quinta-feira, abril 16, 2009

Partisans

Morreu ontem, em Paris, o escritor e político Maurice Druon. Resistente à ocupação nazi, viria a ser ministro da Cultura de George Pompidou. Na Académie Française assumiu uma crescente deriva conservadora, que foi marcando a sua bela escrita e os seus actos de vida. Ficou famosa a sua rejeição à entrada das mulheres na instituição, titulando a obstrução - felizmente, sem sucesso - a Marguerite Duras.

O pretexto para esta nota poderia ser a passagem de Druon por Lisboa, em fins de 1942, após ter saído clandestinamente da França ocupada. Foi uma jornada com o também escritor Joseph Kessel, no caminho para se juntarem ao general De Gaulle. Apanharam um hidroavião no Tejo, para Londres, depois de uma travessia épica da fronteira luso-espanhola, sob neve, durante a qual ambos declamaram clássicos franceses, para entreter o tempo.

Mas hoje apetece-me lembrar que, também com Kassel, Druon foi autor da letra do magnífico "Chant des Partisans", com música de Anna Marly, que é considerada a mais marcante canção da resistência francesa, de que se pode ouvir aqui uma versão. Sempre tive a curiosidade de saber como é que o agora ultraconservador Druon vivia o facto de ser co-autor do poema de um dos hinos mais revolucionários de sempre.

5 comentários:

Paulo Correia disse...

A França honra os seus valores.

Ligado ao General De Gaulle, Maurice Druon nasceu em Paris, no dia 23 de abril de 1918, tendo entre seus antepassados um bisavô brasileiro, o escritor, jornalista e político maranhense Odorico Mendes (1799-1864), que se tornou célebre pelas traduções de Homero e Virgílio.

Refira-se a propósito que no dia 8 de dezembro de 1966, foi eleito para a cadeira número 30 da Academia Francesa, sucedendo a Georges Duhamel. Foi Secretário Perpétuo dessa instituição, a partir de 1985, mas, em 1999, renunciou à função, cedendo o lugar a Hélène Carrère d'Encausse.

A sua passagem pelo governo em 1973, na qualidade de Ministro da Cultura, não foi muito bem recebida pelo meio artístico e cultural, tendo provocado protestos muito fortes, devido às suas posições pouco abertas.

margarida disse...

"(...) O pretexto para esta nota poderia ser a passagem de Druon por Lisboa, em fins de 1942, após ter saído clandestinamente da França ocupada. Foi uma jornada com o também escritor Joseph Kessel, no caminho para se juntarem ao general De Gaulle. Apanharam um hidroavião no Tejo, para Londres, depois de uma travessia épica da fronteira luso-espanhola, sob neve, durante a qual ambos declamaram clássicos franceses, para entreter o tempo.(...)"

A imagem que ilustra ‘esta nota’ (como tão singelamente refere estas pinceladas de constante originalidade, interesse e, até, fascínio) condensa o cerne desta vida. Ele foi aquele momento da História, golpe intransponível na memória da Humanidade e, como o texto extraído revela, ‘a sua vida dava um filme’.
E é de ‘filmes’ assim que tanto necessitamos, para continuar a crer no sacrifício, no despojamento, na crença por um ideal superior. Em tempos de tempestade, sobretudo.
Depois deixou de ser herói e tornou-se verdugo? Nessa última guerra os contendores tinham armas iguais. E vozes tonitruantes. E liberdade, já.
Ele, outro. Nós, também.
Nada apaga o passado. Bom ou mau, permanece. Foi bom? É essa recordação que a sua memória merece.
Os seres humanos, por o serem, são de uma complexidade tal que não cabem em definições lineares. O encanto ou o desgosto derivam desse labirinto que cada um é. Dessa galáxia de incalculáveis surpresas. E dos actos de heroísmo que conseguimos. Um só desses redime, tantas vezes, uma vida de afronta.

ARD disse...

Kessel era tio (salvo erro) de Druon.
Quando escreveram a letra do "Chant des Partisans" a palavra partisans ainda não tinha a conotação que adquiriu mais tarde, de "Francs Tireurs Partisans", como a organização comunista do "maquis".
Enquanto resistentes, ambos eram "partisans" eo "chant" tornou-se o hino de todo "l'Armée des Ombres".
Outros factos interessantes: ambos eram de origem russa e também o era Anna Marly, a cantora e autora da música.
Durante a guerra, Druon trabalhou nos serviços de informação das FFL (Forces Françaises Libres) e dessa experiência de espionagem e espiões extraíu matéria para alguns escritos interessante.
Após a a Libertação, evoluiu para uma posição cada vez mais anti-comunista; publicou, por exemplo, um violento ataque, intitulado "La France aux ordres d'un cadavre", sendo que o "cadáver" era a URSS.
Mais uma curiosidade: Kessel foi o autor do admirável "Belle de Jour", que foi filmado por Buñuel, filme, por sua vez, "glosado" por Manoel de Oliveira e também de outro romance que também serviu de tema para outro filme e que se passa em Lisboa - "Les amants du Tage".
Desculpe, senhor Embaixador, este deambular mas, neste caso, as ideias foram como as cerejas...

maloud disse...

Peço-lhe licença, Sr.Embaixador, para colocar aqui um comentário de Anne Sinclair retirado do seu blog Deux ou Trois Choses Vues d'Amérique sobre o personagem
1) le Chant des Partisans - en effet admirable et qui me donne des frissons - est l'oeuvre conjointe de Joseph Kessel (qui, lui, était un immense écrivain, et qui a été bien gentil de laisser son neveu co-signer avec lui ce chant sublime)et d'Anna Marly qui en a composé la musique (que Montand en effet chante magnifiqement et qui est aussi un très beau chant bouche fermée).
2) le seul titre de gloire de Druon est "Les Rois Maudits", pas mal, surtout a la télé dans les années 60, mais pas mieux que Robert Merle et son excellent "Fortune de France".
3) Je crois que ce qui m'a indignée surtout chez le personnage - sinon il faudrait le laisser en paix, ce n'est pas le premier ni le dernier médiocre écrivain à l'Académie Française qui n'a jamais accepté en son sein au XXème siècle, ni Gide, ni Proust, ni Camus, ni Sartre, ni Albert Cohen etc...). Ce qui m'a indignée, disais-je - et après je me calme - c'est qu'il soit allé témoigner EN FAVEUR de l'horrible Papon à son procès! au nom d'une vieille rhétorique gaulliste dont on a déjà parlé ici et qui a fait que le général de Gaulle n'a as voulu poursuivre les collabos comme il l'aurait dû, au nom de la "réconciliation nécessaire" du peuple français.
Ok de Gaulle a, à mon humble avis, fait une faute. Mais nous étions en 1945 et ...c'était de Gaulle! Quand justement, on est Druon, neveu de Kessel, qu'on se veut l'auteur du Chant des Partisans, qu'on est en 1997, et qu'on sait tout ce que nous savons depuis, on ne va pas témoigner en faveur de ce sinistre personnage

José Leandro disse...

Se calhar foi por ter conhecido tão de perto os ditos "revolucionários"...

Poder é isto...

Na 4ª feira, em "A Arte da Guerra", o podcast semanal que desde há quatro anos faço no Jornal Económico com o jornalista António F...