quinta-feira, janeiro 03, 2013

O "seminário"

Ontem e hoje, na inspiradora arquitetura da Fundação Champalimaud, decorre mais um "seminário" diplomático, que junta as chefias políticas com os profissionais com mais altas responsabilidades na casa. O exercício começou por chamar-se, nos primeiros anos, encontro de "altos funcionários".

(Num desses anos, ao tempo em que as reuniões tinham lugar nos salões do Protocolo, nas Necessidades, numa larga roda de diplomatas que se juntou depois do almoço, alguém alertou para o facto de um porteiro estar a vedar a entrada a um determinado colega, no fundo da escadaria. "Porquê?", estranharam alguns. "É que, dado que isto é só para 'altos funcionários', dado o tamanho dele não o querem deixar entrar..." Houve uma sonora gargalhada geral. A risota prosseguia ainda quando, ladeado por um outro colega de talha precisamente idêntica, o tal diplomata minúsculo, empertigado como sempre anda, inquiriu, grave, qual era a grande piada que tanto estava a divertir o grupo. Nem se pode imaginar o ambiente que se gerou, misto de gozo e de embaraço, com o primeiro a prevalecer sobre o segundo, tanto mais que o visado estava longe de recolher unânimes simpatias na casa.)

Para o bem e para o mal, o "seminário" é uma grande montra. Para o bem, porque, numa carreira onde muitos vivemos distantes uns dos outros, essa "missa" anual é uma ótima oportunidade para conhecer colegas, de ouvi-los e de apreciá-los. Formei muito boas impressões de pessoas que só conhecia de nome, quando deles ouvi interessantes análises sobre a conjuntura que afetava países onde estavam colocados, judiciosas opiniões sobre temáticas postas à discussão no curso de debate.

Mas essa montra também funciona em sentido inverso. Uma intervenção mal colocada ou deficientemente formulada, uma pergunta pateta ou descabida ou, muito simplesmente, um tempo infeliz de pronunciamento público podem afetar, um tanto gratuitamente, aos olhos dos outros, uma imagem ou uma reputação criada em anos de dedicado trabalho. E isso pode ser profissionalmente cruel e injusto, razão que leva uma imensidão de colegas a guardarem, naquelas ocasiões, de Conrado o prudente silêncio. É que, para quem antes não conhecia o autor de um momento infeliz, e pode ser esse o caso das personalidades políticas de tutela, "não há uma segunda oportunidade para se criar uma primeira impressão". E, mesmo que essa nova oportunidade exista, é já só para o ano.

17 comentários:

Anónimo disse...

Mas é o que se passa em todas as áreas! Muitos (demasiados) só “trabalham” para o powerpoint.! A tutela diz deles depois da 1ª impressão: Trata-se de uma liderança forte!
… Dá no que está à vista!

Jose Tomaz Mello Breyner disse...

Senhor Embaixador,

Estava à espera de o ouvir falar também do almoço. Gostou da bisque de lavagante e carabineiros? E da panacota de bacalhau? Foram ambas confeccionadas pelo nosso Chefe (York House ) .

Um abraço e bem vindo a Lisboa

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro José Tomaz Mello Breyner: eu fui do que ficaram no seu posto, isto é, aqui por Paris. Por isso. não pude dsr-me ao luxo das suas iguarias. Lá iremos!

Anónimo disse...

“O tal diplomata minúsculo...empertigado como sempre anda...inquiriu grave...longe de recolher unânimes simpatias na casa”.
Está-lhe tirada a fotografia. Com os “características” que o identificam. Genial Seixas!
Poder-se-ia acrescentar, talvez: “que chegou em tempos a alimentar a esperança de altas funções” (aliás, referidas magnificamente, com o seu habitual humor cáustico, num Post passado, aqui neste seu Blogue).
a)Rilvas

Anónimo disse...

Foi Chirac en pleno processo de entrada dos novos membros da UE que se referiu aos países do Leste como "perdendo uma boa oportunidade de terem estado calados". A história fará a história de quem efectivamente perdeu essa oportunidade.

Anónimo disse...

A sua nota aponta para um vazio que continua a pontificar no MNE: um blogue institucional onde os funcionários e colaboradores dispersos se pudessem "cruzar". MAs seria necessário vencer uma cultura de medo que ainda impera. O medo de se expressar. Devo a Paulo Portas o prazer e o gosto de ter lido O Independente todas as 6ãs. feiras pelas 8 da manhã no café. Não devo a Paulo Portas uma revolução na modernização e nos métodos de comunicação que um profissional da comunicação ainda não trouxe ao Ministério. E não preciso de assinar pois tenho sido meticulosamente escondido pela corporação para não aparecer e não me mostrar para que não faça sombra aos medíocres.

