duas ou três coisas
notas pouco diárias de Francisco Seixas da Costa
quinta-feira, agosto 21, 2025
"A Arte da Guerra"
quarta-feira, agosto 20, 2025
Primakov e a NATO
"Ainda hoje de manhã, na reunião da NATO, disse ao ministro Gama que vocês organizaram uma excelente cimeira da OSCE, em Lisboa, há poucos dias. Se soubermos trabalhar à luz do que ali foi decidido, as coisas na Europa podem vir a correr muito bem". Quem me dizia mais ou menos isto, naquela noite de 11 de dezembro de 1996, era Yevgeni Primakov, ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, onde Boris Ieltsin era então presidente. Eu acabara de ser-lhe apresentado, antes do jantar.
Fazer a paz e fazer as pazes
terça-feira, agosto 19, 2025
Sem surpresas
Era expectável que Trump excluísse a possibilidade de colocar tropas americanas na Ucrânia, inseridas numa eventual operação de paz. O ambiente na América para qualquer aventura "boots on the ground" é nulo. A "participação" de que Trump falou deve ser no quadro da monitorização.
Chegou o carteiro
Trump disse que não gosta do voto por correspondência. Eu também não, mas reconheço que, em certas circunstâncias, é difícil evitar esse mecanismo.
Vistas
Alexander Stubb, atual presidente da Finlândia, que eu e vários diplomatas portugueses conhecemos bem há mais de 30 anos, percebeu tudo muito rapidamente: "I should think that Russia’s view of security guarantees is quite different from our view.”
Aliás, Maria Zakharova, a porta-voz de Moscovo foi clara: “Russia categorically rejects any scenario that envisages the appearance in Ukraine of a military contingent with the participation of NATO countries.”
Local
Em cada rotunda do país, há uma mão cheia de cartazes para as eleições autárquicas. Quando se fala de "confiança", quase sempre isso significa pedir o voto para quem já está no poder. Já a "mudança", que também enxameia a propoganda, é para tentar isso mesmo.
segunda-feira, agosto 18, 2025
Prova de força
Trump é um visível ignorante em termos geopolíticos. Diz barbaridades simplórias sobre coisas complexas. Mas sabe duas coisas verdadeiras: que, até ver, ninguém tem mais poder do que a América e que as armas nucleares são a chave de poder de qualquer potência que se preze.
De caras
Salvo no caso de Merz (a BlackRock ensinou-o a fazer "cara de poker"), o olhar dos líderes europeus à volta de Zelensky refletiu o desespero coletivo depois do encontro com Trump. Todos desprezam Trump, todos o temem, todos acabarão por fazer o que ele quiser. E ele sabe isso.
Duas Américas
Não há uma única América, estão os europeus a aprender. Houve uma América que levou a Europa a pensar que era possível trazer a Ucrânia para o "lado de cá", a fazer parte da sua fronteira de segurança. E há esta.
Lembrar Kekkonen
Na conversa com Trump, Alexander Stubb, presidente da Finlândia, lembrou o "modus vivendi" que o seu país encontrou com a Rússia no termo da 2 ª Grande Guerra. Há uns anos, a Rússia talvez tivesse aceitado a "finlandização" da Ucrânia. Agora é tarde.
Ai Europa!
Um dos momentos mais patéticos da reunião à mesa entre Trump, Zelensky e os líderes europeus foi o elogio feito pelo presidente americano a Ursula von der Leyen, pelo resultado na negociação comercial entre os EUA e a União Europeia. Foi um esmerado encadernar de um "diktat".
Estejam atentos
Não excluo poder estar enganado, mas ver os europeus (já) empenhados na discussão das garantias de segurança para uma futura paz na Ucrânia parece significar que dão por adquirida a "troca" de territórios.
E a outra paz?
O Comité Nobel ficaria na História se, por uma vez, mudasse o seu método de trabalho e anunciasse: Trump será prémio da Paz se obrigar Israel a aceitar o Estado Palestino e, até lá, facilitar a gestão de Gaza por uma entidade internacional neutral. E que, sem isso, nada feito!
