quarta-feira, abril 20, 2022

Belicista?

Sobre o caráter xenófobo do poder ucraniano, alegado pelo PCP, para explicar sua recusa a estar presente no discurso de Zelensky na AR, a discussão é possível. Mas apelidar de “belicista” o regime de um país hoje devastado pela agressão militar estrangeira é muita imaginação.

Iniciativa

A Rússia propôs um acordo à Ucrânia. Além da neutralidade, da aceitação do estatuto diferenciado para o Donbass e do “fait accompli” da Crimeia, que mais propostas trará? Que ideias avançará em matéria de desmilitarização e dimensão futura das forças armadas ucranianas? Kiev vai dizer que não, claro. Com o rearmamento intenso em curso, entende que o tempo joga agora a seu favor.

Uma boa notícia


Desde há uns anos, tinha ouvido falar de que existia, ali pela Borralha, em Vila Real, numa casa isolada, no meio de uma quinta, colada ao quartel do regimento de Infantaria 13, em Vila Real, um turismo de habitação. Olhando à distância, a partir de certa altura, pareceu-me que teria havido obras de melhoramento do edifício. Mas a minha curiosidade não foi mais longe do que isso. 

Constou-me, mais recentemente, que ali eram servidas refeições. E foi então - vício antigo! - que fiz algumas perguntas. Ontem, para me despedir da cidade, no fim da Páscoa, fui lá jantar com familiares.

Descobri então, para minha surpresa, que aquilo é hoje um pequeno hotel - o Borralha Hotel - com instalações modernas, com muito bom aspeto. A avaliar pelo preço dos quartos, é uma excelente opção para quem visite Vila Real, onde existe um imenso défice na hotelaria. 

O jantar? Refeição bastante agradável, com serviço atento e profissional (quiçá um pouco lento), num espaço confortável e arejado. O menu é bem construído, a lista de vinhos é adequada, com o Douro em natural destaque. Ah!, e o que é muito importante, a conta final foi equilibrada. 

Com os dias de sol a virem por aí, o espaço exterior promete ser ideal para um copo ao fim da tarde e um jantar ao ar livre. Está assim criada uma saudável concorrência, na mesma zona de Vila Real, ao “Lameirão” e ao “Chaxoila”! Cada um que puxe pelos seus brios, porque há freguesia para todos! 

O que quero, muito simplesmente, aqui deixar registado é que a existência do Borralha Hotel é uma boa notícia para a hotelaria e para a restauração da minha terra.

A diplomacia …


 … existe para ajudar a encontrar saída para isto.

terça-feira, abril 19, 2022

Vila Real, agora

 


Cozinhados políticos

Numa noite de 2006, tive o presidente Lula e sua mulher, Marisa, com outros convidados, a jantar na residência da embaixada em Brasília, que eu então chefiava.

A nossa cozinheira, a excelente Delfina, uma moçambicana mãe de trigémeos, de um dos quais tenho orgulho de ser padrinho, raramente era substituída na sua função. Porém, para essa noite, num dos poucos jantares numa embaixada a que o casal presidencial se dignava ir, eu havia decidido convidar uma jovem “chefe” brasileira que, além de ser nossa amiga, estava a fazer, por esse tempo, bastante sucesso em Brasília.

E o jantar esteve, de facto, muito bom. O presidente e a sua mulher fizeram tantos elogios à comida que, à saída, pedi à “chefe” para vir conhecê-los e com eles tirar uma fotografia. Notei que, quando apresentei e disse o nome da já reputada cozinheira, Lula fez um leve esgar, de uma aparente estranheza.

À despedida, junto ao carro, o presidente meteu-me o braço e, ao ouvido, inquiriu: “Ela chama-se mesmo Mara Alckmin?”. Sorri e sosseguei-o: “Não, presidente! É Mara Alcamim, não é Alckmin!”. Lula soltou uma gargalhada e disse: “Ah! Entendi mal! E até me assustei!”

Geraldo Alckmin era o candidato da oposição que, escassos meses depois, Lula viria a defrontar na reeleição. Um sufrágio em que Alckmin foi derrotado estrondosamente.

Ontem, ao ver confirmado que Geraldo Alckmin se prepara agora para ser o vice-presidente na “chapa”, chefiada de novo por Lula, que pretende ser eleita para o Palácio do Planalto, no próximo mês de novembro, dei comigo a pensar que este mundo dá mesmo muitas voltas!

segunda-feira, abril 18, 2022

O diabo veste farda

Hamilton Mourão, o general vice-presidente de Bolsonaro, que com ele se foi incompatibilizando, aparentava ser uma figura sensata e equilibrada. Por estes dias, resolveu pronunciar-se sobre o tempo da ditadura militar (1964/89). E então percebeu-se: não é melhor do que os outros.

Não vale tudo!

Desejar que Marine Le Pen seja derrotada por Macron é uma atitude de mera decência política. Mas é miserável, revelando falta de lisura em procedimentos que deviam ser isentos, ver as instituições europeias a divulgarem acusações contra ela, a poucos dias do sufrágio. Não, não vale tudo!

Tolerância, pois!

Constituem atos reveladores de medíocre xenofobia, indignos do país tolerante que às vezes pretendemos ser, as atitudes, que parece serem cada vez mais frequentes, contra os cidadãos russos que residem em Portugal.

PCP 2

A atitude do PCP, no conflito entre a Rússia e a Ucrânia, é de uma extrema simplicidade. Desde o fim da URSS, o PCP esteve sempre, em todos os cenários geopolíticos, no polo oposto àquele que foi a posição dos EUA. Não há nada de mais previsível do que os comunistas portugueses.

PCP 1

O drama do PCP: já terá percebido que a atitude de complacência com a agressão russa à Ucrânia desgastou a sua imagem a um nível nunca visto no passado, mas mantem a convição de que, afinal, é precisamente por ser “assim” que, há décadas, sobrevive no museu ideológico europeu.

A chuva vem por aí!


 

Um amigo russo

O conceito de amigo, na vida diplomática, tem frequentemente um significado um pouco específico. Começamos por conhecer alguém, cidadão de outro país, numa determinada cidade, onde ambos somos estrangeiros. Ali coincidimos por algum tempo, estabelecendo uma relação conjuntural, marcada por alguma convivência, às vezes mesmo com alguma proximidade. Depois, rodamos pelo mundo. Anos mais tarde, se acaso nos voltamos a cruzar com essa pessoa em qualquer outro lugar, é quase certo que cairemos nos braços um do outro, considerando-nos “velhos amigos”, como se aquele primeiro contacto tivesse necessariamente tido alguma intensidade afetiva. Será talvez a “solidão” da condição diplomática, ao voltarmos a encontrar-nos num terreno igualmente estranho a ambos, que leva a essa expressão automática de reaproximação, às vezes um pouco exagerada, mas que pode, ainda assim, acabar por ter laivos de uma verdadeira amizade. Comigo, isso aconteceu algumas vezes.

Quando, em 2002, fui para Viena, chefiar a nossa missão diplomática durante a presidência portuguesa da OSCE, sabia que, para ter sucesso, tinha de me “dar bem”, com os meus colegas americano e russo. Os EUA e a Federação Russa são os “donos” da OSCE! É claro que há também os chamados “major players” - a França, o Reino Unido, a Alemanha, com a União Europeia, depois do Tratado de Lisboa, a querer mostrar que existe. E, depois, existem os “key players”, um grupo com outros parceiros, onde estão sempre a Itália, os Países Baixos e a Turquia. Mas esse é um conjunto que vai variando muito, em função da qualidade pessoal e poder de influência dos respetivos embaixadores. Nesse meu tempo de Viena, os meus colegas da Suíça, da Bulgária, da Roménia e do Lichtenstein (isso mesmo!), só para mencionar alguns, integravam esse grupo de “influentes”. Mas, volto ao princípio: conseguir ter “a bordo” o americano e o russo era a condição “sine qua non” para que as coisas corressem bem na OSCE. Nos dias de hoje, como isso é impossível, tudo corre mal por ali.

