé lá abaixo na rua, voltámos calmamente os dois de braço dado, almoçámos no “Espaço Gourmet”, andámos pelos saldos só para confirmar que não queríamos nada, fomos fazer as sacrossantas compras da semana ao supermercado de lá, voltámos para casa há pouco debaixo de chuva.
E é chegados a casa que a coisa aquece, como o prédio é “um clássico” (é mesmo) e não tem elevador, aqui o rapaz parou em 2ª fila (minha mulher ficou a tomar conta do carro) e subi duas vezes com sacos de compras os 75-setenta-75 degraus, fui arrumar o carro à garagem de recolha a 400 mts e ainda vim de lá com mais 2 sacos mais leves.
Ufa, que só de escrever isto fiquei mais estoirado do que de o fazer.

Aqui há uns anos minha mulher fez um exame daqueles de densimetria óssea, tendo dado que os membros inferiores tinham creio que 110% lá do índice que interessa.
Pergunta-lhe o médico se fazia “step”, o exercício aeróbico.
Responde-lhe ela que sim, que todos os dias fazia 75 steps.

E mais ainda: estou mais crescido.
Toda a vida disse a toda a gente que tinha 1,67 mts, era o que dizia o BI e diz agora o CC.
Ora tenho um amigo que teimava ter 1,80 mts e é da minha altura, se tanto.
Portanto fui fazer uma medição científica e afinal tenho 1,71 mts.
Quando tirávamos o BI davam-nos com aquela régua que corria ao longo do cursor da altura, devo-me ter encolhido com o susto.

Andar muito direito ainda e ter um passo suficientemente “atlético” ajuda muito a isto tudo, mas isso o meu amigo sabe pois, com o exercício que faz, estará decerto melhor que eu, essa dos 2 jogos de vólei é obra, ainda fiquei a pensar nisso.
Amanhã é dia de F. Champalimaud, é o que é, “here we go again”.

Um grande abraço para si, que muito aprecio também pela franqueza que põe nas suas intervenções.

manuel campos disse...


Estava ali a tentar repescar uma ideia num livro de bolso (um grande bolso, mas um bolso) e passei outra vez por uma história que mete o Milo Manara.

Mas como são quase 3 da manhã e eu não tenho a vossa vida, fica para depois.

afcm disse...

Por razões do acaso e da Vida, já fui feliz aqui ) no

manuel campos disse...


O Milo Manara (Maurilio Manara) é um rapaz de 1945, um desenhador italiano mais conhecido pela vertente erótica da sua obra (adaptei da Wiki, lá diz desenhista, não uso).
Está aqui o que basta para perceber o resto.

Naqueles tempos de há 30 anos em que ía todos os meses a Bruxelas, era no Boulevard Adolphe Max que me instalava pois ficava perto de tudo o que me interessava nas horas vagas.
Este Boulevard foi construído há uns 150 anos quando taparam e desviaram o rio Senne para permitir a construção ali, havia de ser bonito hoje em dia, desviar e tapar um rio para encher aquilo de prédios.

Nessa altura era por ali que eu fazia o meu passeio diário, antes ou depois de jantar.
Havia então, já não me lembro se no próprio Boulevard se em alguma das ruas à volta, um ou outro alfarrabista, aberto até tarde, com livros e revistas de todos os tipos e onde eu passava uns bons bocados.
E é aí que entra o nosso amigo Milo, pois era precisamente a ver umas obras dele (Manara) que eu estava quando constato que na loja também estava um bem conhecido cidadão português, não político e sem simpatias politicas conhecidas, pessoa que aliàs respeito bastante como profissional.
Só que essa pessoa mostrava algum desassossego, olhando para a porta preocupado sempre que entrava alguém, mas não me ligando grande coisa, pois quem vê caras não vê nacionalidades e eu já tinha perguntado por um livro num francês respeitável.
Claro que fui andando e claro que passei um pouco depois pelas revistas que ele “consultava” (também as “consultei”), onde conclui que, ao pé daquilo, os desenhos do Manara eram passíveis de serem fortemente aconselhados a crianças da pré-primária.
Claro que a situação para mim era e é normalíssima, falsos pudores sempre me irritaram, achei (e continuo a achar graça) àquilo e, quando conto a história ao sabor das conversas que são como as cerejas, nunca disse o nome do senhor, este mundo é pequenino.

Ora isto hoje seria impossível de acontecer, quem ía correr esse risco?
É que, à força do mundo mudar mais depressa do que a nossa mente pode acompanhar, parece que quase toda a gente já não se lembra que há 30 anos havia uns telemóveis pouco práticos e muito caros que faziam e recebiam chamadas, diziam o dia e a hora e pouco mais.
E que hoje a probabilidade de um português que reconheça outro português "famoso" não se ensaiar nada para filmar a pessoa e o que está a fazer e pespegar tudo na net no momento seguinte é grande, a fase seguinte vir a ser tema de programas mais ou menos humorísticos está garantida.

Francisco Seixas da Costa disse...

Manuel Campos. Na pag. 414 do meu livro está lá...

manuel campos disse...


Caro Embaixador Seixas da Costa

O livro de bolso, de grande bolso mas um bolso, onde andava à pesca da ideia (era uma frase que me marcou) é o seu.

De facto eu devia tê-lo referido, porque a inspiração desta lembrança vem de lá, mas pus-me armado em engraçado, o costume, o que é que se há-de fazer.

Só agora ao lê-lo me dei conta que é um cuidado que devo ter nesta "espécie de pastiches", nem pode ser de outra maneira.

Um excelente fim-de-semana para si.





manuel campos disse...


Ainda a propósito de locais de restauração míticos.
Já contei que nunca fui dado à “Mexicana”.
Mesmo tendo vivido e estudado por ali muitos anos e há muitos anos, não me lembro de lá ter entrado mais de uma dúzia de vezes, enquanto vivia positivamente entre a Copacabana e a Roma (às vezes ía casa).

Por razões de natureza prática nos últimos 2 meses acabámos por almoçar lá três vezes, sempre o bife que parecia o mais seguro (apesar de só da 1ª vez ter sido).
Tendo que escolher por ali um sítio espaçoso e pouco ruidoso, onde se pudesse ficar à mesa 3 horas, para conversas mais "de família", é bom.
Tem ali ainda um estacionamento subterrâneo ao lado da igreja, a cancela abre logo e entramos, muitos lugares, à saída escrevemos a matrícula do carro na máquina de pagamento, ficamos felizes quando aparece “viatura encontrada!” ou algo do género, pagamos e a cancela de saída abre logo também, nada daquelas cenas “mas o que é que eu fiz ao raio do bilhete?”.

Pois o “Observador” tem um artigo de há 2 dias sobre o dito espaço comercial que se pode encontrar aqui.

“Pobre Mexicana: podíamos estar num pastelaria clássica ou no refeitório de uma fábrica de ar condicionado há 40 anos”.

Não há ali exagero nem má vontade, é assim mesmo agora.


Isto é verdade?