quarta-feira, novembro 06, 2024

Negócios da China

Será curioso perceber qual o consenso possível deste lado do Atlântico face ao "bullying" a que Trump vai sujeitar a Europa, na sua obsessão comercial contra a China. Embora alguma água ainda vá correr sob as pontes americanas: metade dos Tesla de Musk são fabricados na China.

Com o devido respeito

Posso perceber, como expressão de um sincero estado de alma, o comentário ontem feito por Marcelo Rebelo de Sousa sobre as eleições americanas. Já percebo menos esse comentário ter sido proferido pelo Presidente da República. Mas admito ser eu quem está a ver mal as coisas.

Desafio & oportunidade

Em linguagem empresarial, Trump é um "desafio" para a Europa. Mas, ao contrário da narrativa clássica, é difícil transformá-la em "oportunidade". A menos que o caráter adversarial de Trump levasse a Europa a reforçar-se. Mas "não estamos com gente disso", como antes se dizia.

A Europa e Trump II

Para a Europa, o interlocutor, no principal parceiro à escala global, chama-se agora Donald Trump. Este sabe que não era o presidente desejado deste lado do Atlântico e irá fazer sentir isso. Mas Trump é pragmático nos negócios e, para ele, a relação com a Europa é um negócio.

As culpas de Biden

Biden tem uma importante quota de culpa na derrota de Harris. A vice-presidente pagou pela sua impopularidade interna de Biden, pela obscuridade a que este a sujeitou durante quatro anos e pelo egoísmo e falta de realismo que revelou, ao não ter tido uma saída atempada de cena.

Uma morte política

Harris, como figura política com destino nacional, acabou ontem. Sem cargo eletivo, e na implacável lógica do sistema americano, a liderança da oposição passa agora para o Congresso. Só com a aproximação das próximas presidenciais um nome emergirá. E esse nome não será Harris.

A limpeza das eleições

Uma das boas notícias desta eleição é que a vitória folgada de Trump pode ter feito desaparecer a litigância em torno do processo eleitoral, o que atenua as ondas de suspeição que o próprio Trump ciclicamente lança sobre essa dimensão do sistema político americano.

A solidão europeia

Como sempre acontece, a Europa "escolheu" um candidato à presidência americana à medida daqueles que eram os seus interesses. Ora o presidente americano é eleito para defender os interesses americanos, não os interesses europeus - e, muitas vezes, uns conflituam com os outros. 

"Check the balances"

Trump tem uma vitória inédita, com abalo de todos os "checks and balances: legitimidade adquirida pela maioria do voto popular, maioria no Congresso (câmara e senado), maioria clara no Supremo Tribunal, mantendo a maioria dos governadores de Estado. Melhor era impossível!

Os media

O modo enviezado (por melhores que fossem as razões) como a maioria dos media favoreceu e promoveu a candidatura de Harris levou à ilusão de uma crescente onda popular em seu favor. Afinal, o voto popular veio a favorecer Trump. O "whishful thinking" é isto.

São três e meia da manhã...


... e eu vou deitar-me com as coisas assim. Logo veremos!

Vivó Sporting

 


terça-feira, novembro 05, 2024

América


Aceitei um amável convite da CNN Portugal para acompanhar, a partir das 22 horas de hoje, as eleições nos EUA.

A face exterior da América


Comecemos pelo óbvio. Os americanos, nas suas escolhas eleitorais, mobilizam-se essencialmente pela agenda do seu quotidiano interno. Nestes tempos ela é: poder de compra, segurança, imigração, aborto e temas de género, saúde, desemprego, armas, habitação, valores religiosos e nacionais, questões identitárias, estilos de vida – não necessariamente por esta ordem, dependendo das suas clivagens regionais, étnicas, de classe ou etárias. 

Prevalece a ideia de que o cidadão americano, integrando embora o país mais poderoso do mundo, se interessa sempre pouco por esse mesmo mundo, ou apenas se preocupa pelo que dele possa resultar como impactando no seu dia-a-dia interno. A relevância da questão migratória, com a sua declinação securitária, na agenda eleitoral é talvez um bom exemplo contemporâneo disso mesmo. 

Na História, depois das duas guerras mundiais e do que decorreu da Guerra Fria, de que o conflito no Vietnam é bom exemplo, a que se somou aquilo que o 11 de setembro determinou, as lideranças americanas sempre demonstraram alguma dificuldade em convencer a opinião pública da necessidade de envolver e sustentar a presença dos seus soldados em teatros de guerra no exterior, mesmo que alegadamente para a defesa dos seus interesses. O passado revelou também que, aos ciclos de intervenção externa, se sucederam sempre movimentos de retração no uso das suas tropas em cenários externos, internamente motivados. 

As fórmulas simplificadas são sempre desmentidas pelas exceções, mas isso não nos deve inibir de reconhecer o que parece ser uma tendência: na América, as administrações democráticas surgem, quase sempre, como fautoras ou promotoras de intervenção em conflitos externos, por contraste com os tempos republicanos, aparentemente menos propensos a tal. Numa explicação simples, fica a sensação de que, mais no seio dos democratas do que dos republicanos, prevalece a ideia de que residem na ordem externa muitas das soluções que defendem os interesses da América. 

O que ficou escrito serve de intróito à reflexão do que pode representar, para o mundo, a vitória de um dos dois candidatos, na decorrência do confronto eleitoral de 5 de novembro. 

Comecemos pelo que parece mais fácil. 

No cenário de vitória de Kamala Harris, é legítimo presumir alguma continuidade face à linha da administração cessante no tocante à Ucrânia. No entanto, atento o conhecimento aprofundado que Jo Biden tinha das questões internacionais, é de supor que uma presidente Harris acabe por ficar mais nas mãos da máquina diplomática do State Department, e mesmo do Pentágono. Isso faz presumir que a questão da Ucrânia venha a manter-se com uma elevada prioridade para os EUA, não sendo de excluir uma atitude mais firme face a Moscovo, o que pode depender da composição futura do Congresso. A contrario, uma vitória de Trump parece apontar para um cenário de compromisso, a custo da integridade territorial da Ucrânia, o que representará uma imediata frente de divergência com a Europa. 

No tocante ao Médio Oriente, uma vitória de Trump significaria uma imediata “carta branca” a Israel, aprofundando aliás o isolamento internacional dos EUA e o agravamento da sua perda de autoridade moral. Harris pode ser um pouco mais sensível aos setores democráticos que se escandalizam com a tragédia de Gaza, mas é duvidoso que, mesmo que o tente, lhe seja possível travar Israel, que dispõe de uma capacidade de influência dentro dos EUA que é muito difícil de combater. 

Uma grande dúvida permanece no caso do Irão. Trump foi o responsável pelo abandono dos EUA do acordo nuclear, mas Biden não teve vontade de retornar a ele. O caldo de cultura de apaziguamento que esteve na origem daquele compromisso não parece existir nos dias de hoje, tanto mais que a conflitualidade entre Israel e o Irão se coloca agora como um fator de agravamento. 