Não esperava ter, como não tive, nessa altura, o menor problema com o meu novo colega americano. Mas, com o russo, o primeiro contacto não foi nada fácil. O meu anterior contraparte russo em Nova Iorque, cidade de onde eu vinha, o agora famoso Sergey Lavrov, com quem tinha uma relação de forte cordialidade, mas neste caso algo distante de um registo de amizade, tinha-me dito, quando dele me fui despedir, que o seu colega na OSCE era “excelente pessoa, mas um pouco desconfiado. Vais acabar por te dar bem com ele”.

No meu segundo dia de Viena, fui visitar Alexander Alekseev, assim se chamava o meu novo colega russo. Recebeu-me na sua residência, ao fim da tarde, num ambiente um pouco frio. Era um homem nervoso, de óculos grossos, que não olhava de frente. Tinha um sorriso que era quase um esgar e martelava as palavras. Disse para mim mesmo: “Vai se difícil eu dar-me bem com este tipo. Mas tenho de conseguir”.

A nossa primeira conversa foi quase brutal. Quase sem me deixar apresentar, lançou-se, de imediato, numa litania contra a atitude do mundo ocidental dentro da OSCE, ameaçando com o veto de Moscovo a propostas que carreassem críticas aos seus “protegidos” - e a Rússia protegia todos os países que o ocidente criticasse, em matéria de direitos humanos, de ataques ao Estado de direito, de infringimento das regras democráticas. A Rússia era, na OSCE, o protetor do mundo a que se chamava “a Leste de Viena”, na realidade, dos “trouble makers”: Bielorrússia, Ásia Central, alguns Balcãs.

Encaixei com bonomia o recado, percebia bem a razão de fundo daquele arrazoado e, confesso, não me impressionei minimamente com o tom em que a conversa se processou. Tendo sido antes bem informado, pelo meu antecessor, João Lima Pimentel, sobre o “estado da arte” dentro da organização, estava exatamente à espera daquilo que vim a encontrar. E, até porque vinha da ONU, um terreno bem mais complexo, trazia comigo uma grande autoconfiança. E, por isso, anotei o discurso de Alexander Alekseev, mas dei-lhe o devido “desconto”.

Para o que aqui importa, a minha relação com o meu colega russo, não obstante algumas “escaramuças” de percurso nos tempos seguintes, acabou por ser excelente, fomos criando mesmo, ao longo do tempo, aquilo que pode qualificar-se como uma boa amizade. Ele percebeu que eu era pouco pressionável, que Portugal funcionava como um “honest broker” e que, de mim, não viriam surpresas. Viajámos juntos uma semana na Geórgia, com visitas à Ossétia do Sul e à Abcásia, sempre numa relação franca e divertida. Antes, havíamos passado uns dias no Porto, numa cimeira da OSCE, com uma noite a testar vodkas, no bar do Sheraton. Depois, eu saí de Viena, para embaixador no Brasil. Ele foi para Moscovo, para vice-ministro dos Negócios Estrangeiros. Perdemo-nos de vista.

Passou uma década. Regressei a Portugal, reformei-me do serviço diplomático e, numa outra capacidade de trabalho internacional, no início de 2014, fui a Estrasburgo. Havia-me sido pedido que fizesse uma determinada diligência junto do embaixador russo no Conselho da Europa. (Há semanas, como é sabido, a Rússia abandonou o Conselho da Europa, na iminência de ser suspensa da organização). Quem era o embaixador? Nada mais nada menos que Alexander Alekseev.

O nosso reencontro foi muito agradável. Passámos uma hora à conversa, muito para além da questão que ali me levava. A certo ponto, ele disse-me: “Lembras-te do nosso primeiro encontro, em Viena? Não foi uma conversa fácil…”. Eu “fiz de conta”: “Essa agora! Foi facílima! Tu quiseste assustar-me, ameaçar com o veto russo, mas eu percebi logo que estavas a querer criar uma primeira impressão. E, como viste, tudo acabou por correr muito bem entre nós!” O Alexander deu uma gargalhada, como se o seu anterior “bluff” tivesse sido denunciado e desmontado pelos factos subsequentes. Despedimo-nos com o que interpretei como um sincero abraço.

Que será feito, neste estranhos dias de guerra, do meu amigo Alexander Alekseev, hoje diplomata russo aposentado? Devo dizer que a última coisa que me apetecia seria discutir com ele a invasão russa da Ucrânia. É que imagino que ele talvez pretendesse convencer-me de que aquilo não passa de uma mera “operação militar especial”. Se há coisa que, na vida, há muito aprendi é que não se deve nunca testar uma amizade metendo-lhe a política pelo meio.

domingo, abril 17, 2022

Páscoa


A “operação” já faz parte da tradição, que a pandemia limitou por algum tempo. Pela Páscoa, encomenda-se o cabrito na Dona Rosa, onde a qualidade é garantida, ali ao Arcabuzado, em Vila Real. Depois, à hora do almoço, processa-se um cuidadoso transporte do “material” - batatas, arroz e molho incluídos - até ao local de degustação. Segue-se a função, com líquidos tintos adequados, seguida dos doces da época. A tarde acaba num chá preto, dos de “a sério”, acompanhado dos folares diversos, ali sujeitos a testes de qualidade comparativa. Desta vez, fomos “só” 18…

Ainda vamos a tempo?

 


sábado, abril 16, 2022

Aleluia


No local onde agora estou, só se consegue ouvir os sinos de uma igreja se acaso o vento estiver muito de feição. Verdade seja que, usando sempre, nas férias em Vila Real, o “fuso de Caracas”, em termos daa minhas horas matinais, não consegui esclarecer se, num sábado de Aleluia como este, ainda se manteve o velho ritual dos sinos tocarem em uníssono, logo pela manhã. 

Mas será que isso importa alguma coisa, nestes tempos em que maioria dos sinos que se ouvem são uns “genéricos” em gravação, porque já não deve haver verba para contratar sineiros? (Os muçulmanos também padecem dos males do défice: ainda não há muito tempo, numa capital de tementes a Maomé, ouvi a convocação para orações, o azan, a ser feito pelo muezin da mesma forma). 

Noutras eras desta pátria, em que outros costumes se impunham, na Semana Santa, todas as rádios (televisão não havia) suspendiam as suas emissões à hora de almoço de quinta-feira, entrando em “black out” durante toda a sexta-feira, dias em que não passava pela cabeça de ninguém abrir as portas de qualquer loja comercial e, claro, em que o bacalhau e o peixe eram de regra nas refeições. Mas, mais do que isso: nesses tempos, em que não havia secadoras de roupa, até não era de “bom tom” estender roupa lavada a secar. Imaginem! 

O que Portugal mudou! 

Seramota


Sem o folar da Seramota, de Mirandela, a nossa Páscoa teria sempre muito menos graça. Passei ontem por lá, a abastecer-me de dois exemplares destes. É um dos melhores de Trás-os-Montes, podem crer!

A Dona Inês Seramota convoca, para além do folar, e de outros exemplares de excelente pão, uma dimensão política que, ao que me dizem, em nada diminui a sua popularidade comercial em Mirandela - e também já em outras localidades, onde os seus produtos se vendem. 

