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sábado, maio 28, 2011

Chandeigne

As edições Chandeigne, como outras vezes aqui foi assinalado, prestam uma contribuição inestimável para a divulgação da língua e cultura portuguesas em França, com uma atenção cada vez mais alargada aos países cujas culturas se exprimem no nosso idioma.

Recomenda-se uma visita virtual ao excelente catálogo da Chandeigne ou, podendo, vale a pena perdermo-nos nas instalações desta "Librairie Portugaise et Brésilienne", no nº 10 da rue Tournefort, a dois passos do Panthéon (tlf.: 01 43 36 34 37).

Este ano, o trabalho de Michel Chandeigne e da sua equipa comemora os seus 25 anos de existência. No segundo semestre de 2011, a Embaixada de Portugal em França vai participar nesta comemoração e no agradecimento que todos devemos a quem tem feito um notável esforço pela promoção da lusofonia cultural em França.

Neste final de semana, porque nos aproximamos do "Dia de Camões", sugere-se uma saltada ao stand 505 do Marché de la Poesie, na place Saint-Sulpice, onde a Chandeigne apresenta uma cuidada edição bilingue dos Sonetos de Luís de Camões.

quarta-feira, maio 25, 2011

Dobragem

Nunca, em toda a minha vida, vi um filme ou um episódio completo de uma série televisiva que fosse objeto de dobragem. É uma opção pessoal, de que nunca me afastei. Tendo vivido em alguns países em que a dobragem das séries estrangeiras era a regra, há muita coisa que não vi e outra que tive de comprar em DVD. 

A primeira vez que recordo de me ver confrontado com uma dobragem terá sido em Verin, em Espanha, nos anos 60. Na sala de estar do único hotel daquela vila, desatei às gargalhadas, para espanto dos restantes clientes, ao ouvir, na série televisiva "Bonanza" (quem se recorda?), passada no Texas americano, as exclamações ingénuas de Hoss, ditas em castelhano. Há pouco tempo, noutra cidade espanhola, apareceu-me, na televisão do quarto de hotel, o "Casablanca" dobrado. Foi como assistir a uma comédia, particularmente para quem, como eu, conhece, de cor, diálogos de certas cenas. Para bem se entenderem os malefícios da dobragem, basta que se imagine em que "estado" ficariam os ditos lisboetas de Vasco Santana ou de António Silva se "O Pátio das Cantigas" fosse dobrado em espanhol...

Hoje, assisti, por minutos, à cena mais ridícula a que dobragem pode conduzir. Tratava-se de um diálogo entre uma escocesa e um inglês. A totalidade da graça subjacente ao texto tinha a ver, não apenas com a fonética e as diferenças no sotaque, mas igualmente com alguns trocadilhos, que só seriam possíveis de entender em língua inglesa. Pressentia-se essa graça "ao longe", por detrás da dobragem, mas apenas para quem conseguisse presumir o texto original. Um puro absurdo. Em francês.

A indústria da dobragem é uma "mina" para os atores, pelo que é imensamente protegida por esse lóbi e por um comodismo da habituação no público, que acaba por funcionar em detrimento de um melhor conhecimento das línguas estrangeiras. Em alguns países ainda tem, como justificação com fundamento "democrático", a existência de analfabetismo e a necessidade de facilitar a essas pessoas o acesso ao conteúdo dos filmes. Só que esse argumento não colhe, aqui em França.

Em tempo: reconheço que a dobragem de filmes infantis é um caso bem diferente

quarta-feira, abril 27, 2011

Marcel Gauchet

Uma "habituée" das sessões do centro cultural Gulbenkian, aqui em Paris, interveio para dizer que se tratara da mais interessante conferência-debate a que por ali assistira. Não sei se estava certa, mas a verdade é que quem ontem, ao final da tarde, ouviu Marcel Gauchet falar das "Metamorfoses da democracia" não perdeu o seu tempo.

O filósofo fez um curioso bosquejo da evolução da prática democrática, concordando com quantos colocam a nossa Revolução de abril na abertura da terceira vaga de libertação, que haveria de descer à América Latina, para retornar à Europa da centro e leste. Repetindo que "os homens fazem a História, mas não sabem a História que fazem", Gauchet singularizou o mítico "homem novo" como a tentativa de criar um ator que sabia a História que protagonizava. Nos debates, falou-se, entre outras coisas, da vitória do individualismo, com a "autodestruição doce" do poder coletivo. E a questão da legitimodade, em torno dos modelos de representação política, com as suas contradições e deceções, foi também abordada.

