sexta-feira, junho 28, 2013

Porto 2

Era precisamente meia-noite de ontem quando encerrei o debate na Fundação de Serralves. Mas nem eu nem as dezenas de pessoas que assistiram às excelentes conferências feitas pelo embaixador Rubens Ricupero e pelo professor Marcio Pochmann deram por perdido o seu tempo. O modo atento como as seguiram e as reações suscitadas foram uma boa prova disso mesmo. 

O papel e estatuto futuro dos países emergentes na ordem económica e de governança global esteve no centro das prestações de ambos os oradores, que se interrogaram sobre a diversidade desses atores, sobre as suas singularidades e desafios especificos e, muito em especial, sobre o peso que os seus diferentes modelos poderão vir a ter numa nova ordem internacional futura. Sem colocarem em questão a expectável preeminência da China (e da Ásia, em geral) nesse contexto, ambos os oradores refletiram, embora com tonalidades diversas, sobre o papel central que cabe aos Estados Unidos no processo global. As questões energéticas e ambientais estiveram também em foco, tendo o caso brasileiro, sem surpresas, merecido uma atenção particular, atentas as novas realidades que afetam o curso recente do seu desenvolvimento. 

Como moderador, provoquei os oradores sobre a ausência da Europa nas suas considerações. E foi curioso vê-los a concordarem, no essencial, com a imagem de hesitação que o processo integrador do continente hoje projeta pelo mundo. Rubens Ricupero, com a autoridade de quem foi embaixador em Itália e em Genebra, mas, muito em especial, como antigo diretor-geral da UNCTAD, fez um balanço muito crítico sobre as lideranças recentes na União Europeia, com uma agudeza e frontalidade que, nós próprios, europeus, raramente somos capazes de assumir.

Porto 1

O cenário foi o Forum da FNAC no Norte-Shopping, ao final da tarde de ontem. Fazia-se o lançamento do livro de Alexandra Marques, "Os segredos da descolonização de Angola". Coube-me apresentar a obra a quantos se deslocaram ao evento. 

O livro é o resultado de um minucioso trabalho de investigação, nomeadamente em arquivos documentais, alguns dos quais revelados pela primeira vez, que permite lançar uma luz nova sobre o processo decisório - hesitante, contraditório, por vezes irresponsável, por vezes inevitável - que foi assumido pelas estruturas político-militares portuguesas em Portugal e Angola, desde o 25 de abril até à declaração de independência da colónia. Trata-se de um relato trágico, quase impotente, de um poder político-militar sem capacidade, às vezes também sem vontade, de se exercer em defesa da posição de quantos, como era o caso dos colonos portugueses, eram os evidentes perdedores da História. Podia ter sido feito mais? Houve descaso? Ao leitor cabe decidir. 

O relato de Alexandra Marques, escrito num registo que poderíamos qualificar de bom jornalismo, lê-se com o ritmo de um filme, tanto mais que alguns dos extratos documentais que transcreve são relatos vivos e factuais. A autora não deixa de mostrar uma empatia com quantos, nesse complexo processo, assumiram atitudes, por vezes quixotescas, para tentar evitar o curso que os acontecimentos acabaram por ter. 

Na apresentação que fiz, procurei, essencialmente, contextualizar os acontecimentos ocorridos em Angola na situação política e militar que Portugal então atravessava. É que uma coisa não pode ser compreendida sem a outra. 

Faltar ao trabalho

Ontem, senti uma solidariedade muito grande com quem faltou ao seu trabalho pela simples razão de que o não tem.

Norte-Sul

Conversa à minha frente (e a meu respeito), ao final da tarde de ontem:

- Já viste que este tipo anda cada vez mais pelo Norte? Só esta semana, é a segunda vez que o vemos aqui pelo Porto. E anuncia que, daqui a dias, vai a Guimarães e a Vila Real! Ele morará mesmo em Lisboa?

