terça-feira, novembro 09, 2021

A tropa fandanga

Desde há décadas que as forças armadas portuguesas têm estado envolvidas em operações de paz, um pouco por todo o mundo. A ação dos nossos militares, alguns dos quais pagaram com a vida ou o sofrimento o risco dessas missões, tem vindo a representar um contributo inestimável para a imagem externa de Portugal, por todo o lado deixando assinaláveis marcas de competência e rigor profissional, que é unanimemente reconhecido. 

Se acaso se vierem a confirmar as acusações que envolvem militares portugueses no tráfico de bens preciosos, oriundos das zonas onde estavam mobilizados em operações de paz, isso configurará uma quebra ética que vai muito para além da mera criminalidade. Significa o abandalhamento da farda que essa gente teve um dia a honra de envergar, em nome do nosso país.

É importante, por isso, que este caso seja rapidamente esclarecido e julgado com todo o rigor, cuidando em evitar quaisquer falhas processuais, por forma a que, daqui a uns anos, o assunto não acabe envolvido numa nuvem pantanosa de queixas, recursos e falta de decisões transitadas em julgado. É não só a justiça que assim o exige, como igualmente o reclama o nosso prestígio externo.

16 comentários:

José disse...

Já eu, sou do tempo em que os EUA se opunham a escumalha desta em toda a América Latina.
Já repararam no estilo "blusão e boné" do ditador? Aquela escola hispano-americana...

José disse...

É claro que disparei contra o alvo errado e o meu comentário era sobre a Nicarágua.

caramelo disse...

"Já eu, sou do tempo em que os EUA se opunham a escumalha desta em toda a América Latina."

HAHAHA, opunham-se a quê? ;)

septuagenário disse...

A ONU sempre que entrou nos países africanos independentes desde 1960, foi um desastre em cima de desastre.

Como retornado de Angola vi ao vivo as Nações Unidas entrarem em 1960 no ex-Congo Belga, Zaire, com "turistas" suecos, soldados marroquinos, soldados indianos, sem saberem o que fazer com uma guerra que durou dezenas de anos, e que começou um minuto após o rei belga arrear a sua bandeira.

Aqueles militares não tiveram o mínimo sucesso, antes pelo contrário, foi lenha para a fogueira.

As Nações Unidas foram sempre um perigo para África.

Coitados dos africanos que precisem da ONU.

Se a ONU não tem sucesso em África, a culpa não é dos soldados que vão ajudar, pois estes não são obrigados a conhecer o africano, a culpa é de quem envia esses soldados, sem lhe ensinar que os africanos não nasceram hoje.

Retornado

Flor disse...

Estou estupefacta! ☹️

Joaquim de Freitas disse...

Quando um governo soberano, o governo português, se sente obrigado por uma potência estrangeira, a participar , no quadro da NATO, numa agressão caracterizada no Iraque, ou no Afeganistão, e ao assassinato de milhares de cidadãos de países que não nos atacaram, e que constatamos a desordem vergonhosa que presidiu à 'fuga" dos nossos aliados do teatro de operações, assim como dos dirigentes corruptos do Afeganistão em helicópteros abarrotados de dólares , abandonando aqueles que subornaram para nos servir, não vejo qual prestigio quer agora o governo português proteger, se os factos vêm confirmar o que outros fizeram antes, roubando milhares de objectos de arte nas ruínas de Babilónia e nos museus, que se encontram hoje à venda no Ocidente, nas "oficinas" habituais chamadas lojas de antiguidades...

O prestigio das forças armadas portuguesas e do seu governo caiu estrondosamente e definitivamente, no dia em que aceitaram de participar em todos os crimes que o Ocidente democrático e civilizado lá cometeu. Sem esquecer as torturas na prisão de Abu Graib, por mulheres GI's sobre homens iraquianos nus e acorrentados.

Carlos Antunes disse...

Meu caro Embaixador Dr. Seixas da Costa
A propósito do seu post, bem intitulado de “tropa fandanga”, gostaria, se tiver pachorra para me responder, o que é que as FA portuguesas estão a fazer na República Centro-Africana, tal como nas chamadas missões de paz (Bósnia, Afeganistão, etc.)?
Sei que pós 25 de Abril, os militares portugueses e o poder político inventaram o chamado “conceito estratégico de defesa nacional”, segundo o qual a manutenção da independência nacional e a integridade do território nacional contra qualquer agressão ou ameaça externa se faz fora das fronteiras nacionais, conceito que, em meu entender, mais não foi do que a manutenção, finda a guerra colonial, dos privilégios das elites militares, quer ao nível do quadro dos oficiais generais (temos hoje mais generais dos que então existiam na três frentes da guerra de África), quer ao nível das compras de equipamentos.
A este propósito, não posso deixar de recordar as palavras do seu colega embaixador dos EUA em Lisboa (2007-2009), Thomas Stephenson que em mensagens enviadas a Washington, afirmava que “Portugal tem mais almirantes e generais por soldado do que quase todas as outras forças armadas, passando a imagem de um país de “generais sentados”, em que o Ministério da Defesa não é capaz de tomar decisões e que “os militares têm uma cultura de status quo, em que as posições-chave são ocupadas por carreiristas que evitam entrar em controvérsias”. O embaixador sublinhava ainda que o dinheiro na Defesa é gasto de forma imprudente “No que diz respeito a contratos de compras militares, as vontades e acções do Ministério da Defesa parecem ser guiadas pela pressão dos seus pares e pelo desejo de ter brinquedos caros. O Ministério compra armamento por uma questão de orgulho, não importa se é útil ou não.”
O episódio de tráfico de diamantes, ouro e droga por parte de alguns militares portugueses (certamente por acaso o cabecilha do grupo era o de mais patente) destacados na República Centro-Africana, mais não é que uma consequência desta, para mim, incompreensível missão das FAP.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Carlos Antunes. Peço desculpa, mas não tenho tempo para explicar algo que me parece muito óbvio. Sou 1000% favorável ao empenhamento de Portugal em missões de paz, da ONU ou da UE. Gostaria mesmo que a nossa participação fosse maior.