Táticas
O tom de Gouveia e Melo contra Luís Montenegro, por causa dos incêndios, pode vir a custar-lhe algum eleitorado "laranja". Que contas estará o almirante a fazer?
A autonomia de Zelensky
A única coisa óbvia é que o facto de Zelensky ir em companhia europeia ao encontro de amanhã com Trump amanhã é algo significativo. Depois, cada um infere o que lhe apetece.
A estamina de Trump
Qualquer que seja a opinião que possamos ter da personagem Trump, uma coisa é certa: o homem tem uma estamina física notável para a idade. Estar na berlinda e a falar quase todos os dias para a imprensa é obra! É claro que o "doping" do desejado prémio Nobel faz milagres!
domingo, agosto 17, 2025
Portugal e Israel
sábado, agosto 16, 2025
Alasca 4
1. Putin conseguiu evitar que Trump lhe impusesse um cessar-fogo, que de todo não lhe convinha, porque perdia o ímpeto ofensivo e, essencialmente, permitia à Ucrânia refazer o seu dispositivo militar. Foi a grande vitória russa em Anchorage.
2. Putin não vai conseguir que Trump pressione os europeus a deixarem de armar a Ucrânia, porque o negócio de armas americano é um lóbi demasiado forte. Provavelmente, vai ter de viver com isso. Além disso, a "desmilitarização" da Ucrânia não é concebível.
3. A próxima e muito difícil "batalha" de Putin é garantir que os europeus não colocam tropas na Ucrânia, para as famosas "garantias de segurança". Trump já lhe fez "meio favor", ao dizer que retiraria as garantias NATO. Mas Putin nunca aceitará "boots on the ground" europeias.
4. Se Trump conseguir impor a Zelensky a entrega à Rússia do terço restante de Donetsk, a Ucrânia perderia cinco áreas fortificadas vitais, criadas depois de 2014. Para a Ucrânia, significaria a "entrega dos pontos". Parece-me muito difícil que isso aconteça.
5. Putin poderá viver facilmente com as linhas da frente que existem hoje em Zaporizhia e Kherson. Ao que se sabe, é sua cedência para recuperar o resto de Donetsk. Se o conseguisse, seria um excelente negócio, não perdendo a central nuclear de Zaporizhia.
6. Putin quer obter dos EUA uma recusa formal à possibilidade de entrada da Ucrânia para a NATO. Trump pode dar-lha, mas é duvidoso que consiga blindar o futuro. Um estatuto de neutralidade da Ucrânia, no modelo austríaco, não parece possível.
7. No atual estado de coisas, é implausível que Trump venha a tentar impor aos europeus uma "arquitetura de segurança" que acomode uma revisitação das "root causes" que Putin continua a referir, isto é, a reanálise das fronteiras NATO pós 1997.
8. Não é concebível que, se os EUA conseguirem pilotar até ao fim um processo de paz, não venham a ser conduzidos a levantar as sanções à Rússia. Nada indica, contudo, que venham a conseguir que os europeus procedam de idêntica forma.
9. Parece ser muito difícil aos EUA, por muito boa vontade que tenham para com Putin, conseguir desmantelar os mecanismos jurídicos internacionais entretanto levantado contra este e contra a Rússia. Mas o acesso aos mecanismos de transações financeiras é plausível.
10. Para além dos ganhos territoriais "de facto" (será difícil serem "de jure"), a grande vitória da Rússia na Ucrânia, para além de não ter de pagar quaisquer indemnizações, seria a substituição de Zelensky. A Europa terá aqui a sua real prova de força, ou de fraqueza.
11. É óbvio que o efeito Nobel anda na cabeça de Trump, a propósito da Ucrânia. Isso será um fator de aceleração da sua vontade. Se Zelensky e os europeus (que Trump acusará de influenciarem uma provável recusa ucraniana do seu plano) se opuserem, vai ser o bom e o bonito...
12. No entanto, tudo o que escrevi vale o que a realidade vier a confirmar ou a infirmar.
Alasca 3
Como Trump pensava antes do Alasca:“I want to see a cease-fire rapidly,” he said. “I don’t know if it’s going to be today. But I’m not going to be happy if it’s not today.”
