sábado, fevereiro 26, 2011

O "Expresso" e eu

Hoje, o "Expresso" publica o seu nº  2000 (2000 sábados! Mais de 38 anos!). Ao constatar isso, dou-me conta de uma outra realidade: nunca deixei de ler nenhum dos números do jornal, desde o seu célebre nº 1 até ao que hoje me chega às mãos. Não falhei um único número. Tenho disso absoluta certeza.

Em 1973, quando foi criado, o "Expresso" representou um choque de modernidade sem par na imprensa portuguesa (como o "Público" o seria, anos mais tarde, para a imprensa diária). Para além de ter introduzido, entre nós, a "moda" dos jornais semanários (até então, só havia revistas), ao jeito britânico do "Observer" ou do "Sunday Times", o jornal significava então a abertura de um espaço crítico que passava as margens formais do regime, estimulando os que, dentro dele, punham em causa o seu percurso e, simultaneamente, abrindo os espaços possíveis a quem a ele se opunha. O 25 de abril deve alguma coisa ao "Expresso".

Com a Revolução, o jornal passou a ser uma tribuna determinante, por onde passava - e onde se "fazia" - muita da política portuguesa da época. Tudo o que era opinião relevante teve acolhimento do "Expresso" e muitas das grandes notícias que fizeram sensação foram anunciadas pelo jornal. Navegando sempre num espaço político que, de forma simplificada, poderemos designar como de "bloco central", o "Expresso" cuidou sempre em nunca calar, sectariamente, outros setores. Bem pelo contrário, por vezes deu-lhes uma voz bem superior àquilo que eles representavam ou representam.  

Como disse, li todos os números do "Expresso", embora com desigual atenção. Em Lisboa, porque o compro sempre tarde e sem lugar certo, chego a correr seca-e-meca para encontrar um exemplar. No estrangeiro, chegou-me muitas vezes por "mala diplomática" a Oslo, a Luanda, a Londres, a Nova Iorque, a Viena ou a Brasília. Mas procurei-o também em Bruxelas ou em Genebra, em estadas mais prolongadas por essas cidades. Em Paris, compro-o, ainda no próprio sábado, num quiosque perto da Étoile. Se acaso me falha um jornal, movo mundos-e-fundos (e até meto "cunhas", junto de amigos) para arranjar o número que está em atraso. E que leio sempre, nem que seja duas ou três semanas depois.

Escrevi, fui entrevistado e fui criticado no "Expresso". Nele tive e tenho amigas e amigos, pessoas que muito respeito profissionalmente. Desde logo, o seu fundador Francisco Pinto Balsemão, uma das figuras fundacionais da nossa democracia. Durante muitos anos, a leitura do "Expresso" foi-me fundamental e até "urgente". Depois, com o tempo e a concorrência, acho que o "Expresso" deixou, cada vez mais, de ter muitas "caixas" apelativas; pior, passou a criar (não foi o único) algum sensacionalismo artificial. E passou a ser lido com mais rapidez, com o que isso significa de menor atenção.

Com todos os seus defeitos - e, de certo modo, eles têm vindo a aumentar*, diga-se em abono da verdade -, continua a ser um jornal necessário. Eu, pelo menos, com maior ou menor gosto,  talvez já por mero vício, não passo sem ler o "Expresso".


*em tempo: desde o momento em que escrevi este texto, tenho a sensação de que o jornal melhorou substancialmente.

17 comentários:

Anónimo disse...

Não passo sem o Expresso
E meto cunhas junto de amigos(Faz bem imagine que os inimigos lhe cobram uma fatura incomportável)...

O problema são os síndromes de abstinência e ou privação,sem problema para quem é autodidata...

Fique sossegado na falha de uma edição o sr. redige um express, ah eu posso ajudar sempre com inconveniências, alguns comentadores Seus não gostam, mas é isso que condena este blogue a ganhar o Céu Expressamente...

Liberdade de expressão ...À Flor da Pele...

Desde logo virtude(Democrática) do seu Eu Expresso...
Isabel Seixas

margarida disse...

...Tempos houve em que não era sábado sem o 'Expresso'.
Depois, não.
Mas muitos parabéns, querido semanário que tanto deu a este país!
«de referência», sim! Sempre! Mesmo quando há algo a combater. Dali saíram constelações inteiras!
Com maior ou menor variação, é muito amado e 'lá-de-casa'.
O 'saco' mais fofo e deliciosamente pesado de papel e surpresas (às vezes) que por aí há!
Que continue na batalha pela renovação e que repense essa coisa do diacho do acordo ortográfico, caraças :(

Anónimo disse...

Quando o "Expresso" foi criado em 1973 era criança e andava mais entretida com os livros dos "Cinco".

Comecei a ler o "Expresso" na adolescência e cheguei a ser "viciada", durante mais de uma década esteve sempre reservado numa papelaria.

Fiz a maioria das colecções, algumas de grande qualidade, e tenho guardadas várias revistas que considero especiais.

Actualmente, não leio com o fascínio de outrora porque a oferta já é maior e, principalmente, porque os jornais on-line vieram retirar um espaço à leitura dos jornais/revistas em suporte papel.

Os meus PARABÉNS ao "Expresso" porque, também, não concordando sempre com a linha editorial, considero que é um jornal de referência e com um importante papel na sociedade portuguesa.

Isabel BP

Portas e Travessas.sa disse...