7ze disse...

Senhor Embaixador, permita-me que recorde a imensa dívida de sangue do país para com uma geração de combatentes. Decerto se lembra também do slogan "Nem mais um soldado para as colónias". Como compreender então que se mandem homens para defender não se sabe o quê? Na minha opinião, não são combatentes. Não passam de simples mercenários. Não só compreendo como julgo inteiramente justificadas as reflexões de Carlos Antunes e do meu velho conhecido Retornado.

Paulo Guerra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Paulo Guerra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Paulo Guerra disse...

Julgo que por engano induzido por outros comentadores também acabo de inserir nesta caixa dois comentários respeitantes à questão da Nicarágua. Pelo qual peço desculpa. No caso de serem assim publicados corrigirei à posteriori.

Sobre este enorme embaraço nacional que também não é de certeza uma originalidade das tropas portuguesas julgo que as autoridades estão a lidar bem com um problema essencialmente da natureza humana. E consoante o desfecho ainda acredito que consigamos limpar a nódoa quase na totalidade. Para mim o mais importante foi a denúncia ter partido da própria Missão. Sobretudo com o sebastianismo outra vez muito presente na sociedade.

Carlos Antunes disse...

Prezado Embaixador
Agradeço o seu comentário/resposta à dúvida que formulei. Obviamente não tem que me pedir desculpa.
O blog (que aprecio e acompanho diariamente) é do Embaixador que obviamente apenas terá de responder aos comentários, se e quando o tempo lhe permitir.
Eu apenas tentei humildemente obter de alguém altamente qualificado, embaixador de Portugal nos mais diversos âmbitos, um esclarecimento sobre o “conceito estratégico de defesa nacional” que legitima a presença de tropas portuguesas desde o Médio Oriente, África e Ásia, que como reafirma “gostaria que fosse maior”.
Relembro a este propósito, que sendo amigo e admirador de Jorge Sampaio, como este se opôs (e meu ver bem) à presença de tropas portuguesas no Iraque, tal como pretendia Durão Barroso.
Creia-me com toda a consideração.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro Carlos Antunes. Fiz parte da comissão que redigiu o Conceito Estratégico. Se o ler, encontrará nele as respostas para as questões que colocou.

José disse...

Posso dizer que, em devida altura, considerei candidatar-me à Academia Militar, por gosto pelas questões militares e por proximidade com o Exército. Felizmente não o fiz porque teria falhado - ou no acesso, ou na frequência -, por força da exigência nalgumas matérias para as quais me faltou sempre o "talento".

Da minha proximidade com o Exército derivam memórias de muitas conversas entre oficiais (que eu escutava), e das quais nunca constaram quaisquer assuntos de natureza militar, apenas andando a coisa à volta das promoções, da antiguidade, das diuturnidades, das possibilidades de colocação, da eventual cunha para um certo posto, etc.

"O gajo é do curso depois do meu e já foi promovido?!" - era um "must".

Hoje, embora continue a gostar muito do material militar, devo dizer que perdi grande parte do respeito pelo pessoal militar.

A conversa do "servir a Pátria" não passa de um discurso redondo, ensaiado por carreiristas para justificarem a sua desnecessária existência (deles, não das FA!), ou a sua atual função. Tretas!

E que ninguém me venha dizer que um soldado de sentinela a 2000km daqui serve a Pátria mais do que qualquer honesto trabalhador em Portugal!!!

Carlos Antunes disse...

Caro Embaixador
Li todos os documentos relacionados com o conceito estratégico de defesa nacional (Resolução do Conselho de Ministros 10/85, de 20 de Fevereiro, Resolução do Conselho de Ministros n.º 9/94, de 4 de Fevereiro, Resolução do Conselho de Ministros n.º 6/2003, de 20 de Janeiro, e Resolução do Conselho de Ministros n. º 19/2013, de 5 de Abril, que julgo ser o último e que o actual Ministro da Defesa João Gomes Cravinho entende dever ser revisto).
Por saber que fez parte da Comissão que redigiu o CEDN, é que ousei que me esclarecesse as minhas dúvidas, nomeadamente sobre a razão da presença de tropas portuguesas na República Centro-Africana e noutros países africanos (fora do âmbito da CPLP).
Não tenho por hábito comentar ou colocar questões sobre as quais não me tenha previamente informado ou estudado minimamente. No caso concreto, julgo que a incompreensão resulta da minha incapacidade de análise sobre todos os meandros da questão.
Obrigado ainda assim pela sua atenção e resposta.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...