Caíram logo sobre mim, no final daquele jantar, há dias, em Paris, comemorativo da exposição (excelente, diga-se) de Julião Sarmento. Um após outro, com uma curiosidade gulosa, aqueles amigos declinaram, cada um a seu modo, a questão essencial: "então que tal foi a conversa com a sobrinha da Jane Fonda?"
Eu havia jantado ao lado de uma sobrinha da Jane Fonda?! Não sabia!
O jantar tinha sido em mesas redondas, creio que com umas dez pessoas cada. Na minha mesa, à direita, ficou uma senhora nos seus "mid-forties". Havíamos falado de muita coisa, de termos coincidido em Angola durante três anos, nos idos de 80, quando ela era uma criança filha de um diplomata italiano (tinha na memória, como eu, o som das armas que, por noites seguidas, regularmente pontuavam o recolher obrigatório noturno). Contou-me do pai e das ideias, pouco comuns mas muito interessantes, que hoje cultiva, trocámos notas sobre livros (vários), ouvi-lhe um delicioso episódio passado com Isabel dos Santos, escutei-a sobre esse assunto fascinante (e, para mim, misterioso) que é a relação dos artistas com os curadores das suas exposições, relatou-me divertidas histórias sobre os galeristas e o seu mundo, deu-me notícias sobre uma certa Londres que me intriga e que ela conhece muito bem. Foi um jantar muito divertido, solto, bem disposto, ao lado de uma mulher elegante, risonha, inteligente e muito interessante ("não desfazendo" na companhia feminina do outro lado, que não vem para a história).
E se eu tivesse sabido que ela era sobrinha de Jane Fonda? Por certo, estando em Paris, a conversa iria ter a Roger Vadim (e à imbatível série das mulheres que teve, de que a tia dela fora um mero episódio), provavelmente perguntar-lhe-ia coisas sobre o avô (ou teria uma relação por afinidade?), Henry Fonda (escondendo-lhe eu, por recato, o sentimento de o achar um ator muito sobrevalorizado, sempre com ar "enjoado"), pelo tio, Peter Fonda (passando a conversa pelo inevitável "Easy Ryder" e talvez por umas suas polémicas declarações, há semanas, em que chamou "f...-traitor" a Obama), e, como é óbvio, falaríamos da senhora sua tia, que admiro pela coragem na denúncia da guerra no Vietnam, famosa pelos músculos do "workout" e, claro, pela sua filmografia (que nunca me convenceu muito) - eu que bem a conheço desde o (hoje ridículo) "Barbarella". E, claro, viria à baila o ex-tio Ted Turner, o ricaço da CNN, um liberal (no bom sentido, isto é, no sentido americano) com ar de cowboy, que conheci pessoalmente em Nova Iorque, que havia dado um bilião de dólares à ONU, para um fundo em cuja gestão tive o gosto de participar, durante um ano. Já imagino mesmo o muito vulgar "name-dropping" em que cairíamos (ou melhor, em que eu teria a tentação de cair, confesso). Até porque, finalmente, seria preciso falar sobre quem era a mãe dela (irmã de Jane? de um marido?).
Feitas bem as contas, ainda bem que eu não sabia de quem a minha companheira de mesa era sobrinha. A conversa acabou assim por ser bem mais interessante. E, para aqueles amigos, ficou-me no "currículo": "Com que então numa grande conversa com a sobrinha da Jane Fonda, ehin?!"
1 comentário:
Sr. Embaixador
a minha surpresa por vê-lo publicar uma fotografia com alguma capacidade de perturbar este dia de reflexão !
mas vamos ao assunto, e concordo que existe um certo "perigo maléfico" quando são colocadas "etiquetas" nas pessoas, neste caso seria o nome...
se temos a etiqueta determinada, não nos damos ao trabalho de procurar conhecer a pessoa, os seus sentimentos, a riqueza que poderá ter a sua experiência de vida :)
Daí que se aplique os "Feios, Porcos e Maus” e outros mimos de rajada a muita gente
Enviar um comentário