De há uns anos para cá, à medida que me dei conta da real complexidade de algumas questões, fui deixando de ter uma opinião firme, "de café", sobre certas temáticas que dividem o país.
Por exemplo, não faço a mais leve ideia se Lisboa precisa ou não de um novo aeroporto e, em caso positivo, se ele deve ir para a Ota ou para Alcochete. Também não tenho opinião sobre a necessidade de uma nova ponte sobre o Tejo, como também a não tenho sobre o TGV, dado que já vi argumentos definitivamente convincentes sobre teses diametralmente opostas, quer em relação à iniciativa em si, quer quanto aos cenários de construção possíveis. E eu sei lá se, em matéria de policiamento, deve haver super-esquadras ou unidades de proximidade! E será que os centros de saúde devem fechar à noite ou não?
Alguns conhecidos, ao verem-me "fugir" deste debates polarizados, devem achar que estou a fazer um "número" e que, lá no fundo, o que eu quero é reservar a minha opinião, na busca de me manter consensual e não polémico. Enganam-se redondamente e só provam que não me conhecem bem.
Com toda a sinceridade, devo dizer que ganhei este estado de progressivo "agnosticismo", sobre um número cada vez maior de temáticas "fraturantes", quando passei pelo governo do país e aí percebi que as grandes questões, sobre as quais todos somos chamados diariamente a ter uma opinião "impressionista", têm, na realidade, uma elevada complexidade, muito superior àquela que o simples tratamento mediático permite acompanhar. Foi isso, e nada mais, que me foi conduzindo a uma cada vez maior humildade opinativa. Mas que fique bem claro que não pretendo que esta minha atitude seja a correta. Cada um que pense por si.
Porém, devo dizer que muito me surpreendo que haja alguns "génios" que, nas colunas ou nos écrans, falam de tudo com ar de cátedra, do trânsito ao futebol, do défice à literatura, do ambiente à fiscalidade. Feliz pátria que tais filhos tem! E crédulo país que ainda os ouve.
Vem isto hoje a propósito do Japão, do maremoto e, por via dele, da energia nuclear. A chamada opção nuclear é já um tema vetusto em Portugal. Há anos que se discute se devemos, ou não, construir centrais nucleares. O debate já teve dimensões de radicalidade político-ecológica que o tornaram quase tabu, para, depois de isso, e por "luas" de opinião, voltar a reaparecer, com maior serenidade. Já ouvi a voz ponderada de um técnico competentíssimo, como Nuno Ribeiro da Silva, explicar que a relação custo/benefício dessa opção, para um país como o nosso, é profundamente errada. Há semanas, jantei em Paris com o empresário de sucesso Patrick Monteiro de Barros, que, com números e argumentos fortes, garante exatamente o contrário.
Em que ficamos? Melhor, onde fico eu? Em nenhuma parte, devo confessar. Se a tragédia conjuntural do Japão me leva a aumentar as dúvidas sobre a opção nuclear em Portugal, país de onde não estão afastados riscos muito sérios em matéria sísmica, bem como a total ausência de respostas credíveis para o futuro dos dejetos, a verdade é que nós já temos uma forte ameaça nuclear, com as centrais espanholas aqui ao lado, com as eventuais radiações num desastre a não respeitarem fronteiras. E se o petróleo for por aí acima em matéria de custos? E se as energias renováveis se confirmarem limitadas na sua produção? E se o custo de exploração delas (eólica, fotovoltáica, maremotriz) se provar economicamente irracional? Se os riscos já existem aqui ao lado, e não podem ser evitados, porque não optar por ter essa energia? Mas, por outro lado, não há um limite claro na contribuição possível da produção nuclear para o nosso consumo total, que, aliás, tem custos de investimento muito elevados? E como superar o debate que iria levantar-se sobre a localização das centrais, ao lado do qual o caso da co-incineração iria parecer uma brincadeira de crianças? É que, num país com a nossa dimensão, o chamado efeito NIMBY ("not in my backyard") tem um peso ainda mais importante.
Mas, afinal, sou ou não a favor do nuclear em Portugal? Sei lá! Uma vez mais, não tenho opção.
Não deixa de ser angustiante, mas ao mesmo tempo dá-me um grande sossego, pensar que, cada vez mais, só falo daquilo de que julgo saber alguma coisa. O resto, deixo para os sábios figurantes do "Prós e Contras".