quarta-feira, julho 16, 2025

A "Salvação" do Álvaro


Já um dia contei por aqui esta história, mas vou repeti-la hoje, sintetizada. Logo verão a razão por que o faço.

Tive um grande amigo, bastante mais velho do que eu, chamado Álvaro, que já se foi desta vida há muitos anos. Foi uma das pessoas mais forretas que conheci - e já conheci várias, algumas refinadas. Conheço-lhe histórias deliciosas, fruto desse seu vício temperamental.

Um dia, o Álvaro telefonou-me a perguntar se eu conhecia alguém na Islândia. Ele sabia que, quando eu vivia em Oslo, tinha estado acreditado junto daquele país.

De facto, eu tinha tido contactos com o cônsul honorário português em Reykjavik e disse-lho. Ficou imensamente satisfeito e passou a relatar-me o que pretendia. Ia à Islândia, numa viagem que lhe fora oferecida por um jornal com o qual colaborava, mas estava a ter dificuldade em reservar o alojamento que pretendia. Será que o nosso cônsul podia ajudá-lo?

Para evitar ter de incomodar o nosso cônsul honorário, por um assunto tão fútil, disse-lhe que tinha um conhecimento numa agência de viagens, que seguramente lhe trataria da reserva. O Álvaro reagiu: “Isso também eu tenho! Mas nenhuma agência consegue marcar aquilo que eu quero”. 

Que diabo de alojamento tão especial era impossível de marcar, a partir de Lisboa, num mundo onde essas coisas já se faziam, à distância, com toda a facilidade? 

O Álvaro pareceu-me um pouco embaraçado: “Bom, é que eu soube que as instalações do “Exército de Salvação” têm umas camaratas coletivas muito boas, com um preço que me ficava muito em conta. Se o nosso cônsul pudesse fazer um telefonemazito para lá..."

Nem queria acreditar! Ficar numa camarata do "Exército de Salvação”! O Álvaro era um quadro superior. E já não tinha idade nem estatuto para aquilo. Mas ele não se importava: sabia que preço da dormida era muito “jeitoso”. “Eh, pá! Não sejas chato! Pede lá isso ao homem, não te custa nada”. Não pedi, claro. E, ao que soube, o Álvaro acabou por nunca dormir nas tais camaratas. 

Hoje à noite, estando eu esta noite alojado num hotel em Reykjavik, tive uma ideia: se tiver oportunidade, vou tentar dar uma saltada à “Salvation Army Guesthouse” da cidade. Só por curiosidade. Mas já não vou a tempo de dar ao Álvaro a minha opinião.

1 comentário:

josé ricardo disse...

O Álvaro Magalhães (presumo que é deste que se trata) era, com efeito, um homem de outro tempo, bem dos meados do século XX português.

O Doutor Homem

Hoje à tarde, António Sousa Homem lança um novo livro. Dizem-me que não tenciona sair do seu eremitério do Moledo para estar na apresentação...