Agora mesmo, parado há horas num Alfa Pendular, "in the middle of nowhere", a caminho de Lisboa, lembrei-me da saga de Steinbeck no "Náufragos do autocarro", mas a verdade é que não vislumbrei a saliência artística de Jayne Mainsfield em nenhuma das carruagens, pelo que talvez esta cena de espera nervosa acabe por ficar mais próxima do "Autoestrada do Sul", de Cortázar, no "Todos os Fogos o Fogo", adequada a quando andamos em tempo de férias e se diz ser um incêndio a causa desta infindável seca, pelo que logo me fui precavendo no bar, com sanduiches e uma Superbock, assim acabando por não passar nada mal o tempo, muito também graças ao ar condicionado e à Netflix que trago no "tablet" e que já me deu mais de duas horas de diversão, só perturbada por ter tido de mandar um "pouco barulho!" a uma fulana que andava a anunciar alto, pelo corredor, que já tinha tentado queixar-se junto de um ministro amigo, o qual não lhe terá atendido o telefonema, como confessou em tom mais baixo, o que só prova que este governo, embora não pareça, ainda pode ter por lá alguma gente sensata.
2 comentários:
Ex.mo Senhor Embaixador
Não me parece justo tratar a secção museológica da Estação de Caminhos de Ferro de Santarém como "no meio do nada". Santarém foi a capital real do país durante quatro séculos, coroando as lezírias, é difícil confundir tal pérola com uma planície deslavada e poeirenta do middle-east... Já agora, permita-me que acrescente, os náufragos saem um pouco do "guião" do JS, sempre me pareceram uma concessão aos comentários de "género": diluir o padrão que pintara das mulheres casadas como escravas e das prostitutas como mulheres independentes, pela concessão do desejo (nem que enclausurando-o em circunstâncias tão improváveis e fugídias como a sua paragem na estação que o meu avô construiu); contudo, também me parece que, sentindo-o como uma cedência, se trata de uma obra menor para o autor (se é que tal pode existir, perante a grandeza do senhor!). O maquinista (ou o sistema) preferiu ficar na estação do que "no meio de nada", para não estigmatizar os náufragos do comboio e, a coisa durando demais (por motivos alheios à CP, claro), cada um poder arranjar maneira de ir à sua vidinha. Se calhar, foi um sinal, em especial para o Senhor Embaixador, pois Santarém sempre está na vanguarda das alterações de regime: desde Dom Miguel; a Maria da Fonte (a quem aderiu o Marquês de Sá da Bandeira); desde o Buíça ao pessoal da Rotunda; distrito onde Humberto Delgado teve maior percentagem e único com concelhos com mais de 70% a seu favor (três, todos começados por "AL"), até à EPC no 25. Justificava-se que abandonasse a sua carruagem e zona de conforto e subisse (quase na vertical, hoje o caminho de Santiago que vai dar à Porta de mesmo nome está desprezado e feito caminho de cabras mas dá para passar a pé) até àquilo que o povo chama Portas do Sol, sede da Real e Insigne Colegiada de Santa Maria da Alcáçova. Se e quando o quiser fazer, teremos gente à sua disposição para a visita guiada. Sempre a considerá-lo,
José Fernando
Francisco, ainda se arrisca a que a referida "Fulana" se vá queixar de si ao ministro... Só a mim não me calham cenas dessas envolvendo altos dignitários nos comboios.
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