Num final de tarde de 2007, aterrei no aeroporto de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, no Brasil.
Durante a viagem no táxi que me conduzia ao hotel, vi passar carros com bandeiras, no que me pareceu ser o prelúdio de um qualquer evento desportivo. Perguntei ao motorista de que se tratava. O homem, pelo retrovisor, olhou para mim com cara de poucos amigos e, claramente, com algum desprezo, justificado pelo meu desconhecimento, esclareceu: "Hoje o Grêmio joga com o Inter".
Foi então que me veio à memória que, em Porto Alegre, existe uma das maiores rivalidades que opõem clubes na América Latina - quiçá mesmo do mundo.
O Grêmio e o Internacional, ambos clubes da cidade, são, desde há bem mais de um século, adversários ferrenhos, numa conflitualidade que já produziu mortos e que deixa o clássico carioca Fla-Flu (Flamengo-Fluminense) com o estatuto de rixa de infantário.
Quando um desses clubes gaúchos (“gaúcho” designa um originário do Rio Grande do Sul) joga com uma equipa da Argentina, um país ali ao lado pelo qual nenhum brasileiro morre de amores, há uma metade de Porto Alegre que "vira", por 90 minutos, argentina...
Nessa noite, atenta a má catadura do meu condutor, hesitei alguns segundos antes de lhe colocar a pergunta: "E o meu amigo de que clube é?" O sentimento de pena do homem para comigo acentuou-se ao ter de revelar o que devia ser óbvio: "Sou do Grêmio. Só pode, não é?!".
Já não me recordo de muito do resto da conversa, mas fixei para sempre as palavras de quase ódio com que, a certo ponto da verborreia anti-Inter por que enveredou, me falou de um filho que se tinha convertido em adepto do Inter, por via do namoro com uma jovem de uma família que era adepta do rival. "Mandei ele sair de casa na noite em que soube que se dava com gente dessa! Com roupa e tudo. Foi há quatro anos, vive noutra zona da cidade. Não quero saber dele. Nunca mais."
Chegámos ao hotel. Paguei, não lhe desejei felicidades para o jogo. À noite, na televisão, vi que o Grêmio tinha perdido. Ele não deve ter tido uma boa noite.
Hoje, pela imprensa brasileira, soube que o Grêmio desceu à segunda divisão. Entrou-se, assim, em mais um ciclo de um processo que localmente se designa por “gangorra”, expressão utilizada quando um dos clubes do “Grenal” - termo que também se usa para designar o confronto Grêmio-Internacional - se encontra numa má situação e outro num bom momento.
Que grande ”porre” de desgosto deve ter apanhado ontem aquele meu ocasional motorista de outrora!
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