Sabe-se que o tema do desafio que a China representa é, nos EUA, politicamente transversal, por um conjunto cumulativo de razões. A questão de Taiwan surge como um um elemento importante nesse contexto, mas fica a sensação de que uma nova presidência Trump poderia colocar a questão comercial na primeira linha de uma conflitualidade inevitável, enquanto uma presidência Harris, não esquecendo a dimensão económica, traria Taiwan e os vetores políticos das alianças no Indo-Pacífico para a linha da frente da sua diplomacia. 

À parte estes e outros cenários geopolíticos, é óbvio que uma eventual administração Harris será muito mais favorável a um cultivo do mundo multilateral do que seria uma administração Trump. Isso refletir-se-ia em dossiês tão importantes como as alterações climáticas e, em geral, no papel futuro da ONU, cujo atual bloqueio interno não contribui para o seu prestígio. 

Trump na Casa Branca significaria, quase inevitavelmente, a emergência de uma forte contradição com a Europa, seja pelo renascer do seu peculiar olhar sobre a NATO, com a questão da Ucrânia a agravar esta tensão, seja pelas clivagens comerciais e em outras frentes económicas. 

Em síntese, se bem que nada garanta que venha a ser uma mera continuidade da linha Biden, uma América liderada por Kamala Harris tenderá a ser mais dialogante com os amigos tradicionais dos EUA e, em especial, será muito mais previsível. Trump, por seu turno, será o “happening” que foi no passado, quiçá potenciado no futuro. 

Os Estados Unidos da América habituaram-nos a uma atitude de auto-suficiência e de relativo desprezo pelo modo como os outros, nomeadamente a Europa, olham os problemas globais. Contudo, os democratas costumam disfarçar melhor essa sua arrogância. Trump, seguramente, não se preocupará um segundo com o modo como os amigos da América a olham, desde que consiga fazer com que a sigam. E, como sabemos, os EUA têm meios e poder suficientes para levar isso à prática, gostem os outros ou não.

(Texto hoje publicado a convite da Fundação Francisco Manuel dos Santos, no seu site)

Pronto! É hoje...

 


segunda-feira, novembro 04, 2024

Coincidências


À saída de uma consulta médica, hoje:

- É muito pouco comum o apelido deste médico. Terá algum parentesco com aquele nosso colega de liceu, que tem o mesmo nome? 

- É dificil saber! Não perguntámos ao médico e há muitos anos que não vemos o nosso antigo colega.

Cinco minutos depois, na sala de espera:

- Curioso. Já viste quem ali está? É o nosso colega. Podemos perguntar-lhe se é parente do médico.

Não é, disse-nos ele, que já se tinha cruzado um dia com o médico seu homónimo. Acabámos entre abraços.

Não há coincidências. Claro que não há! 

O viés e a profissão

Acho Trump uma figura sinistra e, no contexto, vejo Harris como um sopro de ar fresco. Como cidadão, eu posso pensar assim. Mas acho incorreto que o nosso jornalismo tome partido e esteja a ser completamente "biased" na análise da contenda presidencial americana.

"Nuestros hermanos"

Desde o auge da questão da Catalunha, há uns anos, que eu não via as redes sociais portuguesas tão polarizadas pela situação política interna espanhola. A tragédia de Valência é agora o pretexto. Dado que somos dois países com agendas em geral bem diversas, acho sempre curioso perceber que temáticas da "vizinha Espanha" excitam este parceiro ibérico, e porquê. 

Império

Uma mulher negra, que cresceu fora do Reino Unido, ter conseguido chegar à liderança do histórico Partido Conservador (e Unionista, parte do nome que muitos esquecem) é, a todos os títulos, um acontecimento notável, seja o futuro aquilo que vier a ser.

domingo, novembro 03, 2024

Aleluia!


Todos os restaurantes a que me apetecia ir, em Évora, neste domingo, estavam fechados. Outros, à hora a que os contactei, não tinham vagas nem esperança de as poderem ter, pelo menos em tempo útil para a minha paciência. 

Estacionei junto ao Templo de Diana (não me perguntem como, por favor!). Arrisquei ir ao "Cavalariça", ao lado da Pousada dos Loios. Havia uma mesa livre. E ali almoçámos. 

Muito bem, diga-se desde já. Trazia comigo algumas reticências, desde uma ida ao homónimo "Cavalariça" da Comporta, em julho, que comunga com este muitas das opções da carta. 

Arquivei hoje essas reticências. Tudo o que se pediu estava excelente. O serviço foi de um profissionalismo raro: atento sem ser subserviente, sofisticado sem ser arrogante, conhecedor sem ser impositivo. Desde o magnífico pão (da casa, com manteiga e azeite "de truz") às sugestões (muito certeiras) de vinho, passando pela qualidade e apresentação de tudo o que se pediu como pratos, com boas sujestões de partilha, até a uma excelente sobremesa (vários chocolates), tudo esteva a preceito. O ritmo do serviço também foi perfeito. O preço final só seria excessivo se a qualidade do que se provou não estivesse à altura, o que não foi o caso. 

Reconciliei-me com o "Cavalariça". É um chão a que regressarei, em breve. E de que deixo fotografia.

Havemos de ir a Viana...

 


Alentejo desencantado


Chamava-se "Alentejo desencantado" um livro de Mário Ventura Henriques que li há muitos anos.

Desencantado é como saio deste meu fim de semana gastronómico no Baixo Alentejo. 

De cinco restaurantes experimentados, apenas um passou a fasquia do razoável. E acontece-me isto a mim, que passo o tempo a elogiar a cozinha alentejana! 

Ainda este mês, a Academia Portuguesa de Gastronomia, de cuja direção faço parte, vai entregar o seu prémio anual "Maria de Lourdes Modesto", destinado a premiar um restaurante de cozinha tradicional portuguesa, à "Mercearia do Gadanha", em Estremoz. 

Haverá um contraste Norte/Sul na qualidade da restauração alentejana? Ou fui eu que escolhi mal as mesas, não obstante andar atulhado com guias, com indicações de amigos comilões e outras de amigos conhecedores? 

Pousar


Sempre que posso, gosto de alojar-me nas Pousadas de Portugal.

Fiz isso este fim de semana, na Pousada de Beja, que já se chamou "São Francisco". 

Desde há uns anos, discretamente, as Pousadas perderam as designações católicas que, por muitos anos, tiveram. Terá sido o "politicamente correto"?

Fui e sou um cliente "ativo" das Pousadas: queixo-me do que está mal, elogio o que está bem. Fiquei muito satisfeito nesta que foi a minha terceira estada na Pousada de Beja.

Desde a sua criação, em 1940, houve 67 Pousadas (66 em Portugal e uma no Brasil). Dormi em 56 delas. Hoje, só há 36 Pousadas.

Nunca cheguei a dormir em cinco das muitas Pousadas que entretanto foram encerradas: Alfeizerão, Berlengas, Forte do Beliche (Vila do Bispo), Vinháticos (Madeira) e São Filipe (Setúbal). 