Saí da conferência "como uma seta": tinha à espera o Real-Barça... A filosofia era outra.

domingo, abril 17, 2011

"Bateau Feu"

Valeu bem a pena ter de chegar a Paris já de madrugada para poder ter tido a oportunidade estar presente no encerramento do festival de cultura portuguesa de Dunkerque, "Temps fort Portugal", organizado pelo "Bateau Feu".

A noite de ontem foi do belo espetáculo de bailado contemporâneo "Vale", de Madalena Victorino. Mas a semana portuguesa, com casas cheias, teve vários outros tempos de dança, de cinema e até de fado, com a presença de Kátia Guerreiro.

sexta-feira, março 25, 2011

Património

A diretora-geral da UNESCO, Irina Bukova, teve a excelente ideia de dirigir um apelo à "coligação" que efetua ações militares da Líbia, solicitando cuidados na proteção do importante património histórico da país. O objetivo é evitar incúrias como as que levaram à pilhagem do museu de Bagdade, aquando da invasão do Iraque, em 2003, bem como outras ações que então afetaram alguns monumentos do país. Esperemos que o facto da "coligação" incorporar países com uma forte tradição na preservação dos valores culturais possa contribuir para o êxito desta iniciativa.

As riquezas históricas líbias são pouco conhecidas. Mas recomendo, francamente, uma visita às fabulosas ruínas de Sabratha (na foto) e Leptis Magna, ambas na bela costa mediterrânica. Mas, já agora!, talvez convenha esperar mais algum tempo...

terça-feira, dezembro 21, 2010

A "Seara" e o padre*

O grupo "Seara Nova" foi, sem dúvida, a mais fecunda escola de pensamento crítico nascida durante a primeira República portuguesa. Dentre os seus objetivos figuravam o aprofundamento de temáticas culturais, cívicas, pedagógicas e económicas, para o que congregou figuras de relevo da intelectualidade portuguesa de então. Criado em 1921, dando origem a uma revista com esse nome, o grupo "seareiro" representou, a partir de 1926 e durante toda a ditadura, um polo alternativo em matéria de reflexão em torno das ideias e da sociedade, com regular acolhimento de textos de muitas personalidades desafetas ao regime, o que lhe valeu ser alvo cíclico da repressão, com uma constante perseguição por parte da censura.

Muitos recordarão a imagem histórica do grupo "Seara Nova", que adiante se reproduz:
Os seus integrantes são nomes sonantes do grupo. Sentados, da esquerda para a direira. estão Jaime Cortesão, Aquilino Ribeiro e Raul Brandão. De pé, pela mesma ordem, veem-se Teixeira de Vasconcelos, Raul Proença e Câmara Reis. Dos fundadores da "Seara", faltarão, na foto, António Sérgio e Augusto Casimiro, se não estou em erro.

Para quem, como eu, tem a coleção da "Seara Nova" desde os anos 50 (adquirir as décadas anteriores é difícil, embora não impossível, mas não tenho espaço para tal), esta fotografia faz parte da minha memória eterna dos "seareiros".

Um dia, porém, nos anos 70, ao analisar um número comemorativo dos 50 anos da "Seara", atentei melhor na fotografia do grupo que essa publicação apresentava. Por uma razão que na altura não identifiquei, achei nela algo de estranho. Fui então à procura de outras imagens do famoso grupo de 1921 e - supresa das surpresas! - verifiquei que as fotos não coincidiam. 

Querem saber porquê? Vejam:
Como se diz nos passatempos: observe as diferenças!

E a principal dentre elas é a existência de um padre no canto superior esquerdo desta segunda foto - esta que é, de facto, a foto original.

Ao que reza a pequena história, "não daria jeito" ter o padre na fotografia. E quem era ele? Trata-se do anónimo pároco de Coimbrão, localidade perto de Leiria onde, em casa de José Leal, teve lugar a reunião fundadora da "Seara" e onde foi tirada a foto. Porque  ninguém terá querido afastar o padre da ocasião, foi decidido apagá-lo mais tarde, historicamente, da fotografia do grupo. 

Como se vê, nem só Estaline tirava Trotsky das fotografias. Mais ou menos pela mesma época, aliás...

