Quando ontem olhei para o "voucher" com o nome do hotel em Paris que me destinaram, houve qualquer coisa que me soou a familiar. Mas achei que era um daqueles "déjà vu" que nos ocorrem sem razão. Quando, ao final da manhã de hoje, entrei na rue de Berri, "a ficha caiu", como dizem os nossos amigos brasileiros.
A chancelaria do Consulado de Portugal, quando Eça de Queiroz chegou em 1888 à capital francesa, para assumir funções como Cônsul-Geral, estava instalada no nº 16 da rua de Berri.
E é neste mesmo edifício que está hoje o Hotel California, onde vou passar a noite.
Foi neste primeiro escritório que Eça de Queirós se defrontou com a intransigência da mulher do Cônsul cessante, a Viscondessa de Faria ("odiosa megera"), que se recusava a abandonar o local, o que provocou "cenas extraordinárias" descritas numa carta a Oliveira Martins, datada de 19 de Setembro de 1888.
Posteriormente, o Consulado mudou-se para o nº 35 da mesma rua, onde está atualmente o Hotel Champs-Elysées Plaza, escritório que António Nobre, numa carta a Alberto de Oliveira, datada de 25 de Novembro de 1890, dia de aniversário de Eça, descreve como "muito pobrezinho". Eça trabalhou aí até à sua morte, em 1900.
O Hotel California já deve ter tido dias bem mais gloriosos, mas, sem eles saberem, o local onde está instalado também já teve. Por "Eça" razão, sabe-me muito bem ficar aqui.
7 comentários:
Hotel California? E a musica dos Eagles, náo lhe ocorreu ? :)
On a dark desert highway, cool wind in my hair
Warm smell of colitas, rising up through the air
Up ahead in the distance, I saw a shimmering light
My head grew heavy and my sight grew dim
I had to stop for the night
There she stood in the doorway;
I heard the mission bell
And I was thinking to myself,
"This could be Heaven or this could be Hell"
Then she lit up a candle and she showed me the way
There were voices down the corridor,
I thought I heard them say...
Welcome to the Hotel California
Such a lovely place (Such a lovely place)
Such a lovely face
Plenty of room at the Hotel California
Any time of year (Any time of year)
You can find it here
ab
Jyder
Meu caro Francisco,
Encantado com a sua evocação queirósica, imagino-o ao recolher há pouco ao California a subir as escadinhas exteriores que o Nobre usou para ascender ao "sacrário do Altíssimo", como diz a Alberto de Oliveira.
Antes, 'minuciosamente'(como este pedira)conta dos cuidados da indumentária com que se preparou: "après midi" negro de flanela e "Diplomático", meias pretas[ ], com a carta do Junqueiro arrecadada no bolso...
Se o meu Amigo descer um pouco a Rue de Berri, cruza obliquamente a do Faubourg St. Honoré e à esquerda , no prédio número 157, poderá imaginar o escritório da 'Gazeta de Notícias' do Rio de Janeiro onde José Maria muito trabalhou. Os textos enviados para o Brasil incluem a brilhante 'Correspondência Europeia', hoje ainda referência inesgotável. E maravilhosamente escritos!
No aniversário da carta de Nobre, em poucas semanas (25 de Novembro) lembraremos conjuntamente os exactos 170 anos do nascimento do "Altíssimo".
Cordialíssimo abraço, caro Francisco,
L.
Caro Anónimo: depois do jantar (um soberbo Merlot 2008 ajudou), entrei a trauteá-la, juro! Mas há hierarquias a respeitar!
Caro Luis. Há precisamente dez anos, nesse dia 25 que o Eça comemora com o meu pai, organizei em Brasília uma celebração "catita" (gosto sempre citar o Dâmaso, até por partilhar com ela a "adresse" - não é "boulevarzinho", mas é o que se pode arranjar). Também não tive o Cruges, mas tive o Adriano Jordão a orientar. Que fazemos para o 25.11 deste ano. Estou mais do que disponível!
Eu estive agora mesmo a uns metros do Hotel California, mais precisamente no 202 do Champs-Elysées, ou seja em plena Place de l'Etoile à entrada da Grande-Armée e com vista sobre Neuilly. Pensei no Luis, e também no Alfredo, na Marie-Hélėne e no Joaquim. Vive la Différence!
Até já Francisco.
JPGarcia
Senhor Embaixador,
Ofício do Cônsul d´Eça de Qeiroz em 27 de Novembro de 1888
Tendo recebido, em remessa do sr. Director do Hospital da Marinha de Lisboa, um frasco contendo o bolbo raquidiano do Comissário da Armada José Allen, falecido recentemente de raiva, no Hospital da Marinha, para ser examinado pelo Professor Pasteur, acabo de receber nesta data, uma comunicação do Dr. Roux, Director do «Laboratório Pasteur», expondo-me o resultado dos exames feitos.~
O bolbo do José Allen (diz Dr. Roux) verificou-se ser, depois de exame, o duma pessoa que sucumbiu a um ataque de hidrofobia, e os animais que foram inoculados com o mesmo bolbo morreram todos da raiva característica.
Apresso-me a informar disto a V.Exa para que possa ser comunicado aos que profissionalmente se interessarão no estudo deste caso.
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Deus guarde a V.Exa
II.mo e Exmo Sr. Ministro e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros
J.M. d´Eça de Queiroz
Saudações de Banguecoque
'Chique a valer' pernoitar num tal hotel, diria decerto Dâmaso Salcede, pensando nos banhos tépidos da sua infância abafada e protegida !
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