É que a simpática senhora, com quem ontem tive o gosto de conversar, é, há muito, uma fervorosa militante do PCP e, por isso uma regular frequentadora (e “alimentadora”) da Festa do Avante. Ontem, na padaria, lá estavam exemplares do “Avante!” e do “O Militante” à venda. No entanto, eu é mais pão…

A Ucrânia

 


Ver aqui.

sexta-feira, abril 15, 2022

A esquina da Gomes

 


Eunice Muñoz (1928 - 2022)

 


“Lameirão”


De todas as vezes que vou a Vila Real, acabo a almoçar ou a jantar, no “Lameirão”. 

Até temo falar muito (mas já falei no passado) daquela que é a minha “cantina” na cidade, não vá o excesso de propaganda, um destes dias, fazer com que eu não conseguir reservar mesa por lá (já aconteceu, já!).

O “Lameirão”, onde oficiam, na sala, o casal Alice e Eleutério, com a cozinha nas mãos da Luísa, irmã deste último, apresenta uma lista que tem a original caraterística de variar a cada dia da semana (às quartas e ao domingo à noite, a casa fecha), com uma constância que permite aos comensais planearem, com rigor, as suas visitas. Mas, além do menu que vai variando, há sempre por ali bola de carne e rissóis, além das rabanadas, uma especialidade da Alice, com uma mão particular para os doces. E o Eleutério tem vindo a melhorar, substancialmente, a oferta de vinhos, com muitos Douros de quintas pouco conhecidas.

Ontem, dei-me conta de que o “Lameirão” tem já menus impressos em francês e inglês - e, que eu notasse, sem uma única gralha na grafia, coisa raríssima na restauração em Portugal. Daqui a tempos, disse-me o Eleutério, passará também a haver uma lista em espanhol (embora alguns gostem mais de dizer castelhano, eu sei).

O “Lameirão” fica junto ao quartel do Regimento de Infantaria 13, na saída pela EN2 para o norte, bem junto a um nó do IP4.

quinta-feira, abril 14, 2022

“A Arte da Guerra”


Esta semana o meu podcast com o jornalista António Freitas de Sousa, para o “Jornal Económico”, aborda a situação na Ucrânia, das eleições presidenciais em França e da nova crise política no Paquistão. 

Pode ver aqui.

Pão-de-ló


Já não é distribuído nestas caixas, mas paro em Alfeizerão, todas as Páscoas, no Café Ferreira, logo à saída da auto-estrada, para “recolher” o pão-de-ló. Ainda hoje por lá estive! Ah! E os outros doces da casa são excelentes. É que… eu é mais bolos!

quarta-feira, abril 13, 2022

Maldonado Gonelha (1935-2022)

 


França - é fazer as contas

                         

Emmanuel Macron, presidente e candidato, “centrista radical”, obteve, na primeira volta das eleições de domingo, 27,84% dos votos expressos. A conseguir preservar, no segundo turno, a 24 de abril, estes mesmos eleitores (e nada indica que venha a perder esses votos), para ser reeleito terá de conseguir mais 22,17% de votos.

As mesmas contas, naturalmente, estará a fazer Marine Le Pen, a candidata de extrema-direita que tem vindo a “dulcificar” o seu discurso, cuja tarefa parece um pouco mais difícil, porquanto necessitará de mais 26,86% de votos, isto é, de mais 4,69% do que o seu adversário.

Para ambos, os votos em falta poderão vir da abstenção (26,31%) ben como de quantos, no primeiro turno, escolheram votar em outros candidatos. 

Embora o eleitorado que, na primeira volta, escolheu um candidato derrotado não tenha, necessariamente, de seguir o seu “conselho” para a segunda volta, naturalmente que esse fator tem alguma importância.

Neste caso, em tese, Marine Le Pen tem um maior potencial teórico de crescimento. Quer o candidato de extrema-direita radical Éric Zemmour, com 7,1% de votos, quer o soberanista Dupont-Aignan, com 2,1%, recomendaram o voto em Le Pen. Se essa indicação for seguida, ela contará, por essa via, com mais 9,2%.

O candidato “verde” Yannick Jadot (4,6%), o comunista Fabien Roussel (2,3%) e a socialista Anne Hidalgo (1,8%) recomendaram também o voto em Macron, o que, em teoria, poderá garantir ao atual presidente mais 8,7%. 

Há, no entanto, um pormenor importante a ter em conta. Enquanto a plausibilidade dos eleitores que votaram Zemmour e Dupont-Aignan se transferirem para Le Pen é muito elevada, pela forte proximidade ideológica, já a probabilidade dos eleitores que, na primeira volta, escolheram Jadot, Roussel e Hidalgo se inclinarem para Macron oferece bastantes mais dúvidas, porque partem de áreas políticas bastante diversas da do atual presidente, pelo que só por um raciocínio tático serão levados a votar nele. Embora seja improvável que algum desses votos possa ir para Le Pen, não é de excluir que a abstenção possa vir a ser o refúgio de parte desses votantes.

Pondo de lado Jean Lassalle, um candidato com um programa que podemos designar de populismo simplista, que obteve 3,1% e que já informou que, pessoalmente, iria votar em branco (o que está muito longe de significar que os seus eleitores venham a fazer o mesmo), há que refletir sobre o destino dos votos de Valérie Pécresse e de Jean-Luc Mélenchon.

Pécresse representou o “Les Républicans”, um partido herdeiro de uma das mais poderosas famílias políticas de França, desde De Gaulle, passando por Pompidou, Chirac e Sarkozy, que mantém uma imensa rede pelo país e detém postos importantes na administração descentralizada, bem como um significativo grupo na Assembleia Nacional. Nas eleições de 2017, o “Les Républicans” foi representado por François Fillon, que obteve 20,01%, maugrado escândalos pessoais de última hora que muito afetaram a sua esperada presença na segunda volta. O facto da candidatura do “Les Républicans” ter recuado agora dos 20,01% obtidos com Fillon para 4,48%, mesmo descontada a medíocre campanha de Valérie Pécresse, é considerado, pela generalidade dos comentadores, como significando que Emmanuel Macron terá já beneficiado, desde a primeira volta, do voto de muitos dos tradicionais apoiantes do “Les Républicans”.

Valérie Pecresse disse, na noite eleitoral, que iria votar Macron na segunda volta. Mas o “Les Républicans”, enquanto partido, apenas aconselhou um voto negativo, isto é, disse aos seus simpatizantes para não votarem Marine Le Pen. Várias figuras do partido, a título individual, disseram ter preferência por Macron, mas outros disseram que nunca escolheriam o atual presidente. O antigo presidente Nicolas Sarkozy, que mantém com o partido uma relação complexa mas que tem algum ascendente em certos setores, fez um apelo ao voto em Macron.

Convirá explicar que, no seio do “Les Républicans”, desde que Macron foi eleito em 2017, existe a sensação, porventura exata, de que o partido que apoia o presidente, o “La République en Marche”, tem vindo a crescer, essencialmente, à sua custa. E, aproximando-se as eleições legislativas em 12 e 19 de junho próximo, muitos, dentro do “Les Républicans”, devem temer que um apelo ao voto agora em Macron possa contribuir para “habituar” o seu eleitorado a seguir de novo o presidente em junho, desfalcando ainda mais o partido em termos de votos. E de futuro.

