Werner Hoyer acaba de ser reconduzido à frente do Banco Europeu de Investimentos, lugar onde já está há seis anos. É um liberal alemão que, por alguns anos, foi secretário de Estado dos Assuntos Europeus, no último governo de Helmut Kohl.
Foi nessa mútua qualidade que nos conhecemos. Chefiámos as nossas delegações nacionais na negociação do Tratado de Amesterdão e criámos, a partir de então, uma relação pessoal muito agradável. Werner é uma figura afável e dialogante, embora muito firme nas suas convicções. Perdemo-nos de vista desde então e só viemos a dar um abraço, há uns anos, num encontro casual de rua, numa noite, na Promenade, cheia de neve, no centro de Helsínquia.
Um dia, nos tempos de governo, convidei Werner Hoyer para vir a Lisboa. Ele tinha-me recebido, meses antes, no seu espartano gabinete de Bona e, ao entrar no espaço que eu ocupava no Palácio da Cova da Moura, ficou verdadeiramente deslumbrado.
O gabinete do secretário de Estado dos Assuntos Europeus, com azulejos nas paredes, um teto de madeira e belas pinturas nas portas, é, na minha opinião, um dos mais bonitos espaços de trabalho de qualquer governante português. Expliquei-lhe que, naquele mesmo local, tinha tido lugar a reunião dramática da última tentativa de golpe de Estado para derrubar Salazar, em 1961. E que aquele espaço fora também o gabinete do general Spínola, chefe da Junta de Salvação Nacional, nos dias revolucionários de 1975.
Portugal desenvolvia, por esse tempo, um esforço diplomático para tentar convencer os nossos parceiros de que a nossa aproximação aos critérios para a entrada na moeda única europeia estava a fazer-se de uma forma sustentada.
A moeda única era uma aposta política mas era, igualmente, um teste à nossa credibilidade. Os países da Europa mais a norte mantinham fortes dúvidas de que Portugal pudesse vir a reunir condições para partilhar o futuro euro. Ainda não havia por ali nórdicos, mas a Alemanha e a Holanda eram, visivelmente, os mais reticentes. Para os alemães, que, no processo da moeda única iam dispensar o seu tão prestigiado marco, todos os cuidados eram poucos. Em todas as conversas, eu ia sentindo que Hoyer, como liberal ortodoxo que era, embora sem o dizer, desconfiava bastante que Kohl pudesse vir a tomar uma decisão política, de cariz voluntarista, em favor de Portugal, dando menos importância às condições financeiras objetivas do nosso país.
A certa altura da nossa conversa, levei Werner Hoyer a ver o magnífico terraço em frente ao meu gabinete. Estava um belíssimo dia de sol lisboeta e, por qualquer óbvia razão, vieram à baila as praias portuguesas. Foi então que lhe ouvi este comentário: "Tenho algum receio que vocês, em Portugal, façam uma fotografia de praia". Não percebi e, como falávamos em inglês e eu podia ter entendido mal, repeti: "Uma fotografia de praia? O que queres dizer com isso?".
Hoyer sorriu e explicou: "Como sabes, nas fotografias que tiramos na praia, temos sempre a tentação de encolher a barriga, para ficarmos mais elegantes para a imagem. Logo que a fotografia é feita, relaxamos os músculos e lá regressa a barriga. O que eu quero dizer é que, na Alemanha, alimentamos o receio de que Portugal - mas não só Portugal - faça um esforço pontual para cumprir os critérios de convergência, em especial em matéria de dívida e défice, estando preparado para o momento em que a decisão sobre a entrada na moeda única vier a ser tomada mas, depois, passado que seja esse instante, venha a haver um progressivo laxismo e um menor empenhamento no esforço orçamental que vai ser necessário manter para sustentar o projeto monetário."
Já tivemos altos e baixos, mas acho que Portugal, nos últimos tempos, tem dado provas de querer ficar cada vez melhor no retrato.
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