Não fiz parte de quantos diabolizaram a solução encontrada para o caso BES, nem sequer pelo facto de termos servido de cobaia a um modelo não testado, desenhado na Europa para instituições de menor dimensão. Com a vida, tenho aprendido a relativizar o meu “achismo” e tendo a só me pronunciar sobre aquilo de que julgo saber alguma coisa. Mas constato que os especialistas, que tão enfaticamente nos vendem soluções, vivem afinal, também eles, num mundo de aproximação titubiante à realidade, embrulhada apenas num artificial discurso afirmativo.
A supervisão bancária falhou em Portugal, como havia falhado um pouco por todo o mundo, aquando da crise financeira. No nosso caso, é uma evidência que o peso do grupo Espírito Santo, associado ao receio de lançar uma faúlha com impactos reputacionais nos mercados, misturado ainda com o espírito de “old boys network” em que vive o sistema financeiro, coibiu a supervisão de tomar medidas drásticas, a tempo e horas. Basta pensar que Oliveira e Costa chegou a fazer parte dos mecanismos de supervisão do Banco de Portugal...
Soma-se a isso – e digo alto o que muita gente pensa – a circunstância dos governadores do Banco de Portugal terem uma independência limitada face aos governos em funções. O facto deste não ter querido partilhar com a oposição a questão da recondução de Carlos Costa diz tudo. E só lamento que Carlos Costa, pessoa que não só tenho por séria como sei que o é, se tenha prestado a um estranho papel face à cobardia política demonstrada pelo governo neste caso.
Todo o país já percebeu que o Ministério das Finanças foi o “backseat driver” por detrás da decisão sobre o BES. O que torna mais escandaloso – e espero que os portugueses não esqueçam – o tom “nonchalant”, em pose estival, como que Pedro Passos Coelho dizia que o caso BES era apenas e só com o Banco de Portugal, nessa atitude de Pilatos liberal que também ajudou a enterrar a PT. Como pode vir a acontecer com a CGD.
Carlos Costa tinha o dever, desde o primeiro dia, de explicar que não podia garantir, a 100%, que a solução por que se optara no caso BES, não teria custos para o contribuinte. Bastava-lhe dizer que, num quadro de incerteza, aquela fora a resposta considerada potencialmente menos gravosa. Afirmar isso entrava em contradição com a “narrativa” otimista do governo? A dita independência de um governador serve para isso mesmo.
É preciso que os portugueses hoje saibam – e isso não lhes está a ser dito – que o caso da venda do Novo Banco tem fortes probabilidades de vir a tornar-se num pesadelo para as contas públicas e para a banca em geral. É muito grave que o primeiro-ministro cessante se refugie em artifícios semânticos para iludir esta realidade.
***
Este texto culmina, por vontade própria, a colaboração regular que mantive no "Diário Económico" desde novembro de 2013. Agradeço aos dois diretores que amavelmente me acolheram, bem como a toda a equipa do jornal, onde só deixo amigos. A quem me lê, prometo que nos continuaremos a ver por aí.
A supervisão bancária falhou em Portugal, como havia falhado um pouco por todo o mundo, aquando da crise financeira. No nosso caso, é uma evidência que o peso do grupo Espírito Santo, associado ao receio de lançar uma faúlha com impactos reputacionais nos mercados, misturado ainda com o espírito de “old boys network” em que vive o sistema financeiro, coibiu a supervisão de tomar medidas drásticas, a tempo e horas. Basta pensar que Oliveira e Costa chegou a fazer parte dos mecanismos de supervisão do Banco de Portugal...
Soma-se a isso – e digo alto o que muita gente pensa – a circunstância dos governadores do Banco de Portugal terem uma independência limitada face aos governos em funções. O facto deste não ter querido partilhar com a oposição a questão da recondução de Carlos Costa diz tudo. E só lamento que Carlos Costa, pessoa que não só tenho por séria como sei que o é, se tenha prestado a um estranho papel face à cobardia política demonstrada pelo governo neste caso.
