terça-feira, janeiro 15, 2013

A França no Mali

A intervenção militar da França no Mali é um ato que consagra um grande sentido de responsabilidade política e que constitui uma inestimável contribuição para a segurança global. Legitimada por um mandato inequívoco do Conselho de Segurança da ONU, com o apoio político - e, espera-se, rapidamente também militar, em termos significativos - dos países da região, a decisão do governo francês permitiu evitar a "débacle" do poder político no Mali e conseguiu travar a escalada de progressão das forças extremistas, com forte componente estrangeira, no Norte do país.

São perfeitamente irresponsáveis, pelo que devem ser tidos por irrelevantes, os comentários negativos feitos a propósito desta intervenção militar. A França não está a praticar nenhum ato de "neo-colonialismo" ou a somar um episódio mais à história da "Françafrique", uma política que, por muitos anos, apenas significou a defesa das ditaduras do continente que Paris entendia dever conservar no poder. Esta ação é essencial para tentar evitar a disseminação do extremismo islâmico, levado a cabo por um "franchising" do Al Qeda. Os países responsáveis não devem furtar-se a contribuir para complementar esta ação liderada pela França, muito em particular ajudando as estruturas malianas a reforçarem as suas capacidades próprias, por forma a garantirem futuramente a soberania e a estabilidade no país.

Esta ação militar não deve fazer esquecer que permanece, no Mali, um sério problema político, que se prende com os equilíbrios entre o Norte e o Sul do país. A intervenção militar, com os custos humanos e financeiros que implica, deve também aproveitar a oportunidade, em estreita ligação com as forças regionais da CEDEAO, para forçar as autoridades de Bamako a encetarem, logo que as condições de estabilidade mínima estejam garantidas, um processo de reconciliação interna. Mas é importante deixar claro que, sem esta ação militar, o Mali entraria numa situação de caos que seria impeditiva de qualquer solução política minimamente eficaz. Só não vê isto quem não quer ver. 

15 comentários:

António Pedro Pereira disse...

Senhor Embaixador:
É a primeira vez que comento no seu blogue:
E faço-o para lhe agradecer o que me dá sempre que aqui venho.
E, nestes tempos interesseiros, devemos estar agradecidos a quem nos dá muito sem pedir nada em troca.
Os seus textos situam-se no cruzamento da sua rica experiência de vida, do seu saber diplomático, da sua vasta cultura, do seu bom senso, do seu espírito de tolerância, valores que estão espelhados no que diz, e dos quais quem me dera poder ter alguma coisa de substancial.
E ainda os valorizo mais quando leio outros textos completamente vesgos, enfeudados a lógicas imediatistas, de cariz ideológico e de grupo partidário.
Muito obrigado.

Anónimo disse...

e quem pensar contrario que veja por exemplo os comentarios no final da seguinte pagina

http://www.rfi.fr/afrique/20130111-suivez-evenements-11-janvier-mali-traore-konna-hollande-onu-mopti-UA


mas tambem deve haver poucas actividades menos conciliatorias que matar terroristas da alqaeda ou qualquer outro tipo de idiota que ande por ai a cortar maos e a querer aplicar a charia a la butcher...


(nao sei como reagiram os tao amigos dos franceses, que sao os qataris, a estas novelas...)


bh




Anónimo disse...

Mais um país que apenas o romantismo de alguns persiste em ver como tal... Divida-se o que não é reconciliável e pronto.

Francisco Seixas da Costa disse...

Caro António Pedro Pereira: gostava que soubesse que são comentários como o seu que me alimentam a vontade de continuar com este blogue. Bem haja!

Anónimo disse...

"Esta ação militar não deve fazer esquecer que permanece, no Mali, um sério problema político". Não é bem, claro, a FrançAfrique, é evidente: mas é operação militar da "France toute seule" numa ex-colônia... Corajosa, qb, até ver, como na Côte d'Ivoire foi para por o outro andar. (Dividir o Mali com os Tuaregues, meter outro presidente, e depois, até quando? Mais uma base militar francesa? Mais uma base militar francesa em Africa? Daniel Ribeiro

Anónimo disse...