Em toda esta análise, quem resta? Jean-Luc Mélenchon, o candidato da “France Insoumise”, um carismático antigo ministro do socialista Lionel Jospin, que congrega alguma extrema-esquerda e uma ala mais radical dos socialistas democráticos. O destino dos 21,95% de votos que agora obteve (em 2017, já tinha tido 19,58%) permanece o grande mistério e vai ser, com toda a certeza, a chave desta segunda volta. 

Mas, antes de irmos por aí, vale a pena lembrar que, embora o Partido Socialista seja uma sombra do que já foi, não deixa, tal como o “Les Républicans”, de ter uma máquina nacional forte e muitos eleitos locais. E tudo parece apontar que muitos simpatizantes da área socialista terão abandonado Hidalgo e decidido votar Mélenchon (com outros a seguirem Macron), porque acreditavam que esse “polo popular” poderia aceder à segunda volta. Esteve perto: faltaram-lhe 2,1 % de votos. Se, tal como aconteceu em 2017, tivesse feito uma aliança com os comunistas, talvez isso tivesse sido possível: Roussel, o candidato comunista, teve 2,3% …

Como se dividirão os votos de Mélenchon, que, tal como já havia feito em 2017, recomendou o “não-voto” em Le Pen, sem no entanto endossar Macron? Embora o reflexo “republicano” de muitos votantes de esquerda os deva levar, maioritariamente, a votar Macron, para tapar o caminho de Le Pen para o Eliseu, esse deve ser um “esforço” muito grande para parte significativa de um eleitorado que fez da crítica acerba ao quinquenato do presidente a sua palavra de ordem. Devemos pensar que, nos votos de Mélenchon, estão muitos “gillets jaunes”, que colocaram a França “a ferro e fogo” durante meses, com a diabolização da gestão de Macron no centro da sua agenda (outros “gillets jaunes” foram já, com toda a certeza, para o apoio a Le Pen). 

A doutrina dos analistas divide-se, nas últimas horas, sobre o destino dos votos em Mélenchon. Há quem diga que eles se dividirão, em partes mais ou menos idênticas, por Macron e pela abstenção, com outra parte significativa a querer “castigar” o presidente, votando Le Pen.

Serve isto para dizer que, se numa lógica de bom sendo republicano, uma vitória de Macron sobre Le Pen, ainda que bastante menos folgada do que em 2017 (66,1%-33,9%), parece ser o cenário mais provável, permanece um conjunto de variáveis no terreno cuja quantificação é muito difícil de fazer. 

Por isso, as duas semanas de intensa campanha que está em curso, com o debate televisivo entre os dois candidatos, no dia 20 de abril, prometem ser determinantes. E o modo como os abstencionistas vierem a comportar-se pode ser a chave mestra da equação final.

terça-feira, abril 12, 2022

Sarkozy e Macron

“Je voterai pour Emmanuel Macron parce que je crois qu’il a l’expérience nécessaire face à une grave crise internationale plus complexe que jamais, parce que son projet économique met la valorisation du travail au centre de toutes ses priorités, parce que son engagement européen est clair et sans ambiguïtés”.

Uma bela e digna declaração de Nicolas Sarkozy. Ser apenas contra a extrema-direita é mais fácil.

segunda-feira, abril 11, 2022

O partido da raiva


A palavra “enragé” (enraivecido) marcou, historicamente, a memória da revolta do Maio 68, o desafio a De Gaulle que viria a ditar o seu afastamento, um ano mais tarde. A França tem demonstrado ser a democracia europeia onde, à margem dos poderes eleitoralmente consagrados, surgem, com regularidade, formas de expressão reivindicativa que desafiam esses mesmos poderes, frequentemente de modo inorgânico e sempre de difícil controlo. O movimento dos “Gillets Jaunes” (coletes amarelos), que Emmanuel Macron teve de enfrentar durante o quinquenato que agora termina, foi a mais recente expressão desse fervilhar conjuntural de revolta popular. 

Na prática, o que essas movimentações revelam é que há uma parte significativa da população francesa que entende que as resultantes políticas do voto não esgotam a representação da vontade políticaj. Mais do que isso: esses surtos, com expressões por vezes violentas, traduzem a ideia de que há pessoas e camadas da população que se consideram sem voz ou à qual os poderes organizados não conseguem dar a devida expressão. A legitimidade do sistema é, claramente, posta em causa por esta atitude.

Se olharmos para o saldo político da primeira volta das eleições presidenciais francesas, fica patente que esse grande “partido da raiva”, com expressão diferenciada, representa hoje uma percentagem de votos que se aproxima da metade do eleitorado. À direita, Marine Le Pen e Éric Zemmour, tal como, à esquerda, Jean-Luc Mélenchon, somam votos de muitos milhões de cidadãos que atravessam um tempo de desencanto face às políticas moderadas e reformistas, sendo, ao invés, seduzidas por agendas radicais, embora, curiosamente, de sentido político contraditório.

Cinco anos de gestão política da França por Emmanuel Macron não contribuíram para atenuar este crescente sentimento de rejeição, que revela alguma desfuncionalidade do sistema. Se, em 2017, Macron era uma novidade e uma esperança, nos dias de hoje, a sua imagem, desgastada pela desilusão que diluiu muita dessa mesma esperança, tem mais dificuldade em assumir-se como mobilizadora. De certa maneira, foi essa governação sem chama e carisma, em que ao otimismo constante da mensagem não corresponderam resultados que apaziguassem as inquietações de muitos setores, que deu origem ao reforço dos extremismos, que se constata nestas eleições.

Emmanuel Macron pode, de acordo com a maioria das previsões, acabar por renovar o seu mandato, por mais cinco anos, nas eleições de 24 de abril. Mas o “partido da raiva”, essa conjugação negativa de diversas formas de mal-estar social e político, promete não se aquietar. E, de avanço em avanço, poderá, um dia, acabar por consagrar, num país com a dimensão e a importância da França, uma revolução política de inéditas proporções, com consequências no próprio futuro da Europa.

domingo, abril 10, 2022

Putin no voto

Vladimir Putin vai estar no centro dos debates da campanha para a segunda volta das eleições presidenciais francesas.

Respeito


Afixação de propaganda eleitoral em países que não gostam de poluir visualmente os espaços públicos. No mundo, além desses países, há outros.

sábado, abril 09, 2022

Futebol pelo futebol


Cada vez mais, gosto de ver, na televisão, jogos de futebol entre equipas pelas quais não tenho a menor afetividade ou antipatia. As emoções cansam-me! 

Tenho uma assinatura para ver futebol britânico e, algumas vezes por semana, não quero outra coisa. Se alguém mete um golo, “faço figas” para que a outra equipa empate, apenas para retomar o equilíbrio do jogo. E fico à espera de mais golos.

Canja!

Com os russos bem distantes de Kiev, a romaria política para ir lá ver Zelensky não deve ser lida como prova de coragem. 

Corajosa era a presença dos jornalistas na cidade sitiada. Agora, é “canja”!

Sanções

Lembrar: as sanções à Rússia não são mandatórias pelo ordenamento internacional. Foram unilateralmente decididas pela coligação política que se opõe à agressão à Ucrânia. Quem as dificultar sai das “boas graças” dessa coligação e, no limite, pode sofrer “sanções secundárias”.

Males que vêm por mal

Uma das “casualties” da guerra na Ucrânia é também a sobrevivência política de Boris Johnson.

