Mostrar mensagens com a etiqueta Notas soltas. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Notas soltas. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, junho 05, 2012

Menos de 20 horas em Lisboa

1. Que calor! Parece Marraquexe!

2. É dos meus olhos ou a cidade está bem mais suja?

3. Não é dos meus olhos: há um claro declínio do trânsito em Lisboa.

4. Encontrei um taxista com uma solução para resolver a questão do "gangsterismo" de alguns dos seus pares no aeroporto de Lisboa. Só que "a Antral não quer", disse-me.

5. "Às vezes, os seus textos são longos demais para um blogue. E saem melhor quando se afastam da atualidade". Tomei nota, mas não prometo nada.

6. Assumi funções como membro da comissão para a revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional. Senti a falta de alguém que, infelizmente, não pode lá estar: Ernâni Lopes.

7. Somos o país do ouro. Trouxemo-lo do Brasil para o derreter em patetices, entesourámo-lo com Salazar (com barras de origem duvidosa, com a suástica inscrita, ainda nos fundos do Banco de Portugal) e, agora, nestes tempos em que nos troikam as voltas da vida, os agiotas de banca montada por todos as ruas de Lisboa (até na minha) arrancam-no à miséria das famílias. 

8. No aeroporto, nas partidas, fazem-nos agora passar pelo meio do "free shop". "Good try!", mas já ando nisto há muito tempo e só compro o que me faz falta.

domingo, junho 03, 2012

Os diplomatas e as "secretas"

"Vê lá no que te metes!", prevenia-me, há dias, um amigo quando lhe disse que tencionava escrever um post sobre as "secretas" portuguesas. O facto das pessoas sempre falarem dos serviços de informações "com luvas" prova bem a sensibilidade histórica que a questão tem entre nós. Por muito que alguns possam tentar negá-lo, a verdade é que, no imaginário português, o conceito está ainda ligado aos tempos da PIDE, o que provoca uma reação de imediata prudência. O conselho do meu amigo também tinha a ver com episódios da política recente - embora eu lhe assegurasse que o tratamento do tema não iria nada por aí.

Os serviços de recolha de informações são um instrumento absolutamente indispensável para a defesa dos interesses dos países, na ordem interna e externa. Nenhum Estado passa sem eles, porque as ameaças à sua segurança são permanentes e há que habilitar quem tem responsabilidades políticas com dados que lhes permitam tomar decisões para a proteção desses mesmos interesses. Para serem eficazes, os serviços têm de ser discretos, pelo que têm de ter um caráter "secreto", quer nas suas análises da informação "aberta", quer quando recorrem a outras fontes mais oblíquas para sustentarem a sua pesquisa. E têm de ser independentes, desde logo dos meios económicos e, tanto quanto a razoabilidade e as leis da vida o permitem, dos meios políticos, para que a ciclicidade destes não comprometa a sua funcionalidade.

Os serviços de "intelligence" têm sempre, pelo menos, dois grandes problemas a superar. O primeiro é que não têm a possibilidade de se louvar publicamente na eficácia da sua ação, o que faria com que os cidadãos os aceitassem melhor: a prevenção de uma infiltração potencialmente terrorista, a deteção atempada de redes de criminalidade organizada, o alerta precoce para o surgimento de movimentos extremistas anti-constitucionais, etc. O segundo problema, é, por tradição, bastante mais complexo de resolver e, por essa razão, regular objeto de um controlo parlamentar, sobre cuja real eficácia sempre alimentei imensas dúvidas: trata-se da garantia de que os serviços funcionam num rigorosíssimo cumprimento da lei, em particular daquela que protege os direitos e liberdades individuais dos cidadãos.

Em Portugal, como em muitos outros países, há dois serviços distintos: um para recolha de informações internas e outro dedicado às questões externas. É vulgar esta separação, porque se considera que os objetos de pesquisa são diferentes e porque muitos acham perigosa a mistura das duas culturas. Contrariamente a outras pessoas que muito respeito, cada vez mais sou dessa opinião. Ah! convém também que se diga, subsiste sempre uma tradicional conflitualidade entre os dois serviços, fruto de egos em confronto e de zonas cinzentas, a qual, na realidade, não é mau de todo que continue a existir...

