quarta-feira, outubro 30, 2013

Demagogia e ridículo

Tenho um grande respeito pelas instituições do Estado ("reformado" ou não). Por isso, num momento em que o país (se) debate (com) o mais rigoroso orçamento da nossa história democrática, que impõe sacrifícios que deveriam concentrar a atenção prioritário do governo, fico chocado, triste e civicamente insultado, embora (já) não surpreendido, quando vejo um ministro da República, usar da tribuna mediática depois do conselho de ministros para lamentar as graçolas do sr. Blatter sobre Cristiano Ronaldo, num exercício de patrioteirismo demagógico e ridículo.

Portugal - Polónia

Nos idos de 1975, a voga das "associações de amizade" estabeleceu-se em Portugal, em especial incentivadas por gente ligada ao PCP, no tocante aos países "satélites" de Moscovo, enquanto Pequim era a tutela afetiva para as congéneres dos émulos maoístas. Embora andasse politicamente algo longe dessas águas, através de Carlos Eurico da Costa deixei-me arrastar, com algum entusiasmo, para a criação da Associação de Amizade Portugal-Polonia. As reuniões tinham lugar num prédio do Campo de Santana e Alexandre Babo, advogado e escritor, funcionava como eixo - manifestamente, político - dessa operação. Não éramos "inocentes úteis", sabíamos ao que íamos e, na prática, acabávamos por ser uma espécie de "compagnons de route" de uma estratégia bem montada. Mas esse era "l'air du temps"...

A motivação essencial a que nos propúnhamos era levar a cabo um conjunto de iniciativas na área cultural e, na realidade, o grupo de figuras que a Associação foi capaz de juntar (e escrevo de memória) era muito interessante: José Cardoso Pires, Jorge Peixinho, João Abel Manta, Carlos Eurico da Costa, Jacinto do Prado Coelho, Maria Lúcia Lepecki, Luiz Francisco Rebello, etc. A embaixada polaca em Lisboa era titulada, à época, por um homem muito interessante, uma figura da cultura, com um toque de alguma heterodoxia. Lembro-me de termos "grandes planos", gizados com ele, nomeadamente nas áreas musical, teatral, literária, etc.

João Abel Manta produziu para a Associação um cartaz magnífico, com um camponês polaco numa atitude de companheirismo com o Zé Povinho português, num modelo idêntico àquele que fez para a "aliança Povo - MFA". A ideia era comercializá-lo para recolha de fundos, mas duvido que tenhamos tido qualquer sucesso na operação. Na realidade, a única iniciativa "concreta" da Associação de que me recordo foi um concerto de um pianista polaco no S. Luís, de música concreta... Toda a iniciativa desapareceu, no calor desses anos em que havia muito mais que fazer!

Hoje, aqui por Varsóvia, lembrei-me que as minhas ligações à Polónia são já antigas. Neste caso uma "outra" Polónia.

terça-feira, outubro 29, 2013

Rumo a Belém

Faltam dois anos e quase três meses para o país escolher o substituto do professor Cavaco Silva. Tal como naquelas corridas de bicicletas em pista em que os adversários quase não se movem, mas olham uns para os outros com imensa atenção, para ver quem "salta" primeiro, o ambiente pré-presidenciais começa a aquecer, à esquerda e à direita. Só quem estiver distraído é que ainda não notou.

Há já os que optam por ser mais explícitos nas suas ambições. Há os que arregimentam discretamente "tropas", por vezes com lugares misericordiosamente pagos. Há os que dão "casuais" entrevistas em tom "de Estado" (para suscitarem do putativo leitor um "ora aqui está alguém que dava um bom nome para Belém!") com um ar "mainstream" (isto é, "bloco central") e sempre com patriótica e crítica angústia, para ir com o tom do fado menor que estamos a viver. Há os que, por entre sorrisos, começam a falar dos perfis que não são adequados ao lugar que eles próprios podem vir a pretender. Outros virão. Os que, "com algum sacrifício", responderão a "apelos patrióticos", com "elevado sentido de responsabilidade", em face da "hora difícil que o país atravessa". E há os que estão calados, porque acham que o tempo é ainda de gestão de silêncios ou, num latim de feira, que o "primum milium passarorum est".

