Chama-se Ali, é iraniano, vive por cá há dois anos e guia um Uber. Não conversámos sobre política, mas vi, pelo retrovisor, que lhe sorriram os olhos quando, a propósito das minhas poucas memórias do seu país, lhe falei de Farah Diba, a mulher do último Xá, uma senhora muito simpática com quem, por mais de uma vez, conversei em jantares em casa de uns amigos iranianos, em Paris. "Ah! A família Pahlavi!", reagiu, com o que me pareceu ser alguma nostalgia, embora admita poder estar enganado na minha perceção, formada no banco de trás do carro. Depois, passámos ao futebol. Ali era fã de Carlos Queirós, que treinou a seleção do seu país. Agora, ao que me disse, não há portugueses no futebol iraniano. Contei-lhe que, numa noite em Teerão, há vinte e tal anos, à saída de um jantar num "caravanserai", de uma mesa alguém perguntou de onde vinha o nosso grupo. Quando respondi que éramos portugueses, saltou logo de várias bocas dessa mesa: "Figo!". "Hoje seria 'Ronaldo!' ", disse-me Ali, com uma gargalhada saudável. À despedida, quis ter a simpatia de referir que Portugal tinha duas coisas muito boas: o clima e as pessoas. Só espero que o Ali, na sua vida por cá, não encontre razões para mudar de opinião. Sobre o clima, claro.
13 comentários:
Por aqui, na minha zona de Lisboa, há iranianos, indianos, nepaleses, romenos, ucranianos (brasileiros sempre houve, alguns há mais de 20 anos).
E depois há franceses, italianos, ingleses, americanos, mas isso é outro campeonato das zonas antigas, como se sabe.
Aqui nas obras do telhado andam dois indianos, muito simpáticos, muito trabalhadores, bastante elogiados pelo encarregado, que conhecemos há muito tempo e é de poucos elogios.
Quando nos começámos a cruzar sorriam e cumprimentavam com a cabeça, um dia um deles perguntou a minha mulher “Do you speak English?”, ficou feliz com a resposta.
Há dias cruzei-me com ele e perguntei “Está tudo bem?” ao que ele respondeu com um grande sorriso “Tudo!”, está adaptado.
As muito poucas vezes que fico por casa o dia inteiro, tenho por hábito almoçar fora à mesma, à laia de intervalo, minha mulher raramente vai comigo.
Cansado do caminho que as coisas tomaram na restauração por estes lados, vou ali a uma dessas pastelarias que servem umas refeições completas e rápidas, os donos tratam bem toda a gente ao contrário do “novo-riquismo” dos velhos restaurantes, sempre à espera de turistas que não vão lá porque se servem no Minipreço, os portugueses daqui deixaram de os frequentar e é curioso ver os habitantes locais mais abastados na tal pastelaria onde vou.
Por lá estão dois iranianos que só falam inglês mas toda a gente gosta deles, dos clientes ao patrão, educados, trabalhadores, simpáticos (um deles chama-se Reza).
Ucranianos há muitos e dou-me bastante bem com um deles, talvez o mais empreendedor deles todos, já está cá há muito tempo, tem uma empresa próspera.
Como guarda o carro na mesma garagem de recolha que eu e houve uns tempos em que chegávamos os dois ao mesmo tempo, conversávamos um bom bocado, fala um português perfeito (como aliàs é comum nos ucranianos que cá vivem).
Aqui há uns meses comprou um carro eléctrico, o melhor sítio para o ter a carregar era o lugar onde estava o “espada”, educado como é nunca me disse nada.
Fui eu que lhe perguntei se não queria trocar de lugar, ainda ficou mais meu amigo.
Os brasileiros estão por aí há muitos anos, perfeitamente integrados, a vantagem de ninguém conhecer a minha vida é que todos os outros me dão a conhecer a vida deles.
Sendo eu alguém que aperta a mão e conversa 5 minutos exactamente do mesmo modo com o professor universitário como com o carteiro da área, isso abre muitas portas, diria mesmo que todas.
