quarta-feira, abril 16, 2025

Uma imensa saudade

 


Argélia

França e Argélia mantêm entre si uma das mais complexas relações pós-coloniais da História. Nos vários ciclos políticos, o mal-estar foi uma constante, até chegar ao momento de pré- rutura que hoje se vive. E o território da Argélia chegou a fazer parte das Comunidades Europeias!

Há uma boa síntese hoje no "Le Monde": "Fruit d’une imbrication entre mémoire coloniale, héritages migratoires, passerelles économiques, intérêts stratégiques et convulsions identitaires de chaque côté, la connexion entre la France et l’Algérie est un écheveau infiniment compliqué à manier".

Trump

É interessante a quase unanimidade crítica que por cá se constata em relação a Trump. Dizer mal do presidente americano é hoje um terreno seguro para acordo à mesa de café e em jantares, quase sempre assente em adjetivos depreciativos. E a verdade é que 71 milhões votaram nele...

Às vezes, chovia


(Texto aqui publicado em outubro de 2016, quando passaram alguns meses sem que chovesse ou ventasse em Lisboa. Mas já ninguém se lembra disso!)

As novas gerações, que nos dias de hoje vivem aqui em Lisboa, podem não saber, mas, no passado, às vezes, chovia. É verdade! 

Pequenas gotas de água, aos milhões, frequentemente sob pressão de um ar em movimento a que se chamava vento, desabavam do alto sobre a cidade e molhavam-nos a todos. Para nos protegermos, usávamos uma daquelas sombrinhas com que as senhoras se abrigam dos raios do sol, mas impermeabilizada, chamada guarda-chuva, e vestíamos uns balandraus longos, às vezes impermeáveis, que designávamos por gabardines. Os limpa-párabrisas que se vêm nos carros não existiam então apenas para limpar os vidros, eram utilizados também para afastar as gotas de água com que essa tal chuva enchia a cidade e nos dificultava a visibilidade. É que, nesse tempo, havia inundações que caiam do céu, não apenas as que agora se produzem quando se rompem os canos. Datam, aliás, também desse tempo os telhados inclinados que as casas ainda hoje têm, por onde descia a água provinda da chuva. Ah! E nos dias em que chovia, o sol, que agora brilha em permanência até ser noite, não se via, ficando tapado por um céu cinzento, coberto pelas nuvens, que eram umas espessas formações escurecidas de onde caía a chuva. Era giro!

Vale a pena ter memória, e até alguma nostalgia, desses tempos a que chamávamos "dias de chuva", que às vezes entristeciam as pessoas, mas a que felizmente se deve tanta poesia. Por vezes, confesso que já tenho saudades desses tempos bem longínquos, em que acordávamos e vivíamos, por horas e dias, com a tal chuva a cair sobre nós. Deixo-lhes aqui uma imagem antiga, de arquivo, desses tempos e o link de uma canção que, no Brasil, fizeram mesmo para comemorar tais dias.

terça-feira, abril 15, 2025

Clube de Lisboa


A fotografia é de dezembro de 2016. Minutos antes, este grupo de pessoas tinha acabado de sair de um cartório notarial onde tinha ido formalizar a criação do Clube de Lisboa, uma estrutura de debate sobre temáticas internacionais, que hoje de chama Clube de Lisboa / Global Challenges. Apenas reivindico a iniciativa de termos ido, de seguida, beber uma ginjinha. Quase nove anos depois, todos continuamos ligados aos órgãos sociais do Clube, onde hoje houve eleições. Se quiser participar nas nossas atividades, clique aqui:https://www.clubelisboa.pt/

segunda-feira, abril 14, 2025

Vargas Llosa


Era um escritor genial. Politicamente, era um reacionário. Às vezes, acontece. Na minha hierarquia íntima de admiração, alguns desses criadores têm um valor de exceção, porque conseguiram ultrapassar, graças à sua indiscutível qualidade, a minha rejeição ideológica. A nossa cabeça é muito complicada, não é?

Proibir


Sinal de trânsito que a extrema-direita (e a direita que lhe quer capturar os votantes, cavalgando os medos e as perceções de insegurança) gostaria de ver colocado nas fronteiras. Se os portugueses - um dos povos que historicamente mais emigram - tivessem sido tratados assim...

domingo, abril 13, 2025

O 25 de Abril está de luto


Morreu Carlos Matos Gomes.

Por estas horas

Há dias, em Paris, parei, por instantes, em frente a uma montra com relógios de pulso de uma marca sonante. Alguns, poucos, eram bonitos, outros, a maioria, pretensiosos, outros ainda eram horrorosos, de um mau gosto quase refinado. Quem compraria aquilo? Todos tinham muitos zeros à direita, no preço. Nenhum me entusiasmou.

