domingo, fevereiro 13, 2011

Cumplicidades

Quando, aqui, há dias, eu me referia à proximidade das diplomacias da Índia e de Portugal, estava longe de pensar no que iria suceder, horas depois, no Conselho de Segurança da ONU.

Durante uma sessão a que estavam presentes os ministros dos Negócios Estrangeiros dos países que têm assento nesse órgão, o ministro indiano, por lapso, agarrou no texto que estava sobre a mesa, que o ministro português tinha preparado para a sua anterior intervenção (mas que não tinha usado, porque fez um improviso) e leu-o, durante alguns minutos. Só quando, a certo ponto, se dá conta de que o ministro fala como se fosse membro de um país da União Europeia é que é interrompido pelo seu embaixador, que lhe dá o texto do discurso indiano, não sem que tivesse havido uma embaraçosa hesitação.

Alguns detratores da vida diplomática viram neste incidente a prova de que, salvo em pormenores, a "langue de bois" das intervenções "onusinas" acaba por ser comum aos vários países. Mas as coisas podem ser vistas de outra forma: é cada vez mais natural que membros de governos democráticos possam sentir-se próximos na afirmação de uma linguagem comum sobre grandes temáticas internacionais. Por isso, o político indiano ter-se-á sentido confortável com o tom adotado no nosso discurso. A qualidade de membro da UE é que já seria demais!

Veja tudo aqui.

19 comentários:

Alcipe disse...

Como eu disse agora a um amigo indiano "when we say we share common values, well, we mean it!"

Julia Macias-Valet disse...

Se o senhor Krishna tivesse redigido o seu discurso ja nada disto acontecia : (

Francisco Seixas da Costa disse...

Cara Julia: so' se os dias tivessem 48 horas e' que os ministros dos Estrangeiros poderiam, algum dia, escrever os seus proprios discursos. Estes textos devem conter uma serie de mensagens sobre os varios temas, que tem de ser equilibradas entre si, em tom e extensao, do conjunto resultando a linha politica dos respetivos governos. Os ministros apontam a "linha" geral e os especialistas elaboram os textos. 'As vezes, mas nem sempre, consegue-se que os ministros passem os olhos pelos textos antes de os lerem. Mas nem sempre... Estas sao as regras da diplomacia contemporanea, goste-se ou nao delas. Leia a banda desenhada "Quai d'Orsay". Explica muita coisa.

Anónimo disse...

Viva sr.Embaixador

Num sotaque cerrado alguém q eu conheci aqui na Bila diria:thingzzz hapenzzz.

Julia Macias-Valet disse...

Obrigada pelo conselho. Vou ler, promis juré !
Mas eu disse "Se"...bem sei que sao os "sherpas" & Co que fazem este trabalho de formiga ; )...mas quand même...fica sempre mal.

Anónimo disse...

Li o Post e o comentário do autor do Post e só me ocorre o seguinte comentário: “!”
P.Rufino

Francisco Seixas da Costa disse...

Diga lá, P. Rufino, as razões da sua "!"...

Anónimo disse...

foi para celebrar a nossa 2º descoberta do caminho neste caso onusiano para a india..:)

margarida disse...

Sim, 'P.', não é nada de ficar sem palavras, muito pelo contrário...; também fico intrigada, não lhe parece normal, haver um, digamos, 'ghost writer'?
Olhe que o Obama também não escreve os seus discursos..., é um simpático muito genial, que o faz:
o Jon Favreau.
Pessoas com uma agenda assim buliçosa não têm tempo para escrever tanto.
:)

Anónimo disse...

