quinta-feira, novembro 21, 2013

Michelin

A edição "ibérica", sempre lançada em Espanha, do guia gastronómico Michelin para 2014 distinguiu 12 restaurantes portugueses, mais um que em 2013. Não conheço quatro desses restaurantes, mas os restantes oito que já experimentei merecem bem a distinção que obtiveram. Como se sabe, as "estrelas" vão de uma a três, sendo que Portugal não tem, como nunca teve, nenhum restaurante ao qual hajam sido atribuídas três "estrelas".

Há quatro ideias que retirei da minha longa experiência como usuário deste guia, em vários países:

- nunca fiquei desiludido com qualquer restaurante "estrelado", em qualquer parte do mundo, muito embora, por vezes, tenha discordado do número de "estrelas" atribuídas. Em alguns casos, a relação qualidade/preço pareceu-me menos adequada. Noutros casos, o serviço ou o ambiente não estiveram à altura da comida;

- não obstante a diversidade da tipologia gastronómica das regiões e países, a seleção privilegia um certo padrão de culinária e até de apresentação. Desde há muito que o guia decidiu privilegiar uma certa "escola" de restauração, deixando de lado outros modelos tido por menos sofisticados;

- apenas referindo-me ao caso português, considero existirem alguns outros (não muitos, é verdade) restaurantes que, mesmo perante o critério tradicional do guia, também mereceriam uma "estrela". E, se esse critério fosse alargado, alguns outros poderiam ser reconhecidos. Desde há uns anos que, para compensar esta "fragilidade", o guia recorre à classificação de "Bib Gourmand", para assinalar outras mesas recomendáveis. O facto da oferta destes últimos não seguir o padrão a que antes me referi deve ser a justificação para a sua exclusão do topo da "tabela";

- o guia insere sempre uma escolha de vários outros restaurantes, em cada localidade, para além dos "estrelados". Frequentemente, acho essas escolhas profundamente injustas e arbitrárias. Vale a pena registar que, por exemplo, na zona oriental de Lisboa, "sobrevive" no guia, desde há muitos anos, um restaurante absolutamente medíocre, em comida, ambiente e serviço. Ainda não vi o guia de 2014, mas imagino que ele surja de novo este ano, como que por "usucapião"...

Em Portugal, o guia "ibérico" de 2014 "estrelou", como se disse, 12 restaurantes. Em Espanha, um país que é quatro vezes maior que Portugal, o número de restaurantes com "estrela" é de 172! Sabem qual é a nacionalidade da esmagadora maioria dos "experts" que visitam os restaurantes portugueses? Adivinharam: espanhóis. Sabem quantos "experts" portugueses a Michelin utiliza? Nenhum.

12 comentários:

margarida disse...

Não vale a pena insistir-se porque, tirando um ou outro pormenor, eles nunca gostam de nós e a malta retribui. Carinhosa e diplomaticamente, claro.
É a História.

Defreitas disse...

PORTUGAL DA "SAÍDA DA CRISE" E DOS JOGOS MAFIOSOS, É ESTE:

" Há crianças que chegam doentes ao Hospital de Santa Maria, em Lisboa, por terem fome. Os seus pais estão desempregados e não têm dinheiro para comida, nem para medicamentos.
As assistentes sociais da unidade hospitalar estão responder a pedidos de ajuda de pais desempregados que têm os seus filhos internados. A revelação é feita numa entrevista à Antena1 pela diretora do Serviço Social do Hospital de Santa Maria, Conceição Patrício."

patricio branco disse...