Como se chegou até aqui? "To make a long story short", diga-se que, com a democracia, com o fim da PIDE (que concentrava as informações internas e externas e cujo "esforço de pesquisa" era facilitado pela "dispensada" intromissão da justiça, pelas escutas sem controlo, pelas prisões arbitrárias e pelas torturas, como potenciadores de eficácia funcional...), as informações caíram, com naturalidade, nas mãos dos militares. A reentrada dos civis na "intelligence" far-se-ia mais tarde, primeiro sob a tutela dos militares, depois por processos de concurso e de cooptação, a que se somou uma estranha cultura comum com certas zonas policiais (os serviços secretos não são polícias). Até que se chegou àquilo que hoje são o SIS e o SIED, respetivamente ligados à parte interna e externa das informações. Pelo meio, diga-se, andou sempre a política, como não podia deixar de ser.

Onde quero eu chegar com este arrazoado? Quero, de forma assumidamente corporativa, chamar a atenção para o facto de que, durante os muitos anos em que os serviços de "intelligence" externa tiveram nas suas chefias funcionários oriundos da diplomacia, nunca foram eles os fautores das conflitualidades públicas em que esses serviços se envolveram. E que foi a partir da decisão, tomada em 2006, de escolher para a chefia da ação externa uma figura alheia à diplomacia que se iniciou a triste polémica que hoje atravessa esses serviços. Os diplomatas não têm o monopólio da ética, longe disso, mas, tal como os militares, têm uma vida profissional exterior para onde sempre podem regressar, cujo "esprit de corps" lhes induz um forte sentido de patriotismo e de serviço público, que lhes evita a fácil tentação de cair em certas derivas. É esta, pelo menos, a minha profunda convicção.

sexta-feira, junho 01, 2012

Luis Abreu


Volto a constatar uma obviedade: cada vez tenho mais mortos conhecidos.

Há semanas, morreu o José Guilherme Stichini Vilela. Um dia, em Angola, nos anos 80, o José Guilherme revelou-me que conhecera, já não sei por que luas, um arquiteto que tinha encarregado da renovação de um velho apartamento que comprara, em Lisboa. Olhei os desenhos e vi que estava perante um homem de extremo bom gosto. Chamava-se Luís Gomes de Abreu. Nesse entretanto, também eu comprei um apartamento, que queria remodelar. Numa vinda a Portugal, conhecemo-nos e encarreguei-o de me dar ideias para essa obra. Não podia ter feito melhor opção. O seu profissionalismo era imenso, a sua engenhosidade era inesgotável, embora o seu preço não fosse nada barato. A obra saiu muito bem.

O Luís não tinha um feitio fácil, era muito teimoso, muito orgulhoso daquilo que fazia, renitente até à exaustão às sugestões dos "donos das obras". Mas eu conseguia ser ainda mais obstinado e, como cliente, era "chatíssimo" (expressão dele). Exigi-lhe pormenores impensáveis: "nunca encontrei um cliente que me pedisse um desenho de uma sanca em tamanho natural, sem aceitar um desenho em escala", disse-me um dia, "só você!". Tivemos cordiais "pegas", mas também belas jornadas de conversa e copos, divertidíssimas, em que ficámos amigos e, depois, quase vizinhos. Recordo bem uma noite, no velho "Botequim", com o Luís a envolver-se numa polémica homérica com a Natália Correia, que acabou por se mudar para a nossa mesa, até às quatro da manhã.

Viamo-nos a espaços. Voltei a tê-lo como arquiteto, numa outra casa. E, claro, voltámos a "pegar-nos" sobre a obra... Mas continuámos amigos e ele continuava a fazer as coisas sempre muito bem. Quando vim para Paris, disse-me que fora ele quem tinha renovado o centro do Instituto Camões, na rue Raffet.

Desde há 30 anos, o Luís tinha uma rotina ímpar: era a primeira pessoa a mandar-nos boas-festas. Chegavam sempre no início de Dezembro. Este ano não chegarão. Dizem-me que o Luís morreu.

Contas

Hoje, alguém me alvitrava, com propriedade, que deveria ser utilizada a expressão "fazer de contas" para significar os arranjos criativos que alguns países europeus estão a desencadear, em matéria da sua contabilidade "para alemão ver" (expressão que, desde há uns tempos, substituiu a histórica "para inglês ver"), com vista a adaptarem-se aos rigores dos limites exigidos pelos tratados europeus.