Daqui a tempos, começaremos a assistir a jornadas das "facas longas", isto é, as campanhas mais ou menos "negras" para liquidar putativos concorrentes, com boatarias sórdidas colocadas, como quem não quer a coisa, no seu local mediático habitual. Não é de excluir que surjam aventuras editoriais "ad hoc", como oportunas rampas de lançamento, assentes em estranhos e/ou estrangeiros capitais. Aproveitando a "lufada de ar fresco" que as recentes candidaturas "independentes" terão suscitado, veremos também emergir nomes "impolutos", dessa entidade mítica que é a "sociedade civil", numa espécie de "remake" das vestais do PRD.

Tenho a sensação que vamos ter algumas surpresas no "mercado" dos candidatos, para além dos "clientes" naturais e óbvios deste tipo de ocasiões, isto é, dos candidatos dos partidos disfarçados de personalidades independentes, sob o alibi do caráter "unipessoal" do cargo. Não falo em nomes, mas começa a ter alguma graça o discurso de quantos dizem (e já são alguns) que "é uma ideia que não me passa pela cabeça" (claro que não!) mas que ninguém sabe "o dia de amanhã" e não admitem que ninguém "condicione" o seu futuro. Onde é que eu já vi este filme?

segunda-feira, outubro 28, 2013

Tadeusz Mazowiecki

Tadeusz Mazowiecki, o primeiro primeiro-ministro polaco da era pós-comunista, morreu hoje, na Polónia, onde circunstancialmente estou.

Há anos, convidado a vir falar da Europa a Varsóvia, pelo antigo MNE Bronislaw Geremek, este apresentou-me a Tadeusz Mazowiecki, que estava presente na conferência. Num jantar que se seguiu, Geremek colocou-me ao lado de Mazowiecki e recomendou-me: "Veja se convence o Tadeusz de que Portugal é favorável à entrada da Polónia na União Europeia". Confesso não ter ficado com memória nenhuma (e eu costumo ter boa memória) da minha conversa com Mazowiecki, um homem algo fechado, tímido, com um perfil de intelectual introvertido. Por isso, não faço ideia se então o convenci. Se tal não aconteceu, os factos posteriores vieram jogar a meu favor.

Habermas

Ando, há anos, para ouvir ao vivo o filósofo alemão Jurgen Habermas. Sem ele, não se percebe a Europa. 
 
Já o perdi, "por uma unha", um par de vezes. Hebermas fala hoje em Lisboa. Logo hoje, eu estou na Polónia. Não é apenas coincidência, é azar. 

Lou Reed (1942- 2013)

Já sucedeu a toda a gente. Estávamos em 2002. Entrámos para jantar, com uns amigos, num restaurante que estava na moda, em "downtown" Manhattan. Passámos por uma sala onde uma cara, numa mesa, me disse qualquer coisa. Minutos depois, saiu-me: "não era o Lou Reed que estava naquela mesa à entrada?". A reação foi imediata: "lá estás tu com a mania de que Nova Iorque é só vedetas!". Chegou o empregado e perguntei: "Na mesa, na outra sala, não está sentado o Lou Reed?". Com uma snobe ausência de expressão, respondeu: "Está.Vem cá muitas vezes jantar. Mora ali, na casa em frente". Julgo (já não recordo bem) que ninguém teve coragem para ir espreitar Quando saímos, já se tinha ido. Talvez para um "walk in the wild side". Agora, segundo a notícia que me chega, acabado de desembarcar em Varsóvia, logo depois da derrota do Sporting, Lou Reed morreu. É a vida, ou melhor, é a morte. Há um dia em que chega aos melhores.

domingo, outubro 27, 2013

Notícias do guião

Um conhecido oráculo oficioso de Fafe explicou hoje que o famoso "guião para a reforma do Estado" tem 90 páginas e por título "um Estado melhor".

Enfim, nada de novo a Oeste. Nos idos de 80, reclamava-se "menos Estado, melhor Estado". Outros acrescentariam, com alguma má fé e pior língua "... e o que sobrar para nós". Ainda será assim?

sábado, outubro 26, 2013

Escutismo

Notável é a explicação dada por Ferreira Fernandes, no DN de hoje, para o facto de não surgirem indicações de que os americanos tenham escutado figuras portuguesas:

"Fartos de tantos "eh pá, sei lá!", "vamos a ver..." e "seja o que Deus quiser" desligaram-nos as escutas".

A direita

Gostei muito de ler o Jaime Nogueira Pinto, naquele heterodoxia de linguagem que lhe vem dos tempos do nacionalismo revolucionário, dizer hoje no "Expresso" que, no património imagético herdado do Estado Novo, "a direita acabou por se tornar um cliché do Vilhena, os banqueiros de charuto com uma corista em cada braço ou no joelho, o latifundiário alentejano de "O Delfim", o inspetor da PIDE com uma gabardine e um chapéu, o Salazar nas caricaturas do Manta..." Para concluir: "Aquele Portugal existia, mas não era assim tão mau".

