Uma cena do filme sobre Margareth Thatcher, na qual, depois de um jantar, as senhoras presentes são convidadas delicadamente a saírem, deixando os cavalheiros sozinhos, a fumar um charuto e a beber alguns álcoois fortes, trouxe-me ontem à memória uma cena passada, há umas décadas, numa embaixada portuguesa num país nórdico.
Tinha sido um jantar em "smoking" e vestido longo, com o qual o novo embaixador quisera ter um gesto elegante de cortesia para com algumas das personalidades locais que o haviam acolhido nesses primeiros meses, desde a sua chegada.
Tudo correra a preceito e o ambiente, no final do jantar, era distendido e alegre. A primeira ronda de cafés fora servida. Forte da sua experiência em países anglo-saxónicos, o diplomata iniciou o ritual:
- Minhas senhoras, convido-as a passarem ao "living". "And the powder room is over there", - disse, apontando para a porta e na direção da casa de banho das visitas, que o embaixador cuidara em ter bem equipada, com escovas, perfumes e tudo quanto presumia necessário para as senhoras "retocarem" a sua aparência, depois da função gastronómica, enquanto aguardariam que os cavalheiros se lhes juntassem.
Mas estava-se num país nórdico. A maioria das senhoras não tinha a menor intenção de deixar os companheiros numa tertúlia masculina. Algumas, contudo, ainda anuíram por gentileza ao convite e fizeram menção de se levantar, mas outras permaneceram no seu lugar e reagiram de uma forma que desarmou o anfitrião:
- "Powder room"? Nem pensar! Eu vou ficar aqui! E, se o senhor embaixador não se importa, vou beber um cognac!
Uma outra disse mesmo que, pensando bem, lhe estava a apetecer um charuto e um "scotch". Outra, ainda, que vivera uns anos entre nós, pediu um Porto.
Toda a sala sorriu. E quem se havia levantado voltou a sentar-se. O embaixador tomou consciência, nesse instante, que tinha entrado num mundo diferente. E também noutro tempo, no modo como os homens e mulheres se comportam socialmente, de forma mais igualitária. Aquele seria o último jantar em que, por ali, as senhoras seria convidadas, no fim de um jantar, a passar pelo "powder room"...
7 comentários:
Além de que há maquilhagens e máscaras faciais que duram a vida toda.
significativo episódio, bonitos tempos os do stiff upper lip, esprit de corps e sauve qui peut, afinal as senhoras tambem gostavam da solução, não tanto no país nordico, mas nos anglo-saxonicos sim, por varias razões presumo, retoques nas pinturas, troca de impressões, um intervalo na formalidade, cada cultura com os seus hábitos comportamentais embora a diplomacia seja um pouco transversal, fatias de carne assada acompanhadas de ervilhas, cenourinhas e salada serve em quase todos os sitios, gelado tambem, melancia não, sim, o powder room está por ali, os nordicos têm as suas ideias libertárias e igualitarias, o seu menu, vodka fria, sim, o conhaque da fotografia está bem no final, etc etc
anglosaxónicos - não
angloSSaxónicos - sim
se junta as duas palavras, tem de colocar outro "s", senão, passa a ser lido como "Z"
Em diplomacia é necessário conhecer-se bem o terreno e o tempo em que os diplomatas se movem.
Nostalgias......
provébio portugûez:
""Conselho e rapé toma quem quer."
Alexandre
Antes e depois do Acordo Ortográfico é anglo-saxónico (para o Anónimo das 10h58m)
Senhor Embaixador,
Antes de mais, faço questão de o cumprimentar, desejando que se encontre bem.
Caso me permita, não resisto à tentação de acrescentar um pequeno comentário, o qual me parece adequado, após ter lido este episódio, que tão bem narrou.
Espero que não considere a minha atitude como sendo presunçosa, até porque – em abono da verdade – não estou a escrever nada de especial.
No entanto, uma vez que não são poucas as pessoas que leem o seu blogue, gostaria de referir que a palavra smoking surgiu numa época em que só os homens "tinham o direito" de fumar. Reuniam-se numa sala onde o podiam fazer, estando vestidos de smoking. Esta situação decorria no final da tarde ou à noite, dado que o smoking só era (e só é) usado a partir de uma certa hora adiantada do dia.
Com os melhores cumprimentos e elevada estima,
Paulo Maia e Silva
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