segunda-feira, abril 10, 2017

Ex-embaixador? Antigo embaixador?

A partir do momento em que, por concurso público, ingressa na sua carreira, um diplomata passa por sucessivas categorias, desde que, para tal, tenha tempo mínimo de serviço em cada uma e lhe sejam reconhecidas condições de ascensão: adido de embaixada, secretário de embaixada, conselheiro de embaixada, ministro plenipotenciário e, finalmente, embaixador. Como é óbvio, nem todos os diplomatas ascendem até ao topo da carreira.

Quando um diplomata chega à categoria de ministro plenipotenciário, a penúltima da hierarquia da carreira, fica qualificado para poder chefiar uma embaixada. Se isso acontecer, fá-lo-á "com credenciais de embaixador". Nesse caso, é-lhe atribuído o título de "embaixador em X", sendo o X a capital ou o país onde está acreditado. 

A tradição e a gentileza diplomáticas mandam a que, no âmbito interno do MNE, quem alguma vez tenha exercido essas funções passe a ser tratado no futuro por "embaixador", independentemente das funções que vier a exercer. Mas não é a esses casos que pretendo referir-me.

Por escolha ministerial, alguns ministros plenipotenciários, desde que possuam determinada antiguidade nessa categoria, podem ser promovidos à mais elevada categoria da carreira - a de embaixador.

Para distinguir estes embaixadores daqueles que apenas têm "credenciais de embaixador", havia a tradição de designar os primeiros por "embaixadores de número" (no Reino Unido por "full rank ambassadors" e em França por "Ambassadeurs de France"). O "número" queria significar que o quadro destes embaixadores é muito restrito, apenas com cerca de 30 lugares (varia ligeiramente com as saídas do quadro para a chefia de lugares junto das Organizações Internacionais). 

Pode entender-se a confusão que por vezes ocorre, pelo facto de alguns ligarem a designação de embaixador à chefia de uma missão diplomática, partindo-se do princípio de que, saindo do posto, o diplomata que aí exercia funções como embaixador deixaria de ter direito a essa designação. Isso é verdade para os ministros plenipotenciários que exerceram essas funções "com credenciais de embaixador", mas não o é para os que entretanto ascenderam ao grupo de embaixadores "de número".

Vale a pena lembrar que houve diplomatas que chegaram ao topo da carreira diplomática sem nunca terem chefiado uma embaixada. Um exemplo? Franco Nogueira, que nunca ninguém deixou de tratar como embaixador, designação a que tinha pleno direito, não obstante o posto mais elevado que exerceu no estrangeiro ter sido o de cônsul-geral.

A regra para olhar estes casos é muito simples: um embaixador tem um estatuto exatamente similar ao de um general ou de um almirante. E, que eu saiba, ninguém se lembra de chamar a estes últimos "ex-generais" ou "ex-almirantes", quando se aposentam ou passam à reserva. A um diplomata que já não esteja no ativo pode, em rigor, chamar-se "embaixador aposentado" ou "embaixador jubilado" (são coisas diferentes uma da outra), do mesmo modo que também se pode designar um "general na reserva".

No meu caso pessoal, tendo passado a integrar a categoria de embaixador "de número" desde 2001, tendo depois ocupado e ultrapassado os três escalões progressivos dentro da categoria, de três anos cada um, sinto-me no pleno direito de protestar sempre que alguém me designa por "ex-embaixador" ou "antigo embaixador".

Porque esta questão se coloca, na maioria das vezes, por simples desconhecimento dos factos, aqui os deixo explicados, da forma mais simples possível, "à toutes fins utiles".

10 comentários:

Anónimo disse...

Apoiado
Fernando Neves

Anónimo disse...

Nos anos 50, quando fui trabalhar como marçano para uma mercearia das melhores que havia em Lisboa (ainda não havia supermercados), recordo que o patrão me recomendou quando fosse levar compras a casa daquele cliente lhe tratasse por Senhor Embaixador. Já estava na reforma... mas assim era tratado.