Ainda não dormi em seis das Pousadas existentes: Alijó, Angra do Heroísmo, Horta, Porto, Câmara de Lobos e Alfama. Com exceção desta última, não excluo poder ainda vir dormir nas outras cinco Pousadas que ainda não conheço.

Serei um recordista de Pousadas? Se não sou, devo (devemos, eu e a minha mulher) andar lá próximo.

sábado, novembro 02, 2024

Alentejo

Para o que me havia de dar!


O empregado do restaurante ficou um pouco banzado, mas lá serviu, como eu tinha pedido, uma ameixa de Elvas a acompanhar o Toucinho do Céu. E não é que liga bem?

sexta-feira, novembro 01, 2024

... e logo se vai ver!


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Moçambique, Georgia, Brasil


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Próximo Oriente


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Camilo Mortágua


Com 90 anos, morreu agora Camilo Mortágua.

Camilo Mortágua, pai da atual líder do Bloco de Esquerda, foi um valente lutador contra a ditadura, participou no assalto ao navio mercante “Santa Maria”, no desvio do avião da TAP de Casablanca para Lisboa, no assalto ao Banco de Portugal, na Figueira da Foz, bem como em outras ações revolucionárias com as quais, como português e democrata, me sinto perfeitamente solidário e cuja execução lhe agradeço e louvo - e que isto fique aqui escrito, preto-no-branco, porque é preciso não ter medo de dizer as palavras justas.

Só uma ditadura que foi culpada por imensos mortos, por uma criminosa guerra colonial, por décadas de perseguições, torturas e prisões que arrasta no seu inapagável cadastro histórico, com a PIDE e a censura cobardemente a seu lado como mão executora, teve o desplante de qualificar como crimes comuns alguns atos justamente praticados, como hoje está mais do que provado, para enfraquecer o regime que iria cair de podre e de ridículo perante a História no dia 25 de Abril. E aproveito o ensejo para prestar também homenagem a essa outra figura de homem de bem que se chamou Hermínio da Palma Inácio, igualmente diabolizado pelos caluniadores anti-democratas.

Alguma direita portuguesa, que nunca conseguiu fazer o exorcismo do Estado Novo, vive ainda uma orfandade envergonhada desses tempos, disfarçada na proclamação da “honestidade” de Salazar, nas acusações comprovadamente falsas sobre um indevido uso das verbas do assalto na Figueira da Foz, numa miserável equiparação das ações da LUAR a delitos comuns - não tendo vergonha de recorrer precisamente à mesma linguagem que a PIDE utilizava. Aqui pelas redes sociais, como se irá ver nas caixas de comentários hoje e nos próximos dias, há ainda muito quem se sinta solidário com a narrativa da António Maria Cardoso. Gente que nunca entenderá que também foi graças a lutadores como Camilo Mortágua que hoje usufrui da liberdade que lhe permite escrever, com total liberdade e impunidade, aquilo que escreve. Como dizia o outro, "eles não sabem nem sonham".

B & B


Há bastantes anos que ouvia falar daquele restaurante, situado numa certa capital de distrito, onde não vou muito e onde tinha escassas referências. A casa chegou a vir assinalada em certos guias, o que, estando longe de ser uma garantia, era contudo uma nota mais a ter em conta (verdade seja que já deles tinha saído). Ontem, calhou passar por essa cidade e decidi visitar finalmente o restaurante. Antes o não tivesse feito. Banal & barulhento. Até nunca mais! (Não, não digo o nome. Só aqui identifico restaurantes de que gostei. Então por que falei disto? Porque já não tenho idade para perder tempo com desilusões, porque este meu erro me irritou e porque isto é um blogue pessoal, onde acho que me posso dar ao luxo de expressar os meus estados de alma, ora essa!)

No Panteão Nacional


No dia 8 de janeiro de 2025, José Maria Eça de Queirós entrará no Panteão Nacional. 

Finalmente!

quinta-feira, outubro 31, 2024

Que triste, "Expresso"!


O "Expresso" considera que declarações "mesmo que feridas de ilegalidade" têm "um fundo de justiça". Estava à espera de ver outros órgãos de informação ir por este caminho, mas confesso que me surpreende de ver o "Expresso" seguir este registo. Mas eu sou um crédulo.

"Com boa imprensa"


O site da Auchan diz isto de mim. Achei imensa graça.

Academia Jorge Coelho


 

Sociedade de Geografia

 


O Sporting, o Porto e o Benfica


Hoje, fui simpaticamente convidado para ir, com um grupo, ver jogar o Sporting com o Arsenal, em Alvalade, no dia 26 de novembro. 

O Sporting é o meu clube. O Arsenal é o meu clube preferido no Reino Unido. Mas espero ver o Sporting derrotar o Arsenal, claro.

Já irão perceber a razão pela qual, a propósito ou a despropósito disto, me lembrei do vinho do Porto.

Embora a França seja o primeiro destinatário mundial das exportações de vinho do Porto, o Reino Unido foi, desde sempre, o mais tradicional destino de venda do Porto de boa qualidade.

O vinho do Porto há muito que faz parte da tradicional cultura social britânica. Num jantar britânico, é de bom tom, no final da refeição, colocar sobre a mesa uma garrafa de cristal com "Port Wine": cada pessoa serve-se a si própria e, após fazê-lo, pousa a garrafa sobre a mesa, colocando-a à sua esquerda, por forma a que o parceiro desse lado proceda de forma idêntica. É considerada má educação passar a garrafa diretamente para a mão do vizinho do lado: deve ser ele a levantá-la da mesa. Ah! e, sem exceção, a circulação da garrafa fez-se de acordo com esse sentido, o dos ponteiros do relógio.

Em 1992, o Benfica foi jogar a Londres, precisamente com o Arsenal. A direção dos "gunners" (designação popular do Arsenal) convidou a direção do clube português para um jantar, num restaurante de Regent Street. Como encarregado de negócios de Portugal, tive o privilégio de ser incluído pelo Arsenal no pequeno grupo de convidados portugueses. Chegado o final do jantar, assomou à mesa um "decanter" com o vinho do Porto, gesto de gentileza para com visitantes, ainda por cima portugueses. 

E aí, para surpresa imensa de quem nos convidava (e um pouco também minha, confesso), nenhum - repito, nenhum - dos portugueses, com a exceção do diplomata presente, aceitou beber um cálice de Porto (o copo da imagem é uma brincadeira futebolística, claro). Uns diziam abertamente que não gostavam, outros que lhes fazia mal e era "pesado", outros apelaram a uma alternativa, como um "malte" ou um cognac. A cara dos britânicos era indescritível.

Para a pequena história: no campo, o Benfica ganhou.

Loures

O senhor presidente da Câmara municipal de Loures disse uma imensa barbaridade: que os envolvidos em distúrbios e atos criminosos deviam ser despejados das habitações sociais que ocupam e que ele próprio assim iria proceder no futuro face a moradores locais nessas condições.

Ao senhor presidente, que acontece ser da minha área política, alguém deveria explicar que quem incumpre com uma lei deve ser pessoalmente punido, mas apenas e só nos termos dessa mesma lei. 