Olha que era, Jaime, olha que era!

Procopiadas

Os leitores deste blogue já devem estar cansados das vezes que, por aqui, lhes falei do bar "Procópio" e dos viciados da sua "mesa dois", uma confraria decrescentemente propensa aos alcoóis e mais dada a chazadas (reais e morais) ou a águas com picos de mais ou menos fama. Às quartas e às sextas, sempre que possível, é dever de quem, deste grupo, anda pela capital, tentar parar uns minutos no "escritório", para rever amigos, trocar graçolas e dar alento à caixa registadora da Alice.

Ontem, um dos membros expatriados dessa tertúlia, havia sido visto de passagem em Lisboa. Constatada a sua "falta de comparência", foi-lhe por mim chamada a atenção telefónica. Logo, no seu Facebook, nos jorrou o seguinte "soneto ao bar Procópio e ao amigo que me chamou":

Eu ouvi o apelo do Procópio,
mas levemente a chuva aqui batia
e a SIC Notícias fez-se ópio,
já eu no meu sofá adormecia,


enquanto no desvão da Mesa Dois
as ideias salvíficas surgiam
e a Pátria se mirava num depois...
que sabemos virá, mas não o dia!

E eu no meu sofá a ressonar!
Ó vergonha, ó infâmia de um destino!
Que é feito do meu brilho a conversar?
"Se nunca o tiveste" diz ladino

o amigo da onça que há em mim!
Pois bebam muito bem, eu fico assim.  

Da filosofia e da vida

1. Nos dias de hoje, ver amigos separarem-se é a coisa mais natural do mundo e, não raramente, a chave para a felicidade futura de ambos. Já assistir a isso num registo de espetáculo público, com a privacidade escancarada ao "voyeurisme", é algo muito triste.

2. Ser olhado de viés numa livraria, acompanhado por cochichos cobardolas, como se estivesse a pedir a "Penthouse", ao comprar um livro de um amigo polémico, retrata bem um Portugal menor que por aí centopeia a sua miséria moral. Aconteceu-me hoje.

Promoção

O "Publico on-line" decidiu promover-me: fala em mim como "antigo embaixador em Luanda", a propósito de umas declarações que ontem proferi, à saída de uma reunião na Assembleia da República", inquirido sobre a situação em Angola.

"To set the record straight": em Angola, fui apenas "secretário de embaixada" durante quase quatro anos (1982-1985), acreditado localmente como "conselheiro", chefiado pelo meu querido amigo António Pinto da França, esse sim, o embaixador português em Angola.

O "Público" errou - para utilizar o nome da secção que o Vicente Jorge Silva, em boa hora, criou com esse nome, desde o início do jornal. Alguma pesquisa jornalística básica poderia ajudar a evitar estes lapsos.

Congos

Ontem, na página do Facebook de um amigo, troquei algumas notas sobre Kinshasa e Brazzaville, as capitais dos dois Congos, separadas pelo majestoso rio com o mesmo nome. E veio-me à lembrança uma história dos anos 80 ligada a uma travessia desse rio.

Eu e um colega acompanhávamos aquela que era a primeira deslocação a África de um jovem político português, com um futuro já então promissor. Acabados os dias de trabalho no então Zaire (hoje República Democrática do Congo), os três tomámos o barco, um "ferry" manhoso e apinhado de gente, que atravessava o rio do mesmo nome, para chegar a Brazzaville, a cidade em frente, na República do Congo, onde teríamos outras reuniões. Contrariamente a Kinshasa, onde havia uma embaixada na qual tínhamos pernoitado nos dois dias da visita oficial, em Brazzaville ficaríamos num hotel, reservado por um cônsul honorário de cujo desembaraço nos diziam maravilhas. Segundo fôramos informados, podíamos ir descansados quanto ao nosso acolhimento e instalação em Brazza, como os locais lhe chamam. Estava tudo tratado.

A viagem foi normal, através de um rio imponente, histórico para Portugal. Quando o barco amarou à margem de Brazzaville, cada um de nós pegou nas suas malas e saiu para o cais. O ambiente era movimentadíssimo, cheio de apitos e gritos, com gente a correr para o barco e outros a formarem filas para controlo dos passaportes. Um pequeno pormenor começou a intrigar-nos: não aparecia ninguém com ar de que estivesse à nossa espera...