A França que aí anda (em 1000 carateres)


As sondagens colocam Marine Le Pen com uma inédita proximidade a Emmanuel Macron, à porta da primeira volta das eleições presidenciais francesas, com desfecho a dia 24 de abril, a disputar entre os dois. Com um discurso social, protetor, de resposta às angústias do aumento do custo de vida, credíveis aos olhos dos eleitores, uma vitória da candidata da extrema-direita, agora travestida de moderada e já “dédiabolisée” pelos media, deixou de ser uma hipótese bizarra. Macron, presidente cada vez mais “sortant”, entrou tarde na campanha, convencido de que o país reconheceria o seu papel internacional e o dispensaria de debates. Isso foi lido como arrogância. O seu quinquenato parecia ter sido relativamente competente mas o seu projeto está a ser pouco mobilizador. Sofre agora da onda “tous sauf Macron”, ensanduichado entre a extrema direita (Le Pen e Zemmour) e a extrema esquerda (Mélenchon), com uma esquerda moderada inexistente e a direita tradicional pelas portas da amargura. E agora?

sexta-feira, abril 08, 2022

A Ucrânia, claro


Há pouco, na CNN, sobre a situação na Ucrânia e a credibilidade da Rússia.

Pode ver aqui.

Daniel Proença de Carvalho


Ontem, juntaram-se na Fundação Champalimaud muitos amigos e conhecidos de Daniel Proença de Carvalho, por ocasião do lançamento do seu livro de memórias “Justiça, política e comunicação social - memórias do advogado”. 

Manuel Alegre, seu amigo desde Coimbra, fez um retrato sentimental da sua relação com o autor, o que foi complementado por uma bela peça de Miguel Sousa Tavares, que aproveitou para “desancar” na justiça portuguesa e nos seus agentes - tema que, aliás, é central ao livro. 

Faço parte de quantos - e alguns, como eu, estavam naquela sala -, em momentos diversos do passado, nas últimas décadas, estiveram em “barricadas” opostas a Daniel Proença de Carvalho. No meu caso, sempre e só no plano político, onde creio que, desde sempre, nunca tivemos a felicidade de ver as nossas escolhas coincidirem. Coisa que a nenhum de nós minimamente interessa.

Dito isto, que é um facto, devo dizer que, ao ter vindo a conhecer melhor, nos últimos anos, Daniel Proença de Carvalho, acabei por nele encontrar uma pessoa muito diferente da caricatura que tradicionalmente às vezes dele se faz: descobri um homem livre, frontal, com opinião própria, dependente apenas de si próprio, com fortes preocupações de justiça. E também, o que apenas confirmei, uma pessoa superiormente inteligente, divertida, olhando de forma saudável alguns aspetos lúdicos da vida, que ambos comungamos. E, vale a pena dizer, apenas me relaciono com Daniel Proença de Carvalho no plano pessoal, não tendo nunca tido com ele a mais leve ligação profissional.

Sei que este retrato impressionista não convencerá quantos mantêm uma visão preconceituosa sobre Daniel Proença de Carvalho. Estou certo que essa é a última coisa que o preocupa, que vive bem com essas “idées reçues”, que o seu muito cheio percurso de vida ajudou a criar - na justiça, no jornalismo, na política. E até me permito especular que o seu permanente sorriso, a sua imagem de marca, de onde transparece o modo sereno como encara a vida, não agradará a muitos, como imagino que os comentários que aí virão vão revelar. É a vida!

Um forte abraço de parabéns pelo livro, caro Daniel!

Mais claro?

“Estarei cá mais quatro anos e seis meses à espera de si”, disse ontem António Costa numa resposta (provocatória) a Rui Rio. Se isto não significa que o primeiro-ministro português acabou por se comprometer assim a ficar até ao fim do mandato, então não sei o que ele deva dizer.

Jorge Coelho


“Então o meu querido amigo o que é que manda?”. A possibilidade de receber, do outro lado do telefone, esta bem disposta frase era muito elevada.

Jorge Coelho era assim, uma figura cordial, aberta, sem truques, imune à intriga, que nos desarmava pela franqueza. Quanto mais se conhecia o Jorge, mais gostávamos dele, melhor entendíamos a maneira de ser de um homem com um imenso bom senso, um forte sentido de interesse público e, acima de tudo, um amigo do seu amigo, muito respeitado por toda a gente, mesmo pelos adversários.

Faz hoje precisamente um ano que Jorge Coelho nos deixou. Ontem, Vitor Melícias recordou-o numa cerimónia religiosa que juntou mais de uma centena de pessoas. Um ano sem o Jorge é um peso imenso de perda para todos quantos o conheciam e admiravam.

quinta-feira, abril 07, 2022

“A Arte da Guerra”


Em “A Arte da Guerra”, o podcast do “Jornal Económico”, analiso esta semana, com o jornalista António Freitas de Sousa, a evolução da situação na Ucrânia, as consequências europeias da nova vitória esmagadora de Viktor Orbán na Hungria (lembrando também o caso da Sérvia) e o estado da arte na política brasileira, com Bolsonaro e Lula na “pole position” para as eleições presidenciais de novembro.

Pode ver aqui.

Oslo e o crime



Acabei de ler, há minutos, um romance policial, com o título “Sem Rasto”, escrito por Margarida Utne.

O nome ilude. Trata-se de um pseudónimo. Estamos perante um livro de Margarida Ponte Ferreira, uma economista portuguesa que conheci, em 1979, na capital da Noruega, cidade onde ambos então vivíamos. 

No dia 12 de abril, com Mário Mesquita, vou apresentar o livro. No ISEG, na rua do Quelhas, às 18 horas. Apareçam.

Há minutos, no Twitter, surgiu-me um fotógrafo de Oslo. Chega-se lá através de @MortenClicks . Deixo uma imagem sua.

quarta-feira, abril 06, 2022

A Ucrânia, ainda e por muito tempo


Hoje, na CNN, a comentar a situação na Ucrânia.

Aqui.

Ganda rabino!

Ao que atestou o rabino que apoiou a concessão de nacionalidade portuguesa a Roman Abramovich, ele tem uma ligação sentimental a Portugal e hábitos alimentares sefarditas. Deve ser isso: ele tem saudades da salada russa.

Avante…

É estranho o destaque dado ao voto negativo do PCP quanto à audição do presidente ucraniano no nosso parlamento. Notícia - isso sim! - seria a anuência dos comunistas a tal proposta. Mas como é preciso fazer notícias sobre tudo…

Viva o Brexit?

Com o traumatismo ucraniano, as instituições europeias podem ter encontrado um impulso para um salto federal, para um reforço da integração, coisa que, como é sabido, implica mais partilha/cedência de soberania. Se assim for, a ausência do Reino Unido facilita. Viva o Brexit?

terça-feira, abril 05, 2022

Gambozinos

Há pouco, telefonou-me um amigo, zangado pelo facto de eu ter afirmado ontem à noite, na CNN Portugal, que os russos não têm direito ao benefício da dúvida. quanto à autoria do massacre de Busha. Esse amigo defende a tese de que tudo não passou de uma encenação feita pelos ucranianos, para explorarem a indignação da opinião pública internacional.

Acho que os órgãos de comunicação social devem continuar a dar espaço e tempo a quantos, nesta guerra, se sentem mais próximos da Federação Russa, alimentando uma atitude negativa face ao governo de Kiev. Pode ser chocante para muitos, mas continuo a pensar que o 25 de Abril se fez para que ouçamos todas as opiniões, mesmo as mais abstrusas. Quem não concordar com elas que as combata, no terreno das tomadas de posição pública. Contudo, silenciá-las, abrindo uma espécie de “caça às bruxas”, não me parece digno de um país de liberdade. A censura à imprensa existe na Rússia, não a admito em Portugal.

Voltemos ao massacre de Bucha. Ontem, o embaixador russo na ONU disse que os russos não são responsáveis pela morte de qualquer cidadão ucraniano, ocorrida na cidade. O MNE russo e outras figuras do regime disseram coisas basicamente idênticas.

