O mundo, e creio que o próprio Brasil, acordou, há dias, para a realidade do que é, na crueza da evidência, a representação parlamentar brasileira. Poucas coisas terão feito pior à imagem do Brasil do que o espetáculo patético daquela turbamulta ululante, no processo de destituição da presidente. Fiquei triste pelo Brasil. Vou contar-lhes uma história de que fui testemunha naquele mesmo espaço.
Era o dia 19 de agosto de 2005. Tinha sido convidado para estar presente numa homenagem que a Câmara dos Deputados ia promover a Sérgio Vieira de Mello, o funcionário brasileiro das Nações Unidas que, precisamente dois anos antes, tinha sido vítima mortal de um atentado em Bagdad.
Quando cheguei à sala, dei-me conta de que era o único embaixador presente. As restantes missões diplomáticas estavam ali a nível inferior. Não estranhei: de toda aquela gente eu era, com grande probabilidade, a única pessoa que conhecera pessoalmente Vieira de Melo. A diplomacia brasileira também estava debilmente representada, mas isso também não surpreendia: o Itamaraty, o MNE brasileiro, nunca apreciara excessivamente Vieira de Mello. Também sentada nos lugares dos deputados, estava uma luzidia banda de música, que iria abrilhantar o início do ato com a execução do belo hino brasileiro.
A sessão foi aberta pelo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, um inopinado presidente, escolhido como efeito colateral de um dissídio entre fações, que não durou mais de seis meses, suficientes para o consagrarem no anedotário político local. Cavalcanti começou a sua intervenção dirigindo-se ao «Senhor Sérgio Vieira de Mello». Um fâmulo acorreu, pressuroso, informando-o de que, tendo o passamento do homenageado ocorrido já há dois anos, era justificável a sua ausência da sala. Cavalcanti tinha lido mal, deveria ter-se dirigido ao «Senhor familiar de SVM», que ocupava um lugar na mesa. Passou a um texto laudatório e, acabada a função, saiu da sala.
A presidência passou então a ser ocupada pelos oradores seguintes, que emergiam sucessivamente dos bastidores, representando os mais de vinte partidos. Logo que acabavam de falar, zarpavam de imediato.
Quando cheguei à sala, dei-me conta de que era o único embaixador presente. As restantes missões diplomáticas estavam ali a nível inferior. Não estranhei: de toda aquela gente eu era, com grande probabilidade, a única pessoa que conhecera pessoalmente Vieira de Melo. A diplomacia brasileira também estava debilmente representada, mas isso também não surpreendia: o Itamaraty, o MNE brasileiro, nunca apreciara excessivamente Vieira de Mello. Também sentada nos lugares dos deputados, estava uma luzidia banda de música, que iria abrilhantar o início do ato com a execução do belo hino brasileiro.
A sessão foi aberta pelo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, um inopinado presidente, escolhido como efeito colateral de um dissídio entre fações, que não durou mais de seis meses, suficientes para o consagrarem no anedotário político local. Cavalcanti começou a sua intervenção dirigindo-se ao «Senhor Sérgio Vieira de Mello». Um fâmulo acorreu, pressuroso, informando-o de que, tendo o passamento do homenageado ocorrido já há dois anos, era justificável a sua ausência da sala. Cavalcanti tinha lido mal, deveria ter-se dirigido ao «Senhor familiar de SVM», que ocupava um lugar na mesa. Passou a um texto laudatório e, acabada a função, saiu da sala.
A presidência passou então a ser ocupada pelos oradores seguintes, que emergiam sucessivamente dos bastidores, representando os mais de vinte partidos. Logo que acabavam de falar, zarpavam de imediato.
Entretanto, na assistência, foi-se registando uma discreta debandada dos convidados diplomáticos. Eu resisti, estoicamente. No fim da longa cerimónia, chegou-se a um momento patético: eu era o único convidado que permanecia sentado nas cadeiras da Câmara. Na mesa, restava o último orador e o familiar de Vieira de Mello. Ah! Mas não estávamos sós: os músicos da banda, alguns já adormecidos, com as cabeças pousadas sobre as mesas parlamentares, continuavam à espera de que os mandassem embora. Aparentemente, ninguém lhes tinha dito nada!