- Tens razão! Agora é que se percebe melhor porque é que ele se voluntariou para dirigir o Centro Norte-Sul. É para andar para cima e para baixo...

quinta-feira, junho 27, 2013

Maria José

Éramos muitos, naquele quente final de tarde de ontem, no belo espaço da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa. O pretexto foi uma biografia de Maria José Nogueira Pinto, mas a razão real por que alí nos tínhamos deslocado era ter um ensejo para celebrar a memória de uma amiga que a todos nos faz muita falta.

Gostei de ouvir a evocação sentida de Manuela Ferreira Leite, que apresentou a obra. Foi interessante ouvir um testemunho de quem se cruzou com a Maria José na vida política e que cedo percebeu que ela, em tudo o que fez, esteve sempre como uma pessoa "inteira", com um projeto de vida, que apenas adequava às oportunidades que se lhe apresentavam de servir a comunidade a que pertencia.

Mandela

É muito raro encontrar uma unanimidade tão positiva e tão sincera. Nelson Mandela é das poucas pessoas que concitou esse sentimento global. Nunca lhe poderemos agradecer suficientemente a tolerância de que deu provas, a fantástica lição que esse homem, que esteve preso durante 27 anos, que combateu em forçado silêncio um dos mais odiosos regimes do mundo, nos conseguiu transmitir.

Não tenho heróis. Mas reconheço que Mandela é um herói. Aquele sorriso bom vai fazer falta ao mundo.

Brasil

Há uns tempos, contei (ler aqui) a minha primeira conversa com o presidente Lula, a propósito do futebol. Lembrei-me ontem dessa conversa, ao ver-me "torcer" com entusiasmo pelo Brasil, no jogo com o Uruguai. E recordei, em especial, uma realidade que os portugueses tendem a esquecer. É que se é natural, em muitos deles, a propensão para apoiarem o Brasil - e a presença de Felipão à frente do "escrete" ajuda muito a esta vontade -, não devem, contudo, esperar uma automática retribuição por parte dos nossos amigos brasileiros.

Há alguns "Brasis" que muito pouco têm a ver com Portugal, país com o qual apenas partilham (alguma) língua. Há muito brasileiro, de origem alemã, italiana, árabe ou outra, que nunca teve um antepassado português, que não tem primos por cá, pelo que não foi educado a ter uma afetividade especial por um país do qual só lhe recordam que chegaram Cabral e, no início do século XIX, uma bizarra corte.

Quem não perceber esta eterna assimetria nunca entenderá a relação luso-brasileira. Quem, em Portugal, gosta do Brasil, tem de saber viver com esta realidade.

quarta-feira, junho 26, 2013

Correspondência

Queixam-se comentadores do blogue da minha falta de atenção àquilo que escrevem, da muito frequente ausência de uma nota, mínima e cordial, da minha parte, ao cuidado que tiveram em deixar umas palavras num ou noutro post.

E queixam-se muito bem! Têm toda a razão! Porém, se por ora não prometo corrigir-me, porque a minha vida é o que é, asseguro que o meu complexo de culpa está a ser constantemente inflacionado na medida exata dessas confessadas falhas, como numa conta a prazo, sempre a render. Com o peso da consciência a atormentar-me a existência e o écran, acabarei um dia (com muito maior probabilidade, uma noite) por mudar de (maus) hábitos. Não desesperem!

Só que até a esse meu "regresso aos mercados" de uma blogosfera mais atenta, lamento muito, mas as minhas respostas manter-se-ão episódicas. Desculpem lá!

Referências

Em Portugal, convencionou-se dizer que há dois jornais diários "de referência": o "Público" e o "Diário de Notícias". Eu sei que o JN ou "Jornal de Notícias", tal como o "Correio da Manhã" não gostam desta qualificação, que subtilmente os menoriza, tanto mais que vendem muito mais do que os tais "de referência". E imagino que o "Diário Económico" e o "Jornal de Negócios" só não reajam porque vivem no seu nicho específico de mercado. O mesmo acontece, à semana, com o "Expresso", que parece evidente não temer deixar de ser "de referência", em favor de "O Sol" e, muito menos, do "O Diabo". Já as revistas, "Visão" e "Sábado", como se policiam mutuamente, não correm riscos maiores. Dos desportivos já nem se fala: "A Bola" já foi a grande "referência", mas a perda da sua independência, ou melhor, a confirmação plena do seu alinhamento clubista, tal como acontece com o "Record" e, ainda mais desbragadamente, com "O Jogo", deixou esse mercado já sem nenhuma "referência". Poupemos as revistas sociais e cor-de-rosa, onde as "referências" são outras, entre futebolistas, modelos e "big sisters", e, ao sol do dia, já trabalham afincadamente para o bronze e, à noite, para os cartões de ingresso nas festas algarvias. 

