sábado, outubro 25, 2025

O filósofo do olhar


Tínhamos falado pelo telefone, há meses. Conheci-o há dois ou três dias. Queria fazer uns retratos meus para integrar numa exposição que vai organizar. Como me tinha lido, na véspera, a gabar-me de ter comido uma dúzia de castanhas assadas em menos de 24 horas, disse-me para não me esquecer de levar algumas para a sessão fotográfica. 

Cheguei lá de mãos a abanar. Não há castanhas assim à mão de semear por essa Lisboa. Fomos falando, à medida que a máquina ia disparando. Depois, a surpresa. Já tive muitas fotografias de estúdio na vida, mas nunca ninguém me tinha dito, a certo passo, para ir dizendo mentalmente um poema, enquanto estava a ser fotografado. Não era preciso declamar, bastava "falá-lo" interiormente. Que poema escolhi? "As mãos". Ontem, mandou-me uma fotografia: "Escolheu Manuel Alegre e no instante certo o cabo disparador foi accionado. Eis o resultado!" É curioso: aquela imagem, que guardei, ficará sempre associada ao poema que então eu dizia para dentro. Passa a ser uma fotografia com moldura poética.

Horas depois enviou-me outra. Nessa, eu estou com um olhar estranho. Disse-lho. Retorquiu, por mensagem: "O retrato capta quem somos, quem podemos ser, quem estamos quase a ser e também o que poderíamos ser". Caramba! Retratos assim poucos se podem dar ao luxo de ter. Só os não reproduzo aqui, como fui autorizado a fazer, porque não.

O retratista chama-se Veríssimo Dias. Teve uma vida por mundos que já foram outros, nota-se que adora o que faz, embora a sua faina profissional de base fosse distante da fotografia. Talvez por isso, faz esta magnificamente, de forma leve, natural, com um rigor suave, por onde perpassa um sentido estético de exigência. 

Às vezes, a vida ainda nos surpreende. Foi o caso.

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