No desagradável global da situação, uma coisa nos deve consolar: as contas portuguesas, por muito complicadas que estejam, são transparentes, como o reconhecem as instituições internacionais. Assim, no nosso caso, e embora, cada vez mais, precisemos de fazer as contas, já não precisamos de "fazer de contas"...Valha-nos isso!

quarta-feira, maio 30, 2012

Um facto

A má fé e a distorção propositada obtêm, por vezes, algumas vitórias. Admito que alguns possam não gostar do novo Acordo Ortográfico, mas não é aceitável que, por mera vigarice intelectual, se procurem criar mitos em torno das mudanças que ele introduz.

O mais flagrante, e que tenho verificado que que está já na cabeça de muitas pessoas incautas, é a ideia de que a palavra facto passa, por virtude do Acordo, a mudar para fato. De tanto isto ser repetido, há quem acredite.

Ora isto é uma falsidade, que alguns se entretêm a instilar. Por uma vez, que fique claro: o novo Acordo Ortográfico não altera a forma de escrita (e, naturalmente, de pronúncia) da palavra "facto"

Quantas vezes será necessário repetir isto? 

Diplomacia

Com frequência, alguns jornais têm inserido notícias sobre as atividades delituosas de um vice-cônsul português no estrangeiro, qualificando-o como "diplomata". O assunto já foi aqui abordado.

Numa carta ao diretor de um jornal diário, expressei, há semanas, o meu protesto pela abusiva utilização desse qualificativo. Quando um diplomata comete um delito, deve ser tratado como tal. Quando esse delito é da responsabilidade de um qualquer outro funcionário do MNE em ação no exterior deve ser identificada a sua função específica. Neste caso, um diplomata é um diplomata, um vice-cônsul é um vice-cônsul.

Um outro colega decidiu colocar igualmente "os pontos nos is" sobre este tema, numa carta enviada ao DN, acolhida aqui pelo provedor dos leitores do jornal, Óscar Mascarenhas. Como dizia alguém de cujo nome me não quero lembrar, todos não somos demais...

Hoje, surgiu no "Público" uma nova reportagem sobre o tal vice-cônsul, escrita em termos perfeitamente corretos. Que este exemplo frutifique, é o que posso esperar.

(Nota: uma primeira versão deste post continha uma inexatidão)

segunda-feira, maio 28, 2012

Grécia

Na Grécia, o povo votou e os políticos que escolheu consideraram-se incapazes de gerar uma solução governativa que permitisse impor as reformas que ajuda externa hoje exige. Por essa razão, a Grécia regressa, daqui a dias, às urnas, na esperança de que o povo grego reveja o seu sentido de voto e faça uma escolha diferente. 

E se não o fizer? E se o sentido desse voto confirmar a não aceitação das políticas de rigor que, há mais de dois anos, estão a ser impostas ao país, sem que, no entanto, os gregos vejam uma luz de esperança, ao fundo do túnel de sofrimento que atravessam?

Ontem, um português, amigo de há mais de meio século, que vive na Grécia, deixou-me no Facebook a mensagem: "por aqui vai tudo mal, mas ainda vai ser pior".

E juntou-lhe um poema de Gunter Grass, que ele próprio traduziu:

                         "A vergonha da Europa"

À beira do caos porque fora da razão dos mercados,
Tu estás longe da terra que te serviu de berço.

O que buscou a Tua alma e encontrou
rejeita-lo Tu agora, vale menos do que sucata.

Nua como o devedor no pelourinho sofre aquela terra
a quem dizer que devias era para Ti tão natural como falar.

À pobreza condenada a terra da sofisticação
e do requinte que adornam os museus: espólio que está à Tua cura.

Os que com a força das armas arrasaram o país de ilhas
abençoado levavam com a farda Hölderlin na mochila.

País a custo tolerado cujos coronéis
toleraste outrora na Tua Aliança.

Terra sem direitos a quem o poder
do dogma aperta o cinto mais e mais.

Trajada de negro, Antígona desafia-te e no país inteiro
o povo cujo hóspede foste veste-se de luto.

Contudo os sósias de Creso foram em procissão entesourar
fora de portas tudo o que tem a luz do ouro.

Bebe duma vez, bebe! grita a claque dos comissários,
mas Sócrates devolve-Te, irado, a taça cheia até à borda.

Os deuses amaldiçoarão em coro quem és e o que tens
se a Tua vontade exige a venda do Olimpo.

Sem a terra cujo espírito Te concebeu, Europa,
murcharás estupidamente.

domingo, maio 27, 2012

Rússia

De há muito que deixei de ligar ao festival da Eurovisão, que, salvo algumas exceções, se converteu num espetáculo "kitsh", de qualidade quase sempre muito duvidosa. O facto de algumas das nossas participações nacionais terem oscilado entre o estanhado mau-gosto e o retorno a um nacional-cancionetismo de novo tipo também me estimulou a não perder tempo com aquele festival.