Além de que a ideia de que as famílias devem pagar pelos erros desses titulares de atos foi uma prática israelita ao tempo em que havia Gaza - e essa similitude de atitude é capaz de não ser a mais honrosa imagem para os socialistas de Loures.

Para além de Kursk

Há uns dias, escrevi, aqui e no Twitter, isto: 

Pensemos friamente: a eventual utilização tropas norte-coreanas na defesa ou retoma da região de Kursk, zona russa parcialmente ocupada pela Ucrânia, seria uma coisa muito diferente do seu emprego na luta no território ucraniano.

No Twitter fui "zurzido" de todas as formas e feitios, de "comuna" para baixo. Como imaginam, foi para o lado que dormi melhor! 

Agora descubro Jo Biden a dizer isto. Basicamente o mesmo, isto é, uma ideia óbvia.

André Freire


Quando uma morte ocorre de uma forma inesperada, acidental, costuma dizer-se que é uma morte estúpida. A morte de André Freire, uma figura marcante da nossa vida académica e cívica, no auge da sua pujança intelectual, é uma morte imensamente estúpida.

CNN Portugal


Ontem, correspondendo a um amável convite dos meus amigos da CNN Portugal, tive muito gosto em regressar pontualmente à estação, para comentar as eleições americanas. Farei o mesmo na noite eleitoral. 

Veja aqui.

quarta-feira, outubro 30, 2024

Sectarismo

O sectarismo faz baixar a guarda. Há uns anos, John Bolton era um "troglodita", quase fascista, que Trump levou para a Casa Branca. Agora, feito anti-Trump, é um guru dos anti-Trump. Há uns anos, Meloni era uma perigosa fascista. Agora, apoia a Ucrânia e já está do "lado certo".

Media

É impressionante olhar a comunicação social dos EUA: praticamente não há meios de informação que não estejam enfeudados a um dos dois campos políticos. É muito difícil encontrar análises com alguma distância ou neutralidade. A América está mais polarizada do que nunca. 

Pontaria


Então queriam que não se aproveitasse o feriado para fazer "ponte" de quarta a terça?

"Umas palminhas!"


Ontem à noite, na Gulbenkian, ao final do primeiro andamento de um Requiem de Brahms, um auditor mais entusiasmado bateu palmas, fortes. Por três segundos. Logo sossegou, em face do silêncio dos restantes 1202 espetadores. As palmas da sala - que foram entusiásticas e merecidas, diga-se - viriam no final da peça completa, como mandam as regras. Aquelas primeiras palmas tinham sido muito sinceras, porém extemporâneas. 

Parte-se do princípio de que as palmas são uma manifestação de incentivo e de satisfação, por parte do público. Para quem está no palco, é um reconhecimento da qualidade da prestação. As palmas podem, contudo, não ser sinceras. 

Há precisamente 95 anos, com 19 de idade, o meu pai era funcionário público em Lisboa. O salário, contava ele, não era grande coisa e, para poder ir ao teatro declamado e às revistas, procurava obter bilhetes a preços mais baratos. Eram os chamados "bilhetes de claque". 

O que era isso? Eram bilhetes vendidos por intermediários, a preços bem mais baixos do que os praticados nas bilheteiras. Quem comprava "bilhetes de claque" ficava com uma obrigação, simples mas nem sempre cómoda: bater muitas palmas, ao longo do espetáculo, para "puxar" pelo restante público e assim animar a sala. Isso tanto podia ser feito nos primeiros dias de exibição, para sublinhar o "êxito" após a estreia, como acontecia quando os espetáculos entravam em declínio, em matéria de público, caso em que os bilhetes entravam em "saldos". 

O momento das palmas dos portadores de "bilhetes de claque" - que creio nunca excediam uma meia dúzia de pessoas por sala - eram determinadas pelo "claqueiro", um homem que ficava de pé, encostado a uma das paredes do teatro, e que, quando entendia, batia ele próprio palmas, sinal a ser seguido pelos portadores de "bilhetes de claque".

O meu pai recordava, numa imagem da memória divertida e feliz que guardava desses tempos, que quando as pessoas que tinham adquirido "bilhetes de claque" não estavam a cumprir de forma tida por satisfatória a função a que se tinham comprometido, o "claqueiro" se aproximava delas e sussurrava: "Ó senhor! Umas palminhas! Não se esqueça!"

Vim para Lisboa cerca de 40 anos depois do meu pai. E ainda usei, por diversas vezes, "bilhetes de claque", que comprava a um cavalheiro redondo, de fato preto e cabelo empastado, plantado ao fim da tarde à porta da estação do Rossio. "Para o Variedades não tenho nada. E já está difícil para o Maria Vitória! Mas ainda há bilhetes em conta para o Monumental e para o Avenida ", dizia, em voz baixa.

Que me recorde, nunca fui recriminado pelos "claqueiros", pelo que presumo que me comportei à altura das suas expetativas. Ou, se calhar, gostei mesmo das peças que vi... 

terça-feira, outubro 29, 2024

Equívoco


Há um imenso equívoco no mundo do futebol. 

O adepto clubista investe, emocional e irracionalmente, num emblema. Sofre e sente profundamente as vitórias e as derrotas do seu clube. Já se percebeu que isso é das lei da vida.

Por um qualquer mistério, que confesso que nunca percebi, o adepto comum parece ser levado a pensar que um jogador ou um treinador, chegado de um outro clube, muitas vezes transferido e pago a peso de ouro, passa, por essa simples transferência, a ter de transpirar um "amor à camisola" do novo clube idêntico àquele que o adepto sente, como se de um amador se tratasse. 

Às vezes, é verdade, há alguns profissionais que "go native" e passam a ser adeptos e a partilhar a mística do clube. Mas essa é exceção. A regra, para um profissional, é mostrar plena lealdade ao clube, enquanto nele trabalha, e que exerça a função para que foi contratado da melhor forma que sabe e pode. Quando tiver de sair, não lhe é exigível nada mais do que o cumprimento do que estiver no contrato, escrito ou implícito. Tudo o resto não passa de um equívoco.

Europeus

Não deixa de ser algo irónico que, no momento em que a União Europeia - algumas das suas políticas e leis - é fortemente criticada em alguns dos seus Estados, como fautora de problemas, essa mesma União seja tida como um eldorado por alguns putativos futuros aderentes.

Livros

Posso estar enganado e a ecoar uma ideia meramente impressionista mas, depois de passear por algumas livrarias, fiquei com a sensação de que os livros de auto-ajuda, de "how too" e de filosofias-de-trazer-por-casa sobre a vida estão em crescendo em edições portuguesas.

Trump

É difícil avaliar o efeito de um comentário muito insultuoso para a comunidade latina nos EUA, feito por um apoiante desastrado de Donald Trump, durante um dos seus mais importantes comícios de campanha. Se Trump perder, estas coisas irão serão contabilizadas.