O nosso político, de fato escuro e Church brilhantes, olhava ansioso para todo o lado mas, muito especial e insistentemente, para o meu colega e para mim, responsáveis naturais por uma logística que, pelos vistos, começava a falhar. Mirando em volta, ambos nos interrogávamos, em silêncio, sobre o que fazer. O meu colega decidiu ir até à entrada do porto, a fim de ver se acaso não estaria lá alguém. O jovem político ficou então "encarregado" de tomar conta das malas - e guardarei para sempre essa imagem, um tanto ridícula, de uma figura com uma gravidade inquieta, algo intimidado pela coreografia incontrolável de uma África em que quase acabara de aterrar, encastelado com malas em volta. Por mim, dediquei-me a preencher os formulários dos passaportes, umas imensas folhas, em duplicado, onde o que eu ia escrevendo se misturava com gotas de suor que caíam sobre o papel, tipo almaço, onde se alastravam em manchas, num braseiro de mais de 40 graus, sob um sol tórrido.

À distância, o político continuava a olhar-nos, já pálido, num silêncio de raiva, com a nossa imagem profissional a cair a pique. O meu colega regressou, entretanto, da sua expedição com um "carão" preocupado: não estava ninguém no portão do porto a aguardar-nos. Disse que tinha visto táxis no alto de uma rampa, até onde as nossas bagagens teriam de ser transportadas. E ir para onde? Em voz baixa, com o meu colega, fizemos mais duas constatações "dramáticas": não fazíamos a menor ideia de qual era o hotel onde ficaríamos alojados e, o que era mais grave, não tínhamos nenhum dinheiro local. É que tudo estava nas mãos do agora "maldito" cônsul honorário, que, por essa altura do campeonato, já estaria demitido, num despacho virtual gizado na cabeça do jovem político.

Foi então que o meu colega "inventou" uma solução genial. Subi a rampa, falei dois motoristas de táxi, perguntei-lhes se sabiam onde era o "Hotel Hilton" (nome comum que me veio à ideia, mas não havia nenhum Hilton por lá, perguntaram se não seria o Méridien, disse que sim, para nós qualquer solução servia), contratou-se com eles um preço e foi-lhes dito para arranjarem carregadores para trazerem as malas desde o porto, para pagarem a esses carregadores (ficaram perplexos, mas aceitaram), que depois faríamos contas no hotel (lá chegados, logo veríamos se era esse hotel, mas, pelo menos, estaríamos instalados num "lobby" e aí trocaríamos dinheiro). Alugaram-se dois taxis, um para nós e outro para as malas.

O nosso político descrispou um pouco e abancou no táxi que, embora imundo, era a única hipótese que se desenhava. Quando eu, instalado à frente, levantei um pouco a voz ao motorista, que, percebendo o nosso embaraço, estava a querer renegociar o preço, saiu-se com um "não fale assim com os locais!". Eu ia-me passando! O meu colega, homem já com muitas Áfricas, acalmou-o, acalmando-me: "Deixe-o lá! Ele sabe lidar com isto. Não se esqueça que o último posto dele foi em África..."

"To make a long story short": o hotel era mesmo o Méridien, o nosso pobre cônsul, alertado da nossa chegada e arribado pouco depois, ainda ouviu uma zarabanda das antigas antes de ter tempo para explicar que, afinal, a culpa do que tinha acontecido era toda nossa: é que tínhamo-nos precipitado, saindo no porto errado. Devíamos ter aguardado pela acostagem seguinte, um pouco adiante, onde, numa sala VIP, nos esperavam autoridades locais, bebidas frescas e carros oficiais de luxo. E o homem explicou mesmo que todos julgavam que já não viríamos...

Nunca mais esquecerei essa travessia do rio Congo (ou Zaire), por onde já tinha andado o meu conterrâneo Diogo Cão, nos idos de quinhentos, sem táxis nem hotéis nem cônsules. 

sexta-feira, outubro 25, 2013

Humberto França (1952-2013)


Conhecemo-nos um dia em Pernambuco e, desde o primeiro momento, fiquei sensível ao seu contagiante entusiasmo na promoção das questões da latinidade. Foi o criador do movimento "Festlatino", uma iniciativa generosa e idealista, a que se dedicava de corpo e alma, um pouco por todo o mundo.