Como Trump pensa depois do Alasca"It was determined by all that the best way to end the horrific war between Russia and Ukraine is to go directly to a Peace Agreement, which would end the war, and not a mere Ceasefire Agreement, which often times do not hold up".
sexta-feira, agosto 15, 2025
Alasca
Para a Rússia, o pior resultado que poderia ter saído de Anchorage seria uma pressão americana para um cessar-fogo. A ocorrer, este travaria o seu ímpeto no terreno e daria tempo à Ucrânia para se reconstituir militarmente com apoio ocidental.
Está por saber se Putin fez alguma promessa de moderação das suas atividades ofensivas, correspondendo a recentes desabafos desagradados de Trump sobre a escalada militar russa, ao provocarem vítimas civis.
A ameaça de sanções secundárias a parceiros comerciais russos terá desaparecido do horizonte imediato, o que é uma excelente notícia para a Índia. Nunca acreditei que os EUA chegassem a esse ponto com um parceiro tão importante para impedir a mão livre da China nos Brics.
A acreditarmos - e eu acredito - na sua obsessão infantil sobre o Nobel da Paz, Trump não vai deixar "cair a bola" e vai querer resultados rápidos, para provar que é o "dono da bola". Posso estar enganado, mas Zelensky e os seus aliados europeus vão ficar agora sob forte pressão.
quinta-feira, agosto 14, 2025
Ganda Estebes!
quarta-feira, agosto 13, 2025
Lições da estatística
"Peace agreements rarely end wars, making it important to set expectations for Ukraine peace negotiations. Only 16 percent of interstate wars after World War II ended in a peace settlement. Roughly 21 percent ended with a decisive military victory by one side, while another 30 percent ended with a ceasefire as the warring sides faced a military stalemate but failed to reach a formal settlement". (Seth G. Jones, CSIS)
Olha a meta!
As presidenciais começam a assemelhar-se ao último quilómetro de um sprint. Todos olham para todos, há quem desista, quem mostre que poderá ir ao despique, quem dê a "sapatada" que o anuncia já a caminho da meta e até ressurgem alguns lançados de trás, a fazer prova de vida.
Diplomatas de Abril
O "documento dos nove" tinha sido publicado no dia 7 de agosto, trazendo para a Revolução de Abril uma leitura mais moderada do que aquela que ainda prevalecia no plano político. É que, no dia seguinte à divulgação desse manifesto, tomou posse o V Governo Provisório, o último sob a chefia de Vasco Gonçalves. Duraria pouco mais de um mês.
É óbvio que a última coisa com que a imprensa da época se preocupou foi com o facto de, no dia 13 de agosto, terem tomado posse, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, as primeiras mulheres diplomatas. Até então, era-lhes vedado o acesso à carreira. Havia sido um ministro dos Negócios Estrangeiros chamado Mário Soares quem, um ano antes, decidira acabar com essa anomalia.
O primeiro concurso para novos diplomatas, após o 25 de Abril, foi aberto e anunciado em 13 de novembro de 1974. A partir dessa data, ao longo de meses, tiveram lugar as múltiplas provas escritas, orais e "de apresentação". No seu termo, de entre largas centenas de candidatos, foram escolhidos 43 novos diplomatas. No total, foram admitidas nesse concurso 11 mulheres. A posse foi feita em duas levas: 24 no dia 13 de agosto de 1975 e 19 no dia 1 de julho de 1976.
A "Visão" desta semana traz uma memória desse concurso, a que junta um depoimento do professor Aníbal Cavaco Silva que, com Joaquim Mestte, foi um dos dois examinadores externos ao MNE que integraram o júri de acesso.
Aqueles que tomaram posse nesse primeiro dia, há precisamente 50 anos, juntaram-se hoje num belo almoço de confraternização. Conseguiu-se juntar 17 das 24 pessoas então admitidas. A lei da vida levou, entretanto, seis de entre nós e um impedimento obstou à presença de um outro colega. Deixo a imagem desses 17 diplomatas - melhor, desses sempre "novos" diplomatas...