E sobre as pessoas... Tenho algumas dúvidas sobre a capacidade de acolhimento dos portugueses relativamente a estas pessoas mais pobres.
Defronte da minha casa, está em construção, uma mega obra, no local onde se localizou o anterior Estádio do Sporting Clube de Portugal. Como estou num 10º andar e um pequeno terraço, acompanho ao pormenor, quer o avanço da obra, quer o conjunto dos seus operários da mão de obra: Na cofragem, À parte dos capacetes brancos (Engenheiros) há +ou- 90% de operários, quase todos eles imigrantes: africanos na cofragem; e asiáticos na construção dos vários edifícios. É frequente, muito cedo, no início da manhã, junto ao portão da entrada da obra, uma fila de, maioritariamente asiáticos, alguns com turbante Sikh, a pedir trabalho. Quer-me parecer, não fora esta força de trabalho imigrante, a coisa, com a prata da casa, para este tipo de trabalho, tornar-se-ia muito complicada.
Que o clima português é quase imbatível, isso é sem dúvida verdade.
É que, não somente não faz muito frio nem muito calor, como também é muito raro haver grandes tempestades que dêem azo a cheias, como regularmente há noutros países com clima similar (por exemplo, sul da Austrália ou Califórnia).
Em que língua foi a conversa?
O título do "post" - grande inspiração.
Manuel Campos. A Eletrorápida! Do que se foi lembrar! Entrava-se por um lado e saía-se por outro, não era?
Pedro Sousa Ribeiro. Em inglês, mesmo muito escasso da parte dele.
Caro Embaixador
Não tenho a sua memória mas tenho ideia que sim.
Se surgia a tal dúvida que era preciso pôr a quem ía pagar a conta, era uma aflição dado que começávamos a ser pressionados para não estar ali a empatar o "carrossel", correndo mesmo o risco de ír para o fim da fila.
Como a fila por vezes se estendia pela rua, pois aquilo estava aberto creio que até à meia-noite, não era bom ter muitas dúvidas.
Felizmente as dúvidas não eram muitas, o problema tinha que ser resolvido e aquilo era uma oficina de "arranjos rápidos", normalmente simples (mas urgentes) e pouco dispendiosos.
Permito-me o "abuso" de pôr aqui a ligação para o Google Maps onde lá estão as duas portas (tentei encontrar uma fotografia da época mas não consegui).
https://www.google.com/maps/@38.7378302,-9.1417029,3a,75y,323.9h,81.5t/data=!3m6!1e1!3m4!1sI-IdSxP0svImqcy6QcnKCw!2e0!7i16384!8i8192?entry=ttu
Eu estava então parado onde está aquela carrinha cinzenta à esquerda, no quarteirão da Casa da Moeda não estava nenhum carro, no quarteirão entre a Av. Defensores de Chaves e Av. da República ninguém fora um outro carro parado e lá mesmo ao fundo no sinal antes desta última.
Para uma 4ª feira às 11H30 da manhã, nunca tinha visto.
E eu passo ali há anos e no último ano uma vez por semana sem falha e sempre por esta hora, umas vezes à 4ª, outras vezes à 5ª.
Não ando de UBER porque uso Metro e autocarro quando sózinho mas minha mulher anda por vezes e conta-me que há muito condutor que não fala português.
O problema é que alguns também não falam muito inglês (como este que cita) e isso complica por vezes a viagem.
E porquê? Porque eles seguem as indicações de caminho que lhes é dada pela aplicação que usam e torna-se difícil não só indicar-lhes por onde queremos ir como até caminhos alternativos.
Aquelas aplicações são "cegas" no sentido que o caminho óbvio para elas não o é necessariamente para quem conhece muito bem Lisboa e os seus "atalhos" de sempre.
Várias vezes aconteceu no fim da viagem que o condutor, mesmo português, lhe tivesse agradecido as indicações do caminho mais prático, pois ele ou ela o desconheciam e lhes iria passar a ser útil.
Ando de Metro e autocarro mas pago apesar de, como lisboeta e idoso, ter passe grátis, o que confunde alguns amigos e conhecidos.
