sexta-feira, agosto 31, 2018

As tarefas de Macron


Emmanuel Macron surgiu em França como uma figura política de conjuntura. Se François Fillon não tivesse empregado ficticiamente a sua própria mulher, estaria hoje a habitar Eliseu. Com ela por lá. Macron acabou por ser o candidato anti-Le Pen. Importantes setores da direita e da esquerda votaram nele apenas para afastar, uma vez mais, o fantasma da extrema-direita.

Macron provou, mas só depois, ser mais e melhor do que isso. Revelou ter um pensamento estruturado sobre a Europa, ideias arrumadas sobre o que é necessário fazer para apoiar o euro, uma leitura estratégica da ambição que a Europa deve ter, neste tempo conturbado em que Trump dá as cartas, baralha o jogo e nem precisa de fazer bluff para condicionar o mundo. Macron pode vir a não conseguir levar a sua avante, por oposição alemã, mas mostrou já estar à altura das responsabilidades de uma potência que, após o Brexit, assumirá necessariamente um papel de singular destaque na Europa.

No plano interno, Macron começou por afirmar não ser “nem de esquerda nem de direita”, o que, como se sabe, é sempre um auto-confissão conservadora. E, uma vez mais, isso ficou provado. A política social do novo presidente, sem surpresas, seguiu uma agenda “reformista” e “modernizadora”, com tudo o que isso quer dizer no jargão do liberalismo económico. E, claro, pagou um preço nas ruas. E foi também nas ruas que outros problemas iriam surgir, com um seu colaborador muito próximo, disfarçado de polícia, a ser apanhado a reprimir manifestantes, criando um escândalo reputacional muito sério ao presidente. 

Na composição do seu governo, Macron havia conseguido incluir, como ministro de Estado, Nicolas Hulot, uma espécie de “papa” francês do Ambiente, que havia resistido a convites anteriores de Sarkozy e de Hollande. Foi um fator importante de credibilidade para o novo executivo. Macron disse então querer colocar as questões do clima e da transição energética como sua prioridade central. E tem-no repetido. Há dois dias, Hulot bateu com a porta, com estrondo, alegando não conseguir impor as suas políticas. 

Conseguirá Macron virar o jogo, retomar a iniciativa, recuperar da clamorosa perda de popularidade que hoje o atinge? Com o Brexit no horizonte dos problemas, com Merkel acossada, com a Itália sob uma agenda radical, uma Espanha em equilíbrio precário, quem terá força para garantir sucesso à reforma europeia? Para um país como o nosso, fortemente empenhado na agenda da Europa, a fragilidade de Macron não é uma boa notícia.

12 comentários:

Fernando P disse...

A asserção de que Macron não teria sido eleito sem os problemas judiciais de F. Fillon não se sustenta em nada.
De todos os candidatos da direita, Fillon era o que daria maiores possibilidades de eleição a Macron, com ou sem empregos fictícios. O programa eleitoral ultra-liberal assegurava a Macron uma vitória mais que certa, na minha opinião.
Se Alain Juppé tivesse sido o candidato da direita, acredito que Macron não tivesse sido eleito, dado que Juppé teria ido buscar os votos ao centro, que Fillon nunca captaria.
As primárias da direita e da esquerda foram o seguro de vida de Macron, ao elegerem candidatos que confortavam as franjas mais "extremas" de cada lado, mas incapazes de suscitarem a adesão fora dos núcleos de militantes.

Joaquim de Freitas disse...

A história dirá um dia que a eleição de Macron foi o resultado de uma conspiração da direita, claro está. Esta eleição de um jovem desconhecido três anos antes, mesmo se tinha tomado o chá com Hollande, Minc e Attali (que representava o bilionário Soros); Uma eleição após a campanha mais vazia de política da história da República, apesar de ou através a abstenção maciça.

Uma eleição que viu o candidato da direita ", que não podia perder" varrido (com razão) por um escândalo medíocre; Em seguida, o primeiro-ministro socialista esmagado numa primária, que talvez será explicada daqui a dois séculos. Uma eleição onde os media dominantes construíram exactamente a mesma imagem dos candidatos.

O “novo enfant chéri” da República beneficiou duma constelação deslumbrante. A grande média apoiou-o após o “pschitt” de Fillon. Que se borrou por uma questão de salário para a esposa e filhos e dois ou três fatos de marca. Pobre direita!

