terça-feira, outubro 28, 2014

2018


Por esta altura, em 2018, o Brasil terá experimentado 16 anos consecutivos de presidência de personalidades do Partido dos Trabalhadores (PT): oito anos de Lula da Silva e outros tantos de Dilma Rousseff. 

Estes duplos mandatos não foram idênticos. 

Lula acedeu ao poder depois de ter sido derrotado várias vezes. Moderou o seu discurso e conseguiu sossegar os meios económicos. Com Lula e com uma conjuntura internacional favorável, o Brasil cresceu e muita gente saiu da pobreza. O enriquecimento do país forneceu recursos orçamentais para generosas políticas sociais. Pelo meio, o PT revelou-se um fiel aprendiz dos vícios endémicos do sistema brasileiro, que antes tanto denunciara. O Brasil, grato a Lula, como que o absolveu do descarado “patrimonialismo” do PT e, mesmo no auge do chamado “mensalão”, reelegeu-o. E Lula chegou em glória, interna e externa, ao termo dos dois mandatos.

Para lhe suceder, Lula escolheu aquela que tinha sido a sua mais importante ministra. Dilma Rousseff foi eleita em 2010 apenas e só porque era a candidata de Lula. Também porque, do outro lado, tinha José Serra, um homem de centro-esquerda bem preparado mas sem o menor carisma. Dilma Rousseff teve de titular um Brasil que começava a sair dos “anos de ouro” e a ter de enfrentar as sequelas da crise. Mais ideológica do que Lula, demonstrou ter um forte tropismo intervencionista, que desagradou ao empresariado e às classes sociais mais elevadas, que começaram a dissociar-se de um governo que pressentiam menos pragmático do que o do antigo presidente. E sentem Rousseff crescentemente “prisioneira” do peso financeiro da malha de programas sociais, que arregimentou muitos dos votos que no domingo a reelegeram. Temem agora que, num cenário de um Brasil sem crescimento, a despesa pública que sustenta essa imensa rede de políticas possa levar ao desregramento das finanças, fazendo disparar a inflação (o grande pesadelo brasileiro). Esse outro Brasil errou ao opor a Rousseff uma figura de recorte “kennediano”, com uma aura de “playboy” e um perfil programático muito pouco definido, que ela conseguiu, com sucesso. colar à imagem do Brasil pré-Lula.

Em 2018, teremos a possibilidade de aferir em que medida 16 anos consecutivos de “petismo”, com o inevitável aparelhamento da máquina do Estado que é regra no Brasil, terá ou não induzido consequências deletérias no sistema, bloqueando mesmo a facilidade da alternância. 

Um dia, numa conversa com Lula da Silva, referi-lhe a apreciação positiva que ele tinha obtido junto de vários embaixadores estrangeiros, pelo facto de ter resistido à tentação de “brigar” por uma reforma constitucional que lhe autorizasse um terceiro mandato, e que seria fácil de ele obter. Na ocasião, disse-lhe que, de certo modo, ele “tinha conseguido tirar o Brasil da América Latina”, onde a opção pela continuidade política costuma prevalecer sobre a estabilidade institucional. Em 2018, logo veremos se o Brasil regressou ou não à sua geografia natural.


Artigo que hoje publico no "Diário Económico"

10 comentários:

patricio branco disse...

Cada vez mais o brasil alinha com a outra america latina e perde a individualidade e caracteristicas que lhe eram proprias.
a demagogia e o populismo imperam.
e dilma não é lula, não tem nem 1/5 da popularidade e simpatia do antecessor.
as eleições afinal foram decididas no dia do acidente de avião.

opjj disse...

Plenamente de acordo com as suas interrogações. Veremos qual o impacto dos 50 milhões de subsiodependentes, conforme um economista brasilero.Num flash televisivo, uma mulher nova dizia que recebia 150 reais e mostrava dúvidas em quem votar por causa de perder subsídio.. Parece pouco o valor.
Cumps.

Anónimo disse...

"errou ao opor a Dilma um perfil Kennedyano" porquê? Eu realmente não acho Kennedy uma grande espingarda... mas eu sou de direita. E á demagogia opôs-se que perfil?

João Vieira

Unknown disse...