Voltemos então aos diários "de referência". Para notar que o "Diário de Notícias" anunciava ontem, com euforia: "DN foi o jornal que mais subiu no trimestre". Bingo! Imbatível! Leia-se agora o "Público", também de ontem: "Audiência do 'Público" cresce 5,7%, em contraciclo com diários generalistas". Caramba! 

Não li as notícias, claro. Haverá por aqui qualquer contradição ou passa-se com os jornais o que se passa com os partidos em noite de eleições? Isto é, todos ganham?

Quando hoje se abrir a edição do dia destes jornais "de referência", já ninguém se lembrará dos exageros eufóricos de ontem. Porquê? Porque, neste meio, funciona a velha máxima: "o jornal da véspera só serve para embrulhar peixe". Ou melhor, hoje nem isso!, porque a ASAE agora não deixa. Nem peixe nem castanhas!

Em tempo: o "Expresso" junta-se às "referências", titulando, modesto, que "O 'Expresso' foi o único jornal a aumentar as vendas"

terça-feira, junho 25, 2013

Angola

É um livro garantidamente polémico. Tenho muito gosto em apresentá-lo, porque aborda um tema que continua envolvido em alguns mitos/verdades dos quais, talvez não por acaso, a nossa história política contemporânea nunca se libertou. 

É um assunto que sempre me interessou. Vivi o tempo decisivo de 1975, como militar. Assisti então a Assembleias do MFA, onde a questão era abordada. De seguida, ainda nesse ano, mas já como diplomata, acompanhei o assunto no Ministério dos Negócios Estrangeiros. A partir de 1982, e por quase quatro anos, estive colocado na nossa embaixada em Luanda, período em que tive a oportunidade de revisitar, com amigos angolanos e portugueses, muito do que por ali se passara sete anos antes. Essa foi também uma oportunidade para tentar perceber o traumatismo dos acontecimentos de 27 de maio de 1977, uma data trágica de clivagem que, embora possa não parecer, tem muito a ver com tudo aquilo que o livro relata. E, sempre como interessado no tema, li muito do que, cá dentro e mesmo lá fora, se publicou sobre o tema do processo de independência de Angola - embora não tivesse tido acesso a uma imensa parte dos documentos que Alexandra Marques agora traz a público, pela primeira vez.

Alexandra Marques é uma jornalista que enveredou, há alguns anos, por um percurso académico na área da historiografia. Felizmente, manteve o registo de escrita da sua profissão anterior, o que confere ao livro um ritmo interessante e ágil. Sem a menor dúvida, aconselho a leitura deste seu trabalho.  

Na FNAC do Porto, pelas 18 horas de quinta-feira, dia 27 de junho, lá estarei a falar do livro e, incidentalmente, de Angola, um país que, como hoje se constata, é a única ex-colónia de que Portugal não se tornou independente.   

segunda-feira, junho 24, 2013

O casamento

Ficou a olhar para a folha de papel. Invadiu-o um sentimento de alguma tristeza. A lista dos convidados que o seu futuro genro indicara para a festa de casamento estava recheada de nomes sonantes, figuras gradas da indústria nortenha, dois presidentes de Câmara e até um deputado. Do seu lado, do lado da filha que agora ia casar, os convivas eram, em geral, gente modesta, alguns familiares, amigos chegados e colegas da noiva. Nenhum nome conhecido. O "máximo" que tinha para apresentar era um velho padre, figura de há longa data ligada à família, que se tinha voluntariado para celebrar o ato. 