Ao entrar para o liceu, o meu avô materno ofereceu-me um belo relógio. Um Regines. Era dourado e, aparentemente, tão bom que, com medo de que eu o perdesse, nunca me deixaram usá-lo. Quando essa confiança chegou, já eu queria ter um relógio “à homem”! Devem-me ter comprado um Cauny ou coisa parecida, que era o vulgar de Lineu naquele tempo. Tinham preços muito em conta, mas atrasavam-se e, às vezes, paravam de vez. Quando fui bancário, comprei um ou dois desses Cauny, que os contínuos nos impingiam, a preços "de amigo".

Um dia, todos deixámos de dar corda aos relógios: vieram as pilhas. Passou-se então para o período do plástico, em que se trocava de relógio como quem muda de camisa. Foi a invasão dos Swatch. Depois de algumas tentativas (o preço permitia isso), fixei-me nos modelos “skin”. Sempre muito simples, nada de arrebiques. Nunca quis coisas grandes, cheios de manigâncias técnicas, de cronómetros e luas, botõezinhos para tudo e mais alguma coisa. Até acabei por dispensar aqueles que tinham datas e os dias da  semana. É que eu acabava por não me fiar no que esses relógios me diziam, porque não me lembrava se os tinha atualizado, aquando das mudanças da hora. A única extravagância a cujo luxo sempre me dei foi querer ter ponteiro dos segundos - confesso agora: por pura hipocondria, para medir as pulsações. Só isso. 

Gosto de relógios leves, com um mostrador espartano. Desde há anos, alterno entre um Mondaine com ar de relógio de estação suíça (já tive três), e um Tissot um pouco mais pesado, adquirido num avião, naquele tipo de impulsos que se têm à passagem da hospedeira com o carrinho do “free shop”. De quando em vez, olho a gaveta da mesa de cabeceira e faço a troca de um por outro. Até me cansar de novo e trair o que trago no pulso. 

Herdei alguns relógios: três de sala (é verdade!), franceses, daqueles com caixa de madeira, pesos negros e sonoras badaladas. Ofereci um deles a uma prima, guardo os outros, ambos a funcionarem lindamente. Tenho também a estatueta metálica de uma Diana, que segura um relógio que balançou em tempos felizes. Sou também orgulhoso possuidor de um (pouco valioso, mas magnífico) relógio de parede da Reguladora, de madeira, redondo, com um belo som metálico, que sempre vi em casa dos meus pais. E tenho um pesado e vetusto despertador Cyma (“Acima de Cyma, só Cyma”, ouvia-se nos altifalantes do campo de jogos da minha terra), que os meus pais me “cederam” quando fui para a universidade, com a recomendação: “Não o percas! É da fundação”, com isso querendo significar do início seu casamento, nos anos 40 de outros tempos. Devolvi-o mais tarde. Recuperei-o, infelizmente, ao perdê-los. E, do meu pai, guardo ainda, numa vitrine, o seu eterno Zenith de pulso. 

Não tenho uma particular fixação por qualquer marca de relógios. Não tenho, aliás, o menor fetiche por essa coisa de marcas, que excita tanta gente. Isso é válido para relógios como para tudo o resto, carros e roupa incluídos. E nunca ambicionei ter um relógio de uma marca especial. Cedo na vida concluí que há relógios bastante bonitos que não são muito caros, embora tenha já visto relógios bem caros com um design que me agrada bastante. Mas, por exemplo, nunca me passou pela cabeça ter um Rolex. A frase palerma de um célebre publicitário francês - “Se, aos 50 anos, não se tem um Rolex é porque se falhou na vida” - criou-me uma inultrapassável rejeição pela marca. Não gastarei nunca muito dinheiro num relógio, mas algo me diz que posso perceber, sem a menor dificuldade, o fascínio que os relógios provocam em muita boa gente. 

Há tempos, ofereceram-me um belo relógio, que havia pertencido a um familiar a quem a vida não deu o tempo que merecia para gozá-lo. Decidi agora: vou passar a incluí-lo nas rotações de relógios de pulso que vou fazendo. É isso!

Voto

Não, não preciso de ver debates televisivos para saber, sem a menor sombra de dúvida, em quem vou votar nas próximas eleições, com o claro objetivo de mudar para um governo que seja bem diferente do atual. Mas percebo muito bem que quem estiver hesitante pondere o destino do seu voto à luz dos debates.

sábado, abril 12, 2025

Debates

Ainda não vai ser desta que arranjo pachorra para ver debates eleitorais. Talvez apenas o Ventura - Montenegro. Mais não consigo, confesso. Mas nem isso garanto! Os meus amigos não me percebem. E eu até os percebo. Mas que hei-de fazer?!