Todo o país já percebeu que o Ministério das Finanças foi o “backseat driver” por detrás da decisão sobre o BES. O que torna mais escandaloso – e espero que os portugueses não esqueçam – o tom “nonchalant”, em pose estival, como que Pedro Passos Coelho dizia que o caso BES era apenas e só com o Banco de Portugal, nessa atitude de Pilatos liberal que também ajudou a enterrar a PT. Como pode vir a acontecer com a CGD.
Carlos Costa tinha o dever, desde o primeiro dia, de explicar que não podia garantir, a 100%, que a solução por que se optara no caso BES, não teria custos para o contribuinte. Bastava-lhe dizer que, num quadro de incerteza, aquela fora a resposta considerada potencialmente menos gravosa. Afirmar isso entrava em contradição com a “narrativa” otimista do governo? A dita independência de um governador serve para isso mesmo.
É preciso que os portugueses hoje saibam – e isso não lhes está a ser dito – que o caso da venda do Novo Banco tem fortes probabilidades de vir a tornar-se num pesadelo para as contas públicas e para a banca em geral. É muito grave que o primeiro-ministro cessante se refugie em artifícios semânticos para iludir esta realidade.
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Este texto culmina, por vontade própria, a colaboração regular que mantive no "Diário Económico" desde novembro de 2013. Agradeço aos dois diretores que amavelmente me acolheram, bem como a toda a equipa do jornal, onde só deixo amigos. A quem me lê, prometo que nos continuaremos a ver por aí.
(Artigo que hoje publico no "Diário Económico")
15 comentários:
Que o Novo Banco (ou BES) dará um rombo tremendo no déficit deste ano parece ser consensual.
Que apenas se saberá depois das eleições, também.
Mas este é um daqueles inúmeros casos em que um governo de cobardes (este) sacode a água do capote: a culpa é do BdP.
O que eu julgo ter percebido é que o déficit ficará sempre acima dos 3% de acordo com as previsões da UTAO, independentemente do caso BES.
Se assim for, é uma derrota em toda a linha: desemprego (sim, claro), dívida, déficit, miséria e miserabilismo. Tudo por uma vontade imensa de satisfazer clientelas.
O que se passa com as gentes deste país?
Sr. Embaixador,
Um dia em conversa com uma amigo que trabalha no BdP e quando a situação do BES/GES já era mais que óbvia, aconselhei-o a ler o cisne negro de Nassin Nicholas Taleb, um livro fundamental para qualquer analista.
A resposta dele foi perguntar-me quem era esse autor. Expliquei-lhe que era um economista com formação em filosofia e tentei desenvolver o tema pela rama dando-lhe a entender algumas coisas indirectamente. De nada serviu. Economista com formação em filosofia?! Não pode ser bom!
Depois da queda do BES/GES voltei a encontrá-lo várias vezes. Acho que agora já entendeu o que eu lhe tentava explicar.
Se ao menos no BdP deixassem certas bíblias e lessem o que devem. Espero que agora tenham já adquirido o Anti-frágil, o livro mais recente do mesmo autor, é que a Banca não está nada bem.
Abraço
Não só esta solução vai ter custos para os contribuintes e não sabemos ainda nada da mais que provável maré de processos judiciais que vai cair em cima do Novo Banco (uma das agências de rating já considerou que esse risco não é quantificável), como esta solução não honrou a palavra do Estado com ninguém. Com os lesados do papel comercial, com os pequenos accionistas que investiram no aumento de capital do BES (exigido, mas não garantido pelo BP, nas palavras de Carlos Costa), no fundo com pessoas que até podiam ter sabido que investiam num produto com risco, mas nunca num esquema de Ponzi, supostamente sob supervisão estatal. O BPN, esse, pelo menos honrou a palavra do Estado, por muitos custos que tenha tido. E isto tudo feito com o Alto Patrocínio de Sua Exa, o Presidente da República, que falou quando devia ter ficado calado, ao contrário do que é costume. Mas, por causa de um frete ao Governo, que veria o deficit de 2014 disparar para valores escandalosos se tivesse recapitalizado o BES (solução defendida por Vítor Bento), Carlos Costa prestou-se a esta triste figura de um regulador que vai vender uma operação bancária que no futuro vai regular. Mais uma razão (e não é pequena) para correr com este Governo!