* Uma amiga que, neste Natal, esteve na casa onde a foto foi tirada, esclareceu que o "apagado" pároco se chamava Horácio Biu. Finalmente, o homem recuperou o nome...

quarta-feira, dezembro 15, 2010

Carlos Pinto Coelho (1944-2010)

... e assim, "acontece"! Morreu Carlos Pinto Coelho, um homem que tinha em si todo o entusiasmo do mundo e que, por muitos anos, com aquele sorriso aberto, ajudou, diariamente, a divulgar a cultura portuguesa.

Alguns recordarão também aquela forma tão característica de apresentar o "Jornal" da RTP2, que levou Herman José a criar um "boneco" nele inspirado, sem que o Carlos com isso se ofendesse. E outros reterão para sempre aquele que foi o eterno homem da rádio.

Lembro-me do curioso dialogo que uma noite estimulou, na RTP, entre o embaixador Calvet de Magalhães e eu próprio, sobre a diplomacia e as suas histórias. O que me deu algumas ideias...

Um dia, quando uma patetice de alguém o afastou de fazer o que gostava e fazia bem, o Carlos Pinto Coelho disse-me que ia para o Alentejo. Depois, voltou, creio para a TSF e para a sua eterna RTP. E agora, partiu. "Acontece"...

Até sempre, Carlos!

domingo, novembro 28, 2010

Porto

As Éditions Autrement há muito que nos habituaram a olhares diferentes sobre realidades comuns, que julgamos conhecer bem, mas sobre as quais, com surpresa, acabamos por vir a aprender coisas novas e perspetivas inesperadas.

Há semanas, tinham-me falado deste "Porto, poètes et bâtisseurs", um trabalho muito cuidado de Édouard Pons, com belas fotografias de Antonin Pons Braley. O autor é um antigo diretor da Agence France-Presse e já havia sido responsável pela obra "Lisbonne, terre de rencontres".

Este livro sobre o Porto, integrado numa coleção sobre cidades do mundo, é uma viagem feita através da voz de várias e, algumas inesperadas, figuras que nos ajudam - mesmo a nós, portugueses - a entender melhor o que há de particular numa cidade que, talvez melhor que qualquer outra em Portugal, destila um orgulho na sua intimidade, ao mesmo tempo aristocrática e regional, com tudo o que isso tem, simultaneamente, de notável e limitativo.

O Porto contemporâneo é uma realidade complexa, que - desculpem lá! - combina frequentemente algumas frustrações de afirmação nacional com dimensões de uma riqueza única no espaço português. Às vezes, o Porto aparece provinciano, no simplismo de um discurso através do qual auto-limita as suas fronteiras. Outras vezes, se se for mais ao seu fundo, a "capital do norte" dá-nos lições de modernidade e de inesperado cosmopolitismo. Talvez por isso, há imensa gente em Portugal que acha o Porto uma cidade e uma sociedade "estranha". De certo modo, não deixam de ter razão, mas eu entendo que isso é um involuntário elogio.

É este retrato múltiplo que este livro surpreendente nos traz. Por ele passam testemunhos de renomadas figuras da cultura, misturadas com pessoas simples, mas representativas, do dia-a-dia portuese. Não está lá tudo, mas está lá muito e, melhor!, está o suficiente para o que é importante: seduzir um leitor francês a interessar-se por essa realidade metropolitana ímpar que, em Portugal, é o Porto. Pena é que muitos portugueses teimem em não conhecer o Porto.

quarta-feira, outubro 13, 2010

Alfredo Margarido (1928-2010)

O Daniel Ribeiro, correspondente do "Expresso" em Paris, acaba de dar-me conta da morte, ontem, em Lisboa, de Alfredo Margarido.

Margarido foi uma espécie de figura mítica para a minha geração. Oriundo das artes, viria a revelar-se como uma personalidade de recorte cultural eclético - da ficção à sociologia, da pintura à antropologia, da história das ideias às questões africanas. Viveu em vários lugares, que sempre marcaram o seu percurso intelectual. Paris foi, a partir de 1964, o seu "porto de abrigo". Aqui dirigiu os "Cadernos de Circunstância", uma revista policopiada, de edição irregular, que marcou um tempo importante nos meios portugueses no exilio em França (e de que,  por sorte, tenho todos os exemplares das muito raras edições originais, embora os seus textos tenham sido editados  em Portugal depois do 25 de abril, creio que pela "Afrontamento", não sei se em versão completa).