Notara na expressão facial da filha - ou fora impressão sua, levado pelo seu próprio sentimento? - um certo desapontamento, quando ambos haviam percorrido a lista de convidados da família, para preparar os convites. Mas que podia ele fazer? Velho engenheiro, com uma carreira limpa mas escassos contactos, tivera uma vida simples, dedicada à família, sem grandes rasgos sociais. Nunca cultivara amizades com gente que conhecera na faculdade, alguma hoje até com certa projeção. Entre todos esses colegas, um deles chegara mesmo a ministro, com um lugar cimeiro no governo. Havia-lhe mandado uma carta a felicitá-lo, por ocasião da tomada de posse, e recebera dele, a agradecer, um cartão bem simpático, onde o agora político recordara, com surpreendente memória e detalhe, um episódio do tempo comum passado na escola da rua dos Bragas, lá no Porto. Orgulhava-se de o ter como amigo.

Foi então que, de súbito, a ideia lhe ocorreu: e se o convidasse? Caramba! Se ele aceitasse, era uma "bomba"! O casamento passava a ter outro "sainete" e a filha, estava certo, ficaria orgulhosa das amizades do pai. Mas, por outro lado, acanhava-se de estar a incomodar o amigo, que os anos tinham tornado um tanto distante. Ficou a matutar na ideia durante algumas horas mas, ao final do dia, decidiu-se. Na manhã seguinte tentaria falar com o ministro. Se não desse resultado, paciência! Mas, pelo menos, ficava de bem com a sua consciência e havia feito o possível para proporcionar à filha uma cerimónia de casamento de que se podia orgulhar.

O acesso ao ministro foi, para sua surpresa, bastante mais fácil do que supunha possível. Horas após o contacto com o gabinete, o próprio governante ligou-lhe diretamente, com um tom de grande simpatia. Foi então, perante essa atitude amiga e aberta, que decidiu ser totalmente franco com o antigo colega, ao formular-lhe o convite para o casamento da filha:

- Eu não sei se deveria estar a dizer-te isto, mas julgo que a nossa relação me pemite que o faça. Para além do grande gosto e honra que teria em rever-te e ter-te na cerimónia, a tua presença no casamento representaria muito para a nossa família, porque, da parte da minha filha, a generalidade dos convidados são gente comum e, do lado do futuro marido dela, vêm figuras relativamente destacadas e conhecidas. Não posso esconder-te que a tua vinda seria para nós um fator de grande prestígio.

A reação do ministro ficou acima das expetativas:

- Ó homem! Percebo muito bem! Eu e a minha mulher vamos ao casamento, com imenso gosto. E diz-me uma coisa: se eu for num "carrão" oficial, isso ajudará?

- Claro que sim! Mas nem te pedia tanto! Basta-nos a tua presença...

- Não, não! Vamos fazer as coisas como devem ser feitas. Olha! Lembrei-me agora: até vou levar batedores!

E assim aconteceu. A presença daquele simpático ministro nortenho na boda foi um momento alto da cerimónia. E o pai da noiva sentiu que nunca poderia agradecer suficientemente àquele seu colega de curso, cuja chegada, antecedida por dois espampanantes polícias em motos, ficou para sempre a marcar a memória desse dia feliz.

domingo, junho 23, 2013

S. João

Este é um post lacónico. Não é todos dias que há noite de S. João no Porto. 

sábado, junho 22, 2013

Coimbra

A qualificação de um bem cultural como "património mundial" da Unesco é um processo complexo, que obriga à preparação de um pesado dossiê de candidatura, à criação de um conjunto de condições, sujeitas a apertados critérios e avaliações feitas através de rigorosas visitas, bem como à implementaçào de estruturas permanentes de acompanhamento que garantam a preservação futura do bem. Além disso, o êxito de uma candidatura depende também muito do trabalho diplomático desenvolvido na sua estruturação, feita sob a responsabilidade da Comissão Nacional da Unesco mas, muito em especial, da constante sensibilização, feita em Paris, pela missão portuguesa junto das estruturas da organização e dos representantes dos membros do Comité do Património Mundial.