Turismo


Ontem, dei uma de turista e subi ao terraço da torre das Amoreiras. Não me arrependi.

segunda-feira, outubro 28, 2024

A apuração e os apuros da verdade

Os recentes atos eleitorais na Moldova e na Geórgia, independentemente de terem tido resultados oficiais que apontam em sentidos contrários, mostram que os eleitorados daquelas antigas repúblicas da União Soviética permanecem bastante divididos, isto é, que, independentemente da eventual vitória de uma linha, subsiste um forte movimento de opinião em favor da linha que se lhe opõe.

Em ambos os casos, o desfecho dos sufrágios permanece objeto de forte contestação. Em ambos os casos, há acusações de ingerência russa, em favor dos grupos políticos mais favoráveis a Moscovo. Em ambos os casos, o mundo ocidental é acusado de favorecer os partidos que combatem a influência da Rússia. Em ambos os casos, no exterior do país, cada um acredita apenas na palavra de quem está próximo dos projetos e das orientações políticas que são as suas. Em ambos os casos, porque se trata de democracias sobre cujo modo de funcionamento subsistem muito sérias dúvidas, a verdade é um bem difícil de apurar. Exceto para os que não têm dúvidas e são donos dessa mesma verdade, a qual, curiosamente, coincide exatamente com aquilo que pensam.

A presidente


Por estas horas, na Geórgia, antiga república soviética do Cáucaso do Norte, vivem-se momentos de forte tensão política. O resultado das eleições legislativas deste fim de semana, oficialmente anunciado como sendo de sentido favorável à força política que está no poder há vários anos, é posto em causa pelo conjunto das forças da oposição, bem como pela presidente da República, Salome Zourabichvili. 

O governo é acusado de estar enfeudado aos interesses de Moscovo e a Rússia surge, em especial num discurso de há horas da presidente (a imagem é desse momento), como tendo interferido diretamente no ato eleitoral. Os próximos dias vão ser decisivos para se perceber qual será o desfecho deste confronto. 

Mas não é das eleições de ontem que quero aqui falar hoje.

Quero deixar uma nota sobre Salome Zourabichvili. Nascida em Paris, de pais de origem georgiana, foi diplomata francesa durante quase 30 anos. Um dia, foi designada embaixadora da França na Geórgia. O mais surpreendente viria em seguida: em 2004, Zourabichvili saiu dessas funções, passou a ter nacionalidade georgiana e ... foi nomeada ministra dos Negócios Estrangeiros da Geórgia! 

Visitei-a poucas semanas depois da sua assunção de funções. Tinha ido a Tbilisi, capital da Geórgia, integrado numa missão da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), ida de Viena. Éramos cinco embaixadores: Estados Unidos, Rússia, França, Itália e Portugal. O nosso objetivo era múltiplo: visitar a zona de fronteira entre a Geórgia as repúblicas russas da Inguchétia e da Chechénia, onde tinham ocorrido incidentes de que Moscovo se queixava, bem como as regiões da Ossétia do Sul e da Abcásia, ocupadas por independentistas que punham em causa a soberania da Geórgia sobre esses territórios. E, nesse contexto, durante quase uma semana, viajámos muito e falámos com muita gente.

A conversa com Salome Zourabichvili começou com a forte rejeição por parte desta de quaisquer responsabilidades do seu país nos acontecimentos que tinham levado às acusações russas. E viria a acabar algo tensa. 

O meu colega americano, Stephan Minikes, numa lógica bilateral que não era para ali chamada, decidiu dizer à nova ministra do interesse de Washington em reforçar fortemente a cooperação dos EUA com a Geórgia. (À saída, no corredor, perguntei-lhe: "Os EUA não têm cá embaixador? Não devia ser ele a dizer o que disseste?" Minekes, cuja experiência diplomática era muito escassa, atentou no que eu lhe disse: "Se calhar tens razão! Espero que o State Department não se aborreça"). 

Na ocasião, vi o embaixador russo, Alexander Alexeyev, ficar cada vez mais agitado na sua cadeira: uma das queixas de Moscovo era precisamente essa crescente intromissão americana numa área do mundo que a Rússia, visivelmente, considerava parte da sua "chasse gardée". Depois do 11 de Setembro, o "politicamente correto" da luta contra o terrorismo tinha obrigado Moscovo a mostrar-se complacente com a intromissão dos EUA no "near abroad" da Rússia, mas o prolongamento americano nessas regiões, em especial Cáucaso e Ásia Central,  começava a irritar Putin.

Os três embaixadores da União Europeia olhavam, entre o interessado e o divertido, aquele esgrimir da lógicas argumentativas que, no fundo, simbolizavam já fortes rivalidades geo-políticas de natureza global. Zourabichvili, que ali se percebeu ser fortemente anti-russa, travou-se então de razões com Alexeyev. Aqueles quase três quartos de hora de debate ofereceram-me um bom retrato da senhora, a qual, a partir de então, veio a ter um futuro destacado na política do seu país. 

Quatro anos mais tarde, depois de grosseiros erros táticos cometidos pelo então presidente georgiano, Mikheil Saakashviki, a Rússia daria uma primeira machadada nas ambições da Geórgia de se aproximar do ocidente e de recuperar os territórios perdidos. Agora, vinte anos depois, Salome Zourabichvili é a presidente do seu país em termo de mandato, que iniciou em 2018. Este seu estertor político soma-se ao facto de os presidentes georgianos deixarem, a partir deste ano, de ser eleitos em sufrágio direto e passarem a ser escolhidos pelo parlamento. 

Não me admiraria nada se, num futuro não muito longínquo, Zourabichvili viesse a ver-se obrigada a ter de ir passear pelas ruas do seu Paris natal...

domingo, outubro 27, 2024

O senhor Fernando


Morreu o senhor Fernando, Fernando Pinto de Sousa. Quem não é de Vila Real, não o conheceu. Para as novas gerações da cidade, o nome do senhor Fernando também dificilmente dirá alguma coisa, embora a sua figura, de porte direito, a passear-se lentamente pelas ruas, fizesse parte, por muitos anos, do cenário urbano.

O senhor Fernando morre com 97 anos, precisamente a mesma idade com que por ali perdi o meu pai, vai para muito tempo. Há uns anos, tinha feito ao senhor Fernando a promessa de estar presente na festa do seu centenário. Mas já não vai haver festa.

Quem era o senhor Fernando? Por muitos anos, nem sei quantos, era a pessoa que tomava conta do "Clube de Vila Real", a agremiação social que reunia a elite da cidade. Ali havia bailes, livros e revistas para ler, um bilhar e sala de jogo de cartas. Do jogo "social", a casa declinou para terreno de pura e dura jogataina, depois para um ambiente de copos e de música, evolução que lhe prolongou a existência mas corroeu em absoluto o prestígio, deixando de servir os propósitos que tinham levado à sua criação. 

O senhor Fernando viveu no andar superior do "Clube" e geriu, por décadas, o quotidiano da casa, providenciando cafés (imagino que também álcoois) e renovando baralhos de cartas. Por décadas, conciliou os egos locais que por ali andavam, "importâncias" que se contrapunham, feitios que se chocavam. Deve ter estado presente em confrontos, até físicos, de que se sabe que o Clube chegou a ser cenário.

