sexta-feira, setembro 11, 2015

Pensão completa?


Há tempos, um amigo referia-me o facto de ter pretendido obter alojamento em algumas pequenas unidades hoteleiras da Região do Douro e ter verificado que muitas delas não dispunham de quaisquer lugares vagos, fosse para que data fosse. Disse-me ter-lhe acontecido o mesmo em algum turismo de habitação e turismo rural, já noutras regiões. E explicou-me que isso não ocorria apenas no verão, como seria natural, mas ao longo de todo o ano.

Congratulei-me, naturalmente, com o facto da nossa ocupação hoteleira viver um período de alta, de haver uma crescente procura de zonas do país que fogem ao conceito do "sol e praia". Muitos estrangeiros estavam, por fim, a perceber que, neste canto da Europa, existe a oferta de um produto turístico de qualidade, com diversidade cultural e monumental, servido por uma excelente rede viária, muito pouco "viciado" no modelo de exploração intensiva que "matou" outras regiões, com espaços naturais preservados, com uma diversidade gastronómica e vinícola muito rara, tudo isto cumulado por um acolhimento pessoal quase sempre de grande simpatia. Graças também a fatores externos que nos ajudam, Portugal está "na moda" e é preciso apoiar e estimular esse movimento.

Esse meu amigo logo arrefeceu, contudo, o meu entusiasmo. De facto, tudo isso era verdade, só que muitas dessas pequenas unidades hoteleiras, afinal, estavam, na prática, vazias. Vazias? Ao que ele constatou por mais de uma vez, ao contactar mais de perto muitos desses espaços, alguns proprietários mantêm essas unidades sem a menor utilização turística, ficcionando a sua ocupação apenas para justificarem os fundos que receberam para a construção ou remodelação das casas.

Ao longo das últimas décadas, já tinha ouvido falar de casos semelhantes: solares, casas antigas e muitas unidades de turismo rural cuja reconstrução tinha sido feita com dinheiros públicos (sim, porque as verbas da União Europeia são verbas públicas), numa ajuda que tinha como contrapartida obrigatória aumentar a oferta hoteleira regular mas que, na realidade, apenas serviram para alguns "empocharem" essas ajudas, comporem as habitações e, depois, manterem-nas comodamente vedadas ao uso turístico.

A pergunta que eu faço é muito simples e gostava de para ela poder ter uma resposta de quem de direito. É feito um acompanhamento do modo como as casas que foram construídas ou remodeladas com fundos públicos cumprem a sua obrigação de se manterem permanentemente abertas à utilização de potenciais utentes? São feitas inspeções regulares sobre as taxas de ocupação? É que se casas estão sempre assim tão "cheias", então quero crer que a receita fiscal deve ser bem significativa. Ou não?

(Artigo que hoje publico no "Jornal de Notícias")

11 comentários:

Anónimo disse...

Pois é! Já dizia a minha avó: "Há muitas formas de matar pulgas". E até que não seria difícil fiscalizar essas "empresas" de como decorrem os seus negócios após terem recebido os dinheiros para as obras que, agora, aproveitam sim, mas para a sua habitação permanente sem... sem hospedes que trariam receitas ao Estado.

Isabel Seixas disse...

NA MOUCHE Senhor Embaixador...
Não me diga que só agora deu conta...

Pois foi, os orçamentos inflacionados para os 50% dos subsídios cobrirem os 100% dos custos e mais alguns extras e se ouvir esses empresários gestores e administradores de chico espertice, ostentam discursos progressistas e de pseudo honestidade em sacar dinheiros de interesse público só para os seus interesses privados, a única alegria que me resta é que a maioria dos que eu conheço vota PSD e vá-se lá saber porquê alegam ser como Deus(deles)quer...

Reaça disse...

Só venho aqui pela palavra "empochar"porque essa estória do turismo rural já é velha de mais de 20 anos pelo país rural inteiro.

Empochar, diz no dicionário, embolsar.

Anónimo disse...

A maioria vota PSD e a minoria? Estas "sondagens" à "boca da esplanada" são um espetáculo!
Claro que os fundos comunitários serviram para "estas coisas" desde sempre e o turismo rural é um caso como bem sabemos.
O que me preocupa no Douro é, com "estas coisas", transformarem-no num resort, expulsarem os viticultores com a vivência humana envolvente e adulterarem o vinho generoso para "mixordices" apelidando-o de "Porto". Mas é para onde vai agora que os viticultores foram deitados à sua sorte!
Tenho quase a certeza que já há muito pouca gente que sabe (provou) o que é vinho tratado.
O Duriense

Anónimo disse...

Embaixador, por acaso já ouço falar nisso tem cinco ou seis anos. N a minha opinião seria assim: eu faria uma penhora sobre essas ditas casas de turismo rural até existir uma devolução com juros de todos os subsidios. Para além disso ainda constituiria como arguidos os donos em processo crime. Mas claramente tudo isto só tem sido possivel devido a um regime burguês, em que claramente esta gente se incorpora e onde não existe ninguém para fiscalizar, aliás como relativamente aos Bancos.Há muito que digo que muita gente que apareceu endinheirada desde os meados da década de oitenta foi só com base em falcatruas e roubos gigantescos, são os chamados "Chico esperto". Andam alguns mais interessados de quem ganhou o debate dos monos e não se preocupam com estas coisas.

Portugalredecouvertes disse...

lembra-me ter lido que a PAC pagava subsídios aos proprietários agrícolas
ainda que esses terrenos estivessem inativos, até em países ricos da UE
e que há tentativas para que essa situação mude ou já terá mudado ?!

Anónimo disse...

Há um caso semelhante em São Paulo, uma "mansão" reformada com o dinheiro dos portugueses e das empresas portuguesas e que serve apenas para o consul dormir como um marajá....Isto, quando o Consulado de Portugal em São Paulo fica apenas a alguns metros e serve perfeitamente para recepções, jantares e eventos de todo o tipo. Mas Portugal, como país rico, não precisa de poupar ou de esforços exagerados "além da Troika"....

Unknown disse...

Um amigo recebeu umas lecas de fundos, remodelou a casa, fez a piscina e vive aparentemente em grandes investimentos com a gestora bancaria(onde passa horas a estudar cenários); chama-se investimento criativo;não era assim o investimento nos tempos aureos de 2008-20111 ?

Jose Martins disse...

Senhor Embaixador,
Alguns portugueses são isto!!!
Dizem que alguns até se servem dos Fundos Públicos para comprarem uma "bomba" de 4 rodas.
Esses alguns são uns sacaninhas "vigaristas" e uns Zéses Penicos.
Os portugueses para serem uns cidadãos porreirinhos devem comer meia sardinha colocada numa fatia de pão e "lambada" no costelado!
Saudações de Banguecoque

ECD disse...

Numa versão um pouco mais trabalhosa é, na sua lógica a mesma do subsidio ao girassol. Plantas x has, deixas ficar e depois recebes x seja muito, pouco ou nenhum o girassol colhido. Curioso ou não, aqui na charneca ribatejana a caminho do Alentejo muitos dos que receberam pelo girassol tb se tornaram nestes últimos anos empresários de turismo rural. Alguns tão malandros que nunca se deram à maçada de angariar um cliente, alias com o tempo as placas com setas indicando turismo rural caíram e sumiram-se nas ervas.

Anónimo disse...

António Cristóvão, acha que os "investimentos áureos" foram em 2008-2011? Ora, ora, se tivesse mais de 30 anos e memória, saberia que foram na década de 90, num tempo em que uma atual Serenal Figura era primeiro ministro. Nunca os investimentos foram tão "áureos" como nessa altura.

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...