sexta-feira, agosto 24, 2018

O campo de Santana


Está provado que a vida política inocula, em muitos que a experimentaram, uma poderosa e persistente adrenalina. Para quem já esteve sob as gambiarras do sucesso, herói das palmas de plateias ululantes, deve ser difícil viver o silêncio do dia seguinte. Um ministro francês disse, um vez, que é complicado ser-se governante e, horas depois, ser condenado a ir passear o cão. Para quem tiver cão, claro. 

Será talvez esse tropismo de ambição que torna tão frequentes as tentativas de “remake”, de regresso a tempos em que se foi incompletamente feliz na política. Se personalidades bem realizadas foram tentadas a esse retorno, pode imaginar-se o que passará pela cabeça de figuras que entendem que o destino não foi justo para com elas, condenando-as a ficar na soleira da História. 

Pedro Santana Lopes é uma figura curiosa na constelação das estrelas de mediana grandeza da nossa vida política. Foi discípulo de Sá Carneiro, mas se se perguntar a alguém o que terá ele herdado do fugaz primeiro-ministro, a resposta pouco terá de concreto. Da sua vida como político executivo, sobra uma passagem pouco destacada como responsável pela Cultura, num governo em que o tema era um fogacho não essencial. Autarca, espelhou o social lisboeta na Figueira da Foz (como o poderia ter feito em Fornos de Algodres ou na Calheta). Na Câmara de Lisboa conseguiu alguma relevância, logo prejudicada pela sua intravável inconstância. Foi um deputado europeu sem história e, como mais notória, apenas ficou a sua passagem pela Misericórdia de Lisboa, onde cultivou a imagem senatorial, ajudada pelo pausado comentário televisivo. Presidiu ao Sporting e debateu penaltis e foras-de-jogo nos rentáveis debates televisivos. Ah! e, já me ia esquecendo, foi primeiro-ministro, num interlúdio político que muitos portugueses hesitam, com sólidas razões, em creditar-lhe como currículo.

O anúncio de que Santana Lopes tinha a intenção de criar um novo partido acabou por ser a revelação de um segredo de Polichinelo. Até numa vetusta capa do “Independente” isso já havia sido notícia. Com Marcelo a tapar-lhe Belém, com um PSD grávido de outras ambições, Santana Lopes ousa romper com o atual sistema de representação partidária, depois do afloramento conjuntural que foi a aventura do PRD, e que só o Bloco conseguiu concretizar, explorando a esclerose do PCP e o excesso de pragmatismo do PS.

Terá Santana sucesso? Logo veremos. Uma coisa é evidente: não deve ser nada fácil viver na nostalgia de um futuro que não se teve.

13 comentários:

Anónimo disse...

Santana Lopes é aquele, o mesmo, que foi despedido de primeiro ministro, com se despede qualquer trabalhador precário que não cumpre os mínimos ? É ?

António Pedro Pereira disse...

Senhor Embaixador:
Como se atreveu a classificar o estado do PCP de esclerótico?
Acaba de ser condenado eternamente às labaredas do Inferno pelos habitantes do Parque Jurássico da Soeiro Pereira Gomes.

Anónimo disse...

Cinglant

Anónimo disse...

CP no seu melhor:

"A CP deu garantias escritas ao PS de que "aceita os atrasos" noutros comboios para que um comboio fretado pelo partido vá à rentrée socialista, num caminho do Pinhal Novo a Caminha. Com a CP numa crise profunda, em que suprime comboios e obriga os passageiros a viajar sem condições, é politicamente surpreendente que o PS se coloque nesta posição."

Anónimo disse...

Mais um delicioso texto, quer se concorde quer não.
Quanto à putativa agremiação, dita partidária. Partidos engendrados e mantidos de cima para baixo acrescentam poucochinho à democracia. Transparecem demasiado a fisionomia dos seus mentores. São como o boletim da freguesia: página sim, página sim uma foto com o presidente da junta ou rodeado de inocentes criancinhas ou aos beijinhos e selfies com os inocentes eleitores, os de certa idade.
Pobre democracia.JS

Anónimo disse...

É impressionante a capacidade que tem para fazer um retrato fiel de Santana Lopes.
A sede de poder do homem é algo surreal, mas por onde passa não deixa saudades.