Presumo que datará da sua estada em S. Tomé, nos anos 50, o encontro com aquela que iria ser sua mulher, Manuela, uma figura muito interessante, também já falecida, de que já aqui falei um dia.

Leia mais sobre Alfredo Margarido aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

domingo, agosto 15, 2010

Gabriel Abrantes

Há semanas, falámos aqui do êxito em Paris de Gabriel Abrantes, um artista português com uma obra plurifacetada.

Ontem, chegou a notícia de lhe ter sido atribuído um Leopardo de Ouro, no festival de cinema de Locarno.

Boas notícias destas é o que nós precisamos.

quarta-feira, agosto 04, 2010

"Sunny"

Há alguns cantores e compositores que ficaram conhecidos apenas por uma canção, êxitos que se lhes colaram à pele profissional e lhes marcaram as vidas - e que talvez os tenham "perseguido" ao longo de toda a carreira.

Estou muito longe de ser um especialista em música, pelo que pode ser defeito meu não conhecer outras canções importantes de Bobby Hebb, que agora morreu, além do seu sempiterno "Sunny", de 1966. Desse tema, tenho interpretações de Frank Sinatra, Dell Shannon (outra "vítima" da "canção de carreira" com "Runaway"), Marvin Gaye, Dusty Springfield, James Brown e os The Four Tops. E recordo muito bem, nos idos de 90, ter ouvido ao vivo a célebre versão de Georgie Fame, numa bela noite no "infamous" Ronnie's Scott, a catedral londrina do jazz.

Ouçam aqui a versão original de Hebb.

sábado, julho 31, 2010

Álvaro Salema (2)

O post que, há dias, publiquei, sobre Álvaro Salema, provocou surpresas: "Quem era? Nunca tinha ouvido falar". Creio que alguns, lá no íntimo, terão julgado que eu estava apenas a magnificar um conhecimento pessoal, por discriminação de simpatia.

Talvez estivesse, mas não estava sozinho. Leiam (um pequeno extrato d)o que escreveu Jorge Amado, na sua "Navegação de cabotagem", quando soube da morte de Álvaro Salema:

"A morte de Álvaro Salema chega-me pelo telefone (...). Ai, meu Deus! exclamo quando Nuno (Lima de Carvalho) me diz: desculpa chamar-te para má notícia, Salema morreu. (...) A partir de agora Portugal será menos ensolarado, menos alegre, menos fraterno. Perco o amigo português de toda a minha vida, o amigo perfeito, o de todos os instantes, aquele que tudo sabia e tudo podia entender.(...) Eu projetara ir a Portugal nesse outubro (...). Já não irei, cadê coragem de olhar para o rosto de Elisa, de pronunciar o nome de Álvaro? (...) O homem mais modesto, o mais corajoso, o mais leal, o mais digno, Álvaro Salema. Em silêncio se retirou de cena, pouco antes do final da tragicomédia, personificava a decência, já não tinha lugar no palco."

domingo, julho 25, 2010

Cinema

António Pedro de Vasconcelos pertence a uma raça muito rara de cineastas portugueses que conseguem cumular três características: terem indiscutível qualidade, não serem chatos e, seguramente por isso, terem, entre nós, um público que paga para ver as suas obras - essa coisa pouco comum, algo "suspeita" e até menos dignificante, no peculiar mundo da produção cinematográfica lusa. José Fonseca e Costa é outro desses autores.

O cineasta tem, por essa razão, toda a autoridade - profissional e cultural - para se pronunciar como o fez, numa carta que dirigiu à ministra da Cultura, que pode ser lida aqui. A sua tese é simples: o Estado democrático não deve ter uma política do gosto.

Não tenho a menor dúvida que esta declaração, frontal e corajosa, de António Pedro de Vasconcelos vai ao arrepio da opinião de quantos, lá no fundo, não se importam de ver as salas de cinemas do nosso país "cheias" como a imagem documenta. São os adeptos de um cinema português para uns "happy few", onde se contam os amigos, os amigalhaços da crítica e, presumo, os membros dos júris que lhe atribuem os subsídios.

sábado, julho 24, 2010

Álvaro Salema

Ontem, numa conversa, veio à baila o nome de Álvaro Salema. Muitos dos leitores deste blogue não o conhecerão bem, alguns nem sequer terão ouvido falar deste ensaísta e jornalista que desapareceu, com 77 anos, em 1991, e que, com Álvaro Cunhal, chegou a dar aulas a Mário Soares, no Colégio Moderno.