Anónimo disse...

Tudo seria mais fácil se todos usássemos uniformes.

Jose Martins disse...

Senhor Embaixador,
Em servir/colaborei/ com 9 (mais um que conheci e não servi)e só 2 com a categoria (full) de embaixador, porém mesmo sem o estatuto reformados ou em serviço nunca deixei de os tratar por embaixador.
.
Isso do ex de qualquer coisa não serve e espécice de segregação. Ficaria mais decente, por exemplo, no meu caso, Assistente Administrativo Principal, reformado.
.
Há de facto uma limitação do número de embaixadores, porque nem todos que geriram uma missão diplomática estão preparados ou vocacionados, para desempenhar o alto cargo de embaixador em país estrangeiro.
Saudações de Banguecoque

disse...

Continuamos tristemente um país de doutores, engenheiros, embaixadores, generais e por ai fora... No Reino Unido, onde lecciono, professores catedráticos (em universidades da Russell league) fazem-se tratar pelo primeiro nome por alunos (de licenciatura, mestrado e doutoramento), por colegas e funcionários. Em empresas de grande dimensão como a Google ou o Facebook, também os directores se fazem tratar pelo primeiro nome. Mas claro que em Portugal, não há cá confusões, cada macaco no seu galho. Muito sinceramente, acho que ganharíamos em aprender que todos merecemos o mesmo respeito independentemente do grau académico ou da função que desempenhamos.

Anónimo disse...

Com todo o respeito, tretas.
Fica muito melhor como Francisco.
Toda a gente é alguma coisa na vida: Pedreiro, Polícia, General, Padeiro, Professor, Coveiro, Banheiro, Malandro, Médico, Arrumador, Feirante e até Embaixador.
Mas no fim, o que é mesmo, é João, Maria, Hermenegildo, Raposo, Olho-Azul, Onésimo, Perpétua e até Francisco.

Um Páscoa Feliz.

David Caldeira


Anónimo disse...

O zé vive nessas benditas e igualitárias anglo-saxónia, mas não lhe chega o auto-alegado cosmopolitismo para ter topado que, por lá, os juízes e os médicos se apresentam sempre com um judge ou um doctor à frente do nome. Nunca deu pelos honorables,pelos lords, pelos sirs. Tadinho, que falta-lhe a noção das matizes das coisas sociais e das relatividades. deve leciconar economia.

Manuel do Edmundo-Filho disse...

Ó zé,e no Reino Unido como são tratados os Embaixadores!?

Francisco de Sousa Rodrigues disse...

Deixemo-nos de provincianismos "hipster" de que os "portugas" são uns saloios onde é tudo "Dr." ou "Eng.", porque nessas culturas "ultra-avançadas" não existe necessariamente menor estratificação ou maior igualdade pela não utilização de títulos.

No Reino Unido até haviam carros tratados por Ambassador, não sem antes terem havido os Princess.

Isabel Seixas disse...

Eu confesso que também dou por mim paradoxalmente a reivindicar o percurso profissional através das categorias que adquiri e ostento com orgulho o trabalho de estudo , sacrifício e renuncia a confortos,que me exigiram.

As categorias e a formação que pressupõem são esclarecedoras sim senhor e quem conhece os degraus que é preciso subir na formação e a dificuldade que implicam sabe que devem ser ostentadas com o orgulho de quem se esforça, e mai nada.

Fiquei agradavelmente impressionada com o saber exigido para o ingresso na carreira de diplomata, consolidou o meu respeito.

Não me deixo impressionar pelos apêndices ao nome próprio, mas que são indicadores imediatos e sucintos do que a pessoa poderá ser num certo domínio...

Poder é isto...

Na 4ª feira, em "A Arte da Guerra", o podcast semanal que desde há quatro anos faço no Jornal Económico com o jornalista António F...