Roissy


Ontem passei no aeroporto parisiense dito Charles de Gaulle, a que muitos franceses (e eu próprio) teimam em chamar Roissy.

Estas designações póstumas podem ser algo constrangedoras. Muitas vezes a memória popular não acompanha o voluntarismo afetivo dos proponentes. Veja-se o que acontece ali mesmo, em Paris, com a place de l'Étoile, onde está o Arco do Triunfo: ninguém a designa por "Charles de Gaulle", sendo esse, no entanto, o seu nome oficial. Em Portugal, a maior "maldade" do género foi darem ao Areeiro o nome de praça Francisco de Sá Carneiro (e colocarem por lá uma espécie de estátua artisticamente ofensiva). É óbvio que ninguém chama o lugar por esse nome. E, no Porto, ouço ainda muita gente a falar da praça Velasquez ou do aeroporto de Pedras Rubras, em lugar de nomearem esses espaços em honra à malograda personalidade que, por escassos onze meses, chefiou o executivo português, durante o ano de 1980.

Voltemos a Roissy. Quem não viveu essa época não pode imaginar a fortíssima impressão que o novo aeroporto de Paris provocou a quem, como eu, ainda na casa dos vinte anos, por lá passou, pela primeira vez, em fevereiro de 1976, menos de dois anos após a sua inauguração. 

A arquitetura hiper-arrojada, quase espacial, daqueles tubos transparentes que levavam aos chamados "satélites", equiparava o local aos cenários de "Barbarella" ou de outras películas de ficção científica, uma escola de arte que sempre envelhece muito mal. E tudo por ali rimava bem com o Concorde, que naquele local tinha começado a sua carreira, escassas semanas antes da minha visita, e por lá a acabaria, efémera e ingloriamente, de forma bem trágica, menos de três décadas depois.

Enviado pelo Ministério da Cooperação (já ninguém se lembra, mas existiu então em Portugal um ministério com esse nome, para onde o MNE me havia destacado, por uns meses, vai para 50 anos), eu tinha sido mandado em missão a S. Tomé e Príncipe. Estava-se em fevereiro de 1976. A minha viagem era através de Paris e Libreville. O único voo alternativo era via Luanda, mas a situação militar na capital angolana tornava então menos aconselhável o uso do respetivo aeroporto. Tive assim o privilégio de embarcar em Roissy e, recordo, fiquei extasiado. 

Com o decurso dos anos, quando às vezes por lá voltava a passar, e passei lá bastantes vezes, ia dando conta de que a imagem do aeroporto estava já longe de ser glamourosa. O edifício tinha envelhecido mal, os tubos e os "satélites" haviam-se tornado algo anacrónicos, todo o espaço estava já muito pouco funcional para as novas exigências de uma circulação cada vez mais intensa de passageiros, com os crescentes requisitos de segurança a imporem-se. Para obviar aos problemas desse crescimento, o aeroporto havia entretanto multiplicado as suas estruturas. 

No dia de ontem, talvez por ter utilizado um dos espaços melhor renovados do aeroporto, ou porque o sol brilhasse bem glorioso, ou porque eu estivesse bem disposto depois de uns belos dias de férias em Paris, acabei por achar mais graça a Roissy. Ou a Charles de Gaulle, pronto, se quiserem!

quarta-feira, abril 09, 2025

segunda-feira, abril 07, 2025

Lipp


 

Saudades da solidão

Que saudades do tempo em que entrava num avião e me punha a ler um livro, em que não havia telefone nem internet. Agora, com estas modernices, estou para aqui a perder tempo convosco.

Soletrar banalidades

Já não há pachorra! Entra-se numa livraria e as estantes estão atulhadas de coisas de " lifestyle" e auto-ajuda. Há mesmo assim tanta gente que não consegue pensar pela sua própria cabeça?

Trumpotimistas

Eles estão à cata, ao virar da próxima esquina. Se e quando, alguma das insanas medidas de Trump tiver um efeito colateral que possa ser lido como positivo ou menos detrimental, os trumpotimistas saltarão de imediato a terreiro. Estejam atentos! Há malucos para todos os gostos.

Diplomacia afetiva

"Olha lá! Mas então tu tens amigos que são radicais de esquerda e tens outros situados bem à direita na política?! O que é que essa malta tem de comum, para serem todos teus amigos?" Respondi: "É muito simples! O que têm de comum sou eu".