Devo começar por dizer que, de há muito, considero que Álvaro Salema é uma das  importantes figuras portuguesas a que o 25 de abril, por que tanto lutou, não fez a justiça que lhe era devida. A culpa é de todos nós, a começar pelo próprio Álvaro Salema. Já explico porquê.

Salema foi uma figura da maior importância na vida intelectual portuguesa, a partir dos anos 40. Professor e crítico literário, foi um escrupuloso cultivador de uma ética pública de grande rigor, que o levava a um auto-apagamento que acabou por afetar a visibilidade do lugar que lhe é devido na história cultural de Portugal. A política era, para ele, um espaço de exercício de serviço à comunidade, pelo que alimentava uma exigência que o tornava quase intolerante perante os que entendia que dela apenas se serviam. Com um intocável currículo na luta pela democracia,  ao tempo em que era arriscado assumi-la como objetivo, foi preso e perseguido. Nunca procurou cargos ou prebendas, alimentando mesmo um cáustico desprezo por quantos viviam nessa obsessão.

Durante muitos anos, Álvaro Salema foi redator principal do "Jornal do Comércio", um dos mais antigos diários económicos portugueses. Dirigiu os suplementos literários do "Diário de Lisboa" e de "A Capital" - ao tempo em que esses espaços tinham um papel fundamental na vida intelectual do país. Colaborou em inúmeras publicações, como a "Seara Nova", o "Sol Nascente" ou o "Colóquio Letras", tendo obtido distinções internacionais pelos seus trabalhos de crítica literária, distribuídos por vários livros.

Por razões que não vêm para o caso, tive o ensejo de privar com Álvaro Salema. Dele recolhi exemplos de postura ética que me levam a manter uma grande admiração pela sua memória. Achei importante dizê-lo aqui.

segunda-feira, julho 19, 2010

Doinel

Quem gosta dos filmes de François Truffaut - e eu gosto imenso e julgo ter visto todos - guardou para sempre no seu imaginário a figura de Antoine Doinel, representada pelo ator Jean-Pierre Léaud. Numa inesquecível série de cinco filmes, iniciada com os "Quatre-cents coups", "Doinel" foi crescendo aos nossos olhos, a partir dos 14 anos, evoluindo num modelo que, contudo, fixou algumas linhas comportamentais comuns. Sempre agitado, com um rosto de gravidade assustada, misto de timidez e indecisão, mas capaz de rasgos atrevidos de surpresa, "Doinel" foi uma figura, em parte autobiográfica, que Truffaut utilizou, com o seu imenso génio, para nos retratar uma França em mudança acelerada de costumes.

O António Alves Martins, o MFB ("militante de fato branco") do MES de que em tempos aqui já falei, ao tempo em que era estudante de sociologia por Paris, contou-me ter ido passar férias com um grupo à Côte d'Azur, que incluía Jean-Pierre Léaud, cujos humores eram difíceis de prever e controlar, mas que podia ser divertidíssimo. Uma vez, em Nova Iorque, em 1992, fiquei numa mesa ao lado de Léaud, no "Michael's Pub", onde ambos e muita mais gente tinha ido ver Woody Allen tocar clarinete, nessas celebradas segundas-feiras. Passei a noite a tentar lembrar-me do seu nome e só me veio à memória "Antoine Doinel". Hoje, com o Google no Iphone, tudo seria mais fácil.

Jean-Pierre Léaud teve uma longa carreira no cinema francês. Para além de Truffaut foi muito utilizado por Jean-Luc Godard, tendo, ele próprio, dirigido alguns filmes. A meu ver - mas esta é uma opinião que vale o que vale - nunca foi um ator excecional e jamais ultrapassou uma aceitável mediania.  Porém, há que reconhecer nele um dos nomes emblemáticos da "Nouvelle Vague" francesa, em cuja história tem um lugar.

Há dias, numa madrugada televisiva, surgiu-me uma comédia romântica de 1996, intitulada "Pour rir!", na qual Léaud contracena com Ornela Mutti. Por uma imensa curiosidade, muito centrada na evolução artística de Léaud, vi o filme até ao fim. A opção iria revelar-se quase masoquista: tive de suportar a inenarrável prestação de Mutti. Machistamente, devo dizer que ela perdeu muitos dos atributos que, durante anos, nos faziam esquecer a sua mediocridade como atriz. Enfim, não ganhei muito para a minha cultura cinematográfica. Para o que aqui me interessa, foi quase patético ver um Léaud de 60 anos assumir os trejeitos e a "coreografia" típicos de um "Doinel" adolescente. 

