Foi ontem anunciado o adiamento da cimeira que estava prevista entre Portugal e o Brasil. Aposto que, no Brasil, os jornais falaram em "cúpula".
Entre o português de Portugal e o do Brasil não há apenas diferenças na ortografia e na sintaxe. Há, pelo meio (os brasileiros dirão "em meio") de um vocabulário comum muito extenso, muitas palavras que são diversas. Alguns vocábulos brasileiros têm origem no português antigo, que se perdeu em Portugal e que permaneceu naquele país, em especial no Norte. Outros termos derivam da influência das línguas locais, como o tupi-guarani, ou de palavras oriundas de outras migrações, como a italiana, que também muito contribuiu para a abertura das vogais na fonética brasileira. Outras ainda, têm a ver com realidades locais e com uma evolução lexical que procurou, muito mais do que em Portugal, verter para a escrita o produto da oralidade popular.
Estas diferenças, que não existem com a mesma intensidade noutras grandes línguas internacionais, não devem ser dramatizadas, mas devem ser lidas como fruto de uma diversidade que não há desvantagem em continuar a ser cultivada, desde que não fragilize o muito que a língua tem de comum, nomeadamente na sua expressão no mundo internacional.
Mas toda esta "conversa" vem a propósito das cimeiras ou cúpulas entre os dois países, que nunca têm uma data certa para a sua realização, que têm lugar quando é considerado oportuno por ambos e quando há suficiente matéria, em termos de interesses bilaterais, que justifiquem a ocasião. O mesmo se passa com exercícios idênticos que Portugal tem com a França, a Espanha ou Marrocos.
Em 2006, teve lugar no Porto uma dessas cimeiras. Na noite que a antecedeu, fui testemunha de uma curiosa cena. Num certo momento, os dois diplomatas, um de cada país, que tinham a seu cargo a preparação do texto das conclusões, pareceram-me algo preocupados. O que é que se passava? Muito simplesmente, cada país tinha contribuído com textos para essas conclusões e, ao juntarem-se esses mesmos textos num documento comum, ele ficava uma verdadeira "manta de retalhos", com expressões portuguesas e brasileiras, com uma espécie de ortografia e vocabulário "a meio do Atlântico". A imprensa, que era o destinatário principal dessas conclusões, iria, com certeza, ironizar com essas diferenças. E seria ridículo produzir dois documentos com diferentes ortografias, sintaxes e vocábulos.
Foi nessa altura que eu, e creio que o Lauro Moreira, o embaixador brasileiro que viria a ser o representante do Brasil na CPLP, nos voluntariámos para ajudar. Por alguns minutos, dedicámo-nos ao exercício de procurar sinónimos e expressões que, não apenas fossem comuns a ambos os países, mas que, igualmente, não apresentassem diferenças ortográficas. O nosso esforço foi bem sucedido e, nos poucos casos em que não fomos capazes de contornar as diferenças existentes, optámos por colocar as fórmulas portuguesa e brasileira, separadas por uma barra.
Tudo se resolve, entre Portugal e o Brasil.
17 comentários:
"Tudo se resolve, entre Portugal e o Brasil."In FSC
O exemplo do post é um bom e interessante indicador e normalmente o espirito das cimeiras é de otimismo, daí ao tudo?...
Curiosamente, no quadro da CPLP, o Brasil usa - e aceita com naturalidade - a expressão "cimeira".
Talvez isso aconteça devido a' adopção pelos restantes parceiros da norma europeia do português mas também , estou seguro, por acção do Lauro Moreira, lusista incorrigível e lusófono empedernido.
cimeira parece-me melhor que cupula: cimeira portugal brasil / cupula brasil portugal.
esta foi adiada e talvez bem.
Caro ARD: uma solução fácil é aceitar que, quando as reuniões se passam no Brasil, o comunicado faça referência a "cúpula" e que, quando tenham ligar em Portugal, se utilize o termo "cimeira". V. Exª sabe bem que a imaginação é uma das qualidades diplomática mais importantes (depois do sentido de compromisso e do bom-senso)
Caro JR: não percebo a sua dúvida, isso sempre foi muito claro. Ou não?
Verdade. Imaginação, bom senso e boa vontade.
A solução da barra a separar as duas formulas reúne essas características.
Foi usada, por exemplo, no Protocolo sobre as
Comemorações dos 500 anos da Descoberta.
Mas, no caso da CPLP, o Brasil usa MESMO a palavra "cimeira" como se pode constatar visitando.a pagina Web do Itamaraty em
www.itamaraty.gov.br/temas/mecanismos-inter-regionais/cplp
Snr. Embaixador,
cimeira ou cúpula, esta sua estória fez-me lembrar uma outra:
A filha de um colega seu, rapariga já espigadota, relatava num círculo familiar, entusiasmada, as impressões que tinha colhido numa viagem que tinha acabado de fazer a Roma. Interrogada por um parente com pretensões de erudição artística, sobre o que mais a tinha marcado na visita à catedral de S. Pedro, respondeu peremptória: " gostei imenso da cópula"!
