A decisão de
Marcelo Rebelo de Sousa de partilhar o dia de hoje com cidadãos portugueses
residentes no exterior merece ser saudada.
É clássica a frase
ficcionada de um português, interrogando-se junto de outro, de forma desencantada,
pelo facto de um país de descendentes de quantos «deram novos mundos ao mundo» continuar
a ser, nos dias de hoje, a nação mais pobre da Europa ocidental. A resposta do
interlocutor é clássica, na sua ironia : «Não é verdade! Nós não somos descendentes
desses portugueses intrépidos que descobriram o Brasil ou o caminho marítimo
para a Índia. Nós descendemos dos que não quiseram ir, dos que por cá
ficaram...» De certo modo, o mais ousado e ambicioso Portugal foi o que daqui
partiu.
O nosso país tem
hoje a viver no estrangeiro uma percentagem muito significativa da sua
população. Salvo exceções, a maioria desses nossos compatriotas foram obrigados
a sair, pela circunstância do país onde nasceram não ter sido capaz de lhes
proporcionar condições para aqui
realizarem o seu futuro, como seria da natureza normal das coisas. Esta é uma tragédia
nacional, com que vivemos desde há séculos e que nos desqualifica perante o
mundo. Não conheço nenhum país que force os seus cidadãos a emigrar e que, simultaneamente,
seja visto de forma prestigiada pela comunidade internacional.
No passado,
Portugal «exportava» mão-de-obra pouco qualificada, pessoas geralmente com escassa
formação, que iam para «os Brasis», depois para a Europa ou para o norte das
Américas, à procura de melhor sorte. A partir dos anos 60 do século passado, a
ditadura ludibriou muitos milhares de novos «colonos», seduzidos por um futuro
em Angola ou Moçambique, a quem foi escondido que estavam destinados a ser
«carne para canhão», no mais do que expectável estertor do nosso patético colonialismo.
Depois, foi o que se viu, com esses compatriotas a «retornarem» ao solo
europeu, ou a espalharem-se da África do Sul à Austrália ou, uma vez mais, pelo
continente americano.
Os últimos anos trouxeram
uma realidade migratória diferente. Largos milhares de jovens, alguns com excelentes
qualificações que o país pagou, na convicção de que neles alicerçaria o futuro,
continuam a ser condenados a ir buscar melhor vida algures, cedidos
«chave-na-mão» a economias desenvolvidas, que avidamente os aproveitam para o
seu desenvolvimento. É frustrante sentir que Portugal perde, em muitos casos de
forma definitiva, a sua geração mais qualificada de sempre.
Marcelo Rebelo de
Sousa, com este seu gesto, cumpre um dever de gratidão e contribui para tentar
preservar o tecido dessa magnífica reserva de portugalidade que são as nossas
comunidades.
22 comentários:
dizem alguns emigrantes, pensam quase todos, que «Portugal é bom...para passar férias".
E muitos estrangeiros, sem o dizerem e sem o pensarem, têm, inconscientemente, a mesma reacção que os emigrantes.
Se todos os emigrantes reformados fossem cativados a vir passar a reforma em Portugal, isto era melhor que ter petróleo ou minas de oiro.
"Não conheço nenhum país que force os seus cidadãos a emigrar e que, simultaneamente, seja visto de forma prestigiada pela comunidade internacional".
Esta sua frase é uma vergonha. Bastaria referir as enormes comunidades migrantes espanholas e italianas (dois países com enorme "boa imprensa"), para demonstrar a sua falta de razão. Infelizmente, o que está escrito já não pode ser apagado.
Ao Anónimo dos 10.18. Que eu saiba, Itália e Espanha são dois países que, no atual momento, não produzem fluxos importantes de emigrantes. Talvez também por isso tenham "boa imprensa". Pense nisso!