Excelente!
Esclarecedor qb, e se o espaço permitisse, teria de certo muito mais "matéria" (de importância capital para os portugueses em geral e os contribuintes em particular) para referir.
Resta-nos esperar pela alternativa que se desenha (ténuemente) e se irá conseguir ser uma alternativa frutífera.
Francisco
É sempre bom sermos nós próprios a escolher onde usamos a nossa (por vezes incómoda) voz!
o Novo Banco tem fortes probabilidades de vir a tornar-se num pesadelo para as contas públicas e para a banca em geral
O que ao fim e ao cabo são (as contas públicas e a banca em geral) uma e a mesma coisa: o povo português. Porque todo o povo português tem uma conta bancária e todo ele contribui para as contas públicas. Os prejuízos da banca repercutem-se, direta ou indiretamente, em prejuízos para todos nós, porque todos somos clientes da banca.
Mas qual era a alternativa? Nacionalizar o banco por inteiro e assumir todas as perdas? (isto parece-me pior...) Deixar o banco ir à falência (e potencialmente abalar a confiança de todos os depositantes portugueses)? Se havia uma solução que melhor salvaguardasse o interesse público, que solução era essa?
A crítica que o Senhor Embaixador aqui faz é uma crítica que fica pela forma. Ficamos sem perceber qual é a sua posição relativamente à resolução. Se acha que foi uma boa medida, então acho que deve dizê-lo.
Cara Helena. É bom quando isso acontece exclusivamente pela nossa própria mão e, melhor ainda, quando todos ficamos de bem uns com os outros. Obrigado pela sua nota e um abraço amigo deste Paris de que sei que tanto gosta, embora com "mixed feelings", sib um esplendoroso sol de setembro.
Leu mal, Zé! Releia pf o que eu escrevi.
Nunca será de mais referir o papel lamentável que o venerando chefe do estado ( tudo com letra pequena ) desempenhou neste processo. Quanto ao governo ( também com letra pequena) achava que já nada me surpreendia mas ainda me tenho enganado.
JPGarcia.
Nunca será de mais referir o papel lamentável que o venerando chefe do estado ( tudo com letra pequena ) desempenhou neste processo. Quanto ao governo ( também com letra pequena) achava que já nada me surpreendia mas ainda me tenho enganado.
JPGarcia.
A falta de memória é um problema....
Um caso semelhante durante o período dos seus queridos socialistas que foram branqueando o que passava no BPN (Oliveira e Costa) graças ao querido Vítor Constâncio,sabe a história... até houve um inquérito na AR... !
A culpa é sempre da "direita/outros" os rosinhas e aventais são sempre impolutos.
Também não se esqueça do BCP e dos respectivos escuteirinhos rosas.
Portugal
O Primeiro parágrafo inclui as pessoas, que como eu (Graça Costa) infelizmente efabularam com mais verdade do que as tiradas "realistas" dos que tinham "certezas e nunca se enganavam"... E agora?!
“Aqueles que nos criticam hoje foram os mesmos que nacionalizaram o BPN. Não me venham falar de Dias Loureiro, não fui eu neste governo nem o doutor Paulo Portas que nacionalizámos o BPN e que tornámos os portugueses, todos eles, lesados do BPN”, disse Pedro Passos Coelho."
Ou eu tenho dois informadores crediveis, ou um dos dois não está em sintonia com a realidade: Foi-me garantido, que a solução para o BES, tinha sido decidido, com directivas da UE(provavelmente em conversações com muitos governos , incluindo o de PCoelho), mas a decisão foi de Bruxelas.
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