Falemos claro
Aquilo que a legislação impõe como ações preventivas para evitar os incêndios é cumprido? Claro que não. Mas, se fizerem as contas, constatarão que, incúria à parte, não há em geral condições de viabilidade económica que permitam aos proprietários levarem à prática essas regras.
terça-feira, agosto 12, 2025
A lasca
Quando, em 1979, cheguei à Noruega, meu primeiro posto diplomático, a aprendizagem da língua portuguesa fazia-se na Universidade de Oslo, num minúsculo departamento dependente da secção espanhola, como frequentemente acontece. Era seu responsável o professor Kåre Nilsson que, nesse mesmo ano, lançou o primeiro dicionário de Norueguês-Português.
Antes do Alasca
Parece haver importantes avanços militares russos nos últimos dias na frente ucraniana. Pode ser só uma coincidência, mas o "timing" decidido por Trump para a reunião no Alasca parece ajustar-se à perfeição ao interesse essencial russo. Quem é amigo, quem é?
O Alasca
Já dormi (numa tenda militar!) a norte do Círculo Polar Ártico, mas nunca fui ao Alasca, que anda por essas bandas. Confesso que a minha curiosidade sobre aquele que é o maior estado dos EUA se resumiria à possibilidade de conhecer a cidade de Anchorage, o seu aeroporto (por razões históricas que eu cá sei) e de poder ter oportunidade de olhar, do lado "de cá", o estreito de Bering, o que seria mais complicado. Sou muito dado a fazer "vezinhos" em algumas geografias, nem sempre as mais óbvias e populares. Mas também já me resignei a ser modesto nas minhas ambições nesse domínio.
segunda-feira, agosto 11, 2025
Pousio
Os comentários a este blogue andam muito agitados. Em lugar de ter de os selecionar, acho mais avisado suspender a sua aceitação. Até ver.
Os trabalhos do Luís
Sabemos que é mais agradável aparecer apenas a público nas ocasiões positivas, imagino que reste ainda alguma memória traumática do patético incidente com o helicóptero, mas seria simpático o senhor primeiro-ministro vir a terreno mostrar solidariedade com as populações afetadas pelo fogo. Pense nisso!
Notícias da paz (4)
Será um teste para a independência do Comité Nobel norueguês o modo ira atuar face à pressão para galardoar Donald Trump. Se Trump viesse a ser escolhido, quase absolveria o viés do comité sueco, quando, em 1953, deu um inenarrável Nobel da Literatura a Churchill.
Notícias da paz (3)
A entrega de um território em disputa entre dois países para exploração por parte de empresas americanas, protegidas por forças militarizadas próprias, é, sem a menor dúvida, uma iniciativa original. Dá mesmo um novo e mais prático sentido à expressão "negociar a paz".
Notícias da paz (2)
Há qualquer coisa de potencialmente muito contraditório entre o que parece serem as bases de um acordo americano-russo sobre a Ucrânia e a preservação da face, não apenas de Zelensky, mas igualmente dos seus principais aliados europeus.
Notícias da paz
Um dos fatores que, até há pouco tempo, ninguém tinha em grande conta no processo negocial sobre a Ucrânia era o desejo, narcísico e quase infantil, que Trump tem de obter o Prémio Nobel da Paz - proposta já apresentada por um eventual criminoso de guerra e alguns autocratas.
domingo, agosto 10, 2025
A Volta
António Filipe
António Filipe, um homem sério que merece o respeito de muita gente à esquerda, não pode ser o candidato de quem não quer ver em Belém um presidente de direita, fardado ou não, por uma razão muito simples: numa eleição presidencial vota-se em quem tem possibilidades de ser eleito
Anexar ao processo
sábado, agosto 09, 2025
"A Arte da Guerra"
Nós e Israel
Adquira a "Visão" e ajude à sobrevivência de uma revista que foi e é um marco no jornalismo português.
Regresso da praia
"Espíritos zainas e marranicas"!
sexta-feira, agosto 08, 2025
Pimba!
Bela resposta do Tribunal Constitucional a um gesto de cedência xenófoba do governo, apenas para agradar à extrema-direita e tentar não perder o eleitorado preconceituoso das "perceções".
