sábado, abril 12, 2025

Roissy


Ontem passei no aeroporto parisiense dito Charles de Gaulle, a que muitos franceses (e eu próprio) teimam em chamar Roissy.

Estas designações póstumas podem ser algo constrangedoras. Muitas vezes a memória popular não acompanha o voluntarismo afetivo dos proponentes. Veja-se o que acontece ali mesmo, em Paris, com a place de l'Étoile, onde está o Arco do Triunfo: ninguém a designa por "Charles de Gaulle", sendo esse, no entanto, o seu nome oficial. Em Portugal, a maior "maldade" do género foi darem ao Areeiro o nome de praça Francisco de Sá Carneiro (e colocarem por lá uma espécie de estátua artisticamente ofensiva). É óbvio que ninguém chama o lugar por esse nome. E, no Porto, ouço ainda muita gente a falar da praça Velasquez ou do aeroporto de Pedras Rubras, em lugar de nomearem esses espaços em honra à malograda personalidade que, por escassos onze meses, chefiou o executivo português, durante o ano de 1980.

Voltemos a Roissy. Quem não viveu essa época não pode imaginar a fortíssima impressão que o novo aeroporto de Paris provocou a quem, como eu, ainda na casa dos vinte anos, por lá passou, pela primeira vez, em fevereiro de 1976, menos de dois anos após a sua inauguração. 

A arquitetura hiper-arrojada, quase espacial, daqueles tubos transparentes que levavam aos chamados "satélites", equiparava o local aos cenários de "Barbarella" ou de outras películas de ficção científica, uma escola de arte que sempre envelhece muito mal. E tudo por ali rimava bem com o Concorde, que naquele local tinha começado a sua carreira, escassas semanas antes da minha visita, e por lá a acabaria, efémera e ingloriamente, de forma bem trágica, menos de três décadas depois.

Enviado pelo Ministério da Cooperação (já ninguém se lembra, mas existiu então em Portugal um ministério com esse nome, para onde o MNE me havia destacado, por uns meses, vai para 50 anos), eu tinha sido mandado em missão a S. Tomé e Príncipe. Estava-se em fevereiro de 1976. A minha viagem era através de Paris e Libreville. O único voo alternativo era via Luanda, mas a situação militar na capital angolana tornava então menos aconselhável o uso do respetivo aeroporto. Tive assim o privilégio de embarcar em Roissy e, recordo, fiquei extasiado. 

Com o decurso dos anos, quando às vezes por lá voltava a passar, e passei lá bastantes vezes, ia dando conta de que a imagem do aeroporto estava já longe de ser glamourosa. O edifício tinha envelhecido mal, os tubos e os "satélites" haviam-se tornado algo anacrónicos, todo o espaço estava já muito pouco funcional para as novas exigências de uma circulação cada vez mais intensa de passageiros, com os crescentes requisitos de segurança a imporem-se. Para obviar aos problemas desse crescimento, o aeroporto havia entretanto multiplicado as suas estruturas. 

No dia de ontem, talvez por ter utilizado um dos espaços melhor renovados do aeroporto, ou porque o sol brilhasse bem glorioso, ou porque eu estivesse bem disposto depois de uns belos dias de férias em Paris, acabei por achar mais graça a Roissy. Ou a Charles de Gaulle, pronto, se quiserem!

4 comentários:

João Cabral disse...

É por esses motivos que ainda hoje não chamo Altice Arena ao Pavilhão Atlântico, até porque as arenas são onde se toureia, sempre foi, até importarmos essa americanice ridícula. Agora é tudo arenas, mesmo que não tenham touros. Modas parvas. Mas é também por isso que ainda hoje para algumas pessoas Torres Couto ainda é líder da UGT, Mário Soares ainda é presidente, Cavaco Silva ainda é primeiro-ministro e Gilberto Madaíl ainda é o presidente da FPF. Coisas...

Anónimo disse...

Fernando Neves
Já em Lisboa se passou a chamar Marquês à Rotunda, até mudaram o nome da estação do metro. O meu Pai dizia com razão que se podia ter dado ao local o nome de Rotunda MP, em vez de Praça MP. Já o Rossio e o Terreiro do Paço nunca são chamados pelo se nome oficial

carlos cardoso disse...

O aeroporto de Roissy é péssimo. Foi pensado para gerir aviões, mas é extremamente «unfriendly » no que respeita a passageiros. Tem ainda o triste record de ser o aeroporto onde se extraviam mais bagagens. No meu caso foram quatro vezes em que a bagagem não apanhou o avião mas conheço muito mais casos com pessoas conhecidas.

Anónimo disse...

Curioso, ninguém se lembrar da Praça Humberto Delgado (Sete Rios) e do Aeroporto Humberto Delgado (Portela).

A Europa de que eles gostam

Ora aqui está um conselho do patusco do Musk que, se bem os conheço, vai encontrar apoio nuns maluquinhos raivosos que também temos por cá. ...