A Rússia, que é a única entidade agressora neste conflito, à evidente revelia do Direito Internacional, não tem um passado recente que lhe permita reivindicar o estatuto de um Estado “de bem”, antes pelo contrário. Violou flagrantemente as leis internacionais em 2008, na Geórgia, voltou a fazê-lo em 2014, ao “empochar” a Crimeia e alimentar o secessionismo no Donbass, colocou a “cereja no bolo” ao invadir agora a Ucrânia. A Federação Russa não tem um histórico mínimo de credibilidade que faça com que possamos acolher, com qualquer benevolência, as suas teses. No caso de Busha, tudo indica que a culpa lhe pertence.

Nos tempos que correm, e à luz das evidências do passado, tendo a duvidar, por sistema, das afirmações de Moscovo. Há muito que deixei de acreditar em gambozinos.

segunda-feira, abril 04, 2022

Luís Menezes Cordeiro

Há pouco, no “Público”, li que morreu Luís Menezes Cordeiro. Tinha 90 anos e foi embaixador.

Com muita pena minha, não consegui estar em Lisboa a tempo de ir prestar-lhe uma homenagem pessoal na basílica da Estrela, ao final da tarde de hoje.

Em 1977, Luís Menezes Cordeiro passou a chefiar uma repartição no setor económico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, onde eu já trabalhava, como jovem diplomata, desde há um ano, com o pelouro das relações com os países do Magrebe e do Médio Oriente.

Era um homem baixo, com um permanente sorriso, que nunca falava alto e que, desde o primeiro dia, introduziu uma gestão suave naquele serviço. Tinha, ao que lembro, um especial talento para falar com as senhoras, que pareciam sempre sensíveis - no bom sentido, entenda-se - ao seu charme pessoal.

Dei-me lindamente com o embaixador Menezes Cordeiro, durante os quase dois anos em que trabalhei sob as suas ordens. Depois, a vida separou-nos pelo mundo. Chefiou várias embaixadas, de Bissau a Varsóvia, de Abidjan a Santiago do Chile.

Um dia, num contacto ocasional que tivemos, fez-me uma confissão: “Quando fui chefiar o serviço em que o meu amigo trabalhava, isso foi considerado uma “missão de risco”. Porquê? Porque você e outro colega estavam colocados por lá! Nem imagina os alertas que recebi! Que eram dois comunistas, gente perigosíssima, que era preciso vigiar com muito cuidado!” Para logo acrescentar: “Mal eu sabia que não iria ter o menor problema, que vocês eram funcionários dedicados e cumpridores, que tudo ia correr às mil maravilhas!”

Vale a pela recordar que, nesses tempos conturbados do pós-PREC, algumas figuras do extremo conservadorismo das Necessidades identificavam quem fosse um pouco mais à esquerda com o labéu comunista. 

Não resisti a perguntar-lhe: “E quando é que concluiu que nós não éramos comunistas?”. A resposta foi deliciosa: “Eu, de início, não cheguei a perceber se vocês eram ou não eram comunistas. Mas posso dizer uma coisa: por essa altura, no contacto convosco, cheguei a pensar que se todos os comunistas fossem como vocês, então os comunistas não eram assim tão maus...”

O outro “comunista” era o Mário Jesus dos Santos, um grande amigo com que ainda há dias jantei e cujo último posto como embaixador - imaginem! - foi Kiev.

Já um dia contei por aqui a história que deixo de novo registada. Repito-a hoje, no dia em que desaparece mais um dos meus “chefes” - e tenho um imenso orgulho de ter ficado amigo de todos, repito, de todos eles.

Deixo um abraço de pesar à família do embaixador Luís Menezes Cordeiro, em especial à sua filha Ana Paula, que comigo trabalhou em Brasília e que aí me proporcionou o último encontro com o seu pai.

Todas as razões são boas para vir ao Porto

 


Todas mesmo, é de justiça dizê-lo! 

Há locais que nem deviam vir no mapa…



 … não vá o pessoal descobri-los!

… e não vi por lá o abade!

 


Ainda há sítios assim em Portugal...


… conservá-los é quase um dever patriótico.

domingo, abril 03, 2022

O congresso do CDS ou a prova de como pode haver vida para além da morte

O tempo e a paciência não dão para tudo e, devo admitir, estou num radical “blackout” às rádio e televisões, que se prolonga desde quinta-feira, tema da Ucrânia incluído, fase que só tenciono encerrar ao final da tarde de amanhã, segunda-feira. (O que, de quando em vez, vou lendo, nesta A4 mais pequena e mais grossa em que agora escrevo, chega-me e sobra). Por isso, não ouvi nem uma palavra do que terá sido dito no Congresso do CDS, embora, sempre que passo perto de televisores, note que por lá pulula a imagem desengravatada de muitos “centristas”. (Chega a ser irónico, e espero que não seja considerado insultuoso, nos dias de hoje, usar para esta designação para o CDS). O culto que os portugueses têm pela sua História coeva terá levado o nosso complacente jornalismo a dar uma atenção desmesurada ao encontro do CDS. (Li que alguém do CDS nele disse este “bon mot”: “Não interessa como aqui chegámos, o que interessa é como daqui saímos”. Imagino que em bons carros, mas há que convir que é uma bela “trouvaille”). Por mim, tendo andado este fim de semana pelo Minho, obviamente por outras razões bem mais lúdicas, algumas vezes me cruzei (e cumprimentei, ora bem!), em casas de restauração e hotelaria, de cartãozinho ao pescoço, gente amiga e outra só conhecida do CDS, a meio desta sua romagem ao berço da pátria (e de Freitas do Amaral, já agora, embora creia que a maioria se reivindique mais de Amaro da Costa), na busca de um derradeiro e salvífico sopro de existência cívica para o partido ainda do Caldas, se a Remax não tiver de ser ali chamada. (Achei muita graça a alguém que escreveu que este congresso do CDS é mesmo a prova provada de que “há vida para além da morte”). Aliás, constatei, sem a menor supresa, que os congressistas do CDS se sabem bem amesendar e aboletar. Se conseguirem, como resultado dessa reemergência, vir a “limpar o sebo” eleitoral ao pessoal do senhor Ventura e à nefasta nuvem liberal, que a mão nunca lhes doa. Nesse caso, diria, sinicamente (eu não escrevi “cinicamente”, notem bem!), que mil CDSs floresçam, em lugar de quem agora anda em S. Bento em seu lugar! Mesmo que, para isso, tenham de ter a polémica liderança que agora lhes saiu na rifa! Mas isso já são as minhas embirrações a darem nota de si!

Quem muito mente…

Se Putin e a Rússia, ao longo dos últimos tempos - na guerra, a mentira sobre factos é vulgar, mas não tem necessariamente de ser “de regra” -, tivessem habituado o mundo a ser quase sempre é verdade aquilo que afirmam, a sua desresponsabilização pelo massacre que terá ocorrido em Busha poderia ser ponderada. Assim…

Lygia Fagundes Telles


2005. Almoço no restaurante “Navegador”, no Rio de Janeiro. Dia da atribuição do Prémio Camões à escritora brasileira Lygia Fagundes Telles. À minha direita, estava sentada a homenageada. À minha esquerda, tinha Agustina Bessa Luís.

Eu (confesso!) tinha lido então muito pouco de Lygia Fagundes Telles, mas agarrei aquilo que dela conhecia para ancorar a conversa. (Em voz não muito baixa, minutos antes, Agustina tinha sido franca: “Não gosto muito do que ela escreve!”). 