Hoje, está icomestível...já não compro há uns anos...melhor, deixem de comprar qualquer pasquins... maior parte deles, escrevem pior que os leitores, incluindo a minha pessoa.

Nada tenho nada contra Xico Balsemão que, é um porreirão e danado para as saías travadinhas.

Carlos Fonseca disse...

Até Janeiro de 2009, fui também leitor de todos os números do Expresso, incluindo os dos "anos de brasa", em que o jornal chegou a sair às quartas e sábados. Lembra-se?

Entretanto, tal como aconteceu com o Público, o jornal (bem acompanhado pelos seus jornalistas) acomodou-se.

E, hoje, nem Expresso, nem Público.

E tenho pena. Mais por mim - que sinto a falta, quer do velho Expresso, quer do Público do Vicente Jorge Silva - do que por eles.

Carlos Fonseca

Jose Tomaz Mello Breyner disse...

O que vale é que o "Zé do Boné" reconhece ser aparvalhado

Unknown disse...

é um Grande Jornal sem duvida, merece os parabéns.

José disse...

O Expresso fazia-me estar nos "Elísios", às sete das matinas... esgotava.

Cantemos com Cesária Évora ... Saudade...Saudade...

cunha ribeiro disse...

Parabéns pelo record absoluto, Sr Embaixador!
Ao evocar o sítio onde compra o seu expresso em Paris, recordou-me o exacto local onde eu o comprava, a ele e à "Bola", finais dos anos SETENTA.
E também o café onde eu os lia - o GEORGE V - enquanto ia mirando as estatuetas que se sentavam lânguidas, ali à beira...

Helena Oneto disse...

Li todos os "Expresso" de 1973 até Março de 1978. Aqui, fui algumas vezes ao "seu" quiosque mas por vezes chegava tarde demais. Ficava sem semanario mas, em contrapartida, aprendi muito do que o Senhor aqui chamou de "lexico forte" da nossa linda lingua portuguesa...:).

patricio branco disse...

Os jornais diários ou semanais decaiem, ou adaptam-se a novos gostos, concorrencias e publicos para poderem sobreviver.
Só muito ocasionalmente compro um diário ou semanário, ou revista de actualidade. É frustrante folhear as páginas e ao fim de 10 minutos nada haver que desperte o interesse, noticias, cronicas ou artigos de opinião.
O expresso e o sol são quilos de papel (um gasto inutil de arvores), não se poderia racionalizar os cadernos, diminuir as páginas?
Mas não é só cá. O monde lê se nos mesmos 10 minutos e ficamos coma sensação de inutilidade.
Alguma excepção abro para 2 ou 3 jornais espanhois e ingleses, onde encontro ainda boa materia para ler durante 1 hora, bem sentado e um chá ao lado.
Não gasto dinheiro em jornais, apenas assino 2 ou 3 publicações especializadas que vêm de inglaterra e frança. As noticias diárias vejo-as por internet.
Faço portanto economias financeiras e de papel.
Ps. li o primeiro expresso e o 10 publico, tenho felizmente essa memória jornalistica.

Helena Sacadura Cabral disse...

Curiosamente aqui deixei de o ler.
Quando estou aí compro-o no mesmo local do Senhor Embaixador.
Vá-se lá entender as mulheres...

Pusinko disse...

Sempre tive uma grande afeição pelo Expresso, cresci a ver o meu pai a lê-lo. Eu comecei com as revistas do Tom & Jerry no falecido "Expressinho" e continuei pelas revistas (Vidas, Única) e o resto do jornal com o tempo. Agora, fora de Portugal, passo as horas mortas de férias a folhear os jornais passados, só pelo prazer de voltar no tempo. (E de ter jornais de verdade, em papel, escritos em Português) ali à mão.

patricio branco disse...

li o 1º expresso, já não digo o mesmo do 2000.

Anónimo disse...

Senhor Embaixador: não detenho "marca" comparavel a de V.Exa., mas terão sido relativamente poucos os número do "Expresso" que não li.Toavia confesso que cada semana que passa tenho mais dificuldade em faze-lo.Em minha opinião a independencia,a qualidadade das diversificadas colaborações que aí se podiam ler estão a ser progressivamente abandonadas.
E as recentes alterações verificadas,nomeadamente, quanto aos cronistas indiciam que uma certa orientação vai ser acentuada.
Lamento que seja assim,até porque,as alternativas não existem.
EGR

João Espinho disse...

Cheguei a ir de Bona ao Luxemburgo para ter o Expresso fresquinho, com pastéis de nata e "bica" de café. Agora, que o tenho a 100 metros de casa, já não me dou ao trabalho de saber se ainda se vende em sacos de plástico. Mas no passado sábado vi-me na obrigação de confirmar que o voyeurismo WikiLeaks também tinha inundado a 1ª página do Expresso. E logo na edição 2000. Sinais dos tempos....

Alexandre disse...

Tambem sou leitor assiduo. Até tenho assinatura electrónica. Mas a modernidade do inicio, nao se mantem hoje, pelo menos na parte tecnológica... rssss
Ainda não têm um app para os iPads, coisa que o Público e até o Diário de Notícias já têm há alguns meses! e a versão electrónica, para ler no laptop é extremamente difícil de usar e lenta. Só com muita paciencia consigo ler o Expresso aqui no Haiti... rsss

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...