À medida das minhas possibilidades, dei-lhe alguma colaboração na difusão da "mensagem" do movimento, porque o interpretei como um interessante esforço para reforçar as dimensões culturais da latinidade. Em março de 2012, tive o gosto de o receber na embaixada em Paris, à frente de uma delegação do "Festlatino".

Foi a última vez que nos vimos. Trocámos entretanto alguns mails. A última mensagem que dele recebi foi de maio deste ano. Duvido que o "Festlatino", que vivia da sua força anímica, resista à sua saída de cena.

Conselho da Europa

Desde a manhã de hoje, participo num debate organizado pela Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, na velha sala do Senado, da Assembleia da República. Estamos a tratar questões de Cultura, Ciência, Educação e Media.

Nele falarei dos programas de Educação Global que o Centro Norte-Sul, do Conselho da Europa, que atualmente dirijo, tem vindo a desenvolver.

É muito curiosa esta sensação de intervir, no próprio país, representando uma estrutura de natureza multilateral. Sentimos como que uma neutralização da nossa própria posição pessoal, passando a ser olhados, pelos conhecidos portugueses, como alguém que vem de fora... cá dentro.

As aventuras da ironia

Há dias, falei por aqui da "humilhação" que supostamente atravessaria setores oficiais portugueses pelo facto de não terem sido reveladas escutas suas pelos serviços secretos americanos. O texto fazia jogos de palavras, que julguei facilmente compreensíveis, com ironias à mistura sobre o "guião para a reforma do Estado" (que já aí vem, o que pode significar que fui eu o "ouvido"...) e as supostas escutas na sede do PS.

Então não querem lá saber que, no Brasil, houve quem achasse que os portugueses se estavam a queixar, a sério, por não terem sido espionados?

No Natal do ano passado, fiz por aqui um "desagravo" ao patusco Artur Baptista da Silva, o "especialista" das Nações Unidas que enganou televisões e jornais.

O que sucedeu? Vários blogues acharam que eu tinha acreditado no homem, não obstante, pelo texto, eu ter espalhado notas que davam facilmente a entender que se tratava de uma brincadeira, ainda por cima surgida quando toda a tramóia estava bem clara.

A ironia e o humor são coisas complexas. Passam pela cultura, por pontos de cumplicidade, por códigos. Embora, nos dias que correm, o inverosimil esteja a acontecer, não quero voltar a ser confundido com os produtores de graças tristes. Vou passar a ter mais cuidado.

quinta-feira, outubro 24, 2013

Portuñol

Há uns anos, fui a Madrid chefiar uma delegação portuguesa. Sentado à mesa de trabalho no palácio de Santa Cruz (equivalente ao nosso palácio das Necessidades), iniciei espontaneamente a minha intervenção em espanhol. Segundos depois, dei-me conta que o meu nível de expressão em língua espanhola, sendo mais do que suficiente para uma conversa solta, não dava para sustentar quase duas horas de trabalho técnico, recheado de expressões que não podem dar lugar a um mínimo de ambiguidade.

(Até 1979, eu nunca tinha ousado expressar-me em espanhol. Lia muito bem a língua, percebia-a falada, mas eu próprio falá-la era bem diferente. Daí que raramente ousasse pedir mais do que "un solo".... Quando fui viver para a Noruega, o meu primeiro grupo de amigos era composto por diplomatas espanhóis, brasileiros e latino-americanos. Com algum esforço, tive de começar a "aculturar-me" ao espanhol, que era a língua franca nesse meio. A curiosidade fez-me mesmo comprar uma gramática e livros de exercícios de espanhol. Mas nunca fui muito longe, confesso... Logo nas primeiras férias em Portugal, numa deslocação a Verín, na Galiza, entrei numa loja e teimei em testar o meu espanhol. O comerciante galego sorriu para mim, com um ar piedoso, e disse-me: "Por que não fala português? Percebemo-lo melhor...")

Mas voltemos a Santa Cruz. Ao constatar o esforço que a "habla" me estava a custar (no fundo, repercutindo a tirada do lojista galego..,) o meu contraparte espanhol, Ramón de Miguel, que entendia bem o português, propôs-me o seguinte:

- Eu falo espanhol e tu falas português. Se ambos falarmos devagar, as nossas delegações entendem.

Os minutos seguintes vieram a provar que isso não era verdade. Se, para o nosso lado, era relativamente fácil acompanhar o que o meu contraparte espanhol dizia, notei que, falando em português, mesmo que artificialmente mais lento, a restante delegação em frente a nós tinha dificuldade em entender-me. A constatação disso, ao final de alguns minutos, acabou por pôr-nos todos a falar... em francês!