A solução final
É mais ou menos isto
O pessoal no poder anda deslumbrado e tenta apressar o receituário liberal, soprado por jovens turcos (e outros já menos jovens) das "business schools". O truque é comprar a extrema-direita com medidas xenófobas no "ar do tempo", em troca do apoio no desmantelar do Estado social.
Façam as contas
Os números de Gaza começam a aproximar-se da estimativa mais baixa de Hiroshima. E não foi preciso incomodar ninguém em Dimona.
Os Inglusos
Formam uma raça à parte, uma espécie de casta, embora pálida e sem turbante. Representam-se como o genérico lusitano de uma elite. Não se juntam muito entre si, porque são de tempos diferentes ou porque os feitios e os afetos os fizeram conflituar e, vá lá!, porque todos têm o individualismo como o único modo filosófico de vida que é "bem" adotar.
quinta-feira, agosto 07, 2025
Morreu o último ministro de Salazar
Almeida Costa tomou posse como ministro da Justiça em 22 setembro de 1967. Foi reconfirmado no cargo por Marcelo Caetano, em 27 de setembro de 1968. Deixou o cargo em 7 novembro de 1973. Foi presidente da Câmara Corporativa de 16 de novembro de 1973 até ao 25 de Abril.
quarta-feira, agosto 06, 2025
Lições do Tio Sam
Ver Trump e a sua camarilha, agressores diários da separação de poderes e da liberdade dos media, incentivadores de conspirações violentas contra a democracia, virem acusar as libérrimas instituições brasileiras de abusos de poder seria caso para gargalhada se não fosse trágico.
Não me convinha...
terça-feira, agosto 05, 2025
Índia
Estejam atentos. Uma chave determinante para o futuro do sistema geopolítico global chama-se Índia. O que vier a ocorrer em torno da evolução da posição desse país, na sua relação com os EUA, a China e a Rússia, num prazo muito curto, será relevante muito para além das suas fronteiras. Repito: estejam atentos.
segunda-feira, agosto 04, 2025
O Hamas e as vítimas
As crianças devem morrer à fome em Gaza como forma de castigar o Hamas? Mas então não era ponto assente que o Hamas não tinha legitimidade democrática e mantinha a população de Gaza debaixo de coação, sob um regime de violência e medo? Se assim é, que culpa tem a população?
De costas direitas
Ao ouvir ontem, pela milésima vez, o "senta-te direito!", lembrei-me do Tenente Podre. O meu pai, nativo de Viana do Castelo, que teve um doce exílio em Vila Real durante 60 anos, levou consigo para lá um montão das suas histórias de infância e juventude, que passaram a fazer parte do património de uma memória que não vivi. Às vezes, falava no Tenente Podre.
O Tenente Podre não se chamava assim. Era conhecido com essa designação porque, rezavam as crónicas, cheirava em regra mal, provavelmente por défice crónico de lavagem corporal, detetável por quem com ele se cruzava nas ruas. Tinha sido da arma de Cavalaria, mas o facto de não ter passado daquela patente, já na fase avançada da vida em que o meu pai o tinha conhecido, fazia presumir que a sua carreira castrense não fora por aí além.
Casado com a Dona Miquelina (do que eu me lembro!), o Tenente era conhecido por usar para com ela expressões tributárias da sua especialidade militar. No Café Bar, para lhe pedir o açúcar, ficara famoso o seu: "Ó Miquelina, dá aí um coice no açucareiro!". Na Bandeira, a caminho da casa, que parece que era perto da Capela das Almas, se a cônjuge se adiantava na passada, atirava-lhe, à distância: "Ó Miquelina, parece que vais com o freio nos dentes!"
O Tenente e a Miquelina tinham uma filha solteira, a Ilda. Dizia o meu pai que a pequena, já entradora numa então preocupante trintena de anos, passava bastante ao largo da formusura e que o decurso do tempo não parecia ajudar a que arranjasse um par que a fizesse desamparar a casa paterna. A Ilda tinha por mau hábito, ao andar, inclinar-se um pouco para a frente. O Tenente, pressentindo que essa atitude corporal poderia agravar a já de si escassa atração de pretendentes, volta e meia berrava-lhe, com voz de parada: "Ó Ilda! Põe-te tesa!"