Os altos funcionários reconheceram um dos seus. Assim como a oligarquia financeira. Macron chegou no momento em que os dois partidos políticos principais, o partido Socialista, e o da direita dura, os republicanos, se estatelavam, descredibilizados.

Nunca tendo conhecido um mandato electivo, Macron começou logoa sofrer da sua imaturidade política e sua falta de enraizamento na res publica, cometendo erros muito grosseiros que suas qualidades de “forte em tema” não puderam ser evitar

Ele acredita numa forma de pensamento mágico na qual o que é dito é programático, performativo, e apaga todas as contradições. Dizer que é ele "o chefe dos exércitos" e demitir o Chefe de Estado-maior como um chefe de equipa desarrumado, que não cometeu nenhuma falta, não o faz o líder natural dos exércitos. Pelo contrário.

Na República, não se impõe o seu poder por humilhação e por golpes de queixo à Mussolini. Macron, o Júpiter, suscitou, além da demissão dum general de cinco estrelas, a de quatro ministros sob simples suspeita.

O inspector das finanças Macron fala da banca como "uma escola de rigor e humildade" que ele sente ser "mais livre e empreendedor". Talvez, mas como a maioria dos filhos brilhantes da burguesia francesa, Macron nunca terá fundado ou gerido uma empresa. Além da companhia França, é claro. E isso agora sente-se.

Seguiu o Conselho de Alain Minc : -: "para fazer política hoje, tens que ser rico ou asceta." Começa a criar fortuna, faz-te um banqueiro de negócios. Primeiro, serás livre para aconselhar os políticos durante este período. Mas, acima de tudo, vais ganhar bem a tua vida e vais ganhar a tua liberdade. Macron fê-lo.

Joaquim de Freitas disse...

SUITE


Os Macron são arrivistas. Cada um tem o seu próprio programa: Brigitte Macron mandou mudar a carpete de Brégançon, palácio de férias presidencial na Cote d’Azur, carpete perigosa para os seus sapatos de talão alto, mandou mudar todos os cortinados, demasiado transparentes, mandou mudar a louça de Sèvres, do Eliseu, para deixar a sua marca, exigiu uma piscina para Brégançon, que é à beira mar…

Para Macron e os seus ministros, é uma questão de acelerar a guerra de classes liderada pelas classes dominantes contra as conquistas sociais, culturais e políticas do programa do Conselho Nacional de Resistência em 1944. Macron quer satisfazer o programa do Patrão do MEDEF formulado em 2007: Anular tudo o que foi criado entre 1944 e 1952, sem excepção.

A Europa, com Macron, Senhor Embaixador? Mesmo se quer aproveitar a maré baixa de Merckel para a substituir, a Macron e à França faltam-lhes muitos trunfos.

Quando se conhece as palavras de Macron neste ultimo ano, os Europeus vão o mandar passear nas próximas eleições. E a Europa será levada na enxurrada.

Macron no texto:

Durante uma visita na Sociedade Gad." Há uma maioria de mulheres nesta sociedade. Alguns deles são analfabetas.»

"Não me vais assustar com o teu t-shirt. A melhor maneira de comprar um terno é trabalhar.»

"Uma estação de caminho de ferro é um lugar onde se encontra pessoas que tiveram sucesso na vida e pessoas que não são nada."

"Quais são os problemas da África?" Quando os países ainda têm sete a oito filhos por mulher, você pode decidir gastar bilhões de euros, você não vai estabilizar nada.»

"Precisamos de jovens franceses que queiram tornar-se bilionários".

“Muitas vezes a vida de um empresário é muito mais difícil do que a de um empregado. Ele pode perder tudo, e tem menos garantias.»

"O liberalismo é um valor de esquerda."

"Os funcionários devem ser capazes de trabalhar mais sem serem pagos mais, se a maioria dos sindicatos concordar."

E enfim, Astérix não lhe perdoará de ter ido criticá-lo na casa dos Vikings, há dias…Os Gauleses não são refractários à mudança, mas sobretudo não querem ser transformados em Bengalis…

Anónimo disse...

WOW

O Macron será como eu: Não-politizado??
Parece que já vou tendo colegas que não teem vergonha de o dizer frontalmente, como eu digo.

Isto vai tão imprevisivel que mais do que nunca hoje como no tempo de Luís XIV ele dizia face a uma petição: "Je vérais".

Mas gostei deste "post". Se não o inutilizarem pode ser que o Macron se faça ao bife.

Anónimo disse...