Porque me lembro disto agora? Porque, há dias, num congresso em que participei na Turquia, sobre a América Latina, vi-me envolvido numa situação complicada, ligada ao uso do espanhol. 

As línguas oficiais eram o turco, o espanhol e o inglês. Durante o voo, preparei uma intervenção para cerca de 40 minutos, que deveria pronunciar num mano-a-mano com a antiga ministra dos Negócios Estrangeiros, Trinidad-Jimenez. Cabia-nos a ambos pronunciar as "conferencias magistrales" que encerravam o primeiro dia de trabalhos. Tendo o inglês como opção, não hesitei um segundo em escolher essa língua.

Para além de dois discursos iniciais de figuras oficiais, em turco, durante o congresso toda a gente falou em espanhol, mesmo os turcos e brasileiros presentes. À medida que se aproximava o momento de intervir, comecei a angustiar-me: só eu falaria em inglês? Isso iria soar muito estranho e obrigaria à mobilização dos aparelhos de interpretação por parte do auditório, que, sem exceção, entendia e falava espanhol.

Foi então que tomei uma decisão, da qual, confesso, me viria a arrepender: decidi falar no "meu" espanhol. No passado, já tinha feito três intervenções nessa língua (uma no Chile, outra no Uruguai, uma outra em Espanha), mas todas haviam sido baseadas em textos escritos, previamente testados com cultores da língua. Desta vez, porém, iria improvisar, com base num texto... em inglês! Na prática, usei um "portuñol" que, no entanto, me deu imenso trabalho. Durante mais de meia-hora, fiz tudo para ser compreendido. Julgo que as pessoas acabaram por perceber o que eu disse, muito embora reconheça que aquela não foi a minha "finest hour". Mas foi uma das mais difíceis!

Decidi que este foi o derradeiro teste ao meu "portuñol". A partir de agora, só o usarei em conversas "ligeiras", nas "tiendas" ou para pedir um café...

quarta-feira, outubro 23, 2013

Descobrimentos

Será na quinta-feira, dia 24 de outubro, na livraria Bullosa, em Entrecampos, que apresentarei este magnífico livro do professor Paulo Jorge de Sousa Pinto, com um prefácio do jornalista Ferreira Fernandes.

Contrariamente àquilo que o título algo "ligeiro" do livro pode induzir, estamos perante um trabalho com grande profundidade histórica, apoiado numa completa bibliografia, escrito num português "de lei", que nos ajuda a lançar um olhar novo sobre algumas questões dessa aventura ímpar que foram os descobrimentos portugueses.

10 brevíssimas

1. Catherine Deneuve fez 70 anos. Isto começa a ser preocupante...
2. Moçambique em pé de guerra. É o que dá um país começar a ter dinheiro.
3. Bela passagem de gerência na Câmara do Porto. Agora, a ver vamos...
4. Não é saudável o degradar da linguagem no discurso político interno.
5. Terroristas espanhóis libertados por erros da Justiça. Estas coisas pagam-se.
6. Jean-Claude Juncker ganha de novo no Luxemburgo. É um grande amigo de Portugal.
7. Tenho pena pela quebra do FC do Porto no plano europeu. Sem ele, goste-se ou não, Portugal não tem futuro no futebol internacional a nível de clubes.
8. Discretamente, saiu da cena da vida o general Belchior Vieira. Era um senhor das nossas Forças Armadas.
9. Continuam as dissonâncias no executivo. Agora é o "programa cautelar". Caramba: não conseguem combinar nada? Ou falar menos?
10. A entrevista televisiva do embaixador angolano em Lisboa foi modelar. Defendendo, com elegância diplomática, os interesses que o seu país entende dever defender.

Discriminação

Aqui entre nós, não deixa de ser uma suprema humilhação para Portugal o facto de, nas revelações que vão surgindo sobre as espionagem pelos serviços secretos americanos a políticos de vários países, não ter aparecido a mais leve referência a Portugal.

Então ninguém escuta os nossos governantes? Ninguém quer saber o que eles dizem? Ou será que os americanos já conhecem o "guião para a reforma do Estado" e nós não? Estarão a copiá-lo?

Faça-se devida justiça à oposição, que bem tentou remar contra a maré, denunciando escutas à sua sede. Mas também ninguém os ouve...

Giuliani

  A América é uma terra de oportunidades. Mas, quando elas escapam das mãos, transforma-se num país cruel. Rudy Giuliani, como mostra este t...