verifico que ao contrario de há 20ou 25 ou 30 anos atrás cheguei à indiferença quase total em relação às estrelas michelin, aqui ou além, nem as mínimas das curiosidades em ir provar as *, conhecê las, na verdade tenho as minhas estrelas patriciais que também mudam, desaparecem, aparecem novas, aumentam de 1 para 2, ou ficam em 0, 3 nunca, na comida ponho três condições iniciais, pouca gordura, pouco sal, pouco açucar, depois gastar pouco, o preço justo nas contas, de preferência no máximo 15 p/pessoa, se comi bem e a factura foi entre 10 e 12 por pessoa poderei voltar, não pergunto o nome do chefe, para voltar atrás no tempo fui 2 ou 3 vezes ao belcanto, sentia me noutro mundo de outros tempos, mas isto antes das estrelas, ovos à dr serviam, curioso nome de prato…
sr empregado, traga me a sopa do dia e água frize com gás, ou o peixe grelhado do dia, robalo pode ser, com batatas cozidas e feijão verde, a terminar café, claro que com estas exigências não funcionam as estrelas, gosto de perceber os ingredientes de que se compõe o prato, vê los, por isso não vou em bacalhaus à brás, mas quem seria o brás? nem em lasanhas. uma cerveja numa mesa exterior ao fim da tarde bem tirada com uma boa sandwich clube também pode ser, há sítios por aqui que as fazem bem, pois os inspectores da michelin como serão ao terem por profissão comer e beber?
e a curiosidade em entrar num restaurante desconhecido, onde se espreitou a sala e se leu a ementa à porta? Mas não nos devemos precipitar…
e assim vamos, tudo isto tem que se lhe diga, irs, estrelas, frescura dos produtos, pontos de cozedura, quantidade, apresentação, preços, peixe, carne ou vinho, serão importantes as saladas com seus ingredientes e temperos para os empregados viajantes da michelin? e a tiragem do café? espero que sim, um mau café estraga muita coisa, bom apetite portanto, etc etc

Anónimo disse...

Pois é, senhor embaixador, é tudo muito bonito.
Sacanas dos espanhóis que batemos em Aljubarrota.
Sabe, há muitos meses que não vou a um restaurante (há meses fui a um de 5 €, conhece?), e o bife também acabou.
Frango e umas febritas de porco, e não pode ser todos os dias.

Nota - e eu que julguei que importante era a policia subir as escadas do parlamento, o Soares pedir a demissão do Silva e o discurso arrasador do Pacheco. Coisa de um pobretanas...

outeiro

Defreitas disse...

O amigo J. era um destes patifes que era bem-vindo no paraíso dos anjos.
As fadas, os demónios, os arcanjos, as quatro filhas de Sátão eram as suas frequentações. Ele sentia-se como na sua casa por toda a parte. Um dia, encontrou-se, de férias, no outro mundo, convidado por Santo Teodoro, um velho amigo dos seus pais.
O santo propôs-lhe, para lhe dar prazer, algumas visitas culturais ao museu da arte de morrer, ao palácio do rei dos fantasmas, ao jardim zoológico dos animais do Bom Deus e outros lugares do pais extraordinariamente frequentados por turistas defuntos. O amigo J. consultou os catálogos que o santo lhe propunha, fez uma careta e disse-lhe:
"A tua generosidade comove-me, mas os parques e os monumentos já vi que chegue "chez nous", os vivos, e basta. Em contrapartida, só conhecemos nos nossos reinos racionais, que paraísos minúsculos e infernos ridículos. Gostaria de visitar os verdadeiros".
"Nada mais simples meu amigo, respondeu-lhe o aureolado".
E cá estão eles na entrada dum destes restaurantes de luxo onde só se fala a meia voz. Dois lacaios em frente deles se curvam e recebem os vestuários e os chapéus.
- A cave, meus Senhores? Ou o primeiro andar?
- A cave, respondeu Santo Teodoro.
Rectificação de gravata, piscadela ao amigo J. boquiaberto.
- Claro que é melhor começar pelo inferno. " Après toi ! Atenção aos degraus.
Descem entao. E que vêm-eles? Uma imensa sala de jantar com quatro muros indiscerníveis, uma única mesa mas longa, tão longa que se perde ao longe, nas brumas do infinito. Na mesa, belas travessas perfumadas como no Natal, lagostas, pratos de arroz perfumado, carnes condimentadas com especiarias raras, sobremesas sublimes à" la chantilly", enfim um verdadeiro festim de reis gourmets e gourmands!
Mil convivas face a face, cada um armado duma grande colher com um cabo mais longo que o braço. Cada um enche-a, mas como fazer para a retornar como deve ser em direcção da boca escancarada, torcida pelo esforço? Este diabo de cabo da colher é demasiado comprido! Toda a gente protesta, vocifera, estende o pescoço, cai para o chão, suja o plastrão da camisa, morre de fome na abundância.
- Eles são estúpidos, diz o amigo J.
- Não, danados, responde Teodoor. Anda daí, vamos ao primeiro andar agora.
Sobem. Rés-do-chão, escada abrupta e lá, surpresa. Mesma sala de restaurante, mesma mesa até ao infinito brumoso, mesmo festim, mesmos convivas, mesmas colheres exageradamente longas. Mas aqui come-se, aqui saboreia-se, lambe-se os dedos, ri-se também.
Cada um alimenta aquele que está em frente. O amigo J. sorri.
- O paraíso?
- Exactamente, respondeu Santo Teodoro. Tenho um vazio no estômago. Vamos almoçar.

