"Eu tinha 20 anos e não deixarei ninguém dizer que essa era a melhor idade da vida". A citação de Paul Nizan, retirada do "Aden Arabia", é vulgar, mas é pena não ser completada pelo que vem a seguir: "Tudo ameaça de ruina um jovem: o amor, as ideias, a perda da sua família, a entrada no grupo das pessoas crescidas. É duro aprender o seu lugar no mundo."
Não sei se eram exatamente esses os sentimentos que me atravessavam nesse mês de outubro de 1967, quando me preparava para completar essa idade mítica. Conhecendo-me, não creio.
Lembro-me muito bem de ter recebido, verifico agora que com essa idade, a notícia da morte de Che Guevara, faz hoje precisamente meio século. Recordo a imagem do seu corpo indecentemente exposto na Bolívia, como relíquia de vitória da ditadura militar sobre a guerrilha.
Guevara estava já na fase em que os "dois, três, muitos Vietnam" andavam muito longe de hipóteses de concretização. Antes, andara próximo da guerrilha independentista angolana, no "ano em que estivemos em parte nenhuma", como ele classificaria esse tempo no Congo. Cuba e a sua revolução, essas estavam já muito longe.
Tal como Fidel, Guevara nunca fez parte da minha mitologia de esquerdista. Talvez porque a revolução cubana teve lugar antes da minha idade adulta, o seu socialismo "latino" disse-me sempre muito pouco. Mas Guevara, caramba!, era "do meu lado". Por isso, li o seu diário (edição espanhola, comprada à sucapa na Tanco, em Orense), e também o que Régis Debray escreveu sobre ele, apreciei sempre a sua bela foto feita por Alberto Korda e tenho ainda por casa esta antologia dos "Cadernos" da "Dom Quixote", que a polícia logo recolheu pelas livrarias.
Ernesto "Che" Guevara morreu há 50 anos. Tinha 40 anos, o dobro da minha idade de então. Não seria "a melhor idade da vida", mas era uma bela idade para apreciar as revoluções e acreditar que elas ainda eram possíveis. É que, mesmo não o sendo, as revoluções fazem para sempre parte do património dos que nelas acreditaram. E os bons sonhos não têm preço!