Como pode ver, não é apenas um questão Portugal-Brasil...
Os habituais cumprimentos,
A. Costa Santos
É nesta alta cimeira
que a cópula vil me arrasa
e fico de tal maneira
que já nenhum golpe de asa,
nenhum vislumbre de cima,
nenhum apelo de casa
me devolve a vez primeira
que a cópula me foi brasa
e em cúpula fescenina
ardeu como em tábua rasa.
Na cúpula do desejo,
o amor qual ferro em brasa,
fosse cimeira o ensejo
ou cópula que se atrasa,
estou já longe da rima
e mais perto da palavra,
derradeira ou pristina,
que em "summit" enfim se trava!
a) Feliciano da Mata, rima a preceito com tom e jeito
Correcção:
Onde se lê "estou já longe da rima"
Deve ler-se "pôs-me já longe da rima"
Favor corrigir no texto, Senhor Embaixador
a) Feliciano da Mata, autor
Curiosamente sempre achei o estimado sr. Feliciano da Mata homem recatado
Eis quando da cúpula da cimeira ou da cimeira da cúpula brota um estimulo desencadeante que o faz expressar a sexualidade na forma ardente...
Embora embevecida por quem se esforça por surpreender,fico sempre rendida a quem de facto surpreende.
Não duvido que seja convidado para presidir à cimeira dominando como domina temáticas universais em qualquer estilo literário,
Só temo que o roubem para comentador de Telejornais.
Senhor Embaixador, depois de tentar cultivar-nos, só mesmo aqui, nesta sua casa, é que se podia encontrar um "desatino" destes.
Fala-se-lhes de cúpula e, zás traz, já estão a pensar na cópula...
Podiam, ao menos, fingir ser intelectuais e referir Francis Ford Copolla. Mas não. Vão logo para os maus caminhos.
Em especial este Feliciano da Mata, agora autor, que tenta driblar-nos com rimas poéticas atentatórias dos bons costumes. Onde já se viu?!
Só lhe falta ser sexólogo, com estas cimeiras eróticas onde "o amor queima como ferro em brasa", e o ensejo, afinal, mais não é do que desejo.
Estive para lhe responder em rima, mas a idade não mo permite. De facto, velha que sou, já me esqueci de tudo o que destas cimeiras, alguma vez terei julgado saber!
Cara Isabel Seixas: não está, com certeza, mais surpreendida do que eu estou com a deriva erótico-poética do Feliciano. Já nada nele me admirará, no futuro, depois da leitura das estrofes supra. Que bicho lhe terá mordido? Esperará integrar uma edição póstuma da Antologia da Poesia Erótica e Satírica da Natália? Ou, com a carreira das parabólicas na estrada de Catete, terá na ideia fazer um programa de poesia na TPA angolana, talvez com o título de "Quem me dera ser rima", para tresler uma designação consagrada por um conhecido lusófilo? Não fosse eu estar de férias, preocupar-me-ia. Como estou, bebo uma cidra normanda por ele. E pela sua cura, claro.
"Bebo uma cidra normanda Por Ele"
In FSC
Pois será Melhor, senão...
Nem sei se nesta fase será boa essa lembrança.
Aguardemos com serenidade.
Mas já agora um título interessante para o improvável programa
"Quem me dera (antes) ser sua Prima"
Dado o quanto
"mais prima mais se lhe é Rima"
"Bebo uma cidra normanda Por Ele"
In FSC
Pois será Melhor, senão...
Nem sei se nesta fase será boa essa lembrança.
Aguardemos com serenidade.
Isabel Seixas
Ó Isabelinha, agora é que me haveis deixado perplexa.
Então fazíeis do nosso Feliciano da Mata um homem recatado?
Não sabeis que do recato, jamais brota poesia?
Feliciano da Mata foi um escravo de Alcipe. Uma vez liberto, aqui tendes o resultado: poesia erótica ao estilo do velho Botequim, onde creio ter visto - nessa altura eu via bem tudo o que me rodeava - uma espécie de alter ego deste nosso poeta. Seria ele? Creio que sim.
Querida Amiga "Helena"
Permita-me ter um ponto de vista diferente face ao "jamais" brota poesia do recato...
QUANTOS HÁ RECATADOS FORÇADOS (por desencontros circunstanciais) AO RECATO , que sublimam através da poesia como condenados,o que o desejo intenso inoportuno e insensato lhes pede de facto.
O recato a que me reporto é de facto a contenção verbal/escrita, concordo, inicialmente por excesso de Zelo profissional,de modo algum abstémio E CASTRADOR da forma unipessoal de expressão da sexualidade.
Aliás convenhamos que o Sr. retrata a experiência numa metáfora avassaladora tão Camoniana...
Deve ter sido!
(Qual choque térmico culminando em queimadura de 3º grau, com a particularidade de dar prazer...)
Mesmo mesmo o tal fogo que arde ...
Isabel amiga
Um abraço e um sorriso para si.
Mas ao recato, prefiro o desacato, apesar de saber que tudo depende das circunstâncias!
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