Foi hoje, passava um minuto da uma hora da tarde. Eu ia atrasado para a reunião na FCSH, da Universidade Nova, na avenida de Berna. Entrei com o carro para o pátio da Faculdade (privilégio de quem é membro do Conselho da Faculdade). Um aluno ia a atravessar e eu travei a fundo. A culpa era toda minha. Pedi desculpa e fui estacionar.
Aquele episódio, sem consequências, ficou a bailar-me na memória, não percebi então bem porquê.
Duas horas depois, antes de ir buscar o carro, "caiu a ficha", como dizem os brasileiros.
Havia sido há 43 anos, em 1973. Eu entrei naquele mesmo portão, a guiar um Fiat 128. Não tinha carta, confesso! O carro não era meu, era emprestado. Ali era o chamado "Trem Auto", onde se "tirava a carta" militar. Era o que eu ia fazer. À minha frente, já dentro do pátio, atravessou-se um Alferes. Travei a fundo, pedi desculpa, ele olhou-me de soslaio. Eu era apenas Aspirante, como se via pelas divisas.
Fui para a sala de provas. O Alferes entrou. Era o mesmo! E ia ser o meu examinador!
- Você vinha a guiar o carro? Tem carta civil?
- Não, não tenho...
- Essa agora! E então anda a guiar sem carta?
- É verdade! Trouxe o carro de perto...
- Pois, pois! Bonito!
Ele tinha toda a razão. Temi o pior. Mas passei, sem dificuldade.
Um dia, já na "peluda" (isto é, depois de fazer o serviço militar), lembrei esse episódio ao Alferes examinador. Chamava-se Leal Loureiro, foi uma grande figura da edição portuguesa, fundador da "Afrontamento". A última vez que nos vimos foi na "Bucholz", que ele dirigia. Morreu há alguns anos.
Lembrei-me hoje dele, por este simples episódio da vida.
ps - embora o crime já tenha prescrito, não acredito que venha a ser absolvido em todos os comentários.
12 comentários:
Não me parece... Com essa abordagem, os puritanos vão conter-se.
Grande Amigo meu, cheio de humor e culto, desde muito novinho, ao contrário da maior parte dos rapazes com quem nos cruzamos hoje. Teve uma sorte que invejo, morreu novo, mas de repente, a dormir, sem ninguém dar por nada.
Atire a primeira pedra quem nunca guiou sem carta :)
Os oficiais não usam divisas, mas sim galões.
Caro Francisco,
Absolvido mas Buchholz tem dois h.
Um abraço
JPGarcia
Eu nunca guiei sem carta e tirei a carta à primeira no código e condução.
Também conduzi sem carta, mas com consequências mais graves, num episódio em que quase desfiz um jeep recém-reconstruído no ASMA em Luanda.
Vinha de Novo Redondo para a Gabela, e a meio da subida do morro que da zona das salinas, e durante alguns quilómetros de curvas e contra-curvas, vai até à Gabela, apanhei areão numa das curvas e o jeep parecia uma bailarina até dar umas cambalhotas, que me mandaram para o Hospital Militar durante 13 meses. Tinha exame de condução marcado para a semana seguinte ao acidente.
Levei com 3 autos, e só uma amnistia concedida pela visita do papa Paulo VI, me livrou de uma "porrada" séria. Claro que para beneficiar da referida amnistia tive de pagar o prejuízo causado à Fazenda Nacional, na percentagem da culpa no acidente que me foi atribuída pelos peritos.
Ai que prazer não cumprir um dever
Então, ser em ditadura e não o fazer...
Se travou a fundo, é porque ia depressa de mais.
Infelizmente, em Portugal, há muitos campus universitários nos quais é permitido andar de automóvel. Ainda mais infelizmente, muitos dos automobilistas não reconhecem que estão num local onde devem circular numa velocidade muito - mas mesmo muito - baixa.
Eram as regras do jogo. O alferes Loureiro estaria a pensar n'A Regra do Jogo, a sua editora?
Vale a pena visitar este blogue, também para ver os "professores" de português fazendo correções ao texto...
Ó Embaixador esse anónimo que veio corrigir ai o seu português, será o senhor da boina? ele gosta muito de correções. Sabe penso que será por isso que usa boina, por certo quando era pequenino, deve ter sido um menino muito corrigido e ficou com esse trauma.
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