6 comentários:
Embaixador, melhor do que eu sabe que mesmo aqui no seu blogue esta questão sobre o que se está a passar no Brasil tem acirrado opiniões. Já por aqui o disse e vou afirmar de novo, sou português( com muito orgulho), vivo e trabalho no Brasil. Sou de esquerda, de tipo social democrata á europeia. Resumindo sou do Partido Socialista( menos no tempo do Sócrates, ai votei Bloco de Esquerda). Vejo boa parte da esquerda portuguesa a ir na conversa do Golpe, como já o disse golpe foi em 1964, ai sim foi um golpe. Será que as pessoas que aqui vem com argumentos a lembrar o tipo "intelectualoide" porque o intelectual não se deixa enganar, dizia será que sabem mesmo que tipo de personalidades, são Dilma e Lula? atenção que eu sei que a esmagadora maioria da classe politica brasileira não presta, é corrupta. Aquilo que "intelectualoides" como o senhor Freitas e o reys, aqui vem dizer e defender chega até a ser infantil, eles colocam em causa várias instituições de um país que nem sequer é o nosso, colocam em causa todo um processo que até ver corre dentro da legalidade e isto só porque são pessoas que não conseguem enchergar para lá do dogma. Confesso o Lula para mim nunca me entusiasmou, naõ gosto do estilo nem politico nem pessoal, não gosto de assistencialismo, naõ gosto de populismo. Sou de esquerda, não voto no Brasil, uma vez que sou português( com orgulho, até mesmo das nossas colonizações), não sou do tipo do Freitas e outros que falam mal da nossa História e das nossas colonizações, só por achar que isso faz dele um intelectual, mas não faz, quando muito faz dele um "intelectualoide". Sou a favor da destituição da presidente Dilma, olhe nem vou falar no assunto das pedaladas fiscais e outras coisas, vou apenas a uma questão que para mim foi crucial, foi quando esta senhora nomeou Lula para ministro, se duvidas eu tinha relativamente ao caracter e falta de ética destes dois personagens, ai fiquei sem qualquer duvida. Não sou apoiante de nenhum partido politico no Brasil, mas de uma coisa tenho a certeza, lugar de ladrão e corrupto é na cadeia, seja ele quem for. Dizem esses "intelectualoides" que atrás citei de que se trata de uma disputa esquerda e direita, nada disso. Estão presos muitos donos de grandes empresas, não me parece que sejam pobres ou descamisados. Aliás era com essa gente que o PT fazia os seus grandes negócios, eles o PT o tal protector dos pobres e humilhados comia na mesma mesa dos grandes empresários, muitos deles corruptos e ladrões como aliás se tem comprovado. Agora que a esmagadora maioria da classe politica brasileira mete nojo isso é um facto. Desde o PT até aos deputados religiosos da treta, metem todos muito nojo.
que tristeza
infelizmente, nao vao faltando, por este mundo
"belo hino brasileiro" ??? Veja lá se eles se enganaram...
Dadas as funções que exerci nas negociações de Timor, conheci bem o Sérgio Vieira de Melo. Era um homem excepcional, como result de o terem ido buscar, quando já era Alto Comissário para os Refugiados para chefiar a Missão da ONU no Iraque. Guardo a carta que me escreveu quando deixei de me ocupar de Timor. Disse-me que não tinha seguido a carreira diplomática pela perseguição a que o Pai, diplomata, tinha sido sujeito no Itamarati durante a ditadura militar. Também que tinha tido um antepassado, liberal, preso em S. Julião pelos miguelistas durante a guerra civil.
Fernando Neves
É lamentável aquilo que se está a assistir no Brasil. Acho que nomeação de Lula para ministro terá sido porventura a mola que virou decisivamente o jogo contra Dilma.....não mais se ouviu falar em prisão de Lula....
Enganam-se todos, pensando que a seção da câmara que decidiu, em parte, o impeachment da presidenta, que foi um espetáculo patético. Foi sim uma grande festa, com muita alegria do povo, 80%. Só pensar que estamos a 1/2 caminho, andado para empurrar essa matilha de corruptos e incompetentes para fora do governo, mereceria uma festa maior, e nada de patético. Foi um deboche bem no estilo que o Lula e a Dilma governaram o Brasil. Dizer que é golpe? A presidenta viajou para os USA, e deixou o "golpista" no seu lugar, nem uma insana do quilate da Dilma, faria isso, se o Temer fosse um golpista. O traste estará de volta no sábado, para assumir a presidência. No Brasil todas as instituições estão funcionando, dentro da mais perfeita normalidade e de acordo com a constituição, mesmo com um STF em que 8 dos seus 11 ministros foram colocados pelo PT. (Partido do Trambique). Viva a democracia. Fora Dilma. Fora PT. A população brasileira está na mesma euforia e alegria que Portugal vivenciou o 25 de abril. O Brasil teve seu 17 de abril. Abril para os de fala portuguesa é um mês abençoado. VIVA A DEMOCRACIA.
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