sábado, novembro 18, 2023

Artigo no 'Jornal de Letras"



Na primeira pessoa

Qualquer cidadão sensato, ao deparar com um volume de quase 700 páginas, tem o direito de interrogar-se: "o que é que, de tão importante, este tipo tem para dizer que justifique esta dimensão de escrita?" 

Percebo lindamente a perplexidade, porque ela sempre me atravessa quando, numa livraria, sou tentado por algum cartapácio deste tamanho. Raramente consigo obter a resposta antes ler o livro. Vou, assim, procurar ajudar o potencial leitor.

Quase quatro décadas de vida diplomática, com mais de cinco anos de atividade política pelo meio, por vezes em quadros funcionais de responsabilidade, representam, há que convir, um património de alguma experiência. Achei que podia ser interessante partilhá-la, referenciando episódios que, nesse percurso, mais me marcaram, recortando figuras e refletindo sobre conjunturas atravessadas.

Da revisita feita a esses tempos, em retratos isolados cuja possível coerência apenas uma leitura conjunta pode garantir, o eventual leitor poderá ajuizar sobre se consegui decantar um registo escrito apelativo, seja na diversa forma expositiva escolhida, seja na valia intrínseca daquilo que optei por destacar.

Quem me conhece sabe que procurei, às vezes até de uma forma algo obsessiva, ainda que me não compita aferir com que sucesso, conciliar uma empenhada atenção aos deveres funcionais com um modo de estar na vida que fugisse ao estilo bisonho e oficioso do burocrata de escritório ou do profissional de salão.

Isso conduziu-me a um olhar sobre as coisas e as pessoas à minha volta que tentei despir do rigor sombrio de quem se leva demasiado a sério. A ironia e o humor andaram sempre por ali. E procurei passar isso à escrita.

Mas, no fim de contas, pensará o putativo leitor, um livro de 700 páginas é, necessariamente, um livro "pesado". Não, não é. O "Antes que me esqueça" tem um "tom leve, na atitude e na escrita, porque esse é também o sentido algo lúdico do saldo que guardo de uma experiência que, no seu todo, me deu um imenso prazer". Digo isto mesmo na introdução. Os episódios que agora convido a ler foram sendo colocados por escrito ao longo de 14 anos. Não têm a menor ordem sequencial entre si, pelo que o livro pode ser aberto indiferentemente em qualquer página, em qualquer texto, com o leitor seguro de que aí encontrará sempre a respetiva contextualização. Pode mesmo dar-se ao luxo de andar para a frente ou para trás no volume, com a certeza de que nunca se perderá. Faça a experiência.

Convenci-o? Não sei, mas gostava de saber.

1 comentário:

Tony disse...

Sr. Embaixador. Belo texto explicativo e por assim dizer, entusiasmante, criando, pelo menos para mim, muitas "ganas" pela sua leitura. Peço desculpa pela ironia que referi, há dias, de que iria meter férias, a fim de dar conta das quase 700 páginas. Parabéns.

Isto é verdade?