Hoje surgiu a notícia de que a Universidade de Coimbra - que também inclui a zona da Alta e da Sofia - foi consagrada com o estatuto de "património mundial", na reunião do respetivo Comité, reunido no Cambodja. Para além dos muitos amigos que tenho na Universidade, quero deixar aqui um abraço muito especial para os colegas que realizaram, em Paris e já no Cambodja, um trabalho que sei que foi determinante na superação das dificuldades com que estes processos sempre se defrontam, em especial na fase que antecede as decisões: o embaixador Moraes Cabral e o dr. Pedro Sousa e Abreu. Os meus sinceros parabéns pelo seu magnífico e bem sucedido esforço.

Ponte da Arrábida

Esta noite, vou dormir ao lado dela. A bela ponte da Arrábida, desenhada por Edgar Cardoso (cujo centenário de nascimento também se comemora agora), faz hoje 50 anos.

Não sei quantos, dentre os leitores deste blogue, tiveram a curiosa experiência de subir no elevador que, no passado, pelo menos do lado da cidade, nos levava até ao seu tabuleiro. Eu fi-lo, pouco tempo depois da inauguração, com o meu tio Óscar (de quem já aqui falei um dia), militar aposentado, que tinha um orgulho imenso na sua cidade, cuja história e curiosidades me mostrava, com detalhe, na sua encadernada coleção de "O Tripeiro", em tardes amenas na varanda da casa na Ramada Alta. Foi pela sua mão que, desde muito jovem, aprendi a gostar do Porto.

O elevador já não existe, há muito. Mas a ponte era e continua a ser uma das (muitas) maravilhas da cidade.

Janus

Janus é um deus romano com duas faces - que olham simultaneamente para a frente e para trás. Desde há dezasseis anos, sem falhas, o Observatório de Relações Exteriores da Universidade Autónoma (até ao ano passado em associação com o "Público) edita um anuário a que dá o nome de "Janus" (podem aqui ser consultadas todas as versões informáticas dos anuários de 1996 a 2012). É um trabalho sempre de grande interesse, onde se inserem análises sobre a conjuntura e as grandes questões internacionais, bem como sobre a política externa portuguesa. Tal como em alguns anos passados, também eu colaborei na edição de 2013 do "Janus" (com este texto), a qual teve como temática central "As incertezas da Europa".

Há dias, num fim de tarde, na FNAC do Chiado, a convite do professor Luis Moita, fui convidado a fazer a apresentação do número do "Janus" correspondente a 2013. Na minha intervenção, para além de destacar alguns dos principais textos inseridos no anuário, notei o facto de nele ser inserido um interessante - e julgo que inédito - conjunto de estudos sobre as Forças armadas nos PALOP. 

Aproveitei o ensejo, seguindo um pouco alguns dos textos publicados mas dando também algumas sugestões para futuras edições, para fazer um greve bosquejo das grandes linhas da política externa portuguesa, procurando detetar continuidades mas também certas inflexões conjunturais, fruto dos tempos e de algumas decisões menos felizes.

Recomendo vivamente a leitura do "Janus" 2013, agora com uma dimensão mais "friendly", a qual, contudo, não afetou a originalidade gráfica que é a sua imagem de marca. E, para os cultores de relações internacionais, aconselho também uma visita ao boletim bilingue janus.net - e-journal of International Relations, de cujo Conselho consultivo me orgulho de fazer parte desde a sua criação, em 2010.

sexta-feira, junho 21, 2013

Internet

Lisboa foi um vez mais o cenário do EuroDIG, o espaço europeu de debate sobre a governança na internet. Mais de trezentos participantes, na sua maior parte estrangeiros, animaram nestes dois dias um debate muito participado sobre o modo como se poderá ou deverá intervir na regulação do espaço informático. Esta conferência foi seguida, em simultâneo, um pouco por todo o mundo, com participação em tempo real de cidadãos de vários países, num ambiente que, sem surpresas, se expressou exclusivamente em inglês.