Resta por resolver uma contradição no plano interno: é indefensável Hollande impôr austeridade draconiana aos franceses ao mesmo tempo que encontra financiamento para uma intervenção armada, ainda que inteiramente justificada. A solução só pode ser europeia, porque os restantes países europeus têm que perceber que a segurança tem um preço e que não pode ser a França sozinha a arcar com o peso dessa responsabilidade comum. É óbvio que a zona euro precisa de se dotar de todos os mecanismos de uma verdadeira moeda, incluindo a possibilidade de emitir dívida europeia, de forma a permitir financiar a sua própria segurança de forma eficaz, como o fazem os Estados Unidos e o Reino Unido. A intransigência alemã e de alguns dos seus satélites, ao recusarem a discussão sobre eurobonds, é potencialmente muito perigosa para a segurança de todos nós.

DL

Anónimo disse...

Nem sei se gosto se não gosto. François Hollande usou agora mesmo exatamente as mesmas palvaras que Nicolas Sarkozy quando atacou os líbios, por causa de Benghazi (e por causa do grande filósofo BHL que também apoia esta guerra, neste momento). "Bamako teria caído" - Hollande. "Benghazi teria caído" - SarKozy. Veremos o saldo de tudo isto. Na Líbia a coisa ainda vai no adro e é já catástrofe como era para ter sido, segundo BHL. No Mali, veremos - acordo com os Tuaregues, divide-se o país ao meio (metade tuaregues, metade amigos da França, depois a gente verà no futuro...), muda-se de presidente e instala-se mais uma base militar francesa na África Ocidental? Por favor: eu gosto dos Tuaregues, por causa da natureza, dos camelos, dos cavalos, do cuscus e de tal e tal...e porque sou zen. Que puta de terra esta onde tudo se resolve à porrada....

Helena Oneto disse...

Caro Antonio Pedro Pereira,

Subscrevo inteiramente o seu comentario. Tenho o privilégio de conhecer pessoalmente Francisco Seixas da Costa e garanto-lhe que reune todas as qualidades que citou além de ter um sentido de humor "exquis" e de ser um "fin gourmet". FSC é também um excelente embaixador.

Carissimo Senhor Embaixador,
Concordo consigo. A França fez o que devia, todos estão de acordo mas, por hora, so recebeu promeças de ajuda logistica dos "grandes" (EUA et RU), a Argélia não se decide e os visinhos, coitados, pouco podem ajudar...

Anónimo disse...

Ainda não consegui integrar no meu mental a ideia de normalidade de um país estrangeiro poder entrar por outro país adentro e ser aplaudido...
A minha saída de Portugal em 64 está já ligada à dificuldade de ir combater os "turras" que estavam na terra deles...
Francamente não sei como reagiria naquela mesma época (consciente que era Salazar quem governava) se uma tropa estrangeira invadisse Portugal.
Serei de mental pouco evolutivo nesta matéria, serei, mas isto de independência e soberania bole comigo.
José Barros

Helena Oneto disse...

Caro José Barros,
Respeito o seu conceito de independência e soberania mas neste caso a realidade e o contexto são totalmente diferentes.
Imagina o que é viver num pais islâmico regido pela charia?

Anónimo disse...

Quem se exprimiu bem a este propósito foi o Embaixador francês em Londres numa entrevista audio. Frases bem articuladas, sintaxe bem esgalhada. O problema c'est l'accent. E não pude deixar de pensar no célebre Inspector da Pantera Cor-de-Rosa...

Anónimo disse...

Faço minhas as palavras do José Barros.
E agora vou estudar quais são as riquezas do Mali.
xg

Helena Oneto disse...

"Des députés européens déplorent la solitude de la France": http://www.lemonde.fr/afrique/article/2013/01/15/75-des-francais-favorables-a-l-intervention-francaise-au-mali_1817472_3212.html#xtor=RSS-3208

Helena Oneto disse...

Para os que (ainda) teem duvidas sobre a intervenção da França no Mali : "La "guerre contre le terrorisme", version française" : http://www.lemonde.fr/afrique/article/2013/01/15/la-guerre-contre-le-terrorisme-version-francaise_1817070_3212.html#xtor=RSS-3208


"Il y avait un risque d'implosion du Mali": http://www.lemonde.fr/afrique/article/2013/01/15/il-y-avait-un-risque-d-implosion-du-mali_1817336_3212.html#xtor=RSS-3208

Anónimo disse...

É muito próprio nos dias de hoje não deixar de reconhecer as dádivas que nos são dadas.

Não haverá mal por isso em agradecer o facto de Portugal ser um país com muitos dias de bom tempo, sem ser necessário pedir favores ao céu.

Apenas peço que assim continue, pois assim virão mais turistas visitar a "west coast".

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...