Lygia era uma figura pessoalmente muito interessante, com alguma doçura, nos 82 anos que então já tinha. Disse-me coisas muito simpáticas sobre Portugal e os seus amigos portugueses, que eram muitos. E, nunca mais o esqueci, repetiu uma frase que ouviu um dia ao seu pai, sumariando a sensação que ele tivera, numa viagem de barco a Lisboa: “Ir a Portugal é como atravessar a rua para ir visitar um parente”.

Lygia Fagundes Telles morreu hoje, aos 98 anos.

Acordar assim

 


sábado, abril 02, 2022

Lata 2

É fantástica a “lata” da Federação Russa: destroi, a ferro e fogo, infraestruturas por toda a Ucrânia e, em face de uma isolada ação militar de retaliação de Kiev sobre uma instalação russa, afirma que isso põe em causa o processo negocial. Se isto não fosse trágico era apenas ridículo!

Lata 1

No “Expresso da Meia Noite”, assistiu-se a um espetáculo extraordinário: o assessor (português) de Viktor Orbán, que se distinguiu a promover a candidata búlgara contra António Guterres, na defesa “patriótica” da ida de António Costa para a Europa. E ninguém lhe lembrou o passado!

sexta-feira, abril 01, 2022

Assim, é fácil…

Gente que combateu ferozmente e disse “cobras e lagartos” de António Costa como primeiro-ministro, surgiu, prestimosa, a elogiar as suas qualidades para altos voos europeus, mas apenas quando constatou a quase impossibilidade de isso vir a acontecer a curto prazo.

Entretanto, em Cartago…

Enquanto o mundo se distrai com a Ucrânia, há quem não perca tempo. O novo ditador tunisino deu a última machadada na representação democrática e assumiu todos os poderes. Quando alguém referir as “primaveras árabes”, que esqueça a Tunísia.

Lembrar

O presidente da República tem uma visão muito própria dos seus poderes - e julgava que isso tivesse já fosse óbvio. O sistema político português, para quem o tenha esquecido, é semi-presidencialista. Com Marcelo, quem tente sublinhar a vertente parlamentar não terá muita sorte.

Brasil

Sérgio Moro e João Dória desistem das candidaturas à presidência do Brasil. Moro corria quase por si próprio. Dória fora eleito numas primárias do declinante PSDB. Estará a criar-se o ambiente para o surgimento de uma nova candidatura de “terceira via” - nem Lula nem Bolsonaro? 

quinta-feira, março 31, 2022

“A Arte da Guerra”


A evolução da situação na Ucrânia, as eleições presidenciais francesas e a crise no Partido Popular espanhol, na edição desta semana de “A Arte da Guerra”, o podcast do “Jornal Económico”, uma conversa minha com o jornalista António Freitas de Sousa. 

Pode ver clicando aqui.

Vai ser assim?

Devo ser eu, com certeza, quem está enganado, mas tenho a firme convicção de que António Costa, pessoa por quem tenho o maior apreço, e que merece todo o meu apoio neste seu início de novo mandato, comete um imenso erro ao deixar pairar a ideia da sua eventual candidatura, daqui a dois anos e meio, ao lugar de presidente do Conselho Europeu. 

Esse erro tem duas dimensões. 

Desde logo interna. Não se inicia um cargo, com esta exigência, com uma espécie de nuvem de dúvida sobre se cumprirá ou não, até ao final, o mandato, tão personalizado, que os portugueses lhe confiaram, sem a menor dúvida para uma legislatura de quatro anos. Quando António Costa foi a votos, estava implícita a sua disponibilidade pessoal de ficar até ao termo do mandato. Agora - a menos que venha a fazer, rapidamente, uma declaração formal, tipo “read my lips!”, de que não abandonará o “barco” - os portugueses vê-lo-ã como um primeiro-ministro “a prazo”. Isso afeta a sua autoridade, induz instabilidade na equipa governamental, vai abrir uma constante especulação e polémica sobre o nome que pode suceder-lhe. António Costa sabe, melhor do que ninguém, que isto não é favorável à governação do país.

A segunda dimensão é externa. Então o primeiro-ministro português vai passar a entrar nas reuniões do Conselho Europeu como um putativo candidato ao cargo de uma pessoa que acaba de ser reeleita para dirigir esse mesmo Conselho, que ali estará por mais dois anos e meio, na lógica implícita de que “quando saíres daí, vou eu para esse lugar”? Não é isto incómodo? Não se sentirão os pares de António Costa tentados, daqui até lá, de lhe fazerem sentir que “ou te portas bem e como nós queremos ou não votamos em ti”? E sabe-se lá, neste tempo político tão volátil, se os equilíbrios políticos internos em outros Estados não evoluem em termos que possam pôr em causa as “contas” que, a esta distância, parecem ser favoráveis ao desígnio atribuído a António Costa.

Perguntar-se-á: mas António Costa já disse que será candidato ao tal lugar? De facto não disse, mas eu, no meu entender, acho que ele devia deixar “crystal clear”, desde já, que não abandonará o cargo para que foi eleito em Portugal. Outros dirão: e se ele não quiser tomar essa atitude, pretendendo manter “abertas as portas”, com a legitimidade de quem tem o direito de vir a decidir da sua vida futura? Nesse caso, é muito simples: aplica-se aquilo que escrevi nos parágrafos acima.

Faço uma ressalva, com toda a modéstia: posso ser eu quem está a ver mal a questão.

Aviso à navegação

Não concordo com quantos acham inadequado o aviso feito pelo presidente da República de que não deixará que esta maioria venha a gerar um outro primeiro-ministro, em caso de saída do atual, a meio do mandato. É bom que o presidente diga agora o que poderá vir a fazer então. O país e os seus agentes políticos ficam a saber, com frontalidade, com o que podem contar. Isso já aconteceu no OGE e, contrariamente a outros, a mim não me pareceu nada mal que o presidente tivesse avisado a tempo o que faria se ele não fosse aprovado - e fez. Nas últimas eleições, votei no PS na convicção de que iria ter António Costa, e não qualquer outra pessoa, como primeiro-ministro, pelos próximos quatro anos e meio. Não votei para vir a ter uma surpresa.

quarta-feira, março 30, 2022

Capelões, capelas e capelinhas

Para além da óbvia demissão, pela hierarquia do ramo militar respetivo, de um capelão que, pelos vistos, parece achar que uma provocação e alguns copos podem justificar um assassinato, estou muito curioso em saber qual vai ser a reação de uma outra hierarquia a que o tal capelão também está subordinado. Essa mesma!

terça-feira, março 29, 2022

Outros mundos

Hoje, num certo contexto, fui convidado a abordar a situação interna e a futura liderança no Partido Popular espanhol, o congresso desse partido e a importância disso para os equilíbrios políticos da nossa vizinhança. Amanhã, numa rádio, vou participar num debate sobre as eleições presidenciais francesas. Mais tarde, num jantar de trabalho, vamos analisar o ano político que o Brasil está a atravessar. Serve isto apenas para lembrar que, apesar de tudo, há mais vida para além da (pobre) Ucrânia.

Inteligência

Não votei nele, mas gosto de ver Rui Tavares eleito para a Assembleia da República. Embora saiba que isto pode ser bem menos consensual, quero dizer que, num outro tempo, também vi com gosto a eleição de Francisco Louçã. A inteligência ajuda sempre a que o futuro seja melhor.

CDS

Sou, de facto, um saudosista. Confesso que me fez falta ouvir a voz do CDS, na sessão de abertura desta legislatura da Assembleia da República. 