Na manhã de hoje, coube-me participar na moderação de um painel onde se falou da utilização da internet para a propagação do "discurso de ódio" e como meio de "difamação". O ambiente da discussão procurou aprofundar o difícil equilíbrio entre a plena liberdade de expressão e o melhor modo de regular o abusos que o espaço da internet pode proporcionar. Em especial, trabalhou-se a forma de superar, na ausência de um normativo aceite à escala global, a contradição entre uma mensagem que praticamente não conhece fronteiras e a existência de jurisdições nacionais, únicas entidades que podem exercer uma função reguladora. O risco de alguns Estados poderem sentir-se tentados a uma ação autónoma, de matriz censória ou bloqueante, no caso de não ser possível garantir alguns mecanismos regulatórios que, de forma razoável, possam obviar a flagrantes abusos foi um tema bastante discutido.
           
Foi um debate muito interessante, em que tive o ensejo de pôr em evidência o trabalho do Centro Norte-Sul, do Conselho da Europa, que, de há muito, desenvolve uma ação muito interessante no sentido da promoção do diálogo, nomeadamente através da internet, entre cultores de diferentes visões do mundo, em particular na área religiosa, num esforço de promoção de um cidadania ativa e esclarecida. O Centro alimenta cursos "on-line" que já envolveram milhares de participantes, oriundos de diferentes zonas do mundo, sendo hoje uma muito original plataforma de diálogo, em especial entre a juventude europeia e do mundo magrebino.

Steinbroken arrependido?

A propósito da necessidade de financiamento das "pequenas e médias empresas", os primeiros ministros de Portugal e da Finlândia assinaram um artigo conjunto no "The Wall Street Journal".

Longe parecem assim idos os tempos em que, do lado finlandês, nos chegavam ventos de aberta rejeição à ajuda europeia a Portugal, em momentos muito complexos da crise da dívida soberana. Agora, pelos vistos, a Finlândia está, pelo menos nesta área, do mesmo lado que nós na barricada. Nada como fazer parte das pequenas e médias "potências" para poder encontrar, ao virar da esquina europeia, algumas conjunturais afinidades eletivas. Até quando, vá lá saber-se!

Posso estar enganado, mas admito que o nosso velho amigo Steinbroken, figura maior da diplomacia nórdica, seja bem capaz de estar por detrás deste inesperado volte-face. Nunca é demasiado tarde para uma contrição, mesmo com a frieza ártica.

quinta-feira, junho 20, 2013

Osvaldo de Castro (1947-2013)

Osvaldo de Castro foi uma figura relevante dessa Coimbra mítica da crise académica de 1969. Nesse tempo, só lhe conhecia o nome. Depois, em algumas fotografia históricas da época, vim a identificá-lo com uma gabardine branca, "à Vittorio Gassman". Noutras, como a que surge em cima, aparece a falar "às massas", como vice-presidente da Associação Académica de Coimbra, durante esse belo movimento que contribuiu para desmascarar a farsa marcelista.

O Osvaldo morreu hoje. Só me recordo de o ter conhecido pessoalmente na aventura política em que ambos tivemos o privilégio de participar, a partir de 1995. Cruzei-me então, numa empatia geracional que logo nos uniu, com o humor e a ironia deste homem de fortes princípios, cuja evolução cívica se fez com serenidade mas também com forte convicção. Ele soube correr os riscos de quem colocou a sua própria liberdade em causa, em favor das ideias que defendia, mas, igualmente, foi capaz de assumir, com frontalidade e face a não poucas incompreensões, a necessidade de concluir que, para novos problemas e num tempo diferente, as respostas tinham de ser diversas.

Guardo, muito em particular, recordação dos turbulentos dias que ambos passámos em Seattle, representando Portugal na frustrada reunião da Organização Mundial de Comércio, em 1999. Rimos então da caricata situação de nos vermos protegidos pela polícia, em face dos manifestantes, muitos deles bem violentos, que identificavam os delegados à conferência como o "devil" a combater. É que, décadas antes, não nos passava pela cabeça que viesse a ser esse o nosso lado da rua...

Aqui fica um forte abraço ao Osvaldo e o meu respeito à sua Família.