Anónimo disse...

É capaz de vir a preencher um espaço Neo-Liberal, muito do gosto de um certo eleitorado, que tem algum peso. Não me admiraria que consiga uma margem de 10% de votos. O que faria implodir o PSD. Ou quase. PSL pesca em águas de uns tantos "jovens" Neo-Liberais que não conseguem formar um Partido e naqueles que defendem a aberrante governação (que levou o País à banca rota - ao tempo de Passos/Portas).
Por mim, se o seu "novel" Partido - Aliança - levar ao enfraquecimento e atomização da Direita, excelente!
(PS: Embora não me apareça que o PS/de Costa consiga uma maioria absoluta, muito longe disso. E se assim for, ainda bem - as maiorias absolutas neste país só nos trouxeram dores de cabeça).

Anónimo disse...

Tenho a solução para isto dos comboios
É passarem os comboios que agora circulam entre Lisboa e o Porto para as linhas do Alentejo e das Beiras durante um mês. Tenho a certeza que o problema se resolve imediatamente.
Claro que depois de o marcelo ir fazer uma viagem, nesses comboios, entre Lisboa e o Carregado (carregados de história...) e de os da comunicação social se alvoroçarem todos em todas as aberturas de noticiários.
Era remédio santo.

António Pedro Pereira disse...

Ao Anónimo das 09:51, 24/08/18,
Concordo, na essência, com o que diz.
Com a atitude crítica generalizada da população para com os partidos e os políticos, estes deviam ter o bom senso de «não se porem a jeito» para não levantarem um coro de críticas contra si.
Mas o bom senso é hoje uma virtude rara, um pouco por todo o lado.
No entanto, é preciso ressalvar que, na CP, existe desde há muito tempo a norma da prioridade dos comboios especiais sobre todos os outros, sejam eles fretados por quem forem.
Depois, há que avaliar caso a caso, e aí é que deve entrar o bom senso.

Anónimo disse...

Primeiro,vamos ver se consegue as 7500 assinaturas. Se conseguir, vai a eleições, mas, tenho a convicção que não irá ser eleito. Também, tirará poucos votos ao ppd/psd e à dona cristas. Prevejo, finalmente, que de vez, terminará a sua carreira politica, deixando de andar por aí.

Anónimo disse...

No primeiro governo da AD o que era importante decidia-se na reunião das quartas-feiras durante a qual Franciscoo Sá Carneiro,Francisco Balsemão,Diogo Freitas do Amaral, Adelino Amaro da Costa e Vasco Pulido Valente, analisavam, comentavam,resolviam e definiam as estratégias e taticas para suster e contrariar as forças políticas derrotadas nas eleições legisltivas.A mistura" distopiana" de revolucionários cabisbaixos,PC's desorientados, eanistas preplexos, militares atrapalhados e PS's engasgados com a a vitoria do adversário, dava um país muito dificilmente governavel .
Nos gabinetes da Gomes Teixeira cirandava um jovem, oriundo das hostes do PSD e que se desesperava por dar palpites, ter opiniões e encontrar pretextos para entrar no gabinete do Primeiro Ministro. Que fosse visivel,este não apreciava excessivamente as visitas e nunca consentiu que as tais reuniões das quartas-feiras o incluissem.
Tudo isto a proposito de um apregoado qualificativo de"colaborador directo de Sa Carneiro" que o já não tão jovem político inclui nas suas referencias auto laudatorias.

dor em baixa disse...

Mas o Campo de Santana não é ali ao lado da morgue?

Anónimo disse...

Camaradas , a vitória é certa !


"O político cujas palavras tanto ‘indignaram’ as extremas-esquerdas é o mesmo que faz os orçamentos que o PCP e o Bloco aprovam no Parlamento. Deixo um desafio aos deputados bloquistas e comunistas. Estão indignados com as palavras de Centeno sobre a Grécia? Então votem contra o último orçamento deste governo. Se não o fizerem, as palavras de Centeno são também as vossas palavras.

A Venezuela mostrou a incapacidade dos nossos marxistas para defender um regime socialista. Como os entendo. O apoio aos orçamentos de Centeno mostra a sua disponibilidade para votar a favor de políticas financeiras ortodoxas. Bem-vindos ao neo-liberalismo, camaradas."

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