Anónimo disse...

Pois é... Parece que os diplomatas também precisam de uns cinco minutos de glória perante os seus pares. Não lhes chega apenas uma carreira dedicada. Enfim... é a cultura que temos. Mas... eu não sei

Anónimo disse...

Deu-lhe hoje, à velha senhora, para comentar comentadores - e sempre com a 'liberdade' que no Alvarinho bebe, dia a dia:

caro 'eu não sei' não me é caro
que eu sei bem que nada sabe
nem sabe - eu sei - que é tão claro
que só calar-se lhe cabe
(calar-me sim eu também
rimalhar pra quê pra quem?)

'minúsculo… e empertigado'
rilvas houve mais do que um
altamente alcandorado
na adm'nistração é comum
(portou-se com altivez
um com quem fui uma vez)

Anónimo disse...

A bisque de lavagante e carabineiros e a panacota de bacalhau foram-nos oferecidos pela Viniportugal. O Senhor Primeiro Ministro ofereceu-nos sopa de ervilhas com pancetta e bacalhau com broa. O Senhor Presidente da República ofereceu-nos bolo-rei, sonhos e pastéis de Belém. Comemos tudo.

a) D.Luís da Cunha

Helena Sacadura Cabral disse...

Com tanta oferta... será que se tratou de um bodo aos pobres?!

Helena Sacadura Cabral disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

É isso , Dom Luís da Cunha: comemos tudo. Desde o seu tempo!

Isabel Seixas disse...

Eu acho que os seminários são de facto "encontros", desejados por motivações diversas, o mote normalmente alimenta o "pretexto", sempre útil e com um valor pedagógicoe direcionado à aquisição de conhecimento , nem sempre concretizado com a finalidade expressa,de discutir ideias, rumando em clivagens de discussão de pessoas,não menos interessante, agora, que são normalmente "produtivos" ó se são...

Alcipe disse...

Ó Velha Senhora, isto é verso de boa qualidade, estou a falar a sério:

caro 'eu não sei' não me é caro
que eu sei bem que nada sabe
nem sabe - eu sei - que é tão claro
que só calar-se lhe cabe

Ah, se bebesse menos, deixasse de fumar e de usar tantas palavrões ... que isso dos poetas malditos já foi chão que deu uvas! Regenere-se, a bem do SNS de todos nós, beba sumos de laranja, faça jogging e verá como a sua poesia melhora e ganha quotas de mercado.

patricio branco disse...

optima iniciativa sob todos os aspectos que deve continuar.
e, já agora, o mne precisava de facto de um bom auditório para estes eventos e outros, com capacidade para 100 ou mais participantes, escusava de ir para casa alheia.

Isabel Seixas disse...


Sr. Embaixador por uma questão de justiça, permita-me.

Ó cara Velha Amiga
Que insensibilidade a minha(...)

"(calar-me sim eu também
rimalhar pra quê pra quem?)"In VA

Rimalhar:
para participar,
contribuir na exposição de ideias
ajuda a desvendar
origens de opinar
consensos discensos e as suas teias...

Rimalhar para Nós

Muitas vezes parasitas da sua voz na sua escrita,do seu estilo literário "informal"
da sua coragem "desinteressada"
na sua exposição em troca de "nada",do seu anonimato(do mal o menor)...

Obrigada pelo outro olhar que sempre existe...

Por mim, bem haja.

Anónimo disse...

Diz-me a velha senhora que agradece ao caro Alcipe a sério e lhe contesta a brincar:

alcipe amigo consigo
iria sem objeção
sermões porém não lhes ligo
galinha velha não brigo
que as coisas são o que são
a mais não quero ou me obrigo

qual verso nem qual reverso
os versos pra mim são nadas
em versos eu nem converso
dedilho é contas de um terço
faço é palavras cruzadas
e nada ganho nem perco*

e quanto a isso do sumo
de frutas prefiro o vinho
de resto nem sequer fumo
e presto pra pouco assumo
mas finjo mais que consumo
palavrões e alvarinho

podia fazer poesia
sublime da verdadeira?
calhando - sei lá - podia
chegar-lhe à beira algum dia
mas porra que trabalheira
lixada bem me f…lixava

de todo o modo morria
morro antes rimalhadeira
mas morte que quero havia
de ser na tal brincadeira
fruindo em grande a folia
do resto de amor que me inteira
parceira de quem me queira
e eu queira

*
então amor a poesia
'ganha cotas de mercado'?
presumo ser ironia
não quero o caldo entornado


ps
rimalhice tão comprida!
é que tendo tempo a mais
tempo é menos prá devida
paragem vendo os sinais
tempo é pouco pra cortar
poder ver e respirar
leitor e autor perdoais?

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...