O senhor Fernando, porém, foi sempre uma pessoa discreta, como se requer a quem tem de organizar um cenário de intensa passagem lúdica de cavalheiros e de outros que se esforçavam, muitas vezes debalde, por passar por sê-lo.

Na minha adolescência, o clube foi também um ponto de encontro noturno para os filhos dos sócios, como era o meu pai, em especial no Verão. Mas isso não se fazia sem uma regular tensão com o senhor Fernando, que nos aturou alguns desacatos, que chegou a ter de queixar-se de nós à direção, a qual acomodava depois as coisas com uma conversa discreta, sob a promessa de não fazer chegar o assunto aos nossos pais. E o senhor Fernando esquecia os nossos pecadilhos. E ficou mesmo amigo de muitos de nós.

Nas últimas décadas, quando acontecia eu estar presente em algum ato público na cidade onde nasci, o senhor Fernando tinha a constante gentileza de se apresentar por lá estar, assim sublinhando a amizade que fazia o favor de ter por mim.

Nesta despedida do senhor Fernando, com que parte um pouco da Vila Real da minha memória de tempos felizes, deixo um abraço de pesar ao seu filho Álvaro, que era um orgulho constante nas conversas do pai.

Falando do Partido Democrata americano


Imagino que muito poucos terão paciência para me ouvir durante 18 minutos, mas tendo a ingenuidade de pensar que sempre haverá alguns resistentes, deixo um link para a intervenção, sobre a identidade político-ideológica do Partido Democrata americano, que proferi na Conferência Anual da Fundação Res Pública, na quinta-feira, dia 24 de outubro.

Aqui fica o link

Resultados

Uma democracia saudável revela-se pela serenidade com que são aceites os resultados eleitorais. Felizes os países - e Portugal é um deles - onde, ao final do dia, se conhecem os vencedores e os vencidos, com estes a aceitarem o desfecho, por ínfimas que as diferenças possam ser. 

Ferreira do Alentejo


Tive ontem o gosto de intervir numa iniciativa organizada em Ferreira do Alentejo, no âmbito da respetiva Universidade Popular, de que é reitor o professor David Justino. Devo dizer que desconhecia esta interessante entidade até que, já há alguns meses, recebi um convite para ir ali falar, formulado por Inácio Ludgero, uma conhecida figura da fotografia e do foto-jornalismo português, que há muito desenvolve uma meritória atividade na área da difusão cultural.

Com uma sala cheia de gente que se mostrou interessada e muito interventiva - onde tive o prazer, logo à entrada, de ver à venda a 3ª edição do meu livro "Antes que me esqueça", publicado há quase um ano - mantive mais de duas horas de animado debate. O tema era "A Diplomacia e a vida", mas logo se percebeu que, da análise em abstrato da natureza da atividade diplomática, a conversa teria de derivar para a atualidade do estado do mundo. E assim aconteceu.

Um agradecimento particular é devido ao presidente da Câmara de Ferreira do Alentejo, Luís Pita Ameixa, que foi o anfitrião do evento, e à "culpada" pela extraordinária atividade cultural que se desenvolve em Ferreira, Dra. Maria João Pina.

sexta-feira, outubro 25, 2024

Notícias do Cáucaso

Quando leio na nossa comunicação social os zelosos semânticos chamarem caucasianos aos brancos, pergunto-me o que pensarão disto os cidadãos do Cáucaso. Quando voltar a jantar no "Ararate" (recomendo!), vou perguntar.

Danças políticas

O pequeno partido da direita radical parece uma barata tonta no mercado político. Afasta-se da extrema-direita quando pressente que isso é tóxico, cola-se e descola-se da direita clássica à medida das conjunturas, tentando cavalgar as oportunidades mediáticas.

Isaltino

Sou insuspeito de poder ter a menor complacência com a figura política de Isaltino Morais. Mas sou obrigado a reconhecer que esteve bem na sua postura perante os recentes acontecimentos de violência.

A Rússia e os BRICS

A reunião dos BRICS foi o maior sucesso diplomático que a Rússia conseguiu, desde o início da invasão da Ucrânia. Putin foi hábil no modo como abusou desse palco para defender a sua posição nacional, excedendo manifestamente a sua qualidade de presidência rotativa dos BRICS.

Foi bastante significativo ver vários Estados do "mundo BRICS" a apoiar, expressa ou subliminarmente Moscovo. O silêncio complacente de outros revela que a causa ucraniana pode estar a perder cada vez mais força naquele âmbito.

Guterres e os BRICS

Guterres não poderia nunca eximir-se a estar presente na cimeira dos BRICS, apenas pelo facto de ela ter lugar na Rússia - que, aliás, é um membro permanente do Conselho de Segurança da ONU. Quando os EUA invadiram ilegalmente o Iraque, o SG da ONU cortou relações com Washington?

Devendo estar consciente de que a forma é relevante para o conteúdo das coisas, a máquina da ONU deveria ter cuidado ao pormenor - e visivelmente não o soube fazer - da coreografia dos momentos do seu SG com Putin, evitando o aproveitamento por este das "photo opportunities".

Norte-coreanos

Pensemos friamente: a eventual utilização tropas norte-coreanas na defesa ou retoma da região de Kursk, zona russa parcialmente ocupada pela Ucrânia, seria uma coisa muito diferente do seu emprego na luta no território ucraniano.

Há um aspeto interessante na presença de tropas norte-coreanas na Rússia. Trata-se de gente que viveu toda a vida num condicionamento total, em matéria de contactos e de informação. Será que o seu governo e os russos conseguem preservá-los da "poluição" pelo mundo exterior?

" O que faz falta"


Tenho imensa pena que um conflito de agendas me não permita estar em Matosinhos, na Casa da Arquitectura, na inauguração da exposição "O que faz falta", comemorativa dos 50 anos de Arquitetura em Democracia.

Tenho o gosto de contribuir com um texto para o respetivo catálogo, que proximamente será editado, a que dei o título de "Assim estamos".

Ilegalização?

Nunca fui adepto da ilegalização do Chega, com base na sua possível inconformidade com o nosso ordenamento constitucional. Conheço os riscos que uma ação nesse sentido pode vir a ter, em termos de vitimização e hostilização do seu eleitorado. Porém, o comportamento daquele grupo político começa a configurar uma postura que desafia a ordem constitucional. E a democracia tem de saber defender-se.

(Este post não aceitará comentários).

O voto absolve?

Algo vai mal neste país quando, ao ser abordado o caráter eventualmente criminoso de atitudes de responsáveis de um partido de extrema-direita, se argumenta com os votos que esse mesmo partido obteve, como se pudesse haver uma espécie de legitimação democrática dos crimes.

(Este post não aceitará comentários).

Áh!


Talvez fosse útil alguém explicar a alguns "injustamente acusados de serem jornalistas" (como dizia Baptista-Bastos) que as siglas e os acrónimos não levam acento. Isto está a ficar bonito, está!

América



Sou suspeito, porque fui um dos interventores na Conferência Anual que a Fundação Res Publica ontem realizou, dedicada às eleições presidenciais (e não só) nos EUA, mas tenho a impressão de que quem a ela assistiu, e quem nela participou, não deve ter dado por mal empregado o seu tempo. Coube-me ali falar da identidade político-ideológica do Partido Democrata. 