Há que convir que entre o "senta-te direito!", que vou ouvindo cá por casa, e o "põe-te tesa!" que a Ilda escutava do pai militar não há, salvo no estilo, um oceano de diferenças. Em ambos os casos, é tudo por boas causas.
O serviço na restauração turística
domingo, agosto 03, 2025
sábado, agosto 02, 2025
sexta-feira, agosto 01, 2025
Ulster
Leis
Marcelo Rebelo de Sousa, com algumas decisões sobre diplomas governativos, avisa Luís Montenegro de que, em São Bento, existe um executivo que é apenas minoritário, pelo que não pode "armar-se" em maioritário na atitude, em especial quando legisla sobre temas altamente polémicos.
Democracia. Ponto
Ouvi há pouco uma declaração deliciosa: "Não me venhas com essa conversa ideológica da 'democracia liberal'. Democracia é democracia, não precisa de adjetivos. Não estraguem a democracia com qualificativos que só afetam o seu bom nome."
"Chapeau!"
Velhos são os brancos!
O governo nomeou João Soalheiro com presidente do Instituto do Património. Não conheço o senhor, mas conheço o Soalheiro Vinhas Velhas (bebam bem fresco!), pelo que me parece um nome adequado para tratar de coisas antigas.
Ah! Pois é!
A Finlândia comemora um ano sem mortes nas estradas. Imagino o comentário dos nossos aceleras, à conversa, a atestar uma bejeca à porta de uma loja de "tunning": "Aquela malta não pisa o pedal nas estradas e depois queixa-se: tem depressões e suicida-se. Vai dar ao mesmo."
A "Visão"
Sou um "teimoso" leitor da "Visão" desde o seu primeiro número, em 1993, ao tempo de Carlos Cáceres Monteiro. Creio que nunca deixei de adquirir qualquer das suas edições, tendo mesmo passado a ser seu assinante, na última meia dúzia de anos, precisamente para reforçar o meu apoio ao seu excelente jornalismo.
Custa-me imenso encarar a hipótese de perder esta "news magazine", que nasceu da escola de "O Jornal" e que fez par com outras publicações do antigo grupo, onde também se destaca o magnífico "Jornal de Letras", este sob a batuta do meu amigo José Carlos de Vasconcelos, a quem também mando um forte abraço.
quinta-feira, julho 31, 2025
Devolvam-me o Ras!
Mas a que propósito vem isto? É que pressinto no ar uma imensa jogada de discriminação política e étnico-cultural, um pouco subtil deliberado de esquecimento de alguém que, desde a minha juventude, me tinha habituado a ter entre os íntimos, essa insigne figura que sempre foi o chefe etíope Ras. Foram décadas em que fui acompanhado pelo Ras. Agora, nem a mais medíocre folha pseudo-informativa do interior se digna lembrar esse nome histórico do cruzadismo. Há, manifestamente, uma conspiração contra a Etiópia! Não há vergonha! A terra do Preste João, do Negus, do Abebe Bikila! Devolvam-me o Ras, por favor!
quarta-feira, julho 30, 2025
Mau, Maria!
A política externa não é uma coisa "de modas", mas de princípios. Não se vai "por aqui" ou "por ali" apenas porque os outros países vão nessa direção. Se vier a reconhecer a Palestina agora que outros o fazem, Portugal não passará de uma "Maria vai com as outras" ... se as outras forem. O comodismo é muito triste!
O preço dos vinhos
Um garrafa, num restaurante, nunca custa o mesmo que, pelo mesmo produto, nos é pedido numa loja especializada em vinhos ou numa grande superfície. É uma ingenuidade pensar que um restaurante teria a obrigação de cobrar, por uma garrafa, um preço similar àquele pelo qual ela é vendida no comércio de rua. No vinho, como em qualquer outro produto que comercia, o restaurante cobra sempre um diferencial: com ele paga o investimento da aquisição, os custos do serviço, os salários, os encargos de estrutura (rendas, empréstimos, etc) e, naturalmente, o lucro legítimo que o proprietário retira do seu negócio.