O economista instantâneo

É extraordinária a quantidade de economistas instantâneos que as medidas aduaneiras de Trump criaram. Um taxista eleborava sobre os efeitos nas taxas de juro e no petróleo, com à vontade idêntico ao de um seu colega que, há anos, detalhava sobre a "saída limpa" depois da "troika".

Notre Dame (renovada)

 


... por aí além!


No sábado, no final de um espetáculo que me não acrescentou muito, dei comigo a usar uma frase de um outro tempo: não foi uma coisa por aí além.

domingo, abril 06, 2025

José Neves


Sentaram-me ontem ao seu lado, na sessão de apresentação do programa eleitoral do Partido Socialista, para cujo capítulo de relações internacionais, Europa e defesa dei uma modesta contribuição. (A qualidade de independente e de não militante não me impede de fazer tudo o que estiver ao meu alcance para tentar pôr fim ao ciclo governativo que, em má hora, nos saiu em rifa.) 

Ele, o meu vizinho de cadeira (do outro lado, tinha uma simpática "rapper"), era, em toda aquela mobilizada sala, a pessoa que mais direito teria de ali estar. E passava completamente desapercebido. Chama-se José Neves e há meio século que nos cumprimentamos com grande cordialidade, embora sem nos conhecermos bem. 

Lembrei-lhe que ele seria ali o único membro que estivera presente na reunião fundadora do Partido Socialista, na Alemanha, a menos que o Alberto Arons de Carvalho andasse algures pela sala (o restante, Rui Mateus, há muito que "saiu" da História). "Tenho 94 anos, sabe?". Caramba! Eu não sabia. 

Falei-lhe da famosa fotografia de 19 de abril de 1973, em Bad Münstereifel, na transformação da Ação Socialista Portuguesa em Partido Socialista, em que Mário Soares queria criar o partido e Maria Barroso se opunha e perdeu. "Eu apareço na parte de cima das fotografias, sou o mais baixo. Mas não estava em pé: estava sentado num banco..." E acrescentou: "Pensando bem, é muito estranho que tivesse havido fotografias: era uma reunião clandestina!" Assinalei que não surge, na imagem mais conhecida da reunião, Seruca Salgado, talvez por ter sido ele o fotógrafo. Mas José Neves notou: "Há outra fotografia em que ele aparece". Fui agora confirmar e assim é. E falou-me de uma outra reunião, em Paris, de que eu nunca tinha ouvido falar: "Foi num espaço arranjado pelos socialistas franceses. Dessa não há fotografias".

José Neves é uma figura histórica do socialismo português. Esteve exilado desde 1965 em Londres e só regressou a Portugal com a Revolução. Publicou, em 2023, "Partido Socialista: da Génese à Refundação (1875-1973). Muita saúde, foi o que lhe desejei com um abraço solidário, no fim da festa.

E vamos a isto! 

Jerónimo Martins


Daqui a dias, como foi já publicamente anunciado, vou deixar o cargo de membro não-executivo do conselho de administração da empresa Jerónimo Martins, lugar que ocupava desde abril de 2013. Sou, atualmente, um dos administradores mais antigos da empresa, tendo cumprido quatro mandatos de três anos, o que, aliás, já de si é pouco usual. 

Comigo saem outros cinco colegas, um português e quatro estrangeiros, num processo de rotação que se processa com toda a normalidade, similar a outros que testemunhei no passado. No meu caso, aliás, a saída estava definida e datada há três anos. 

Passarão agora a integrar o conselho, além de figuras estrangeiras, três personalidades portuguesas extremamente qualificadas, que aliás conheço bem e que, tenho a certeza, carrearão novas perspetivas, fruto da sua muito diversa e rica experiência profissional, para os debates no seio da administração. 

É esse, precisamente, o sentido da contribuição que se pretende seja dada pelos administradores não-executivos ao trabalho das empresas, facto que a opinião pública em regra desconhece. A grande maioria dos administradores não-executivos raramente é oriunda do ramo económico das companhias que integram.

Foi em dezembro de 2012, a semanas de sair de embaixador em Paris, por imposição legal, e de ir abandonar o serviço público que tinha exercido por mais de quatro décadas, que recebi um convite de Alexandre Soares dos Santos para me juntar à Jerónimo Martins. Tinhamo-nos encontrado brevemente ao tempo em que ambos presidíamos aos Conselhos Gerais de duas universidades públicas.

Foi para mim uma total surpresa: viviam-se os tempos da "troika" e do governo Passos Coelho, executivo que ninguém desconhecia estar muito longe da minha simpatia. Entendi dever dizer isso mesmo, com clareza, a quem me formulava o convite, não fosse dar-se o caso de poder haver algum equívoco. A resposta desarmou-me: "A política não é para aqui chamada. Precisamos de si para nos ajudar a pensar o futuro, à luz da sua considerável experiência internacional. Só isso!" 