Desta vez, porém, graças ao alerta de alguém, reconciliei-me, momentaneamente, com a Eurovisão. Ao ver e ouvir as velhotas russas, dei por mim a apreciar, com gosto, o espetáculo e a pensar que, por uma vez, o passado pode vir a ter imenso futuro.

quinta-feira, maio 24, 2012

Samuel Pisar

Há dias em que, por precipitação, falamos demais. Ontem, para mim, foi um deles.

Num jantar, aqui em Paris (alguns comentadores acham que a vida dos diplomatas é feita de jantares: é verdade, temos o hábito, quiçá excessivo, de jantar uma vez por dia), fiquei sentado próximo de um cavalheiro, já de certa idade, que, em determinado momento, e tendo sabido que eu era português, se referiu a uma homenagem que vai ser prestada, na UNESCO, a Aristides de Sousa Mendes. Revelou-me estar envolvido na organização e eu congratulei-me logo com isso, tanto mais que, como o informei, era agora o representante português na UNESCO e também ia colaborar no evento. Porque, à mesa, havia uma senhora de permeio e porque ele falava em voz bastante baixa, não tinha ouvido bem o seu nome. 

A certo passo da conversa, ainda sob o tema Portugal, perguntou-me por Mário Soares e pela sua "simpática esposa", que conhecia bem. Disse-lhe as últimas notícias que sabia de ambos, tendo ele acrescentado: "Um livro meu tem um prefácio de Mário Soares". Com um orgulho algo adolescente (cada vez mais me convenço que nós "adolescemos" com a idade), saiu-me de imediato: "Tem graça! Eu também tenho um livro prefaciado por Mário Soares". Sorrimos e o jantar lá prosseguiu.

Minutos depois, perguntei discretamente à senhora que se interpunha entre mim e o tal cavalheiro, já octogenário: "Tem ideia de como se chama o seu vizinho do lado? Não consegui ouvir o nome dele...". A senhora olhou para o pequeno papel que identificava o conviva e disse, baixo: "Samuel Pisar".

Samuel Pisar? "O" Samuel Pisar, nascido na Polónia, que estivera detido em Auschwitz, que escapou miraculosamente das garras de Mengele e de outros cenários de horror, cujo pai fora morto pela Gestapo? "O" Samuel Pisar que, no fim da guerra, se formara em Oxford e na Sorbonne, e que, naturalizado americano, dera aulas em Harvard e fora assessor económico de John Kennedy? Olhei de viés e, com uma curiosidade acrescida, procurei escutar algo que ele dizia para o outro lado da mesa. Nada de decisivo, apenas elogiava a textura dos espargos que estavam a ser servidos, agora que é a época deles.

No final do jantar, num canto, falámos um pouco da Europa e do lugar de Portugal nela. Samuel Pisar é hoje um senador de uma vida que, como poucos, soube recriar a partir da barbárie e que um dia, ao que agora recordo, escreveu: "hoje, sobrevivente dos sobreviventes, sinto uma obrigação de transmitir algumas verdades que aprendi na minha passagem pelo mais baixo da condição humana e, depois, por alguns dos seus momentos altos".

Nunca me perdoarei de ter, inadvertidamente, "rivalizado" com Samuel Pisar, ao reivindicar ter, como ele, um prefácio de Mário Soares. Ou melhor, e pensando bem, talvez tenha a obrigação de ficar contente por poder ter, com ele, esse honroso ponto em comum. 

segunda-feira, maio 21, 2012

Ainda e sempre os livros

Há uns dias, revelei aqui o ambiente que a minha casa em Lisboa iria ter quando todos os meus livros chegassem. Este fim de semana, descobri esta forma um pouco mais prática de os arrumar, embora talvez com alguma dificuldade de acesso àqueles que fiquem no meio. Mas não se pode ter tudo, não é?

sexta-feira, maio 18, 2012

Portugal e a guerra

Meaux é uma pequena cidade na periferia de Paris. Há meses, foi lá inaugurado um museu sobre a primeira Guerra Mundial.

Ontem, aproveitando o feriado, visitei esse museu e recolhi esta imagem num documento comemorativo da nossa participação naquela guerra. Verdade seja que foi a única referência a Portugal que por lá encontrei...