Num canto da janela , uma sigla discreta, um homem gordo. Parecia o Bibendum de Michelin...

Anónimo disse...

É que, Senhor Embaixador, como bem se diz nesta terra, mais vale cair em graça do que é sem engraçado. E basta um certo "beautiful people" e figuras mediáticas adoptarem um restaurante, um bar ou seja o que for para esse lugar entrar na lista dos intocáveis e manter a fama, mesmo que não a mereça de todo.

Anónimo disse...

O mais provável é que um dos parâmetros para ganhar uma estrela, seja "hablar"

Anónimo disse...

Para ter três estrelas Michelin em Portugal, num mundo ideal bastaria um sítio limpo em frente ao mar, uma toalha e guardanapos imaculados, um caldo verde a sério, um peixe fresco impecavelmente grelhado com uns gelos salteados, um queijo da Serra verdadeiro amanteigado, um leite creme sem exageros de acúcar e um vinho verde ou branco servido â temperatura ideal. Parece fácil e simples mas não é.

Anónimo disse...

Sr. Embaixador: Conheço o L'AND, na estrada que vai de Montemor-o-Novo para Vendas Novas. Muito agradável, para ficar, até pode ver as estrelas num tecto envidraçado. Come-se bem, considerando embora que é bastante caro. Por um 1/3 do preço, come-se muito bem noutros sítios.Pertence à uma família Cunhal... mas o outro Cunhal levantar-se-ia da tumba neste "seu" Alentejo. Não é para os trabalhadores rurais, longe disso.Só dormir uma noite é cerca de 1/3 dos seus proventos mensais, trabalhando n horas por dia. Assim vai o mundo, assim vai este Portugalucho...

Manuel Teixeira disse...

Não seria antes de considerar que Portugal tem um restaurante por cada 83000 habitantes e Espanha (só) 1 por cada 260000?

Carlos Fonseca disse...

Frequentei durante alguns anos um restaurante que viria a ser "medalhado" com uma estrela - o Ramalhão, em Montemor-o-Velho

Era um restaurante que servia principalmente pratos de cozinha regional (segundo o proprietário inspirados nas receitas de sua mãe), sem nada de sofisticado, pelo que fiquei surpreendido com a atribuição do "galardão".

Era muito frequentado por clientes residentes na região do Baixo do Mondego, ou naturais de lá, como é o meu caso.

Acontece que o "galardão" parece ter subido à cabeça do nosso amigo João, que se envaideceu, começou a inventar, e deu cabo do negócio. Há muito que fechou.

Tive pena porque gostava de tudo lá: da ementa, do ambiente, que incluia a lareira acesa no Inverno, da decoração rústica e simples, da simpatia das senhoras, quer das que serviam na sala, quer das da cozinha, sem esquecer o próprio João (neste caso até à chegada da estrela, que, subindo-lhe à cabeça, acabou por não lhe iluminar o caminho.

Anónimo disse...

É muito bom termos sítios onde se come bem (que são muitos);
É muito bom termos sítios que, além de se comer bem, funcionam como chamarizes turísticos;
A melhor descrição foi dada pelo anónimo das 17:29. Já estive em vários sítios desses (mesmo longe da beira-mar e até substituindo a carne pelo peixe e o branco pelo tinto);
A descrição do comentador De Freitas é muito dura, mas muito verdadeira. Muito português anda no fio da navalha. Muito desejo que estes servidores da miséria e da morte desapareçam de vez, para que o bife deixe de ser pecado e para que as tão atrativas (e lucrativas) industrias da caridade voltem a estar "às moscas";
Também me deixei de restaurantes, mas por pura necessidade. Anseio lá voltar e comer um bom naco em homenagem às jonet e aos policarpos desta vida. Irei lutar por isso. Abaixo os policarpos. Os carpos ao talher.
Desculpe-me, senhor moderador, mas estou farto desta merda.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...