E foi exatamente assim, durante 12 anos. Os meus colegas de conselho, entre os quais fiz alguns amigos para a vida, testemunharam frequentemente a minha teimosa heterodoxia, e até algum isolamento, em face de outras perspetivas conjunturalmente dominantes nos debates. Mas sempre ali disse tudo o que quis dizer, às vezes coisas que sabia irem ser menos cómodas de ouvir. Honra muito a empresa o cultivo desse saudável ambiente de pluralismo e de tolerância.

Aliás, a prova provada da total liberdade que sempre vivi na Jerónimo Martins - também comum a outras empresas com que colaborei e a outras em que atualmente continuo a trabalhar - é que, como colunista de três jornais, que entretanto tinha passado a ser, eu zurzia regularmente, sem contemplações, as minhas "bêtes noires" políticas. Contudo, nem por isso alguma vez recebi a menor observação de desagrado, ou sequer uma recomendação de contenção, da parte de qualquer dos meus empregadores. Nem por uma só vez! E eu sabia, de certeza segura, que, muitas vezes, eles não concordavam minimamente com muito do que eu por ali escrevia.

Quando entrei para a Jerónimo Martins, fui à Colômbia, à inauguração da primeira loja que lá foi criada. No ano passado, abrimos ali a loja 1000! Nos quatro mercados onde hoje opera, a Jerónimo Martins tem cerca de 6000 lojas, dando emprego a mais de 140 mil pessoas. Há 12 países membros da ONU que têm menos habitantes... 

Quero, assim, nesta ocasião, deixar claro que tive um imenso gosto e orgulho em ter colaborado, durante estes 12 anos, com a Jerónimo Martins, onde fui muito bem acolhido e que, afetivamente, me sentirei para sempre "lá de casa". 

Aproveito para deixar um sincero abraço a Pedro Soares dos Santos, o líder da empresa, o principal responsável pelo imenso êxito que ela tem vindo a ter, nas quatro geografias onde hoje atua. É público e notório que Pedro Soares dos Santos é uma pessoa que, em certos setores, suscita alguma polémica, que tem motivado o surgimento de alguns detratores e até, posso imaginar, de alguns inimigos. Mas é bom que se saiba que também tem muitos amigos. Eu, por exemplo.

sábado, abril 05, 2025

Desculpa, Manuel!



Fiz o meu melhor, mas o melhor não chegou! Tentei compatibilizar uma inadiável ação cívica, no Parque das Nações, com o lançamento de um livro do meu amigo Manuel Duran Clemente, que iria ter lugar na Voz do Operário, horas depois. Não deu para ir! A ubiquidade é "uma cena que não me assiste", como dizia o outro. Lisboa, num sábado de sol, cheio de turistas que descobriram o miradouro da Senhora do Monte, deixou a Graça pouco acessível, para mais a quem já ia atrasado e com necessidade de estacionar. E assim, errando nervoso por ruelas e já quase a chegar por lá, concluí que ia ter de faltar, ao contrário do que tinha prometido, ao lançamento do livro do Manuel, um camarada de armas, como eu tributário desse insigne Serviço de Administração Militar, que alguma coisa deu a Abril. "Mas isso já foi há meio século!", dirão uns cínicos preciosistas de datas. Eles não sabem nem sonham que meio século é uma ninharia para uma amiga cumplicidade. Vou comprar o livro, claro. E, depois, direi de minha justiça. Só posso esperar que tenha sido "bonita a festa, pá".

O meu primeiro telegrama


Ontem, passei pelo arquivo do Ministério dos Negócios Estrangeiros e pedi para ver a "telegrafia" saída da  nossa embaixada em Oslo nos anos de 1979 a 1982. O meu objetivo era recolher dados de que necessitava para uma determinada finalidade.

Esses telegramas, nome que no MNE se dá às comunicações entre as embaixadas e Lisboa, são assinados pelos dois embaixadores com quem ali trabalhei sucessivamente e, em escassos casos, subscritos por mim próprio, como "encarregado de negócios", nas ausências dos titulares e no período em que assumi a chefia entre esses dois embsixadores.

Estava eu entretido a ler essas escassas centenas de textos quando, de repente, deparei com este telegrama. Tem a curiosidade de ser o primeiro texto dessa natureza que eu assinei, no dia 17 de julho de 1979. Há dias, curiosamente, deixei aqui cópia do último que subscrevi, em janeiro de 2013. Verdade seja que, se este último tem algum "sumo", o que hoje publico é um texto completamente vulgar, que constato que apenas cuidei que estivesse bem ao estilo MNE.

