Distraído com outras coisas, dou-me hoje conta
que a "Sá da Costa", a histórica livraria do Chiado, vai fechar nas
próximas horas. Sinto-me especialmente triste pelo facto? Nem por isso, exceto
na medida em que o encerramento de uma livraria é sempre uma machadada no
património cultural.
Recordo, bem jovem, entrar naquele
ambiente escuro e sentir, com alguma incomodidade, as conversas da tertúlia
idosa que abancava no local suspenderem-se com o surgimento do intruso. Por alguns anos, a
"Sá da Costa" intimidava-me, criava-me um certo desconforto, o que
me levava a ser um visitante esporádico. Em certas alturas, tinha a sensação de que faziam um favor ao venderem-me algum livro. Nos últimos tempos, sentia, por vezes, alguma curiosidade em entrar naquele espaço decadente apenas para apreciar a estranha
mescla de volumes que compunha as mesas laterais de entrada: "best
sellers" misturados com obscuras edições de autor, estudos microscópicos
sobre temáticas raras junto a volumes para turistas, prolongando a especiosa
escolha que era feita nas duas montras.
Nunca percebi a "Sá da Costa", a sua
lógica e a sua filosofia. Reconheço que o defeito deve ser meu. E deve ser o
mesmo que fez com que não tivesse sentido muito o fim da vizinha "Diário
de Notícias" ou da "Portugal". Ou que me faz ser algo
"neutral" face à "Bertrand", que apenas reconheço fazer
parte da identidade da zona, hoje transformada numa espécie de Algarve
lisboeta. Por mim, guardo saudades livreiras do Chiado apenas para a
"Moraes" e para a "Opinião".
7 comentários:
ficarão os classicos sá da costa dessa livraria que deve ter tido o seu papel, função, especialização e espaço, quem se reunia lá? na bertrand era o aquilino, o almada negreiros, na sá da costa não sei, está por fazer uma historiografia das livrarias de lisboa, não o habitual, albuns de fotografias antigas, mas o papel que tinham, o tipo de livros que vendiam, a especificidade de cada uma, os grupos intelectuais que cada uma reunia, os seus catálogos como editoras, não só vendedoras, etc.
muitas outras terminaram, a luso-espanhola, a portugal, as citadas moraes, uma francesa mais acima, quase no largo trindade coelho, a parceria abaixo, os antiquarios livreiros e alfarrabistas tambem a fechar quase todos, ficam a bertrand e a ferin, sim, não sejamos nostalgicos, mudam se as vontades e os tempos, hoje há novas fnacs, leyas, depois que haverá?
Sempre me cheirou a mofo essa livraria. Era entrar e sair.
Não conheci as duas últimas que mencionou. Sobre a Sá da Costa, concordo que o ambiente era estranho e que, dificilmente, nós sentíamos à vontade em folhear um livro ou perguntar por um autor. Tudo arrancado a ferros.
Mas foi lá que descobri alguns dos meus autores favoritos e onde se vendiam as edições da finisterra e de outras revistas inexistentes noutras espaços.
Nos últimos tempos, já com poucas esperanças de sobreviver, um grupo de jovens fez daquele sítio uma verdadeira livraria: conhecedores, amáveis e com edições que só ali se encontravam. Tenho pena por esses miúdos.
Recomendo a Letra Livre, livraria de fundos que, a par com alguns alfarrabistas resistentes na zona, ainda sabem que produto vendem: o livro.
Já gora, aproveito para referir as saudades que tenho da Eterno Retorno e da Ler Devagar na Rua de São Boaventura.
António Nunes
Não tendo sido nunca politizado, desde sempre a Sá da Costa foi para mim uma livraria de esquerda republicana. Quando lá ía era mais para ver o que se publicava nessa área. Assisti a uma decadência que nunca percebi a razão mas.... eu não sei se não será a mesma que este país está agora a atravessar.
Curiosamente, há largos anos, das poucas vezes que lá entrava, me recordo de ver um grupo de "intelectuais" de idade já entradota, ao fundo, com ar observador para quem entrava..., o que mos deixava pouco à vontade.
Caro embaixador: que grandes recordações do Sr. Edmundo Costa da Morais, no Largo do Picadeiro!Grande livreiro!!!
do ponto de vista olfactivo, sempre um critério essencial para julgar uma Livraria, a Sá da Costa vinha no topo da lista (memórias de 1971)
JRyder
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