domingo, junho 19, 2016

A homofobia em Portugal



Acho saudável o sobressalto suscitado pelo atentado terrorista que teve como alvo uma discoteca frequentada por homossexuais nos Estados Unidos. Embora pense que há outras dimensões dessa agressão que se devem considerar a nível idêntico da óbvia homofobia subjacente ao ato, creio importante que esse fator específico seja sublinhado, entendendo como natural que o acontecimento mobilize uma atenção particular para o tema. Porque ele é, cada vez mais, socialmente importante. Com a maior sinceridade, penso que só poderemos considerar-nos um país plenamente livre quando nos libertarmos, por completo, dos preconceitos residuais que o tema da homofobia ainda suscita.

Faço parte de uma geração que foi aculturada de uma forma muito peculiar quanto ao tema da homossexualidade. Não obstante, desde muito novo, ter convivido sem problemas com pessoas que deixaram entender publicamente essa sua opção sexual, não tenho o menor pejo em admitir que a aceitação "compreensiva" e formal dessa realidade ia estranhamente de par com o regular uso de uma linguagem jocosa e menorizante sobre o fenómeno. Ironias e graçolas, tendo como alvo os não heterossexuais, faziam parte de um discurso machista que eu próprio utilizei até muito tarde e com que, não raramente, me cruzo ainda em alguns circuitos sociais, onde o fator etário não é despiciendo.

Na cidade de província onde vivi até entrar para a universidade, a cultura dominante estava eivada de um ambiente profundamente discriminatório, que isolava e ridicularizava socialmente os homossexuais, que eram apontados a dedo pelas ruas, mesmo se tal era muitas vezes atenuado por uma espécie de tolerância sobranceira, mas que não escondia a ideia de fundo de que, no final de contas, se tratava de uma "anormalidade", mais ou menos admitida por uma espécie de liberalidade modernaça. Olhando retrospetivamente para esses tempos, posso imaginar a violência que esse ambiente social constrangente provocava, não apenas nessas pessoas, mas igualmente em quantos imagino que foram forçados a retrair a assunção pública da sua opção sexual.

Devo dizer que me dou conta de que esse ambiente paternalista está muito longe de dissipado nos dias de hoje e de que terão de passar ainda bastantes anos até que o respeito pleno pela liberdade de assunção de uma opção diferente da heterossexualidade seja comummente aceite de forma natural. Talvez o facto da cada vez mais famílias serem confrontadas com o "outing" de alguns dos seus membros possa ajudar a acelerar esta evolução.

Como cidadão, tenho a sensação de que este tema deu passos de gigante, nos últimos anos, em Portugal. E, devo dizer, sinto-me orgulhoso por fazer parte de um país que foi capaz, num prazo de tempo relativamente curto, de dar mostras de assumir uma postura de grande abertura nessa dimensão essencial da luta pela igualdade entre as pessoas. 

Há um teste que costumo utilizar para perceber se a aceitação da homossexualidade por parte de pessoas com quem convivo é real ou é apenas o resultado de um esforço intelectual para seguir o "politicamente correto": a questão da adoção de crianças por casais homossexuais. Independentemente de poder compreender quantos, por razões religiosas e até de uma certa leitura sobre a integração societal, achem que o crescimento de uma criança de deve fazer sob um quadro parental com um casal no modelo tradicional, estou profundamente convicto de que a grande objeção à adoção de crianças por homossexuais tem, "on the back of the mind", a ideia da "anormalidade" dessa opção e, no fundo, uma não assumida convicção de que se pode estar a expor as crianças a possíveis atos de pedofilia. Posso estar enganado neste meu raciocínio, mas é o que sinceramente penso.

12 comentários:

Joaquim de Freitas disse...

Existem muitos outros parâmetros que tornam o problema difícil. Por exemplo, a posição das religiões, incluindo a católica, desde há séculos , e do que está escrito na própria Bíblia.

A comunidade gay devia questionar-se sobre a utilidade das paradas triunfais da "Gay Pride" nas grandes cidades do mundo e dos espectáculos oferecidos por alguns dos seus membros em publico.

Aliás, encontramos o mesmo problema com o anti semitismo de certos povos católicos, onde a noção de culpabilidade do povo Judeu na morte do Cristo, que também era Judeu, aparece ainda hoje na mentalidade de gente pouco instruída mas profundamente religiosa.

alvaro silva disse...