Se bem atentarem, nele sigo a regra sacrossanta da Casa de evitar artigos e preposições, uma prática já então sem o menor sentido, que ainda refletia os tempos em que os telegramas eram enviados pelo telégrafo e era preciso poupar nas letras e no custo do envio. Nesse ano de 1979 e muito depois, a regra só era mantida por mero seguidismo com a liturgia da casa. Recordo-me bem quando um dia, 25 anos mais tarde, como embaixador no Brasil, dei instruções escritas aos meus colaboradores para passarem a escrever textos corridos: houve quase um motim! A tradição deixa raízes.

A máquina em que grafávamos os textos não permitia colocar acentos nem cedilhas, o que, como notarão, obrigava à repetição da letra em sua substituição. Por exemplo, "não" é "naao", para utilizar algo (por ora ainda felizmente) em voga. No texto, repararão também que as nossas autoridades máximas eram (e continuam a ser) antecedidas por "Sexa". O ". /." no final era uma convenção nossa para dar sinal disso mesmo, de que o telegrama chegava ao fim.

Finalmente, uma nota sobre o conteúdo do texto. Era prática regular as embaixadas informarem Lisboa das notícias que saíam sobre Portugal e, ao fazê-lo, era interessante explicar qual era a orientação dos jornais que traziam essas notícias. É o que faço no texto.

Enfim, ao reler agora aquele meu primeiro telegrama, fiquei com alguma pena pelo facto de ele não ter sido mais "literário" e de substância. Mas, pensando bem, fui prudente: se há coisa que o Ministério detesta é ver os encarregados de negócios, conjunturais chefes de missão, porem-se "em bicos de pés".

França. Um clima político pesado e complexo.


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sexta-feira, abril 04, 2025

Uns para os outros


"Onde?! No Cacém?! Tenho de ir à Loja de Cidadão do Cacém, para recuperar o código do meu Cartão de Cidadão?" Era assim mesmo, se quisesse resolver o problema, criado pelo meu descuido, sem ter de esperar quase um mês, fui informado pelo telefone. Mas também podia escolher ir à Azambuja. 

E lá fui ao Cacém. Na sala de espera, sentei-me ao lado de uma senhora, passada dos oitenta de idade, que olhava com curiosidade o iPad em que eu lia notícias, para matar o tempo. A certa altura, não resistiu: "Isso tem as "coisinhas" iguais às do meu telemóvel. Deve ser bom poder ler com essas letras grandes. No meu telemóvel - veja! - são letras tão pequeninas!" Também não resisti: "Quer ter letras maiores no seu telemóvel? Dá-me licença que mude as letras que usa?" E lá fiz a alteração, aumentando-lhe num segundo as letras, com a senhora encantada com o resultado: "Nunca ninguém me tinha dito que isto era possível! Vejo muito melhor assim! O que a gente aprende!". 

Entretanto, já ia passando bastante tempo sobre a hora para a qual tinha sido convocado, e a minha nervoseira ia aumentando. À minha parceira de espera não escapou o facto de eu olhar repetidamente para o quadro eletrónico. A certa altura, perguntou: "O que vem aqui fazer?" Disse-lhe e foi então a vez de ela me ser útil: "Ah! Mas isso não é aqui! É lá ao fundo, na outra sala. Ainda há dias fui lá com uma prima!"

Eu estava, como diz o Sérgio Godinho, "à espera do comboio na paragem do autocarro". O que a gente aprende! Temos de ser uns para os outros, não é?

Le Pen na extrema-direita francesa


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Macron entre o presente e o destino


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Outros tempos


Eu ainda sou do tempo em que o agora vice-presidente americano J D Vance escrevia tweets assim.

Tarifaço

Os brasileiros são incomparáveis na sua capacidade imaginativa para descobrir palavras "gráficas", que crismem certas realidades. As medidas aduaneiras de Trump são, claro, um "tarifaço"!

China

A resposta chinesa às medidas aduaneiras de Trump não "desiludiu" as expetativas: olho por olho. Como estamos em mares nunca dantes navegados em termos de comércio internacional, só nos resta perceber o modo como os mercados vão reagir e, claro, sofrer as eventuais consequências.

Sem olhos em Gaza


Entre os direitos aduaneiros de Trump e as angústias de Zelensky, o mundo não olha para a barbárie que Israel continua a praticar, todos os dias, em Gaza. É uma forma de racismo na atenção. 