Ana Santos Pinto, Bernardo Pires de Lima, Nuno Severiano Teixeira, Pedro Adão e Silva e Pedro Silva Pereira foram os outros oradores, cada um abordando um tema específico. Três horas de útil reflexão, sob a batuta e o relógio de José António Vieira da Silva, com participações interessadas e substantivas da audiência. 

Contudo, nenhum de nós conseguiu adiantar um palpite sobre quem sairá vencedor da compita...

"Obrigado"

Tenho algum orgulho em poder dizer que sempre olhei com grande simpatia para a presença de estrangeiros a trabalhar em Portugal. Por isso, acho que tenho alguma autoridade para poder dizer que não me parece normal que, nas quatro viagens que ontem fiz em TVDE, me tenha cruzado com três condutores que não falavam uma única palavra de português e que tinham um inglês abaixo de "macarrónico". Vá lá: dois deles, no final, com um grande sorriso, disseram "obrigado".

quinta-feira, outubro 24, 2024

Memória


Estive lá hoje. É uma sala vazia de pessoas, mas cheia de boas memórias de quem por ali passou as últimas décadas de uma vida ímpar. Recordo algumas conversas, a última das quais foi já muito penosa. Como me acontece com alguma frequência, senti falta dessa grande figura de português que foi (que é) Mário Soares.

Apresentação



Ferreira do Alentejo



Bloco de Notas


Entrevista conduzida por Maria Flor Pedroso.

Pode ouvir aqui.

Lembrando

Este blogue tem dono. Dono, proprietário. E o dono de um blogue, por muito anti-democrático que isso possa parecer, não autoriza a publicação de comentários que relevem de agendas racistas, xenófobas e discriminatórias. Quando, por vezes, decide deixar passar alguns comentários que se aproximam desse registo é apenas com o objetivo de ilustrar, pela caricatura, a postura ridícula de alguns cromos que por aqui vão aparecendo - e, nos últimos dois dias, tem sido um fartote deles, como seria de esperar. É só para lembrar.

quarta-feira, outubro 23, 2024

Pensem nisto


O colonialismo teve faces bem sombrias. Esquecê-las, só porque são desagradáveis, é uma estupidez histórica e um atentado à memória coletiva dos povos cujas culturas se projetam em língua portuguesa, a língua colonial sem a qual esta fotografia seria improvável.

Este PSD

Este PSD é um partido estranho: deixou de ser desempoeirado nas questões "de costumes" e, apenas para recuperar o voto reacionário, tornou-se igual ao pior CDS na "cidadania" e, o que é muito mais grave, colou-se a agendas do Chega. Tenho amigos do PSD que se sentem incomodados.

terça-feira, outubro 22, 2024

Agora, aguentem-se!

Os governos não são parvos, mas, às vezes, parecem sê-lo. (Não, não vou falar de política interna). 

Anda lá por fora meio mundo excitado com a movimentação dos BRICS. Relembro que tudo começou quando um fulano da Goldman Sachs juntou as primeiras letras do Brasil, Rússia, Índia e China, potências ditas emergentes, que se encontravam em reuniões de diálogo e de muito escassa cooperação, e crismou o acrónimo BRIC. (Um acrónimo, lembro, é uma sigla que se consegue ler como uma palavra). O "S" que então faltava surgiu quando a África do Sul ("South Africa") se juntou aos restantes.

Os BRICS nunca foram grande coisa. A sua identidade vinha mais do contraste com o "primeiro mundo", menos por um qualquer cimento estratégico próprio. Os BRICS nunca foram uma espécie de "G7 dos pobres", muito longe disso. 

Curiosamente, foi o mundo desenvolvido que deu alguma força aos BRICS. Ao ter impulsionado, na crise financeira de 2008, essencialmente por razões de interesse próprio, a atividade até então discreta do G20, pensando que conseguia trazer para uma governança por ele tutelada os principais atores económicos do mundo, o G7 acabou por alargar o diálogo entre muitos desses Estados. No final, não seria o G7 a satelitizar os membros (não ocidentais) do G20, mas seriam os BRICS a cooptar alguns dentre eles para o seu seio, como recentemente se viu.

Mas que não haja ilusões: a identidade dos BRICS nunca igualará a do G7. É fácil explicar porquê.

A China, a que a guerra na Ucrânia obrigou a acelerar a sua dinâmica de ambição como potência, mostra uma clara intenção de utilizar os BRICS como plataforma para tal. Mas, ao contrário do G7, onde a preeminência dos Estados Unidos é não só tolerada como aceite como uma fatalidade, a China não consegue garantir no seio dos BRICS um papel de liderança indisputada. A Índia, que está no grupo por necessidade de afirmação própria, nunca irá permitir que isso aconteça. 

No grupo BRICS original, a África do Sul era, manifestamente, o parceiro mais fraco, e mantem-se irrelevante no atual contexto. O Brasil combateu, sem sucesso, o alargamento dos BRICS, porque sabiamente pressentiu que a extensão do grupo iria significar a diluição do seu poder relativo. Mas viu-se vergado a flexibilizar a sua atitude pela vontade da China (não se percebeu bem se também da Índia). A Rússia, num tempo de grande dificuldade, precisa desesperadamente quem lhe suporte o estatuto de potência, pelo que o alargamento do "clube" seria conveniente à quase obsessiva e ridícula coreografia diplomática de Putin.

E assim os BRICS, nos dias de hoje, vão andando na tentativa de densificação da sua cooperação. Mas sente-se que o mundo ocidental anda cada vez mais preocupado com este diálogo acrescido. E, numa estupidez estratégica e declaratória, junta, às vezes, tudo no mesmo saco. 

O tal mundo ocidental - com os Estados Unidos e a Europa à frente - tentou, na sequência da invasão russa da Ucrânia, apelar aos princípios da ordem internacional que entenderam estarem a ser violados. 

Pelo belo barómetro que são as resoluções da Assembleia Geral da ONU, percebeu-se que esse argumentário euro-americano (com outros amigos mais ou menos íntimos) começou por ter algum sucesso junto daquilo a que alguns chamam "Sul global".

Até que um dia sucedeu o que está a suceder em torno de Israel. E esse tal "Sul global" deu-se de repente conta de que os mesmos princípios e valores que tinham sido evocados para o caso ucraniano afinal não eram aplicáveis no caso palestino. E grande parte desse Sul, com os BRICS à cabeça e com a suas opiniões públicas na base, confirmou que o ocidente tinha dois pesos e duas medidas e que, afinal, os tais princípios e valores só prevaleciam quando serviam de suporte aos interesses geopolíticos ocidentais. E viu-se o tal ocidente, em poucos meses, a perder toda a autoridade moral que invocara na Ucrânia. Sem o afirmar, tinha afinal adoptado o conhecido princípio de Groucho Marx: "Estes são os meus princípios. Se não gostarem, tenho outros".