Caro Sr. Embaixador,
Nem de propósito, esta é primeira notícia do La Repubblica de hoje: http://www.repubblica.it/cronaca/2016/06/10/news/istat_calano_i_residenti_in_italia_per_la_prima_volta_dopo_90_anni-141705028/?ref=HREA-1
Sei que não fala italiano, mas compreenderá o que lá está. Junte ainda estas notícias de 2015:
http://www.corriere.it/cronache/15_luglio_07/nel-2014-italia-la-prima-volta-piu-emigrati-che-immigrati-londra-diventa-tredicesima-citta-italiana-f37cccc6-2478-11e5-8714-c38f22f7c1da.shtml
http://www.ilfattoquotidiano.it/2014/12/10/italiani-allestero-emigrazione-record-mai-cosi-tanti-negli-ultimi-10-anni/1261883/
Infelizmente, neste caso é o anónimo que tem razão. Como pode ver, pela primeira vez em muitos anos, há mais emigrantes que imigrantes em Itália, o que significa que a sua frase "são dois países que, no atual momento, não produzem fluxos importantes de emigrantes" está errada. E Espanha, embora em menor escala, vai pelo mesmo caminho: http://politica.elpais.com/politica/2015/12/04/actualidad/1449220349_507822.html
Aliás, a fuga de cérebros é muito mais grave em Itália que em Portugal. Basta andar um pouco pelas universidades estrangeiras para se ter essa percepão. Pense nisso!
Há muita gente a sair, ou pelo menos a tentar sair, de Espanha, que tem há decadas um índice de desemprego altíssimo, e mesmo de Itália, nesse caso gente muito qualificada.
Fernando Neves
"Que eu saiba, Itália e Espanha são dois países que, no atual momento, não produzem fluxos importantes de emigrantes. Talvez também por isso tenham "boa imprensa". Pense nisso!" Emigram, emigram e de uma forma muito significatifa! Até os franceses! Quanto à geração " de portugueses mais bem preparada de sempre": e as actuais gerações de jovens suecos, dinamaraqueses, alemães, franceses, italianos, gregos e um imenso etc, são menos bem preparadas que as gerações anteriores? Essa afirmação é de uma vulgaridade assustadora e suscita perguntas muito incómodas que cobririam no mínimo, a quem repete até à náudea essa perigosa e demagógica aldrabice, muita vergonha.
Senhor Embaixador: Portugal exportou pessoas de qualidade e importou autêntico lixo subsidio-dependente.
Santa ingenuidade !......
Mas hoje a expulsão dos melhores é feita à custa dos tachos e das prebendas aos dos grupos que são donos disto tudo! Ninguém consegue trabalhar em Portugal por mérito. Só os que "estagiam" no governo e afins é que ganham "competências" como é facto demonstrado à saciedade!
Ó Freitas, deves ter ficado todo contente pelo nosso país ter abdicado de um tesouro avaliado em cerca de 100 milhões de euros de um galeão encontrado na Namibia. Disto tu gostas ó Freitas, que Portugal faça de rico com esses povos. Sinto vergonha e escárnio por Portugal nas lonas abdicar de um tesouro histórico que lhe pertencia por direito internacional.
Será emigração mesmo? Ou será que é Portugal que se purga?
É que nem sei por onde começar...
A nossa emigração não é tragédia, é condição. Sem dramas nem fatalismos à portuguesinha. Um país pobre pequeno e provinciano, que se recusa a evoluir e a mudar, que não tem economia nem iniciativa nunca vai ter lugar para todos. Como parece que o país não muda há uns 250 anos, há de continuar a ser assim.
Quanto à nova emigração... "Largos milhares de jovens, alguns com excelentes qualificações que o país pagou, na convicção de que neles alicerçaria o futuro". A realidade ganha sempre às convicções e ao wishful thinking. Uma graaande maçada, mas é a vida. E sem economia onde aplicar e investir as qualificações, elas não servem de nada. Reconheça que a aposta foi errada:de que é que serviu apostar nas qualificações se não se apostou em criar as condições que absorvessem os "qualificados"? Era o mínimo exigível, o básico. Mas não, andou tudo em modo carpe diem.
Neste ponto, esperava um mea culpa e não um lamento. Custa-me que a sua geração não tenha tido a dignidade e a inteireza de assumir a sua dose de responsabilidades pelo estado a que o país chegou. E não venham atirar as culpas para a troika, a crise, a União Europeia e para o anterior governo. Deve ser a mais nojenta das características portuguesas: sacudir a água do capote.
O que tem estado a acontecer desde 2011 em Portugal é só o resultado da forma brilhante como país tem sido governado desde 76. A inventar a roda sempre que o governo muda de cor. E a crise em PT teve consequências mais graves por isso mesmo. Não espero um pedido de desculpas dos governantes dos últimos 40 anos, mas sempre ajudava a ter-lhes um bocadinho de respeito.