O problema da atitude dos portugueses perante a dita homosexualidade é de rejeição na grande maioria. Sempre foi assim e sempre foram tolerados e de alguma maneira compreendidos. O problema é quando os maricões /mariconas começam a recrutar e a impingir a sua maneira de ser áqueles que o não são e que não gostam desta ou doutras perversões. Eu só sou homofobo quando a mariconada entra á força no meu círculo de relações, enquanto andarem a dá-lo sem o impor a outrem, por mim tudo bem, mas se vem para a rua manifestar-se ou impor-se , eu também me posso manifestar contra. Ou será que não? Será que não é democrático? Fico com as minhas capacidades constitucionais diminuídas? Ou terei (cruzes credo canhoto) de ser dessa seita?

JS disse...

Concordo com o seu "post", nomeadamente com o que assinala no último parágrafo sobre um real perigo nas adopções "gay".

Entretanto permita-me. Como bem acrescenta, "há outras dimensões".
Sim. Não se é obrigado a mencionar "Islão" ou "EI" ou "daesh" neste contexto.

Mas, espero que o Sr. Embaixador ao escrever sobre um outro qualquer "atentado terrorista que teve como alvo uma discoteca frequentada por homossexuais nos Estados Unidos", ou outro infeliz pertinente pretexto, nos dê a sua PREZADA versão sobre a aquilo que muito boa gente (Humberto Eco, por exemplo) assinala como:

"Uma "soft" invasão do Ocidente (EU e EUA) pelo Islão".
Que se iniciou há dezenas de anos e que se incrementou, despudoradamente, nos últimos anos, devido à atabalhoada disfuncionalidade do poder politicamente correcto, neste dois blocos, no que respeita a sua relação com o mundo islâmico.

Um Presidente americano que conviveu na juventude com uma facção do Islão e que culturalmente é um desenraizado.
Uma União Europa pouco coesa, em plena e demorada crise identitária.

Como também sabe essa pouco subtil invasão islâmica no Reino Unido terá sido a motivação do assassino da PM Jo Cox. Que se saiba não houve por ali oportunas homofobias.

Anónimo disse...

A adoção por casais heterosexuais é uma anormalidade também! Ninguém "arrisca" o propor a bigamia como uma orientação sexual, no entanto...! Aquela "coisa" que aconteceu em Paredes de Coura é uma enormidade! Etc. Porquê que teremos de considerar a homosexualidade uma normalidade?
A objeção à adoção por homosexuais tem a ver essencialmente e só com os superiores interesses da criança e não deve ter nada a ver com outros interessses das pessoas! A adoção é só para a criança!

ignatz disse...

tou admirado, só 4 comentários homofóbicos sobre um poste homofóbico. se calhar há mais a aguardar aprovação da censura prévia.

Anónimo disse...

homoSSexualidade!!! Leva dois "s". Não se diz homoZexual!!!

Anónimo disse...

Tinha que aparecer o heterossexual e também parece que não ficava nada mal ser "homo Zé xual"!

Anónimo disse...

A homossexualidade não é uma opção: é uma orientação, uma natureza. Ninguém escolhe friamente ser homossexual ou heterosexual.

A Nossa Travessa disse...

Chicamigo

Tenho um sobrinho gay filho do meu terceiro irmão que se suicidou. Criei-o como mais um filho e confesso que me assarapantei quando ele quis levar o amigo a nossa casa então na Lapa... Mas a Raquel já dito o sim e por isso tive de aguentar. Modifiquei todo o meu (mau) pensamento ao conversar com ele, pessoa de bem. Acabou-se-me a homofobia que tinha tido e agora já não tenho.

Por vezes custa ter um exemplo em casa. Mas nunca é tarde para aceitar...

Abç do Leãozão

Unknown disse...

Nesta como na religião e outras causas, as crianças deviam ser tratadas com muito mais respeito e não utilizadas como instrumento; e são e muito infelizmente.

Anónimo disse...

Há uma grande diferença entre ser-se gay e ser-se homossexual.
Os gays teem geralmente um estilo de vida diferente das outras pessoas.
Um homossexual não tem de ter um estilo de vida diferente das outras pessoas, heteros ou mesmo bi's e assim incluem-se melhor em toda a sociedade em que vivem.
Nunca tenho visto esta diferença explicada na media. Mas dá que pensar.

Marcos PTPG disse...

Que comentário infeliz deste António. Opinião é uma coisa é ignorância outra. Este senhor está a defecar palavras ao dizer que gay e homossexual são comportamentos distintos! Por onde andam os moderadores do site?!

Poder é isto...

Na 4ª feira, em "A Arte da Guerra", o podcast semanal que desde há quatro anos faço no Jornal Económico com o jornalista António F...