Mesmo com os seus limites, o sucesso organizativo dos BRICS, gerando outros movimentos de agregação e simpatia a Sul, confronta visivelmente o mundo ocidental. Mas acaba por ser o resultado de uma crescente hipocrisia por parte deste. Agora, aguentem-se! 

Os governos não são parvos, mas, às vezes, parecem sê-lo. Ou fazer de nós parvos.

Violência e bom senso


É grave aquilo que se passou na periferia de Lisboa, com um morto como resultado de uma ação policial. Não interessa aqui entrar na avaliação das culpas. O que quero lembrar, à luz da experiência de ocorrências similares em outros países, é o forte potencial de arrastamento que este tipo de acontecimentos tem. Todos sabemos que há "bombas relógio" de tensão social e inter-étnica em certas zonas e que uma faúlha pode desencadear uma bola de neve de violência. Portugal não tem um histórico neste domínio, mas nada impede que, de um instante para o outro, as coisas fujam do controlo. Esperemos que assim não venha a ser.

"Santa Luzia"


Há uns anos, Fortunato da Câmara, uma das escassas vozes na crítica gastronómica que nunca me induziu a erros, na indicação de bons restaurantes, tinha chamado a minha atenção para o renovado "Santa Luzia", à entrada de Viseu, que conheci em diversos tempos. Entretanto, constou que o restaurante tinha sofrido mudanças na gerência, o que, para o compreensível conservadorismo dos frequentadores de restaurantes, introduz sempre inquietantes pontos de interrogação.

Acresce que, à volta da cidade de Viseu, tinham entretanto surgido propostas curiosas, desde a sofisticada "Mesa de Lemos" à comida de tacho do "Cantinho do Tito", passando pelo surpreendente "De Raíz". E, claro, havia sempre a segurança do "Caçador" e da "Arouquesa", com o restaurante da Pousada a continuar a não mostrar garra e o "Cortiço" a fazer saudades do D. Zeferino, em tempos em que a "Trave Negra" por ali chegou a pedir meças.

Tudo isto para dizer que me decidi hoje, numa viagem entre Vila Real e Lisboa, a regressar ao "Santa Luzia". Como me recordava que o espaço interior era vasto, ainda tive a tentação de não reservar, mas optei por fazê-lo, como me ocorre 99% da vezes. Em boa hora o fiz: a casa encheu! Mesmo tendo imensos lugares! 

A arquitetura da casa, que creio que já tem mais de uma década neste seu formato, é simpática, moderna, arejada, com estacionamento próprio e espaço exterior atencioso para fumadores.

O serviço foi diligente, sabedor e excecionalmente acolhedor. Tudo o foi pedido estava muito bem apresentado. Alguns "mas": quer uma vitela assada quer o caldo verde que a antecedeu ganhariam em ter um pouco mais de apuro. O galo "pica-no-chão" estava com excelente sabor, embora um pouco demasiado "al dente" (embora galo e frango não tenham a mesma textura, eu sei). As sobremesas provadas eram muito boas. Bebeu-se um tinto do Dão, da casa, que não desmereceu. No meu rácio satisfação/preço, o "Santa Luzia" saiu aprovado. Deixo o registo.

segunda-feira, outubro 21, 2024

Pensem!

Há várias maneiras de fazer alianças com a extrema-direita, tentando captar o seu eleitorado (perdido). Uma delas é copiar as suas ideias.

"Farta Brutos"


Nunca por aqui contei esta história. Uma história muito triste, de outros tristes tempos. 

Foi logo no início dos anos 90. Eu vivia então em Londres. Vim sozinho por alguns dias a Lisboa e telefonei a um grande e velho amigo nosso, sugerindo que fôssemos jantar. 

Ele vivia em Alfama. Na conversa, pelo telefone, disse-me que, não muito longe da sua casa, havia uma tasca, com cozinha tradicional portuguesa, que ele ainda não conhecia e de que lhe tinham falado muito bem. Achei uma ótima ideia. Fui ter à sua casa (recordo-me que vivia no mesmo prédio de Carlos Carvalhas, então secretário-geral do PCP) e daí partimos para o jantar.

Chegados os dois à tasca, sentámo-nos e esperámos para ser atentidos. Comecei a estranhar o facto de, ao final de largos minutos, ninguém vir à nossa mesa. O meu amigo, que se chamava Jorge (morreu, entretanto, há uns bons anos), ia fazendo gestos, tentando chamar alguém para nos servir. Do pessoal da sala e do lado de dentro do balcão, comecei a assistir a sorrisos e a atitudes desdenhosas, que visivelmente lhe eram dirigidas. 

O Jorge era homossexual, tinha uma coreografia gestual que indiciava claramente isso, e rapidamente me apercebi que os empregados da casa estavam a escarnecer do seu nervosismo e da irrequietude dos seus trejeitos. A certo passo, ouvi mesmo de um deles: "Então quem é que vai atender o maricas?". E iam rindo, entre si, de forma alarve.

Nunca me conformei com a cobardia da reação que, a certa altura, tive. Levantei-me e disse: "Jorge, vamos embora!" Sempre fiquei convencido de que ele não estava a aperceber-se bem do ambiente que se tinha criado à nossa volta. Parecia incrédulo, não entendendo (ou talvez não querendo entender) o que se estava a passar. Eu terei achado que uma clarificação pública e sonora da situação o podia humilhar. Arrastei-o para fora do restaurante, metemo-nos num taxi.

Há poucos dias, ao entrar para o "Farta Brutos", com um grupo de pessoas, depois de uma conferência na FLAD, lembrei-me de ter sido precisamente ali que o Jorge e eu tínhamos aportado, logo depois da cena miserável passada na tasca de Alfama. 

Ainda tive a tentação de contar a história às pessoas que iam comigo. Mas achei que quem tinha sentada a meu lado, Anne-Marie Slaughter, a conferencista dessa tarde, ex-assessora de Obama, autora e universitária prestigiada, talvez tivesse alguma dificuldade em entender que, há pouco mais de trinta anos, o ambiente social de Lisboa ainda fosse tão homofóbico e discriminatório. Ou quiçá eu não quisesse, afinal, confrontar-me com o facto de, na circunstância, não ter armado a "peixeirada" que era merecida e ter, simplesmente, optado por ir jantar a outro local.

O "Farta Brutos", a que muitos chamavam o "Tavares Pobre", por se situar nas traseiras do "falecido" "Tavares", essa histórica estrela caída da restauração lisboeta, tinha-nos acolhido, nessa noite de 1990, com a urbanidade da casa decente e muito correta que sempre foi. Lembro-me bem disso.

Várias outras vezes voltei ao "Farta Brutos". Não guardo senão boas memórias desse que é, nos dias de hoje, um dos marcos constantes da boa restauração daquele (infelizmente cada vez mais descaraterizado) bairro. Na noite de há dias, voltei a comer ali muito bem. No final, recebi do proprietário o devido remoque ("Já não vem cá há algum tempo!"), a que pretendo responder com novo regresso em breve.

Negócios da China

Será curioso perceber qual o consenso possível deste lado do Atlântico face ao "bullying" a que Trump vai sujeitar a Europa, na su...