domingo, novembro 05, 2023

Netanyahu


Em 18 de março de 2015, escrevi aqui isto:

"Em meados de 1996, recebi no meu gabinete o embaixador de Israel em Portugal. Meses antes, em Jerusalém, ambos havíamos almoçado em casa de Itzahk Rabin, horas antes deste ser assassinado. A partilha desse momento criara entre nós uma relação especial. 

Israel tinha ido a votos, semanas antes. Netanyahu acabava de ser nomeado primeiro-ministro. O embaixador cessava as suas funções, por ter atingido a idade da reforma. Ia regressar a Israel. Era uma figura muito simpática, popular em Lisboa, onde ia deixar grandes amigos. Ofereceu-me um livro de Amos Oz, que tinha acabado de ser publicado em português. Trocámos algumas palavras amáveis, como é uso nas despedidas, desejei-lhe felicidades pessoais e fui levá-lo ao pátio do Palácio da Cova da Moura, onde estava o seu carro. Lá chegados, perguntei-lhe se achava que a vitória do Likud ia induzir mudanças drásticas no processo de paz que, pelo menos no papel, parecia ainda poder subsistir. Otimista por dever de ofício, disse-lhe que não esquecia que o mais corajoso passo político que testemunhara por parte de um governo israelita - o tratado de paz com o Egito - fora dado precisamente por um governo Likud. Seria este novo governo Likud capaz de uma "paz dos bravos"?

O embaixador olhou para mim de um modo estranho. Fez um ricto facial que não me pareceu dever-se ao sol que lhe banhava a cara. Notei lágrimas a surgirem-lhe nos olhos. Agarrou-me o braço com força e, com visível dificuldade para dizer o que diria de seguida, ousou expressar: "Meu querido amigo. Provavelmente, eu não deveria estar a dizer-lhe isto, mas digo-o: com a eleição de Netanyahu, o meu país entrou no caminho da tragédia. Qualquer paz é impossível com ele. Não o conhecem!". E entrou no carro. Nunca mais o vi. Não sei se, quase duas décadas passadas sobre aquele momento, ainda será vivo. Espero bem que sim.

Lembrei-me dele há minutos. Os israelitas voltaram a escolher Netanyahu."

1 comentário:

PedroM disse...

Não é à toa que o embaixador israelita na ONU bem como o seu MNE, reagiram tão violentamente ao discurso de António Guterres, na ONU.
A meu ver não foi tanto por Guterres ter formulado mal uma frase que ligava o ataque terrorista de 7 de Outubro à situação em que vivem os Palestinos, o que de algum modo poderia, numa interpretação mais manipulatória, justificar os referidos ataques.
A indignação e a reação violenta dos representantes de Israel, deveu-se ao facto de Guterres ter posto o dedo na ferida e referir a contínua ocupação de terras palestinas e a expulsão dos palestinos que nelas habitam, como um fator de violência e impeditivo da paz.
Ora essa é precisamente a política de Israel pelo menos nas últimas quase 3 décadas e é isso que Israel não pode aceitar ser contestado. A frase mal formulada de Guterres foi apenas um pretexto.

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