Trump e a NATO

A NATO, tal como a conhecíamos, não está a funcionar. A sua principal virtualidade era a certeza dos adversários de que, em caso de ataque a um aliado, os outros (isto é, os EUA...) reagiriam em seu apoio. Até ver, com Trump, isso acabou. Contudo, Trump não durará sempre e não há a certeza de que o futuro da América seja seu herdeiro orgulhoso. Podemos assim perguntar-nos se haverá mais vida para a NATO, tal como a conhecíamos, depois de Trump.

Burden

Os aliados europeus dos EUA deram por adquirido, durante décadas, que era do interesse estratégico americano garantir a defesa da Europa. Por essa razão, não iam levando muito a sério os sucessivos avisos para aceitarem o "burden sharing". Agora, Trump acordou-os.

quinta-feira, abril 03, 2025

China

A Rússia é um "fait divers". Para os EUA, o que realmente conta é a China. Com o "tiro no porta-aviões" do comércio, os EUA concretizam agora um ataque sem precedentes aos interesses de Pequim. Nunca sabemos bem o que está na cabeça dos chineses, salvo a questão de Taiwan. Terá graça ver como irão reagir.

Na hora do bitaite

É num dia como o de hoje que me congratulo com o facto de ter decidido suspender o meu comentário regular sobre temas internacionais. É que, estou certo, seria tentado a "dar bitaites" sobre as medidas protecionistas de Trump, tema em que os economistas se dividem.

Isto

Basicamente, é isto: "“The era of increasingly free and extensive international trade, built upon a rules-based system that the U.S. was instrumental in shaping, has drawn to an abrupt end,” Eswar Prasad, a professor of trade policy at Cornell University, said." (NYT)

terça-feira, abril 01, 2025

Militares

Tive ontem o gosto de ser convidado a falar sobre um tema internacional durante o almoço numa associação que reúne pessoas orgulhosas do seu passado militar profissional. Foram algumas largas dezenas que se deram ao cuidado de me ouvir, entre eles oficiais generais dos três ramos das Forças Armadas. As perguntas foram muitas e excelentes, em quase três horas muito bem passadas. No final, foi bonito ver respeitado um minuto de silêncio "em memória dos nossos camaradas que morreram em combate", seguido do canto do hino nacional.

Xenofobia

O diretor da PJ, Luís Neves, cometeu um lapso ao deixar-se ficar na imagem ao lado de Fernando Gomes. A extrema-direita, que nunca lhe perdoou as palavras corajosas com que denunciou o alarmismo xenófobo, caiu-lhe agora em cima. Estou certo que a senhora ministra da Justiça não é das pessoas que se deixam impressionar por estas manobras.

domingo, março 30, 2025

Conversa sobre Defesa


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Do tempo do Dr. Kildare


Com 90 anos, morreu o Dr. Kildare, isto é, o ator Richard Chamberlain. Para a minha geração, a que ainda viu televisão apenas a preto e branco, Kildare era contemporâneo do Bonanza, da Polícia da Estrada, do Mr. Ed, dos julgamentos do Perry Mason e do Roger Moore vestido à Peter Pan, nos pífios cenários do Ivanhoe.

Foi há muito tempo? Se foi! Se o Dr. Kildare ousasse mostrar-se, nos últimos anos, a fazer um gesto como o que a fotografia desse tempo aqui mostra caía o Carmo, a Trindade e o Lux.

Demagogia

Serei só eu quem considera perfeitamente natural que o primeiro-ministro não tenha ficado na fila do serviço hospitalar e tenha sido atendido com prioridade? Passa pela cabeça de alguém que quem tem a responsabilidade máxima na governação do país fique umas horas na sala de espera, de pulseira amarela?

sábado, março 29, 2025

Constantinopla


Um amigo disse-me que vai a Constantinopla ou lá como agora aquilo se chama. Não sou de invejas, mas senti algumas. Fazer toda a Istiklal a pé e apanhar de volta o elétrico desde a praça Taksim é das coisas de que tenho saudades. É das cidades mais fantásticas do mundo! 

Às duas p'rás três!



O estranho amadorismo da classe política dos EUA


Ver aqui.

Um abraço ao Marcos, desde Lisótima


Neste tempo em que os amigos se vão como as cerejas, uns atrás dos outros, sei que arrisco converter este espaço num somatório de notas necrológicas. Mas não posso nem quero deixar de fazê-lo. O meu mundo, que por aqui anoto ao sabor do impulso, sem rotina de diarista*, é o que é e, por muito que procuremos agarrar o futuro, o passado e os seus mortos fazem parte integrante da nossa vida.