Aceito sem qualquer dificuldade que não se queira ler um discurso e, nesse sentido, se opte por falar de improviso. Tarefa fácil para um bom Ministro, conhecendo bem os “dossiers” da sua casa. Já me causa alguma confusão que alguém, com essas responsabilidades, que não são de todo despiciendas, leia, pela primeira vez, um discurso em cima da sessão, ou reunião, onde vai falar. Conheci um caso em que deu uma tremenda trapalhada. O dito Titular da Pasta leu atabalhoadamente o texto que lhe tinha sido submetido dias antes, isto porque, só naquele preciso momento, estava a ter conhecimento do dito discurso. E mesmo se os dias tivessem, no caso vertente, 48 horas como diz, tal teria sucedido, conhecendo-se a “figura”. E todos os representantes dos países ali presentes perceberam isso. Caso para dizer: “não havia necessidade”!
Creio que, por vezes, caro Embaixador, a compreensão para com situações deste tipo tem os seus limites. Há responsabilidades que transcendem quem as tem. Porque se trata da imagem do país que representam. Isto que aqui digo não constitui uma crítica, de forma nenhuma, ao episódio que aqui relata, do MNE Indiano. De todo. Coisas que acontecem. Mas, convenhamos, era melhor que não acontecessem.
Recordo-me de um dia me ter dito que preferia quem fosse frontal, ou mesmo crítico, para consigo, do quem optasse por não o criticar, ou se mostrasse sempre de acordo consigo. Pois, por concordar com essa sua postura, estou em divergência consigo, aqui hoje. Mais até pelo seu comentário, menos pelo Post. E não estou, com isto, a pôr em causa as tais regras da Diplomacia de hoje. De forma nenhuma.
Resumindo, entendo, até prova mais substancial em contrário, que Ministro deve pelo menos ter um conhecimento prévio do que lhe põem nas mãos, em frente dos olhos. O que parte da sua iniciativa. E que demonstra responsabilidade. Que se aprecia.
Cordial abraço,
P.Rufino
PS: e se fosse, por exemplo, enfim uma hipótese académica, o discurso do MNE do Irão que um MNE qualquer começasse a ler?

Cunha Ribeiro disse...

Então suponho que há alguém contratado no Ministério apenas para escrever os tais textos.
Ofereço-me já para redactor. O problema é que ainda escrevo como no século passado...

Francisco Seixas da Costa disse...

(1) a ver se nos entendemos: eu não defendo que os membros do governo não leiam previamente o que vão dizer; digo que, algumas vezes, isso é inevitável, como, quase sempre, é inevitável que sejam outros a escrever os textos;
(2) conheço membros do governo que só liam aquilo que eles próprios escreviam. Volto a dizer: acho hoje isso muito difícil;
(3) para quem não sabe: os textos para os governantes são escritos pelos assessores dos seus gabinetes, pelos serviços do MNE ou por um trabalho cumulativo.

Helena Oneto disse...

Que gaffe monumental!! imagino a cara do nosso MNE a ouvir o seu discurso dito pelo seu colega indiano. Não consta se Luis Amado se apercebeu, durante os três primeiros minutos, da troca dos discursos...:)
Estou de acordo com a resposta P. Rufino! O Senhor imagina a nossa vergonha se lhe acontecesse o mesmo?

Francisco Seixas da Costa disse...

Cara Helena: sem estes episódios, a vida internacional era uma grande chatice...

Anónimo disse...

Tem a sua graça... pelo menos há sintonia na política externa portuguesa e indiana!!! :)

Isabel BP

Anónimo disse...

Só uma pequena correcção Senhor Embaixador: na presente configuração do Conselho de Segurança, o Ministro indiano sentava-se em frente, e não ao lado, do Ministro Luís Amado. Tal terá até permitido uma troca de sorrisos entre as duas delegações quando o Ministro indiano dissse do seu agrado por terem assento no Conselho dois membros da CPLP! Ministro Amado dixit, obviamente...

Anónimo disse...

Realmente, Eu achei o máximo, e daqui quero dizer a Sua Excelência o Sr. Krishna muito obrigada, pelo protagonismo gratuito oferecido de bandeja ao nosso Amado representante que aliás já é amado e desejo-lhe que seja mesmo...

Convenhamos que o nosso discurso estava bem melhor e o facto de geograficamente não ser exequivel, oh! Também... Pf!

Adorei, aleluia, algo a quebrar a monotonia...

E mais...
Sempre soube através do meu sexto sentido que alguns governantes jamais seriam capazes de redigir os seus textos... Não é por nada, só cá por coisas...

Mas gostei tanto da confirmação por alguém idóneo na matéria...
Hum , vou mas é trabalhar.
Isabel Seixas

Julia Macias-Valet disse...

Nunca pensei que o meu primeiro comentario fosse dar origem a tanta "zizanie". Mas ainda bem que assim foi : )

E depois, claro que estes senhores nao podem escrever os proprios discursos, como poderiam !? Um dia sao Ministros da Saude, três dias mais tarde da Cultura e no dia seguinte da Defesa...como se pode saber de tantos assuntos ? Depois da o que da... : ((
Ainda se admiram da percentagem de abstençoes quando ha eleiçoes ? Eu nao.

jj.amarante disse...

Onde se vê afinal a importância do papel timbrado ou, pelo menos, com uns logos para fácil identificação.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...