Ainda acha que há 5% da população que se preocupa com isso?
As pessoas querem é dinheiro no bolso para pagar contas. Pergunte lá a uma amostra de 100 portugueses de todas as idades e extractos sociais quem é Macron e vai ver que menos de 10 dir-lhe-ão quem é.

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Exatíssimamente, Macron é um "não"-politizado de direita, tal como o ilustre comentador das 11 e 49.

Anónimo disse...

@ Sr. De Freitas às 10:26

"Na República, não se impõe o seu poder por humilhação e por golpes de queixo à Mussolini. Macron, o Júpiter, suscitou, além da demissão dum general de cinco estrelas, a de quatro ministros sob simples suspeita."

Como terá sido feita a Revolução Frncesa de 1789 até à época de Napoleão?

De guilhotina em riste com um Rei e uma Rainha de França, e uma enorme quantidade de outros cidadãos anónimos que nem foram edentificados pois tinham sido indicados pelos visinhos, foi mesmo doce. É uma época chamada "La terreur" de 1792 a 1799 por alguma razão.
Mas do Sr. espera-se de tudo.....

Joaquim de Freitas disse...

O que eu queria precisamente dizer, é que hoje, na Republica, em França, os movimentos de queixo mussoliniens, não têm hipoteses O Terror, foi uma fase da Revolução Francesa. Teve início em Setembro de 1792, com o massacre de centenas de monarquistas que estavam presos. O massacre foi comandado pelos jacobinos.

- Áustria, Prússia e outras monarquias europeias pretendiam invadir a França para restaurar a monarquia no país. A França resistiu com a formação de um exército com grande participação das camadas mais pobres. A guerra foi o combate ao inimigo externo que pretendia acabar com a revolução e restaurar a monarquia.

Os jacobinos, sob a liderança de Robespierre, adoptaram uma série de medidas: fim da escravidão nas colónias francesas; abolição de todos os privilégios; divisão das grandes propriedades; tabelamento de preços de produtos essenciais; ajuda aos indigentes e educação básica obrigatória e gratuita.

As medidas radicais despertaram nos girondinos uma forte reacção violenta. Organizados, a alta burguesia da França começou a perseguir, prender e assassinar vários jacobinos.

Os jacobinos reagiram com mais violência, pois chegaram a conclusão que para defender a revolução seria necessário eliminar todos os opositores na França. Em 1793, cerca de 40 mil pessoas (monarquistas, girondinos e ricos burgueses) foram executadas pelos jacobinos.

Agora o caro anónimo pode perguntar se o preço a pagar não foi exagerado. A Republica foi a mudança radical visando transformar uma sociedade feudal numa sociedade digna do século das Luzes.

Lincoln, para transformar a sociedade americana ,foi obrigado a acabar com a escravidão, desencadeando uma guerra civil. O Custo, foi de 650 000 mortos.

Os mortos são sempre demais.

Anónimo disse...

@ Sr. De Freitas.

Resumindo: Os Girondinos da época eram o Trump de agora. Os Jacobinos eram os bons da festa que era necessário fazer para acabar com a sociedade feudal [?] e passar a ser tudo de bom para o mundo no futuro.
Ou seja acabar com a escumalha e ficarem só os bons.
Que critérios foram aplicados para saber quais eram os bons. A sua formação profissional e origem na tal sociedade feudal?
Tal como na Rússia há duzentos anos um médico era obrigado a ser um burguês e por isso.... podia trabalhar mas em regime de voluntariado ou melhor de escravidão.
Não me estendo mais para não cansar.....

Anónimo disse...

@ Sr. De Freitas às 15:53

"Agora o caro anónimo pode perguntar se o preço a pagar não foi exagerado. A Republica foi a mudança radical visando transformar uma sociedade feudal numa sociedade digna do século das Luzes.
Lincoln, para transformar a sociedadE americana ,foi obrigado a acabar com a escravidão, desencadeando uma guerra civil. O Custo, foi de 650 000 mortos."

Será que ele há mortos úteis e outros não. Para se atingir um fim tem que haver mortos em barda e os do inimigo são os uteis e os dos, do bem [sic], são os heroís.


Anónimo disse...

Ficam proibidos de se "meterem" com o caro Joaquim de Freitas. Levamos cada "injeção" de sabedoria. A estas horas da noite é de mais.

Anónimo disse...

No entanto pode-se mandar via este blog alguns textos que ajudariam o Sr. De Freitas a compreender-se??
Se assim entenderem aqui vai o primeiro:

https://www.agoravox.fr/tribune-libre/article/pourquoi-les-francais-sont-ils-207232

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