Morreu há dias, no Brasil, o general Leônidas Pires Gonçalves.
Bem antes de ter chegado ao Brasil, eu já ouvira falar da figura do general Leônidas. Quando, em 1985, Tancredo Neves, presidente eleito do Brasil, morreu sem ter tomado posse do cargo, colocou-se a questão de saber se o seu vice-presidente, José Sarney, poderia assumir essas funções. À tragédia da morte de um presidente eleito somava-se uma séria crise institucional, num momento decisivo para o restabelecimento da nova ordem democrática.
Sob o estrito ponto de vista legal, a subida de Sarney ao Palácio do Planalto era muito discutível. Um vice-presidente não existe sem que antes tenha havido um presidente empossado. Para que Sarney pudesse assumir funções, seria preciso "torcer" um pouco as regras constitucionais. Nestes momentos charneira da História, forçar a legalidade pode ser a melhor solução. Mas só as Forças Armadas, que haviam tutelado a sinistra ditadura e pilotado, sob a pressão popular, a abertura para a democracia, podiam fazê-lo.
O papel do general Leônidas Gonçalves terá sido então essencial, ao que ficou consagrado nos livros da história contemporânea brasileira. Ele terá sido a figura instrumental dessa decisão. Numa tensa reunião em que certos setores, políticos e militares, se inclinavam para que fosse o presidente da Câmara de Deputados, Ulysses Guimarães, a ocupar a presidência, Leônidas, que Tancredo havia escolhido para ministro do Exército (e que Sarney viria a confirmar no lugar) tem a frase célebre e definitiva: "quem assume é o Sarney". Ninguém ousou contestar. Ulysses explicaria mais tarde porque aceitou sem protestar: "O Sarney chega aqui ao lado do seu jurista. Esse jurista é o ministro do Exército. Se eu não aceito a tese do jurista, a crise estava armada’’.
Sob o estrito ponto de vista legal, a subida de Sarney ao Palácio do Planalto era muito discutível. Um vice-presidente não existe sem que antes tenha havido um presidente empossado. Para que Sarney pudesse assumir funções, seria preciso "torcer" um pouco as regras constitucionais. Nestes momentos charneira da História, forçar a legalidade pode ser a melhor solução. Mas só as Forças Armadas, que haviam tutelado a sinistra ditadura e pilotado, sob a pressão popular, a abertura para a democracia, podiam fazê-lo.
O papel do general Leônidas Gonçalves terá sido então essencial, ao que ficou consagrado nos livros da história contemporânea brasileira. Ele terá sido a figura instrumental dessa decisão. Numa tensa reunião em que certos setores, políticos e militares, se inclinavam para que fosse o presidente da Câmara de Deputados, Ulysses Guimarães, a ocupar a presidência, Leônidas, que Tancredo havia escolhido para ministro do Exército (e que Sarney viria a confirmar no lugar) tem a frase célebre e definitiva: "quem assume é o Sarney". Ninguém ousou contestar. Ulysses explicaria mais tarde porque aceitou sem protestar: "O Sarney chega aqui ao lado do seu jurista. Esse jurista é o ministro do Exército. Se eu não aceito a tese do jurista, a crise estava armada’’.
Em 2008, fui fazer uma conferência para oficiais superiores, num mano-a-mano com o meu colega dos Estados Unidos, à Escola de Comando e Estado-Maior do Exército do Brasil, na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro: ele falava da política de segurança dos EUA e eu fazia um "número" similar sobre a União Europeia.
À entrada, ainda antes da conferência, fui levado para a sala do comando da Escola. Um homem alto, já idoso, à paisana, de cara fechada, parecia dominar o ambiente, não obstante haver vários generais fardados na sala. Foi-me apresentado: era o general Leônidas Pires Gonçalves. Ao cumprimentá-lo, disse-lhe que "tinha muito gosto em conhecer uma figura que havia tido um papel crucial na História recente do Brasil". O velho general sorriu um pouco e eu, atrevido, ousei acrescentar: "eu diria mesmo, também na história constitucional do Brasil...". A cara do militar voltou a cerrar-se e, por um instante, perguntei-me se não teria ido demasiado longe na minha graça. Minutos depois, seria ele a acompanhar-nos, a mim e ao embaixador americano, até à tribuna do imenso e repleto auditório, com centenas de militares, fardados e perfilados, num impressionante silêncio.
No final da conferência, o general Leônidas voltou a acompanhar-nos, até à saída. Teve umas palavras amáveis sobre a nossa prestação, que envolvera um vivo debate com o auditório e, para mim, em voz mais baixa, ao despedir-se, acrescentou: "... e vi que o embaixador conhece bem a história constitucional brasileira!". E abriu-se num sorriso tão largo quanto o formalismo e o seu estilo lhe permitia.
O general Leônidas Gonçalves morreu agora, aos 94 anos.
1 comentário:
boa história que ao mesmo tempo define uma personalidade, esse general com autoridade (moral) e respeitado
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