quarta-feira, outubro 22, 2025

Balsemão



Não pretendo fazer aqui um obituário completo de Francisco Pinto Balsemão. Outros o farão bem melhor do que eu. Deixarei apenas algumas notas pessoais.

Com a morte de Balsemão, desaparece alguém que era a personalidade viva mais destacada de quantos fizeram a transição entre o período mais aberto da ditadura com os mais de cinquenta anos de democracia que lhe sucederam.

Desde que começou a ter atividade política, Balsemão mostrou sempre ser um democrata, pelo que a sua entrada no regime que saiu do 25 de Abril se fez com total e indiscutível naturalidade.

Deputado da União Nacional (mas não da sua sucessora, a Ação Nacional Popular), soube, com imensa dignidade, tal como Sá Carneiro, afastar-se de Marcelo Caetano, para não servir de alibi liberal (a palavra liberal tinha, por essa altura, bom nome e era usada na aceção anglo-saxónica) a um regime autoritário que recusava devolver a liberdade ao país. Balsemão bateu com a porta e isso dignificou para sempre a sua história pessoal.

Para mim, contudo, quase tão importante como o político, Francisco Pinto Balsemão acabou por ser o notável criador, ainda em 1973, dessa "pedrada no charco" no jornalismo português que foi o "Expresso". Balsemão nunca escondeu a sua costela de jornalista e acho que sempre considerou essa faceta como um dos aspetos centrais da sua vida. Devemos-lhe também a SIC e, com ela, um grupo de comunicação social, a Impresa, que, nos dias de hoje, estará, ao que se sabe, a atravessar tempos muito difíceis.

Ao longo da vida, cruzei-me muitas vezes com Francisco Pinto Balsemão, com quem criei uma excelente relação pessoal e a quem só devo simpáticas atenções. Quando passei pelo governo, conversámos muitas vezes sobre as implicações europeias do negócio mediático, tema que o apaixonava e em que se tornou um especialista. Em 2012, ambos fizemos parte do grupo de trabalho, nomeado pelo governo, que preparou o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, para vigorar na década seguinte. Depois, ambos trabalhámos, por alguns anos, num conselho consultivo dentro da Universidade Nova de Lisboa, por ele presidido. Há tempos, quando lançou, na cidadela de Cascais, uns encontros anuais de reflexão estratégica, teve a simpatia de ser o moderador da sessão de abertura do primeiro desses debates, sobre a Europa e o mundo, entre Carlos Moedas e eu. A seu convite, tive o gosto de apresentar no ISCTE um livro de que foi co-autor com o político cabo-verdeano José Maria Neves. Salvo raras ocasiões sociais, vimo-nos pouco desde então.

A democracia portuguesa fica de luto, com a morte de Francisco Pinto Balsemão. Digo-o com a maior sinceridade e respeito. Quem me conhece sempre me ouviu afirmar, desde há muitos anos, que ele era das escassas personalidades da direita portuguesa em quem eu poderia ter votado para Presidente da República.

Deixo as minhas condolências à família de Francisco Pinto Balsemão.

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