Fenianos

Conheci ontem o embaixador irlandês em Portugal. Com o espírito jovial de "mediterrânico" do Norte que é típico dos seus concidadãos, falou-me, com entusiasmo, da ideia de fazer um guia com uma espécie de "percurso irlandês" de Lisboa, por forma a evidenciar aos portugueses a importância das relações entre os dois países. Trata-se de um apaixonado pela História e tem vindo a coletar imensa informação sobre o tema.

A meio da conversa, perguntei-lhe: "Já visitou o Clube Fenianos, no Porto?". Nunca tinha ouvido falar. Expliquei-lhe que, desde 1904, existe no Porto uma agremiação que, tanto quanto se sabe, deriva de entidades similares brasileiras (estas últimas, aparentemente, influenciadas pelos Estados Unidos), criadas ainda no século XIX, que tinham como objetivo a recolha de ajuda financeira para os revolucionários católicos irlandeses, que lutavam pela sua independência dos ingleses. De certa forma, como já tenho lembrado a amigos portuenses, o popular "Fenianos" tem uma raiz (pelo menos) etimológica que o liga ao famoso "Sinn Féin", o partido da da Irlanda do Norte que, durante muito anos, esteve por detrás do violento IRA. 

No historial do pacífico clube portuense de hoje, constam já poucos vestígios dessa origem. Na "Sapataria Fenianos", que fica no rés-do-chão, apenas sabem dizer que o nome se deve ao clube. Talvez, numa próxima visita ao Porto, o simpático embaixador irlandês venha a comprar por lá um par de sapatos, em honra da memória da instituição.

quarta-feira, junho 19, 2013

Gente

Os franceses e o "Le Monde" atiçaram-se contra o dr. Durão Barroso, por virtude de declarações por este proferidas, nas quais teriam sido qualificadas de "reacionárias" as objeções colocadas por Paris quanto à inclusão do audiovisual no mandato negocial para a ambiciosa agenda de liberalização de trocas entre a UE e os EUA.

(Seria, aliás, interessante conhecer a posição que Portugal assumiu na fixação deste mandato e os fundamentos em que a mesma terá assentado). 

O "Le Monde", no texto que lhe dedica, é muito cáustico quanto ao presidente da Comissão, qualificando-o de "camaleão", numa alusão, cuja justeza não cabe aqui aquilatar, sobre a sua adaptabilidade ao sabor dos diversos "ventos". Numa perspetiva de amizade e benévola admiração - estas coisas têm sempre leituras não unívocas - o meu amigo António Monteiro qualificava-o, há dias, numa conferência no MNE, como "um homem para todas as estações". Um diplomata menos contemporizador sugeriu que se acrescentasse ao título da conferência: "...e apeadeiros". Enfim, como diria Pirandello, a cada um a sua verdade.

Para vários comentadores nacionais e internacionais, esta atitude do ainda presidente da Comissão europeia poderá vir a comprometer as suas naturais ambições futuras: renovar o mandato na Comissão, substituir Von Rompuy na presidência do Conselho Europeu, aceder à secretaria-geral da NATO ou, limite dos limites, suceder a Ban Ki Moon como SG da ONU.

Neste "totoloto" de lugares de prestígio, movidos por patriotismo ou por outras razões mais comezinhas que não vêm à colação, só podemos desejar, com funda sinceridade, que a França não venha a surgir como um obstáculo insuperável ao prosseguimento da carreira à escala global de um político que os cidadãos deste país - uns com incontido orgulho, outros com maior ou menor desapontamento, outros ainda com um quiçá incompreensível alívio - viram sair de S. Bento para a rue de La Loi, no ano da graça de 2004.

Interpretando esse conjunto de motivações, todos não seremos nunca demais para procurar ajudar a que o dr. Barroso venha a ter acesso a um qualquer destino internacional alternativo àquele em que, na última década, tanto se tem ilustrado. Ao desejar e contribuir para isso, privar-nos-emos, com desprendida generosidade, de testemunhar uma sua eventual presença futura em alguns lugares institucionais da pátria. Mas esse é um sacrifício que, por todas as razões, só tem condições para nos motivar.

Bernardo Pires de Lima

Leio no "Expresso" que Bernardo Pires de Lima vai para Bruxelas, reforçar a equipa de António Costa. É uma excelente notícia. O pr...