Como não gasto mais que uns 20€ por mês a carregar o cartão "Navegante", vivo bem confortável com a situação .
Talvez que "Um dia, se calhar, vou ter de começar a pensar nisso. Até lá, não tenho tempo."
Já passa das 03H30, é capaz de não ser má ideia ir dormir, mais logo tenho umas voltas a dar em transportes públicos e sapatos privados.
Tony
não fora esta força de trabalho imigrante, a coisa, com a prata da casa, para este tipo de trabalho, tornar-se-ia muito complicada
É verdade. Conheço construtures civis pequenos (donos de pequenas empresas), e dizem-me que é extremamente difícil encontrar mão de obra, especialmente tendo em conta que, para diversos serviços, é precisa alguma especialização e conhecimento técnico. Nenhum jovem português hoje em dia quer andar, todo sujo, nas obras.
A propósito de imigrantes e de algo mítico pois se refere muito mais a um mito do que a qualquer realidade.
Sabe-se (porque eu conto) que uma ou duas vezes por semana atravesso a Mouraria via Calçada de Santo André e Rua dos Cavaleiros ou pelas ruelas interiores, estreitíssimas e desertas que de longe prefiro.
Também ando uns bons metros pela Rua da Palma acima (e não é para ir à sede de um partido por ali) e depois abaixo.
E faço isto há muito tempo, há tanto tempo que aquelas lojas todas ainda tinham um número considerável de retornados como proprietários, hoje são todas de emigrantes, quase todos asiáticos de várias proveniências.
Fica assim dito que a minha capacidade de ouvir ou ler considerações baseadas em palpites, imaginações delirantes, preconceitos sociais ou ideológicos e notícias avulsas sobre o “Martim Moniz”, vindas de quem visivelmente não o “frequenta” e não passa lá há 20 anos a pé, é muito baixa para não dizer nula.
Vem isto a propósito de hoje ter feito também esse percurso e ter entrado no Centro Comercial que há ali, tendo percorrido durante uma meia hora os três andares do mesmo, o térreo, a cave e a subcave.
E percorri tudo com um blazer espinhado com um mês, que vestia pela 3ª vez, umas calças compradas a semana passada, uns mocassins pele luva novos e o meu inevitável chapéu de Inverno, a minha mulher não me deixa sair de casa mal amanhado.
Tudo isto para dizer que de discreto para aquele local não tinha nada.
Pois andei por ali no meio de um desinteresse total e generalizado pela minha pessoa, único não asiático ou subsaariano por lá durante aquele tempo todo que lá estive.
Como aquele mundo de lojas acaba por ter o seu fascínio, lá me apareciam pessoas a perguntar se queria ajuda cada vez que parava à porta de uma, eu agradecia e voltavam aos seus smartphones (há quem me venha contar de mercados que visitou no outro lado do mundo e, ao fim de 3 minutos, já lhes estou a dizer “Mas isso tens tu no Martim Moniz, não precisavas de ir tão longe”).
Se descesse a Rua Garrett de fato e gravata não teria de certeza sido assim, como nos contou há tempos o nosso anfitrião.
E no entanto, quando conto isto, há sempre algum espanto nas hostes, sejam quais forem as suas ideias sobre o assunto e o seu pendor partidário, uma coisa é dizer coisas bonitas ou feias sobre o tema, outra bem diferente é estar disposto a vivê-lo de forma mais que natural, ainda que de modo pacato e circunstancial.
A conclusão é simples e sempre a mesma: se não conhecem minimamente aquilo de que estão a falar, porque é que não se calam?
E aqui entram também os “populismos” de que tanto se fala quando se fala de emigração.
Para mim, de direita ou de esquerda, ambos os lados põem todo o peso das suas argumentações no prato da balança que mais lhes convém, como era de esperar.
Mas nenhum dos intervenientes nessas acaloradas tomadas de posição andou alguma vez a passear anónimamente e sózinho no Centro Comercial da Mouraria.
E estão os dois lados errados.
"... Mas quanto ao universo, ainda não tenho a certeza."
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