Chega-me agora a notícia de que morreu, no Recife, aos 85 anos, Marcos Vilaça, um magistrado, escritor e destacada figura da cultura brasileira, que por duas vezes ocupou o cargo de presidente da Academia Brasileira de Letras. E que era meu e nosso amigo - nosso, isto é, de Portugal, que o distinguiu oficialmente. Por aqui era também académico correspondente da Academia das Ciências. 

Marcado na existência pela prematura morte de um filho e, muitos anos mais tarde, pelo desaparecimento de Maria do Carmo, a sua simpática mulher, Marcos, que à primeira vista afivelava um carão grave e enganador, tinha um humor magnífico e uma cultura exuberante, com que sabia alegrar os convívios e entreter os amigos. E tinha muitos.

Marcos Vilaça não visitará nunca mais Lisótima, nome que, desde sempre, ele dava a Lisboa.

* Lembrei-me agora de que, no dizer brasileiro, "diarista" significa "mulher/ homem a dias".

Os EUA e a Ucrânia: as negociações e os negócios


Ver aqui.

quinta-feira, março 27, 2025

Dos lóbis

A escolha do cabeça de lista do PSD por Bragança, que só um cego não veria que iria suscitar polémica, é, em si mesma, bem reveladora de como o partido se encontra preso a lóbis e lógicas de aparelho dos quais não consegue desligar-se. 

quarta-feira, março 26, 2025

O livro, a mesa e a solidariedade


Há dias, numa romagem com o meu amigo José Ferreira Fernandes à livraria Ulmeiro, na Avenida do Uruguai, que mudou ligeiramente de sítio e perdeu o gato à porta, não resisti: comprei, por bom preço, uma edição antiga do "Guia das Assembleias Gerais", de Mariano Roque Laia. 

Ainda me perguntei sobre se não teria um outro exemplar, em algum das dezenas de caixotes de livros que guardo por Vila Real. Se calhar tenho, mas achei que, por vénia à memória, não podia deixar de adquirir aquele livro. 

O "Guia das Assembleias Gerais", de Roque Laia, que teve a sua 1ª edição em 1957, foi, por muitos e bons anos, a "bíblia" das Assembleias Gerais. Trata-se de uma utilíssima codificação de regras e procedimentos, sem força jurídica vinculativa mas com um peso "moral" que, mesmo ao tempo da ditadura, quase ninguém ousava contestar. Usar "o Roque Laia" com mestria era meio caminho andado para gerir bem uma Assembleia.

Muito compulsei "o Roque Laia" quando presidi à mesa da Assembleia Geral da associação de estudantes do ISCSPU - isso mesmo, com "U", quando algum país também teve a ilusão de que o "U" lhe pertencia para sempre... Devo ter sido tão bom presidente, nesse ano letivo de 1969/70, que, no ano seguinte, o Ministério da Educação não "homologou" a minha reeleição. Embora, 30 anos mais tarde, tivesse sido colega de governo do ministro que referendou aquela decisão, tive sempre a delicadeza de nunca abordar com ele o episódio.

Mais recentemente, entre 2013 e 2015, já reformado, presidi à mesa da Assembleia Geral da Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses. Não tive então "o Roque Laia" à mão, mas também não precisei dele. Nos dias que correm, quase dirijo assembleias gerais "de cor".

Dito isto, há poucas horas, voltei a lembrar-me deste recém adquirido livro quando tomei posse do cargo de presidente da mesa da Assembleia Geral da APDP - Associação Protetora dos Diabéticos de Portugal, uma instituição sem fins lucrativos que desenvolve um trabalho imensamente meritório e a que terei o privilégio de poder prestar esta minha modesta contribuição, nos próximos quatro anos, substituindo o Dr. Narciso da Cunha Rodrigues. Já tinha destinado à APDP metade dos direitos de autor da edição de 2023 do meu livro "Antes que me esqueça". Quem comprou o meu livro já ajudou a APDP.

Com franqueza, não espero ter de recorrer ao "Roque Laia" nas novas tarefas que vou exercer. Mas, pelo sim pelo não, o livro já ali está à mão de semear.

(A propósito: sabia que, sem que receba menos reembolso nem aumente o imposto que tem de pagar, pode colocar na sua declaração do IRS a consignação à APDP de 1% daquilo que vier a entregar às Finanças? Se o fizer, ajudará a que esta instituição, que está na primeira linha da luta contra uma doença que afecta um milhão de portugueses, venha a receber uma verba, ainda que pequena, que ajudará ao seu funcionamento? É simples: no campo dos apoios às IPSS coloque o NIF da APDP: 500 851 875. Vá, faça esse gesto!)

Uma imensa saudade