Conservo a memória daqueles que sempre tive como adversários de estimação.

Parlamento

Grande discurso de Augusto Santos Silva, a abrir o seu mandato como novo presidente da Assembleia da República. 

Muito adequado e justo foi aquilo que começou por dizer sobre o seu antecessor, Eduardo Ferro Rodrigues.

segunda-feira, março 28, 2022

Biden

Recorde-se que o discurso de Biden em Varsóvia foi anunciado como devendo conter um importante anúncio. Ora nada de marcante surgiu. Pelo contrário: a julgar pelas vezes que Washington já teve de vir a jogo para explicar a referência à “saída” de Putin, houve ali um óbvio erro.

Violência pública

Sei que a questão é incómoda, mas estou convicto de que a relativa compreensão com que foi acolhida a bofetada dada por um ator a um apresentador, que teria ofendido a sua mulher, durante a cerimónia dos Óscares, não aconteceria se a cor de pele dos intervenientes fosse diferente entre si.

O discurso

O tom das intervenções de Zelensky permite ir aferindo a confiança decorrente da evolução da situação no terreno e do nível de expetativa do apoio internacional.

Ucrânia

A quase ausência de referências à situação na Ucrânia, na cerimónia de entrega dos Óscares, deve ser lida, pelos europeus, como um sinal evidente de que, do outro lado do Atlântico, a opinião pública tem uma diferente ordem de prioridades.

domingo, março 27, 2022

A generosidade tem limites!


O “Clube de Lisboa / Global Challenges”, uma estrutura de reflexão e debate sobre temas e desafios globais, a cuja direção, desde há alguns anos, tenho a honra de presidir, “cedeu” dois membros da sua direção ao futuro governo: Helena Carreiras, como ministra da Defesa, e Bernardo Ivo Cruz, como secretário de Estado para a Internacionalização. 

Mas a nossa ”generosidade” acaba aqui! Não ”sai” mais ninguém da nosso Conselho Diretivo!

Agora a sério, em nome do Clube, e sabendo que represento nestes meus votos a mais de uma centena dos nossos associados, quero transmitir um forte e amigo abraço de parabéns à Helena e ao Bernardo, com desejos de um ótimo desempenho nas suas novas funções.

Já agora, quem quiser saber algo mais de nós, acompanhar as nossas atividades ou mesmo candidatar-se a sócio do Clube, pode ver aqui: https://www.clubelisboa.pt .

O Porto sem ministro


O Porto não tem ministros no novo governo. Vozes do Norte reclamam pelo facto de a segunda cidade do país, com a saída de Santos Silva, não ter quem a “represente”. É um governo “de Lisboa”, dizem alguns. Outros dirão que uma “figuração” regional já não se justifica, nos dias de hoje. Sei lá quem tem razão…

Ou melhor, sei. Pode ler aqui.

sábado, março 26, 2022

Não me conformo!


Esta mudança de hora, em que perdemos 60 minutos (já sei que eles voltam no outono, mas não é a mesma coisa!), nunca me convenceu! Não me parece justa! 

Reler Biden

Depois do discurso em Varsóvia, em que Biden, a propósito de Putin, disse “This man cannot remain in power!”, a Casa Branca esclareceu: "He was not discussing Putin’s power in Russia, or regime change." 

Claro que não! Então não se estava mesmo a ver? Nós é que ouvimos mal…

CNN Portugal

Com o prévio “disclaimer” de ser colaborador da CNN Portugal, quero dizer que considero notável e ímpar o trabalho que está a ser feito pelo canal na cobertura da guerra na Ucrânia, nomeadamente através dos enviados especiais no terreno, muitas vezes em zonas de elevado risco.

A Oeste, algo de novo

O ataque russo a Lviv, quase simultâneo com o discurso de Biden em Varsóvia, mostra a crescente relevância estratégica da zona ocidental do país, mais próxima das fronteiras países NATO, por onde chega o essencial do apoio, militar e outro, à Ucrânia.

“Regime change”

Biden diz que Putin não pode continuar no poder. Resta agora saber o que os EUA estão dispostos a fazer para concretizarem esse objetivo, que pode ter muito a ver com o conceito de “regime change”.

O fim dos princípios?

Nada como a emergência energética e as urgências geopolíticas para porem a salvo de pressões as autocracias medievais do Golfo e alguns países europeus, até aqui visados pela inobservância das regras democráticas e do Estado de direito. Os princípios valem enquanto derem jeito.

Refugiados

A Polónia é um país que tem feito um esforço extraordinário, no acolhimento de refugiados ucranianos, embora sem tradição nesse âmbito. É muito justo que o mundo assegure, com rapidez, um “burden sharing” equitativo, sem o que será difícil a Varsóvia sustentar essa atitude.

“Quando”?

Todos sabemos que Biden é “gaffe prone”. Porém, ficou-me no ouvido aquela sua frase, há horas, aos soldados americanos na Polónia, de que “quando” estivessem na Ucrânia iriam poder testemunhar a coragem das populações face ao invasor russo. “Quando”? O que foi aquilo?

O sol e a guerra

Lembrando o mês de conflito, o céu na Ucrânia foi sempre cinzento, como nos habituámos a imaginar o que “deve ser” o tempo numa guerra. Há pouco, ao olhar o belo sol sobre Mariupol, cidade devastada e sob fogo, o contraste pareceu-me quase chocante. Ali, é já o sul a chegar.

O tempo e o modo

O grande teste à liderança e autoridade política interna de Zelensky será a sua capacidade de definição do “timing” certo para um eventual compromisso com Putin - e em que termos. Como a História nos ensina, só com alguma perspetiva temporal isso pode vir a ser avaliado.

E a China?

A próxima ida de Lavrov a Pequim, depois da conversa de Biden com Xi Jin Ping, pode querer significar que, depois de alguns peões menores em busca de relevância negocial, um peso pesado pode facilitar um compromisso. Acaso ouvimos alguma vez Zelensky criticar fortemente a China?

Cretinices

Até que enfim Putin disse uma coisa com a qual toda a gente sensata deve estar de acordo. Proibir e censurar obras musicais ou literárias de autores russos é uma imensa cretinice. Quando a cultura de dimensão universal começar a ser condicionada é sinal de que está tudo doido!

Nós e a Ucrânia

Entendo que as autoridades portuguesas não devem preocupar-se com as valorações ucranianas da sua atuação. Portugal deve continuar a fazer aquilo que, nas várias frentes, considera que deve ser feito, à luz dos seus compromissos. E, até agora, Portugal tem sido impecável.

Donbass

Parece-me uma evidência - mas é legítimo que haja quem pense o contrário - que a declaração russa de que “o importante é o Donbass” é uma óbvia posição de recuo de Putin, perante a constatação de que outros objetivos não são alcançáveis.

Dormir com o inimigo

Biden referiu que, nos últimos anos, as autocracias se têm espalhado mais do que as democracias. Imaginando que estas, para imporem a sua superioridade moral, não tencionam desencadear uma guerra armada contra as primeiras, para as “convencer”, não seria de parar para pensar?

E a globalização?

Vivemos algumas décadas em que certos teóricos nos vendiam que a globalização era o remédio santo para os males do mundo. Os “descontentes” de que Stiglitz nos falava já há 20 anos, eram então descartados como “colateral casualties”. Hoje, algumas portas fecham-se de novo, não é?

Na minha outra juventude

Há muitos anos (no meu caso, 57 anos!), num Verão feliz, cheguei a Amesterdão, de mochila às costas. Aquilo era então uma espécie de "M...