quarta-feira, setembro 02, 2015

Os russos de Setúbal e outros soviéticos


De um amigo "chegado" (gosto deste conceito caído um pouco em desuso) chegou-me esta nota bem curiosa.

"Não se pode ler tudo e sempre e eu só agora e por um acaso cheguei ao teu post “Petróleo, mentiras e árabes”, recriando uma história famosa dos anos 70. (Tratou-se do episódio dos falsos árabes que foram jantar ao restaurante "Tavares").

Nos dias seguintes, ao jantar, na Rina*, os jornalistas não falavam de outra coisa.

Acontece que em Novembro desse mesmo ano de 1971 houve nova incursão desse grupo de intrépidos foliões, na qual tive a felicidade de participar, fazendo a reportagem no dia seguinte no programa Tempo ZIP, na Rádio Renascença.

O Spartak de Moscovo vinha jogar a Setúbal a segunda mão dos 16 avos de final da Taça UEFA, após empate da zero na Rússia, e a trupe decidiu constituir-se como uma espécie de claque da equipa russa. O Raul Solnado tinha feito o Inspector-geral, de Gogol, no Teatro Villaret, e o guarda-roupa foi o ponto de partida para a brincadeira. Todos vestidos à maneira de aldeões russos do século XIX, embarcámos de autocarro, com partida dos Stones e paragem no Ad Lib, rumo a Setúbal, onde a “claque” russa tinha jantar marcado, antes do jogo, na pousada de São Filipe. 

Eu fui introduzido no grupo pelo Solnado, fazia de intérprete e, à socapa, ia gravando elementos para a reportagem da rádio. O chefe de mesa apanhou-me a gravar conversas mas eu chamei-o de lado e segredei-lhe que a gravação era para o KGB, o que o deixou sossegado. 

O jantar correu em ambiente de grande exaltação, própria de uma “claque” de camponeses russos do século XIX.

Nem o “colinho” da “claque” valeu aos russos: o Vitória de Setúbal ganhou por 4-0, mas na eliminatória seguinte caiu aos pés de uma equipa romena.

No dia seguinte, dois vespertinos – creio que "A Capital" e o "Popular" – publicaram fotos da extravagante claque do Dínamo de Moscovo na bancada do Bonfim. O Tempo ZIP fez a reportagem por dentro do acontecimento."

Quem me fez este relato, que aqui deixo para a história das diversões mediáticas (na altura ninguém dizia isto), foi o João Paulo Guerra, um grande repórter e uma das grandes vozes da nossa rádio.

Desde há anos, o João fazia, todas as manhãs, para a Antena 1, uma síntese de imprensa que levava a milhares de ouvintes o que de mais importante os jornais reportavam nesse dia. Para tal, o João iniciava cerca das cinco da manhã o seu trabalho. Sabendo-me amigo dele, muitas pessoas me transmitiram, ao longo dos anos, o prazer e utilidade dessa companhia, feita de inteligência, sensibilidade e conhecimento.

A RTP/RDP, ao que fui agora informado, colocou um ponto final nesse espaço informativo. Insondáveis são os caminhos dos senhores que por lá mandam e que, neste caso, terão antecipado mesmo de alguns meses o termo do contrato que tinham com o João Paulo Guerra. 

Mas não convém precipitarmo-nos: é importante verificar se isto não está no "MoU" da "troika" e se este governo não obedece apenas àquilo que o mandato de quem o tutela impõe. 

Há uma boa notícia nisto tudo: deixando de estar já obrigado a estas matutinas horas, o João passa a estar disponível para umas jantaradas que, até agora, só podiam ter lugar em fins de semana, com ele a bocejar, numa espécie de "jet lag" endémico. Para a semana começamos, João!

* Ó João, explica lá o que é a Rina, porque eu não sei

4 comentários:

Anónimo disse...

Sobre Rangel, sem mariquices, http://otempodascerejas2.blogspot.pt/2015/09/ainda-rangel.html

Anónimo disse...

Outro texto útil, e sem vernizezinhos, sobre Rangel, http://politeiablogspotcom.blogspot.pt/2015/09/ainda-rangel.html

Gonçalo Pereira disse...

Tem graça. Há algumas semanas, almocei com o chef Michel, que me contou esta mesma história com riqueza de pormenores. Não foi o Popular — foi o Diário de Lisboa que deu a primeira página aos exuberantes russos que visitaram Setúbal.

Ab.

Gonçalo Pereira disse...

(aliás, tenho a primeira página desse jornal, que gostava de lhe enviar, se me der um endereço electrónico)
GP

Agostinho Jardim Gonçalves

Recordo-o muitas vezes a sorrir. Conheci-o no final dos anos 80, quando era a alma da Oikos, a organização não-governamental que tinha uma e...