Depois das eleições de ontem, nas quais perdeu o controlo das duas câmaras parlamentares, o presidente Obama parte para os dois últimos anos do seu mandato numa posição de grande fragilidade. Sem maioria na Câmara dos Representantes e no Senado, dirigir a América é, historicamente, uma tarefa muito difícil para um presidente, que é agora reduzido a uma agenda minimalista e forçado a uma negociação permanente, e quase sempre frustrante, que debilitarão a imagem final do seu mandato.
O sistema americano foi desenhado com grande sabedoria, porque permite ao eleitorado, no "midterm" de um mandato presidencial, como que compensar, por uma "retificação" de parte do Senado, os equilíbrios prevalecentes nos dois anteriores anos. É uma espécie de desafio ao presidente eleito (ou reeleito): se os dois primeiros anos desse seu mandato agradarem ao eleitorado, ele poderá "premiá-lo" com uma representação favorável no Senado; se a avaliação for menos boa, os dois últimos anos poderão transformar-se num "calvário". É este último o destino de Obama.
Depois de Kennedy, nenhum presidente americano tinha criado tantas expetativas, na América e no mundo. As desilusões são sempre maiores quando partem de ilusões que acabam frustradas. Obama era o presidente dos EUA pós-Bush, a figura predestinada a mudar a imagem de um país que, com o seu antecessor, mostrara, ainda mais do que no passado, que o respeito pela ordem institucional internacional parava à porta dos seus interesses.
Obama provou, uma vez mais, que um presidente americano, mesmo com a força da sua legitimidade eleitoral própria, tem sempre à sua volta um colete de interesses e compromissos que é obrigado a respeitar e que, a cada dia que passa, a sua capacidade de os enfrentar, quando existe essa vontade, diminui e se esvai. Contrariamente à ideia de que um presidente negro poderia apaziguar um país fortemente dividido, raramente as clivagens internas estiveram tão acesas e radicalização político-partidária foi tão forte. E tudo isto não obstante o crescimento pós-crise ter surgido, o défice do Estado ter diminuído e a América ter entretanto mostrado uma pujança económica notável, suportada por uma nova autonomia energética que é a inveja do planeta.
No plano externo - o único que verdadeiramente nos importa - a imagem de Obama ficará sempre ligada às promessas que não cumpriu na questão de Guantanamo e à peça retórica que foi o seu célebre discurso do Cairo, sinais de boa vontade que lhe valeram um prémio Nobel da Paz que teve tanto de prematuro como de caricato. Mas, apesar de tudo, temos de ser justos: a América que Obama nos vai deixar compara bem com aquela que ele havia herdado de Bush. Verdade seja que era difícil fazer pior.
No plano externo - o único que verdadeiramente nos importa - a imagem de Obama ficará sempre ligada às promessas que não cumpriu na questão de Guantanamo e à peça retórica que foi o seu célebre discurso do Cairo, sinais de boa vontade que lhe valeram um prémio Nobel da Paz que teve tanto de prematuro como de caricato. Mas, apesar de tudo, temos de ser justos: a América que Obama nos vai deixar compara bem com aquela que ele havia herdado de Bush. Verdade seja que era difícil fazer pior.
7 comentários:
Lame duck President.
nós europeus, vemos os eua pela sua politica externa, os americanos pela interna sobretudo (tal como cá avaliamos o nosso governo em relação à interna). os eua são uma democracia altamente aperfeiçoada e os presidentes governam com negociações permanentes.
é um notável trabalho junto das câmaras. e o voto dos representantes dos 2 partidos pode ser misto, nem sempre funciona a disciplina de voto, um pr pode ter quase tanto trabalho a convencer os parlamentares do seu partido como os do outro. um ocaso, até é, mas não há que dramatizar
Francisco
Poderia assinar por baixo se tivesse a sua capacidade e verve. Esse é e foi o verdadeiro retrato de Obama.
Pela milionésima vez, o homem não é "negro", é mulato!: mãe branca, pai preto. É tão "negro" quanto é "branco", Irra!!!
Tout est dit !
Boa análise e com um travo diplomático. Não podia deixar de o ter vinda de alguém com a vocação do estar "por dentro".
Por lá, nos EUA, o eleitorado recusou claramente a "change" do "... abrir caminho para uma sociedade socialista ..." ao gosto de Obama e da sua numenklatura. Séculos de individualismo cultural não se mudam de cima para baixo.
Teremos uma ... a robusta "América", de volta?.
O homem quereria,o sistema porém...
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