São temíveis! Raramente escolhem a primeira fila dos auditórios, embora isso aconteça com alguns mais vaidosos. Pela minha experiência, a terceira fila costuma ser o seu lugar de eleição, de preferência junto às coxias, por forma a facilmente poderem obter o microfone das mãos dos ajudantes volantes que circulam pela sala. Falo, naturalmente, dos chatos interventores, dos falsos perguntadores, sempre presentes em colóquios, palestras e conferências, que aproveitam o momento da abertura do debate à audiência para fazerem longas dissertações, para as quais ninguém os convidou.
Em Portugal, durante anos, pressentia-os, mal me sentava numa mesa, com um simples olhar pela sala. Conheci alguns de ginjeira, sabia que estavam à coca do momento oportuno, de dedo imediatamente esticado para pedirem o microfone (chegam a fazer sinal prévio aos ajudantes de sala, quando prevêem próximo o período de perguntas). Mas o seu objetivo quase nunca é colocar uma questão aos oradores ou, se o fazem, trata-se de um mero gesto formal, no fim de uma imensa exposição pessoal. Aliás, e pela minha experiência, o que é dito pelos interventores é-lhes praticamente indiferente. Trazem a lição estudada de casa, uma ideia fisgada, as mais das vezes embrulhada em fórmulas confusas, quase sempre com tonalidades radicais. A sua grande finalidade é intervir, opinar, dizer o que pensam, por mais indiferente que isso seja a quem foi ali para ouvir outros. Os mais hábeis, quando pressentem que o moderador da mesa se prepara para os interromper, têm duas técnicas: uma delas é citar, a meio da fala, ainda que obliquamente, um dos oradores oficiais, para dar a falsa perceção de que se encaminham para a formulação de uma pergunta; outra é recorrerem à vetusta figura do "só gostaria agora de acrescentar, para terminar..." ou coisa do género - o que lhe faz ganhar uns minutos mais.
Há dias, num cenário de um qualquer colóquio, ao ver atuar uma dessas personagens, lembrei-me que poderia ser interessante organizar uma sessão onde se pudesse colocar na mesa, como oradores, precisamente um grupo selecionado desses chatos mais conhecidos, dando-lhe, finalmente, o palco que tanto procuram. A dificuldade residiria apenas em encontrar, para o debate, um tema que lhes fosse comum... E plateia para os aturar, claro.
10 comentários:
Ai as jornadas do ISCSP...LOL Cheguei a ve-lo la' senhor embaixador!
A assustadora e temível argúcia do moderador...Severo observador massa crítica sustentada...
Após, nada me estranhará ver a terceira e a primeira filas desertas, além de plateias a entrar Mudas e sair Caladas... Pudera!!!...Se Lhes Parece!Não é para menos.
De qualquer forma um post Divinal, mas a neutralização da dimensão Maquiavel, eu sempre o soube é deveras castradora ora atente-se na sagacidade e vejam... Ah!
Isabel Seixas
Tem toda a razão. Dão cabo da paciência a qualquer um e não se inchergam. Por outro lado penso que as mesas são demasiado complacentes para estas actuações e desperstegiam-se muito por o serem.
João Vieira
Ah! Senhor Embaixador o que me ri com este seu post. Mas há, como erzatz, uns "piquenos" que vão à televisão fazer o mesmo: vender o falso...
Basta fazer zapping e com um desfazamento de segundos, lá aparecem eles, mais casual, mais USA, mais lord, mais proletário - mas tudo muito bom no género - a debitar o seu embrulhado de ideias que preparadas dos gabinetes!
Ai! Senhor Embaixador que pena a mediocridade ter salvo conduto em Portugal...
Para além d"os chatos da plateia" ha outro grupo que gosto particularmente...sao "os dorminhocos da plateia" : )) Estes atacam normalmente depois do almoço...O que eu me ria nos anos 80, quando para arredondar os meus fins de mês de estudante, era também hospedeira de congressos (na Gulbenkian, no Forum Picoas,...).
Talvez o meu grupo seja a plateia ideal para o seu grupo !? : )))
também me ri bastante, recordando cenas recorrentes, nos mais diversos aerópagos...
a figura "penetra" será exclusiva da realidade lusitana?
parabéns por mais esta crónica de costumes, Senhor Embaixador
Ainda estudante na capital do meu país tive a honra de mediar um evento no Senado Federal e lá vi uma rara criatura. Um palestrante que se configurava num desses chatos.
Fenômeno raro e enfadonho que até hoje me causa sono e risos quando lembro que interrompi e cortei o microfone de alta autoridade de minha república.
Abs,
Já vi muita dessa fauna e técnicas curiosas de a contornar. Uma, mais cínica, é perguntar no final da arenga: "mas afinal qual é a sua pergunta?". Esta pode ser combinada com outra, igualmente cínica, que é interromper o opinante para lhe dizer: "fazia o favor de se identificar?" e, fazendo de conta que não ouviu bem, insistir nesse pedido. De outras vezes, o orador pedia que juntassem 3 perguntas de cada vez, respondendo em bloco e diluindo assim o efeito pretendido por esse tipo de inquiridores, aliás e por definição uns grandes chatos.
entrada cheia de boa ironia, retratando um comportamento real, exibicionistta, que deve ser satirizado.
um bom processo, que já vi fazer, é pedir que os que desejam fazer perguntas o façam por escrito, em folhas que se distribuem na altura devida. O conferencista ou membros da mesa selecionam então as perguntas que têm tempo ou lhes interessa responder e já não há exibicionismos chatos e pedantes.
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