Há pouco, no “Público”, li que morreu Luís Menezes Cordeiro. Tinha 90 anos e foi embaixador.
Com muita pena minha, não consegui estar em Lisboa a tempo de ir prestar-lhe uma homenagem pessoal na basílica da Estrela, ao final da tarde de hoje.
Em 1977, Luís Menezes Cordeiro passou a chefiar uma repartição no setor económico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde eu já trabalhava, como jovem diplomata, desde há um ano, com o pelouro das relações com os países do Magrebe e do Médio Oriente.
Era um homem baixo, com um permanente sorriso, que nunca falava alto e que, desde o primeiro dia, introduziu uma gestão suave naquele serviço. Tinha, ao que lembro, um especial talento para falar com as senhoras, que pareciam sempre sensíveis - no bom sentido, entenda-se - ao seu charme pessoal.
Dei-me lindamente com o embaixador Menezes Cordeiro, durante os quase dois anos em que trabalhei sob as suas ordens. Depois, a vida separou-nos pelo mundo. Chefiou várias embaixadas, de Bissau a Varsóvia, de Abidjan a Santiago do Chile.
Um dia, num contacto ocasional que tivemos, fez-me uma confissão: “Quando fui chefiar o serviço em que o meu amigo trabalhava, isso foi considerado uma “missão de risco”. Porquê? Porque você e outro colega estavam colocados por lá! Nem imagina os alertas que recebi! Que eram dois comunistas, gente perigosíssima, que era preciso vigiar com muito cuidado!” Para logo acrescentar: “Mal eu sabia que não iria ter o menor problema, que vocês eram funcionários dedicados e cumpridores, que tudo ia correr às mil maravilhas!”
Vale a pela recordar que, nesses tempos conturbados do pós-PREC, algumas figuras do extremo conservadorismo das Necessidades identificavam quem fosse um pouco mais à esquerda com o labéu comunista.
Não resisti a perguntar-lhe: “E quando é que concluiu que nós não éramos comunistas?”. A resposta foi deliciosa: “Eu, de início, não cheguei a perceber se vocês eram ou não eram comunistas. Mas posso dizer uma coisa: por essa altura, no contacto convosco, cheguei a pensar que se todos os comunistas fossem como vocês, então os comunistas não eram assim tão maus...”
O outro “comunista” era o Mário Jesus dos Santos, um grande amigo com que ainda há dias jantei e cujo último posto como embaixador - imaginem! - foi Kiev.
Já um dia contei por aqui a história que deixo de novo registada. Repito-a hoje, no dia em que desaparece mais um dos meus “chefes” - e tenho um imenso orgulho de ter ficado amigo de todos, repito, de todos eles.
Deixo um abraço de pesar à família do embaixador Luís Menezes Cordeiro, em especial à sua filha Ana Paula, que comigo trabalhou em Brasília e que aí me proporcionou o último encontro com o seu pai.
1 comentário:
Caríssimo Francisco,
Creio ter aprendido algumas subtilezas com o Prof.Lindley Cintra mas nada sobre a gramática da saudade . De qualquer modo , lembro hoje muito o corredor das Económicas .
By the way : gostaria de ter o contacto do Mário Jesus dos Santos .
Um forte abraço,
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