Numa das primeiras vezes em que, como embaixador português em Paris, visitei a Delegação da Fundação Calouste Gulbenkian, para uma qualquer exposição ou concerto, cruzei à porta um cidadão francês que, em face do movimento que via na entrada, inquiriu: “Esta é a embaixada de Portugal?” Ele não fazia a menor ideia de quem eu era e deve ter ficado perplexo com a minha resposta sorridente: “Não é ... mas também é!” A minha reação espontânea traduzia o que, muito sinceramente, eu pensava do papel desempenhado pela Delegação em favor da língua e da cultura portuguesas na capital francesa.
Há precisamente 50 anos, como lembra Rui Ramos numa recente monografia, foi instalado, num edifício da avenue de Iéna, adquirido por Calouste Gulbenkian em 1922, e que seria a sua residência formal em Paris, um Centro Cultural (que evoluiu para aquilo que é hoje uma Delegação) cuja atividade faz parte integrante da própria história da Fundação.
Dirigido ao longo desse meio século por diversas e qualificadas personalidades nacionais, esse “braço” parisiense da Gulbenkian desempenhou um papel do maior relevo como montra cultural portuguesa. Podem discutir-se algumas opções seguidas em todo esse percurso, o universo de abrangência da atividade desenvolvida, mas é indiscutível o benefício que, para a imagem de Portugal, essa estrutura representou, muito em particular como polo do atração dos “lusófilos” franceses e na ligação aos estudos universitários portugueses em França. Além do mais, ontem como hoje, aí se concentra a segunda maior biblioteca portuguesa no mundo, depois da do Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro.
Novos tempos têm vindo a justificar um repensar evolutivo das atividades da Delegação. Um Conselho Consultivo a que tenho o gosto de presidir, constituído por figuras portuguesas e individualidades do meio intelectual francês, tem trabalhado sobre a necessidade de aliar o caráter universalista da reflexão a que a Delegação se dedica, onde as temáticas europeias têm um papel predominante, a uma abordagem cada vez maior das diversas culturas que se exprimem em língua portuguesa. A isso acresce uma atenção, também crescente, às novas realidades que emergem em setores da segunda ou terceira geração de portugueses no exterior, hoje com relevante inserção nas sociedades de acolhimento. E, finalmente, note-se a ligação muito frutuosa que tem vindo a ser conseguida com a histórica “Maison du Portugal”, na Cité Universitaire de Paris, criada pela Fundação nos anos 60, que hoje usufrui de um estatuto distinto, mas que, tal como no passado, continua a acolher estudantes e investigadores portugueses e estrangeiros.
Há já alguns anos, em Paris, fui testemunha da mudança da Delegação da Fundação para novas instalações onde, muito em especial, “respira” melhor a sua fantástica biblioteca. Hoje a funcionar no boulevard de La Tour Maubourg, esta estrutura desenhou, para este cinquentenário em 2016, um interessantíssimo programa cultural que tentará contribuir para uma maior visibilidade de Portugal nesse “mar” de oferta expositiva que é a capital francesa e que se estende muito para além das paredes da Delegação.
Só como exemplos, aí está já uma mostra de Julião Sarmento. No museu “Jeu de Paume” vamos ter em breve Helena Almeida. Em abril, uma grande exposição no “Grand Palais” “revelará”, pela primeira vez, Amadeo de Sousa Cardoso à cidade que mais inspirou a sua obra. E a Cité de l’Architecture et du Patrimoine vai revelar a arquitetura portuguesa entre 1965 e 2015. Uma Primavera cultural portuguesa começou já em Paris, pela mão da Gulbenkian, a nossa “outra” embaixada na cidade.
(Artigo que hoje publico no jornal "Expresso")
1 comentário:
Atenção, a classe media vai deixar de comprar o Expresso.
classe media: 1100,00>>>> rendimento bruto mensal máximo .gordo rosa dixit !
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