Pela minha parte, arrependo-me de ter sido ingénua - achava que ir votar era suficiente, que ser interventiva na minha comunidade era suficiente e que a sociedade civil existia - ter estado desatenta ao descalabro, ter acreditado um bocadinho nos amanhas que cantam, não ter pedido responsabilidades suficientes a quem me governava. Passei a fazê-lo, mas sem grande resultado porque os senhores deputados não respondem a perguntas de cidadãos. Muito ocupados, calculo. Vou experimentar o governo.
O outro lado da nova emigração também é relevante: a voluntária. Os que vão porque não querem cá estar, seja pela cultura do respeitinho que impera, a burocracia ridícula, a falta de debate, de espírito crítico, a cultura medíocre, o bafio mental,pelo interesse instalado que bloqueia qualquer novidade. Aqueles a quem este país não chega. E que já não querem saber muito de Portugal.. é muito fácil desapegar nos dias que correm, quando há tanta vida lá fora. Encontrar outros interesses, outras pessoas, outros desafios.
Só mais uma coisa: eu faço parte da geração mais qualificada de sempre e escolhi ficar em Portugal. Podia ter saído e não o fiz. Afinal de contas, era o meu país, merecia o meu esforço e o meu empenho. E fui ensinada - pelos meus pais e não pelo Estado - a não desistir à primeira dificuldade. Não fui a única. Tenho pena que não nos considere intrépidos, ousados ou ambiciosos. É que nós só queríamos mudar Portugal. Mas isso não interessa nada, pois não?
marta
Sr. Embaixador gostei tanto da marta
basicamente porque me revejo em muito do que Ela diz.
Sei também que há portugueses que no desempenho das suas funções profissionais têm o maior respeito pelos outros cidadãos e percebem o bem aventurados que são em trabalhar no seu próprio país se é e foi esse o Seu desejo,o Sr. incluído claro,mesmo e também independentemente da forma como ascenderam ao lugar que a ver pelas evidências dependeu mais da proximidade com os abana bandeirinhas do PSD E ou PS do que da nota de curso, que me lembre os melhores alunos dos cursos não são os primeiros a ter emprego.
Também tenho visto grandes opositores a este sistema que são os maiores seguidistas e promotores da prevaricação quando entram nele , dando a conhecer de imediato a sua avidez em entrar para fazer parte e não se cansar muito a pensar para mudar para melhor e ou criar estratégias para incluir ...
Agora ir trabalhar para outro país onde sem ninguém saber os ascendentes familiares ou da família politica e dos apadrinhamentos as pessoas são valorizadas pelo que são profissionalmente, até pelo teste vale a pena,já nem falo no valor do valor, não sei não estou que mesmo velhota ... Cada vez gosto mais dos Ingleses, o país que acolheu a minha filha e outros tantos como Ela, têm crescido exponencialmente na minha admiração e gratidão claro.
Agora eu mulher sem Fé tenho muita fé neste governo.
Parabens á Marta pelo seu comentário !
A Marta é a dos seguros?
É que toda a gente parece estar segura a concordar com a Marta...
Há alguém por perto que já está a meter a viola ao saco quando manifestava reservas a Marcelo. Eu cá, socialista, sempre fui à bola do Marcelo e acho que Portugal ficou a ganhar com um Presidente topo de gama, elitista, popularucho e esclarecido, mas eu ando lá fora em Bruxelas a lutar per' vida...
só falta a 1ª dama pimba para o xadrez ficar completo. o povo ia delirar com uma judite loiraça a distribuir afectos melodramáticos.
O texto de « Marta » é abrangente porque toca nos principais pontos fracos que caracterizam a emigração maciça da « miséria » portuguesa , desde há séculos.:
- Falta de perspectivas, o que quer dizer falta de futuro visível.
- Falta de respeito da dignidade humana, num país de valores cristãos.
- Falta de governantes de envergadura num mundo que evolui rapidamente.
Tendo emigrado há meio século, e conquistado uma boa posição social em França, acompanhei a evolução de Portugal através de visitas profissionais três ou quatro vezes por ano, durante trinta anos.
Assim, conheci o Portugal dos anos 60, da “grande evasão” para fugir às guerras coloniais, que caracterizava a juventude emigrante da época, misturada com os da “valise en carton”, que eram numerosos.
Recordo amigos “abastados” que tinham “quintas”, para as quais já não tinham “caseiros” , frequentemente tratados como “escravos”, que tinham partido a monte para lá dos Pirenéus. E que regressavam uns anos mais tarde, de férias, de automóvel, com férias pagas, graças ao emprego obtido na Renault ou no empreiteiro. Imagine-se o impacto desta “riqueza”naqueles que ficaram! Recordo aqueles “brasileiros” que na minha juventude regressavam a Portugal de férias, com o fato branco, o chapéu claro e o “sotaque”!