Para além dos estudiosos e de algumas pessoas ligadas à zona onde teve lugar a batalha de La Lys, em 9 de abril de 1918, raro é o francês que não se surpreende quando lhe falo na nossa participação na primeira Guerra Mundial.

Em tempo: para alguns comentadores, críticos do nosso comportamento em La Lys, deixo aqui e aqui o que sobre isso penso.

quinta-feira, maio 17, 2012

Novo governo

Jantar, na noite de ontem, numa embaixada europeia.

O novo governo, acabado de ser anunciado minutos antes, fazia parte do "menu". A anfitriã distribuiu mesmo a lista completa - 34 nomes - pelo convivas, para avaliar as reações.

Do lado dos franceses presentes, que não eram necessariamente da cor do novo governo, foi interessante notar os comentários à forte presença de mulheres e de figuras com nomes que indiciavam uma origem estrangeira. O mais evidente era, contudo, a revelação do seu total desconhecimento face a muitos dos nomeados, em grande parte membros de uma nova geração e, apenas em alguns casos, com alguma expressão mediática no período eleitoral. Há uma nova França que chega ao governo.

Da nossa parte, dos diplomatas, uma atitude mais contida impôs-se. Sublinhávamos as nomeações óbvias, notávamos duas ou três novidades, mais ou menos inesperadas. Mas éramos reservados, nas apreciações pessoais. O país não é o nosso, o governo é o da França e, seja quem for que o integre, passa a ser o nosso interlocutor. 

A certo passo, alguém referiu um certo nome, agora ministro num determinado cargo. Praticamente ninguém o conhecia. Eu e um outro colega estrangeiro fizemos então "um figurão": havíamos almoçado com ele, há cerca de duas semanas. A nossa "glória" durou precisamente o tempo que nos demorou a dizer todas as escassas coisas que nos era permitido reportar daquela conversa. Amanhã, depois dos jornais e dos debates televisivos, todos ficarão a saber tanto como nós. Ou mesmo mais.

Não há nada de mais parecido com um "dinêr en ville", aqui em Paris, do que uma conversa num "Café du commerce" da província francesa ou no "Café central" de qualquer vilória nossa. Podem crer.  

quarta-feira, maio 16, 2012

Ferry

Jules Ferry é a grande referência histórica da educação francesa. Como político, é reconhecido como o introdutor daquilo que hoje é um orgulho de toda a França: a escola gratuita, laica e obrigatória. Morreu em 1893.

O novo presidente francês, François Hollande, quis homenageá-lo no dia da sua tomada de posse, como uma das grandes figuras do pensamento da República.

Aqui del-rei! Uns cocabichinhos da História foram logo desencantar algumas frases de Jules Ferry onde este defendia a superioridade de umas raças sobre as outras, na sua apologia do colonialismo. Nada que, à época, muita gente não pensasse.

Mas como agora está na moda, pelo "politicamente correto", obrigar à releitura crítica das ideias antigas, o presidente François Hollande acabou por ser obrigado, no seu discurso junto ao monumento a Jules Ferry, a fazer notar que parte das suas ideias era inaceitável e não deve servir de exemplo, à luz dos princípios do humanismo contemporâneo.

Pena é que, já agora!, o "politicamente correto" não se alargue à estética. Isso permitiria dizer que também já não são aceitáveis barbas como as que Jules Ferry exibia...

quinta-feira, abril 26, 2012

Feriado

Conversa ouvida, há uns anos, ao almoço, numa mesa ao lado, num restaurante lisboeta, num dia 24 de abril:

- Eu, cá por mim, detesto o 25 de abril! Só trouxe balbúrdia, arruinou a economia e foi uma deceção! Então, cravos vermelhos, nem vê-los!

-  E o que é que fazes amanhã?

- Vou para o monte, ali ao pé de Serpa, já pedi a tarde ao chefe. Tirando uns dias de férias, e ligando ao 1º de maio, faz-se uma "ponte" imensa. Dá um jeitaço!  

Pois dá!

sábado, abril 21, 2012

Corporações

São evidentes - e, para muitos, chocantes - os esforços de várias corporações para tentarem limitar o acesso às suas profissões. Há uns tempos, esses ventos sopraram do lado dos advogados. Mais recentemente, voltou a ouvir-se o apelo, embrulhado, como sempre, em argumentos de "qualidade", agora do lado dos médicos.