A minha experiência mostra-me que, nos vinhos mais baratos, o multiplicador normal é três vezes superior ao custo em loja, nos vinhos topo de gama um mínimo de duas vezes mais e, nos vinhos intermédios, 2,5 vezes. Mas há restaurantes que praticam multiplicadores bem maiores. Resta ainda acrescentar que, sendo o preço base, para os nossos cálculos, o valot comercial em loja, é preciso ter em conta que os maiores restaurantes compram os vinhos que vendem, em regra, nas empresas distribuidoras, que praticam uma tabela de preços mais baixa. Assim, o seu lucro é ainda maior. Nos vinhos pouco conhecidos, de produtores independentes ou com marcas novas, alguns restaurantes fazem o que muito bem entendem, o mais das vezes à nossa custa...
Como frequentador regular de restaurantes, sigo o princípio de ter sempre presente os preços médio de três ou quatro marcas vulgares de vinhos (sempre com atenção ao ano), no Pingo Doce ou no Continente, comparando-os depois com aquilo que me apresentam na lista de vinhos do restaurante. Até três vezes o preço em loja, acho razoável; mais do que isso, entendo ser um exagero. E a minha apreciação do restaurante "ressente-se" disso, nos conselhos que depois dou aos amigos. Um critério que também sigo é o uso da "app" "Vivino", que permite "fotografar" os rótulos e nos indica, de imediato, o preço médio em loja do vinho.
segunda-feira, julho 28, 2025
Trump 15 - Europa 0
Conheço alguma coisa de negociações internacionais para ousar ter um juízo simplista sobre o resultado da negociação comercial que, aparentemente, terá ontem ficado concluída entre os EUA e a União Europeia. (Escrevo "aparentemente" porque, com Trump, nada é seguro). Quero com isto dizer que não tenho a certeza de que uma qualquer outra equipa negocial europeia tivesse conseguido fazer melhor, nas atuais circunstâncias. Mas uma coisa é bem clara e não pode ser iludida: tratou-se de um "diktat" e o resultado é brutalmente desequilibrado em desfavor da Europa. A acrescer aos direitos aduaneiros impostos (que devem ser comparados com os atuais, não com o pior cenário, como desonestamente Bruxelas está a fazer), a Europa comprometeu-se (ainda não percebi bem como, dado que não se trata de uma competência comunitária) a comprar gás e petróleo aos Estados Unidos, bem como "enorme quantidade" (Trump dixit) de equipamento militar. Se alguém tinha pensado que o aumento exponencial de verbas orçamentais que vai passar a ser dedicado à defesa, aprovado no quadro NATO sob pressão americana, se destinava a reforçar as indústrias europeias e a contribuir para vir a obter a famosa "autonomia estratégica" do continente, pode tirar já o cavalo da chuva, antes que ele se constipe. Os europeus, que desde há três anos vivem atarantados com a ideia de que a Rússia pode "chegar com os tanques à praça da Concórdia", para recuperar uma célebre mitologia de 1981, entregaram-se agora por completo à vontade de Washington. Nada de novo, convenhamos, salvo esta humilhação alfandegária. Era possível fazer melhor? Não sei e, com total franqueza, duvido que fosse. Mas que o resultado é péssimo, disso não tenho a menor dúvida. E há que assumi-lo, sem querer fazer de nós parvos.
domingo, julho 27, 2025
"Bonito 7!"
"Le Tour"
A Volta à França de 2025 acaba hoje, com a clássica chegada aos Campos Elísios, em Paris. Há pouco, por curiosidade, olhei o desenho das etapas e, porque andava distraído, reparei, pela primeira vez, que o "Tour" anda aos saltinhos, havendo uma regular descontinuidade entre os vários percursos diários. Deixo dois mapas comparativos da prova de hoje com a de, por exemplo,1939.
Nuno Portas
Aos 90 anos, morreu agora Nuno Portas, figura maior da arquitetura portuguesa mas, igualmente, da reflexão e da intervenção na dimensão social do urbanismo, setor de que iria ser o primeiro governante em Portugal, logo após o 25 de Abril.