quinta-feira, março 21, 2019

O que é que correu mal?


Tenho na prateleira um livro sobre a civilização árabe que tem o título deste artigo. Lembrei-me dele ao ver, há pouco, nas televisões, a imagem da conferência conjunta de Donald Trump e de Jair Bolsonaro. 

Se, há meia dúzia de anos, alguém me dissesse que este cenário na Casa Branca era possível, teria dado uma gargalhada e, do alto da minha “ciência”, argumentaria, por A mais B, que a ascensão de um milionário megalómano e vaidoso à chefia dos EUA seria sempre travada pelo “establishment” do Partido Republicano e que, no caso da figura brasileira, se tratava de uma personalidade caricatural e risível, alguém cujo primarismo o Brasil nunca iria levar a sério. 

Depois, foi o que foi. O que é que aconteceu? Aconteceu que, por mais previdentes e “conhecedores” que sejamos, nunca conseguimos evitar que os nossos raciocínios acabem por ser conduzidos pelo quadro mental que se nos tornou confortável e que, no fundo, também padece daquilo que, na língua inglesa, se chama “wishful thinking”, que pode ser traduzido por um pensamento marcado por aquilo que, no fundo, desejamos. Tudo o que contrarie as ideias feitas é posto de lado ou tido como de escassa probabilidade.

Tal como no Brexit e nas eleições italianas, nos EUA e no Brasil houve fatores influenciadores do eleitorado que não vimos chegar. Deixámo-nos assim levar pela ideia de que havia uma “impossibilidade” objetiva de ocorrência de certos cenários, porque eles entravam em rotura com aquilo que pensávamos plausível.

Alguns dirão que foram situações excecionais, manipulações comunicacionais, medos induzidos e outros fatores anómalos e conjunturais que produziram esse resultado. Até pode ser verdade, mas o que verdadeiramente aconteceu foi uma expressão democrática de vontades, que teve a consequência que teve. 

A prática da democracia não aponta sempre num sentido democrático, como a História nos ensinou. Mas, para os democratas, a resultante do voto deve permanecer sagrada, salvo se vier a afetar o funcionamento do próprio sistema democrático. Isso não significa que não seja natural continuar a lutar por aquilo em que se acredita, mesmo que isso implique ficar numa posição minoritária e desconfortável.

Trump e Bolsonaro lá estão, graças ao voto popular. Quem deles não gosta deve colocar-se a questão: “O que é que correu mal?” E, se os quiser combater (a eles e aos outros de idêntico jaez), deve começar por “desconstruir” as razões do seu sucesso, refletir sobre os erros cometidos que tornaram possível a sua ascensão. 

5 comentários:

Anónimo disse...

espero que os manjares do uptown tenham sido tão bons como a vista!...

Anónimo disse...

o restaurante é o akla...

Anónimo disse...

“O que é que correu mal?” Manipulação. Ou vamos ignorar que em ambos os casos houve uma manipulação do medo e outros sentimentos básicos da população? É dos livros. No caso do Trump, eram os liberals que estavam a dar cabo de tudo, eram os imigrantes, etc. No caso do Bolsonaro, foi fazer do PT e do Lula em particular o diabo e inventar a história de que a corrupção no Brasil nasceu precisamente com o PT no poder. Simples, não? É claro que houve erros do Obama e do Lula e Dilma (nenhum governo está isento de erros). No caso, apenas foi necessário ampliar os erros até à exaustão e inventar outros. Por isso, dizer, como muitos dizem, que num caso e noutro, as eleições do Trump e Bolsonaro foi pelos erros foi da esquerda, do Obama ou do Lula, é treta.

Anónimo disse...

"O António foi para o Governo. O Pedro foi para o Governo. O Duarte foi para o Governo. A Catarina foi para o Governo. E a Susana foi nomeada pelo Governo. Felizmente, ninguém ficou fora desta história. Tal é a força do amor."......

in Público João Miguel Tavares

Anónimo disse...

Anónimo das 23,19
Isso é que é a nossa verdadeira realidade , e se nos preocupássemos realmente com a vergonha que se passa neste país , com os compadrios e os favoritismos do governo...
O primo , a tia , a mulher , a irmã . Há algum avô ou avó ?

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...