Há atores que guardam uma imagem que acaba por se impor nas diferentes figuras que interpretam, por mais diversas que estas sejam. São "characters" - e isso pode ser uma coisa positiva ou tornar-se pesada e desinteressante, particularmente quando os filmes e as personagens têm de ser desenhados em função dessas suas conhecidas peculiaridades. Foi o que me pareceu, neste triste "Pour rir!",com Jean-Pierre Léaud. 

segunda-feira, julho 05, 2010

Acordo ortográfico

O "Expresso" desta semana passou já a usar as normas do novo Acordo Ortográfico.

O mesmo já acontecia com a única agência noticiosa portuguesa - a "Lusa" -, bem como com o semanário "Visão" e o jornal desportivo "Record".

Acaba, entretanto, de ser anunciado que, a partir de Janeiro de 2011, os manuais escolares irão aparecer sob a nova ortografia, embora haja um período de transição.

sexta-feira, junho 25, 2010

Souto Moura

Os franceses ficam sempre encantados quando ouvem uma certa geração portuguesa expressar-se bem na sua língua. Embora lamentando muito, costumo acabar-lhes cedo com as ilusões, informando-os que, com algumas exceções, somos, em Portugal, uma "raça em extinção".

Ontem, ao ouvir Eduardo Souto Moura ler um belo texto num excelente francês - no qual assumiu a inspiração da sua obra na de Mies van der Rohe -, foi muito curioso ver o público presente na sessão anual da Académie de l'Architecture, aqui em Paris, prolongar essa ilusão de que Portugal permanece como sólido pilar do proselitismo linguístico da língua francesa. Não é verdade, infelizmente.

Souto Moura esteve em França para receber um prémio pela sua obra, dado pelos seus pares franceses, consagrando assim um reconhecimento internacional da arquitetura portuguesa que a todos nos honra.

terça-feira, junho 15, 2010

"Horizons Lointains"

O debate acabou por ser um pouco mais tenso do que eu estava à espera - confesso! -, mas o visionamento do filme sobre Lisboa e a literatura portuguesa, incluído no ciclo "Horizonts Lointains", da cadeia televisiva franco-alemã Arte, baseado numa ideia dos irmãos Patrick e Olivier Poivre d'Arvor (na imagem), animou fortemente, ontem à noite, os salões da Embaixada.

O filme, de cerca de uma hora, constituiu uma visita guiada aos nossos mitos e sonhos, em conversas excelentemente conduzidas por Patrick Poivre d'Arvor com figuras da nossa cultura. Nelas se destaca uma entrevista muito interessante com António Lobo Antunes.

O filme tem a grande virtualidade de "abrir o apetite" para Lisboa e as suas novas escritas, para o Portugal cultural em rápida mutação. O público franco-alemão terá oportunidade de nos olhar um pouco para além do habitual registo de fixação na História e no cultivo de uma endémica nostalgia.

O aberto contraditório sobre o modo de representar filmicamente Portugal, no equilíbrio instável entre a tradição e a contemporaneidade, atravessou o animado debate que se seguiu ao filme, o qual mobilizou o interesse das mais de 100 pessoas presentes. No final, diga-se, fiquei com a sensação de que ninguém se importou em mergulhar em conhecidos "clichés" lusos: vinho do Porto, queijo da serra e pasteis de nata... 

domingo, junho 13, 2010

Vieira da Silva e Paula Rego

Hoje, Maria Helena Vieira da Silva, a pintora portuguesa que a ditadura portuguesa conduziu a tornar-se francesa, faria 102 anos. A França esquece-a como portuguesa e dá-lhe naturais honras de cidadania artística.

Ontem, Paula Rego recebeu da rainha Isabel II uma importante condecoração do país que a adotou - "Portuguese born british painter", era assim que me recordo de a ver irritantemente sintetizada numa biografia britânica.

Não deixa de ser irónico, mas também significativo, que as duas mais famosas pintoras portuguesas se tenham acolhido a países estrangeiros. Mas também não deixa de ser reconfortante que seja em Portugal que, nos dias de hoje, existam os únicos museus dedicados à sua obra.

"It"s the economy..."

"It"s the economy, stupid!", foi a expressão cunhada por James Carville, na campanha de Clinton em 1992, para identificar o e...