Caro Francisco

Também conversei com Lula, aqui em Lisboa, aparentado pelo Mário Soares. Foi um "papo" interessante - Dilma já era Presidente, ainda havia quem dissesse Presidenta... - em que tive a oportunidade de lhe dar a minha opinião em resumo sobre os seus dois mandatos: excelentes e o mensalão

Sorriu, talvez contrafeito, mas respondeu-me: "Gostei, Vou ensinar isso na Dilma..." Sobre a qual tinha e tenho dúvidas e reticências.

Abç

Anónimo disse...

Tendo menos uns bons vinte e tal anos a menos que o Embaixador FSdaC, tenho idade suficente para ter acompanhado a fase final de João Figueiredo e da transição.

Isso de um Brasil onde a corrupção não fosse endémica é pois coisinha de que me não lembro. De Sarney, a Collor, passando por FHC, pelo PT, pela ARENA.

Cancro tamanho tem de ser ferozmente combatido, e Dilma contemporizou menos que Lula, mas isso nem a tornou mais atraente para o eleitorado conservador. Igual resposta deve ser dada a muitas das justas reivindicações pré-copa do mundo.

Agora, não me venham tentar convencer com capas de revistas e jornais marrons que em vez de jornalismo fazem propaganda e intoxicação em nome das extrema-direita dos coronéis, dos velhos amantes do DOPS e até da 3ª via travestida de social-democrata. A realidade não é o que os jornais fazem dela, nem tem de ser aquela a que os boicotes dos possidentes conduzem.

Helena Sacadura Cabral disse...

Acredito que o aparecimento de Lula no final da campanha, tenha ditado o veredicto. Mas duvido que Dilma chegue sem problemas muito sérios a 2018.

Anónimo disse...

Cconvem ser leitor do "observador", diáriamente, por exemplo:

"Europa: a esquerda não é solução"

Anónimo disse...

A Senhora Helena Sacadura Cabral escreveu pouco mas disse tudo.

Eu acrescento:

"Quem ventos planta, tempestades colhe".

Haverá, algum dia, Justiça no Brasil?

Ao EMBUSTE, venha de onde vier, digo e direi sempre NÃO.

Anónimo disse...

Da má fé da direita e da terceira via com a eleição de Dilma, falam bem muitas excelências, inclusive nesta caixa de comentários.

Que foi por pouco, foi sim, por mais quase três milhões e meio de votos, menos que da última vez, ams três milhões e quase meio de votos é voto pa catano. E Dilma Teve 51,64 % dos votos contra os 48,36% de Aécio.

Depois dizem que há o país ao meio. Preocupação que só dá na Venezuela ou no Brasil. Devem esquecer-se de Portugal, mais pequeno é certo, mas onde José Mattoso escreveu um livro chamado Identificação de um País e fala de um país desde sempre em dimorfismo social e cívico. Claro que isso do país dividido só interessa quando a esquerda ganha.

Em 1992, Clinton ganhou com 42 por cento dos votos, em 2004, Bush filho, esse que tão boa figura fez com Barroso, na Terceira, teve 50,7% contra 48,3%.

Mas bão, bão tinha sido em 2000 quando o Bushito se ficara com 47,9% dos votos e ainda assim foi eleito contra Gore, que arrecadara 48,4%.

Eu percebo o problema da divisão dos votos. E da divisão do país. Que traz problemas. Mas percebo eu, que para os que andam preocupados com eventuais c onflitos por causa da divisão isso nem será problema. A direita sul-americana é golpista e não sei se estará curada. O golpe foi foi usado recentemente na Venezuela, da primeira vez de Chavez esteve eleito, ou nas Honduras, onde o governo eleito se varreu para debaixo da mesa uns tempinhos curtos após a sua vitória.

Garanto que se tivesse vencido Aécio, os actuais preocupadinhos se estavam lixando para a divisão do país.

Anónimo disse...

Elogia-se o Observador, circular promocional da candidatura de Barros a PR, dirigido pelo seu antigo assessor de imprensa, David Dinis - um homem que ainda mal tinha deixado o lugar e já assumia editorias políticas em tudo que era jornal nacional do DE ao DN, sem pudor em entrevistas antigos e recentes chefes - e José Manuel Fernandes, cuja opinião se escora em mais do que nos pontos de vista reaccionários e que traz sempre atrelada a propagandista Helena Matos, antiga educadora do povo que só perdeu os bons hábitos da esquerda nunca tendo perdido os maus de alguma dela.

Só para lembrar

Porque estas coisas têm de ser ditas, irritem quem irritarem, quero destacar a serenidade construtiva demonstrada por Pedro Nuno Santos e pe...