terça-feira, novembro 16, 2021

Punir o boato


Nos anos 90, uma revista política britânica de circulação muito limitada, "Scallywag", publicou um rumor, que era falso, sobre um "affaire" do então primeiro-ministro conservador britânico, John Major.

Durante alguns dias, ninguém mais tocou no assunto. Major não desencadeou qualquer ação judicial contra a revista.

Passadas breves semanas, a revista "New Statesman", uma publicação bastante lida, muito próxima dos trabalhistas, retomou o tema, num tom clássico de quem quer ecoar a coisa, mas distanciando-se dela: ”Então não querem lá ver que andam por aí a dizer isto…”

Era comentado o conteúdo do artigo do "Scallywag", embora não credibilizando necessariamente o boato.

Porém, porque o "New Statesman", ao falar no assunto, amplificou a divulgação da mentira, Major (e a senhora envolvida no boato) processaram a revista. E depois, naturalmente, também o "Scallywag" foi a julgamento. Para a História: Major ganhou os dois processos.

O comportamento inicial de John Major mostra que seguiu uma regra básica da comunicação: quando as mentiras têm uma difusão restrita ou escassa credibilidade, reagir contra elas, em termos públicos, acaba por ser contraproducente.

Lembrei-me desta história a propósito de uma “notícia” espalhada na internet por uma boateira profissional espanhola de extrema-direita, detentora de um historial incontável de mentiras, como bem sabe quem acompanha minimamente a política do país aqui ao lado.

A visada, a deputada Mariana Mortágua, não reagiu quando por aí começaram a ser “retweetados” esses delírios. Mas pôs logo em tribunal o seu colega parlamentar de extrema-direita, correligionário luso da maluquinha espanhola, quando este deu amplificação ao assunto.

E fez muito bem!

6 comentários:

José disse...

A Mariana "mortedeagua" (é o que a espanhola lhe chama), fez muito bem.

Este é um daqueles casos que mostra bem a estupidez por trás de muitas das ações do Ventura. Reparem que estupidez não significa necessariamente "burrice". Este tipo de coisas fideliza votos! Mas... vale mesmo a pena?

Recentemente foi formada uma associação para a promoção da "negritude" no meio artístico. É uma coisa que congrega "artistas" pretos, quase pretos ou quase brancos (sempre gostei desta formulação do Caetano Veloso). Trata-se de uma iniciativa claramente racista, a merecer queixa às autoridades competentes e a vergonha pública dos seus promotores ("promotoras", parece-me). Onde está o Ventura? Calado. Se se lançasse contra esta imbecilidade, se entalasse quem a criou e a promove (jornal Público, como não podia deixar de ser), não só fazia um bom serviço à comunidade como ganharia pontos para os seus argumentos e, certamente, mais votos e de maior qualidade do que aqueles de pessoas que andam a ler twits. Mas prefere estas palermices.

Se isto não é ser estúpido...

Luís Lavoura disse...

Eu acho que fez muito mal.
Primeiro, porque o boato (que ela recebeu dinheiro do presidente do BES) não tem nada, à partida, de difamante. Ela pode ter recebido dinheiro legalmente por atividades perfeitamente legais.
Segundo, porque ajudou a difundir o boato.
Terceiro, porque qualquer político sabe que está sujeito a boatos e que a estes deve ser dada grande latitude. A liberdade de expressão deve sempre prevalecer como critério. É isso mesmo que afirma o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, ao qual Portugal está submetido. Se o assunto lá chegar, Mariana Mortágua perderá a causa.

Luís Lavoura disse...

publicou um rumor, que era falso, sobre um "affaire" do então primeiro-ministro conservador britânico

Mas ter um "affaire" é crime? Não é.

O rumor causou algum prejuízo, objetivamente quantificável, ao primeiro-ministro? Não causou.

Portanto, o rumor não acusou o primeiro-ministro de nenhum crime nem lhe causou qualquer prejuízo objetivo, observável e mensurável.

Logo, esse rumor não deveria ter sido punido pela lei.

A liberdade de expressão serve, em boa parte, para dizer disparates. Esses disparates não devem ser punidos, a não ser que causem um dano objetivo, claramente verificável e mensurável. Não basta uma pessoa alegar que ficou muito triste e psicologicamente afetada pelos disparates que sobre ela foram ditos; ela deve ter que demonstrar que sofreu um dano claramente observável e mensurável.

Luís Lavoura disse...

José

uma associação para a promoção da "negritude" [...] uma iniciativa claramente racista

Não me parece racista. Não envolve necessariamente uma discriminação negativa injustificada contra não-negros.

Mexer influências para ajudar ("promover") negros, ou judeus, ou mulheres, etc etc etc não me parece condenável por lei.

José Figueiredo disse...

Que arte, Embaixador!...
José Figueiredo

José disse...

Lavoura,

Sugiro que você, que é um artista do comentário e tantas vezes parece estar às escuras, tente aderir à dita organização. Depois, diga-me se foi aceite.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...