Há médicos a mais? Se assim for o caso, então talvez seja de introduzir mecanismos imperativos para forçar a ida para a província profunda da única profissão que tem um emprego garantido pelo Estado, logo no termo do curso. Auscultem-se as populações...

quinta-feira, abril 19, 2012

Os jardins da Europa

No domingo passado, ao passar na "bruxelense" rue de la Loi, recheada de endereços que albergam outras tantas estruturas da União Europeia, alguém me perguntava se não estaríamos perante uma "mastodôntica" instituição, gastadora de recursos.

(A obcecação pelo "downsizing" dos serviços públicos é hoje um virus subliminar a que poucos escapam).

Ontem, num almoço, aqui em Paris, alguém lembrava que a União Europeia, no seu conjunto, tem menos funcionários do que a "Mairie" (Câmara municipal) de Paris. Ao que alguém comentou, numa nota primaveril: "mas tem muito menos jardineiros..." 

quarta-feira, abril 11, 2012

Marxismo turístico

Há muito quem considere que o marxismo faz hoje parte do "caixote do lixo da História", para utilizar uma formulação do próprio Marx.

Porém, verifiquei, há dias, que Karl Marx mantém uma pujante popularidade na sua terra natal, a cidade alemã de Trier (que, em outros tempos e com outra soberania, se chamava Trèves), próxima do Luxemburgo, onde a sua casa-museu é o principal motivo turístico da cidade.

Poderá assim dizer-se que os habitantes de Trier são, à sua maneira, "marxistas"?

quarta-feira, abril 04, 2012

"Encarnados"


Uma tarde, há muitos anos, numa sala de um serviço do MNE na Visconde Valmor, anunciei a um colega, sportinguista como eu, que tinha decidido ir nessa noite apoiar o Benfica, à Luz, num jogo internacional qualquer. Ele olhou-me, grave, e, em voz baixa, esclareceu-me, definitivo e alvaladicamente crítico: "um verdadeiro sportinguista nunca deseja uma vitória do Benfica, seja contra quem for". 

Imaginei ontem esse colega, cofiando o bigode, consolado, lá no Luxemburgo, com o golo (portista?) de Raul Meireles, que colocou um ponto na ambição europeia dos encarnados. (Sabiam que, por assim ter sido determinado pela censura, no tempo de Salazar, nunca ninguém mais ousou dizer ou escrever "vermelhos", referindo-se ao Benfica, embora não se hesite fazê-lo quando se fala dos cartões?). Esse amigo, no entanto, terá de convir que, para além do resultado, o Benfica fez um grande jogo, lutou com imensa dignidade e foi fortemente prejudicado por uma arbitragem tendenciosa.

Talvez seja por ser um "mau" sportinguista, mas confesso a minha incapacidade em não desejar a vitória de qualquer equipa portuguesa que dispute competições internacionais. 

domingo, março 25, 2012

Classes

Encontrei-o há dias. Careca, mais gordo, mais velho, reformado, mas sempre com aquele sorriso jovial, o mesmo que tinha quando andávamos envolvidos nas "guerras" políticas radicais dos anos 70. Falámos do país e dos dramas caseiros.

- Felizmente que pertencemos a uma geração realizada, comentou. Lembras-te quando lutávamos por uma sociedade sem classes?

Eu lembrava-me, mas não percebia onde ele queria chegar.

- Pois bem. Conseguimos o que queríamos: temos por aqui uma sociedade sem classe nenhuma...

Continua um exagerado.

sábado, março 24, 2012

O norte e a diplomacia

Era a minha primeira viagem a Portugal, como embaixador em França. Estava na sala de executiva de Orly e, a certo ponto, perguntei à simpática senhora da TAP se não era já hora do meu voo. Sossegou-me, dizendo que ainda tinha muito tempo. Minutos depois, com um vago pressentimento, levantei-me e fui ver o quadro eletrónico na parede: o voo já estava em "dernier appel". Agarrei as minhas coisas e, de forma apressada, encaminhei-me para a porta. A senhora da TAP interrompeu-me:

- Mas olhe que ainda tem muito tempo! Ainda não chamaram para o embarque.

- Essa agora! Está ali bem claro, no voo para o Porto, que já é a última chamada.

- Ah! mas vai para o Porto!? É que o embaixadores portugueses vão sempre para Lisboa...

A senhora ficou a saber que a regra tinha algumas exceções: também há embaixadores do norte.

Portugal bem

Portugal votou a favor da admissão da Palestina como membro pleno da ONU, numa resolução na Assembleia Geral da organização. A resolução tem...