Recordo alguns amigos que cá vieram parar por falta das tais perspectivas de futuro, em Portugal, bem visíveis nessas décadas de antes de Abril. Alguns destes amigos foram obrigados a “baixar” as suas “pretensões” sociais para poder integrar-se no contexto do país de acolhimento. Aquilo que nunca teriam podido fazer no país de origem, fizeram-no aqui. Questão: porque não fizeram lá o que “aceitaram” de fazer no estrangeiro? Ninguém aceita facilmente de “descer” na escala social, sem ser obrigado pela força das circunstâncias.
Mas o que notei ao fio dos anos, é a diferença fundamental do capitalismo português e do capitalismo francês.
Em Portugal, durante séculos, a noção de investimento limitou-se àquele que rendia rapidamente e fortemente. O comércio das especiarias primeiro, que permitiu a criação de fortunas colossais, que não criava postos de trabalho, o comércio “protegido” de produções nacionais nas colónias, tais como o têxtil, o calçado, e afins, e a exploração duma mão de obra barata na metrópole, nos latifúndios do Alentejo, entre outros, e mesmo gratuita nas colónias para os produtos agrícolas, permitiu aos bancos e às grandes famílias portuguesas, que os detinham, de constituir impérios comerciais e algumas empresas industriais “exclusivas” de nível internacional. Os estaleiros navais, a siderurgia, o cimento, o vidro, entre outros, foram investimentos das grandes famílias portuguesas.
Mas faltou em Portugal o investimento industrial a grande escala, as PME, que caracteriza os países industriais da Europa, e que são os grandes criadores de postos de trabalho. As primeiras fábricas de electrodomésticos, de automóveis, e duma maneira geral de tudo o que traz um certo valor acrescentado, e, sobretudo, criam postos de trabalho, só apareceram depois da revolução de Abril.
Entretanto, foram firmas estrangeiras que investiram nestas produções, enquanto que os capitalistas portugueses se interessavam mais aos investimentos comerciais nos supermercados, por exemplo, ou na distribuição de produtos importados.
E outros, entretanto, começaram a investir os lucros nos paraísos fiscais, na mira de lucros mais substanciais e mais rápidos, que caracterizam os capitalistas do mundo inteiro actualmente. Conheci alguns capitalistas portugueses, que a partir duma certa época não investiam no seu utensílio de trabalho: a fábrica, afim de melhora a sua rentabilidade ou a sua produtividade. Não! Levavam tudo para a Suíça...
Se o comentário não fosse já longe, valeria a pena de escrever sobre a maneira como o patronato português trata moralmente os seus trabalhadores, além das condições do trabalho mal remunerado e precário.
O voto, Senhora Marta, não chega, para mudar uma situação tão complexa, num país que carece de bons gestionários, mais interessados nos seus negócios particulares, no que “particulares” traz como privilégios, mas sobretudo, que caracteriza um povo que decidiu desde há séculos de não lutar, porque lhe falta o que hoje é essencial num povo: o carácter!
Foram os militares que fizeram a Revolução. Não foi o Povo.
Apostar no futuro supõe pôr em jogo uma certa forma de conforto. Ora o mundo nunca foi tão inconfortável como hoje.
Mas compreendo que existam pessoas, que apesar do horizonte cinzento de Portugal (algures também não é lá muito melhor!) ainda preferem lutar “sur place” ! São corajosas, mas os tempos de hoje não se podem comparar aos de ontem, dos anos 60, sob a ditadura, porque hoje o mercado do trabalho é internacional e não há a PIDE nas fronteiras. E por isso os jovens partem. A lei da oferta e da procura joga plenamente. Os melhores ganham.
Para quem tanto escreveu contra o Prof. Marcelo chegando ao ponto de escrever "Depois nao digam que eu nao avisei" estes posts nao deixam de me espantar... Nao me digam que temos um recem-converto!
Ao comentador das 5.20. Pois sou eu precisamente quem tem mais "autoridade" para escrever. Disse o que disse, não renego uma palavra, constatando com total honestidade o que vou vendo. Se, um dia, tiver razões para me arrepender, lá lembrarei a frase que cita. Se não tiver, melhor!
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